A CONCOMITÂNCIA DO PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO COM O PROCESSO JUDICIAL: O MANDADO DE SEGURANÇA PARA CONTROLE DE LEGALIDADE DE ATOS DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO FISCAL
LA SIMULTANEIDAD ENTRE EL PROCEDIMIENTO ECONÓMICO-ADMINISTRATIVO Y EL PROCESO JUDICIAL: EL USO DE LA ACCIÓN DE “MANDADO DE SEGURANÇA” PARA CONTROL DE LA LEGALIDAD DE LOS ACTOS DEL PROCEDIMIENTO
Mestrando em Direito na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). Graduado em Direito pela Faculdade de Direito do Recife (FDR/UFPE). Julgador do Tribunal Administrativo Tributário do Estado de Pernambuco (TATE-PE). E-mail: davicozzi@hotmail.com
PhD em Direito Tributário pela Universidade de Londres (Institute of Advanced Legal Studies). Graduado e Mestre em Direito pela Faculdade de Direito do Recife (FDR/UFPE). Professor das disciplinas de Direito Financeiro e de Direito Tributário da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). Procurador do Estado de Pernambuco. Advogado. E-mail: paulorosenblatt@hotmail.com
DOI: http://dx.doi.org/10.46801/2595-6280-rdta-47-21
O trabalho, de caráter dogmático, objetiva a investigação do cabimento da ação de mandado de segurança para o controle de legalidade de atos praticados no curso do contencioso administrativo fiscal. Para tanto, inicialmente, aborda-se o conceito de processo administrativo tributário e analisa-se o alcance da vedação à sua coexistência com processo judicial que discuta a legalidade de atos relacionados ao lançamento tributário.
Após, examina-se o delineamento legal do mandado de segurança e a utilização do writ para a proteção de lesões e ameaças a direitos dos contribuintes nas suas relações jurídicas tributárias. Em analogia com as fases do procedimento comum no processo civil, detalham-se as fases do processo administrativo tributário, a fim de estudar as possíveis situações que permitiriam o manejo do mandado de segurança para o controle de legalidade dos atos e omissões praticados no seu trâmite, sem que do ajuizamento decorresse necessária renúncia à discussão da legalidade do crédito tributário na via administrativa. Conclui-se pela ampla possibilidade de utilização do mandado de segurança para a garantia do devido processo legal administrativo e dos seus desdobramentos, o que permite, além de resguardar direitos dos contribuintes, prestigiar o processo administrativo como instrumento eficaz de resolução de controvérsias tributárias.
El trabajo visa la investigación dogmática de las posibilidades de interposición de la acción de “mandado de segurança” para el ejercicio del control de la legalidad de los actos practicados en el procedimiento económico- administrativo. Para tales fines, se describe el procedimiento económico-administrativo en líneas generales y se analiza la extensión de la prohibición a su trámite simultáneo al del proceso judicial que sirva para discutir la legalidad de actos relacionados a la liquidación tributaria. Enseguida se examina la disciplina legal del “mandado de segurança” en el derecho brasileño y su uso para la protección contra lesiones y amenazas a derechos de los contribuyen-tes en sus relaciones tributarias. Se detallan las fases del procedimiento económico-administrativo con la finalidad de estudiar las situaciones que permi-tirían la interposición del “mandado de segurança” para el ejercicio del control de legalidad de los actos y omisiones practicados en su trámite, sin embargo de la continuación del procedimiento. La conclusión es por la amplia posibilidad de interposición de “mandado de segurança” para garantía del derecho al debido proceso en el procedimiento económico-administrativo, lo que posibilita, además de asegurar derechos de los contribuyentes, prestigiar la eficacia de la vía económico-administrativa para la solución de litigios tributarios.
PROCESO
INTRODUÇÃO
No sistema de jurisdição una, adotado pela Constituição Federal de 1988, descabe cogitar da existência de jurisdição administrativa. O processo administrativo, portanto, serve como
instrumento de autotutela da Administração, em regra desencadeado pelo exercício do direito de petição do particular, em procedimento marcado por caráter dialético e em tudo submisso ao princípio do devido processo legal.
Na seara tributária, o contencioso administrativo é o âmbito de revisão provocada da legalidade do lançamento tributário, ato por meio do qual é constituído crédito que, se não impugnado ou finalmente confirmado nas instâncias administrativas de julgamento, é considerado definitivamente constituído e, portanto, apto a ser inscrito em dívida ativa a ser executada em juízo.
À luz da inafastabilidade da jurisdição, com a inexistência de obrigatoriedade de esgotamento de vias administrativas para ingresso em juízo, o processo administrativo de revisão do lançamento assume caráter facultativo. Desta forma, cabe ao contribuinte optar por discutir a legalidade do lançamento nesta esfera ou diretamente junto ao Poder Judiciário – ao qual poderá recorrer, de qualquer forma, caso não acolhidas as suas razões em processo administrativo eventualmente instaurado previamente.
A impossibilidade lógica de que processos sobre a mesma matéria corram em paralelo na esfera administrativa e judicial, o que acarretaria riscos de decisões contraditórias, enseja a previsão do art. 38, parágrafo único, da Lei n. 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais – LEF), que prevê a renúncia à discussão administrativa da legalidade de crédito tributário quando ajuizada ação judicial de titularidade do sujeito passivo da relação tributária.
O alcance de tal dispositivo, no entanto, é limitado, visto que o ingresso em juízo em concomitância com a reclamação administrativa é legítimo quando o objeto dos processos em ambas as esferas não seja idêntico. A linha a separar a possibilidade e a impossibilidade de coexistência entre as instâncias nem sempre é clara, porém.
Neste contexto, destaca-se a possibilidade de utilização do mandado de segurança para a garantia do devido processo legal administrativo, ou, em outras palavras, ainda que se incorra em redundância, para efetuar o controle de legalidade dos atos do processo administrativo de controle de legalidade do lançamento tributário.
O trabalho, assim, busca identificar, a partir do estudo do alcance da limitação legal à concomitância entre a discussão do crédito tributário nas esferas administrativa e judicial, o cabimento do mandado de segurança para interferir nos atos praticados nas diversas fases do processo administrativo tributário.
PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO E LANÇAMENTO: DEFINIÇÕES
O lançamento pode ser conceituado como “ato administrativo de aplicação da norma tributária material que se traduz na declaração da existência e quantitativo da prestação tributária e na sua consequente exigência”1.
O ato constitutivo do crédito tributário, assim, é produto potencialmente resultante do procedimento administrativo preparatório do lançamento, de natureza inquisitorial2 e caráter precipuamente instrutório, de identificação e prova dos liames obrigacionais entre os sujeitos da relação tributária3. Dado o caráter inquisitório do procedimento preparatório, não há necessária participação do contribuinte nos seus atos.
A natureza inquisitorial do procedimento fiscal prévio ao lançamento, com a mitigação do contraditório nesta etapa, entretanto, não representa vulneração a garantias do contribuinte, visto que apenas o ato de lançamento veicula pretensão formal a recair sobre o patrimônio do particular4. Ademais, o direito de impugnação administrativa da exigência fiscal eventualmente formulada engloba o questionamento da validade dos atos preparatórios, os quais, conquanto não produzam efeitos jurídicos tributários autônomos, condicionam a validade do produto resultante, ainda que com ele não se confundam5.
Os atos integrantes do procedimento preparatório, portanto, não são impugnáveis administrativamente de forma autônoma, isolada, mas somente enquanto parte do ato constitutivo. Tal limitação, por óbvio, não impede que lesões ou ameaças a direitos decorrentes da prática de atos preparatórios sejam reparadas ou inibidas pelo Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, da CF/1988), ainda que deles não resulte exigência fiscal imediata ao contribuinte.
Neste sentido, a provocação ao Poder Judiciário é indispensável para coibir a perpetração de atos de sanção política, entendidos como “restrições de direitos fundamentais impostas pelo Poder Público com a finalidade oblíqua e desviada de efetuar a cobrança do crédito tributário sem a observância do devido processo legal”6 – ou seja, sem que seja constituído crédito tributário passível de controle de legalidade na via administrativa, com os efeitos decorrentes. É exemplo desta prática a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos, inadmissível consoante entendimento sumulado do Supremo Tribunal Federal (Súmula n. 323).
A análise provocada da legalidade do lançamento tributário é realizada, na esfera administrativa, quando instaurado processo administrativo inaugurado com a manifestação da resistência do sujeito passivo à pretensão do ente tributante, no exercício do seu direito de petição de fulcro constitucional (art. 5º, XXXIV, “a”, da CF/1988). Deste direito, é corolário o direito a uma decisão administrativa que analise as objeções formalmente opostas à pretensão fiscal7.
O também chamado contencioso administrativo fiscal, portanto, inicia-se com a impugnação administrativa do ato constitutivo do crédito tributário, suspensiva da exigibilidade do crédito tributário (art. 151, III, do CTN), a ser analisada por órgãos da própria Administração, a fim de controle interno de legalidade do lançamento e do procedimento a ele antecedente, em processo marcado por caráter dialético, com a necessária observância do contraditório e da ampla defesa.
Destaque-se, neste diapasão, que a ideia formulada se refere a um conceito estrito de processo administrativo tributário, que parte da existência de contraposição de interesses formalizada, sem o que haveria atividade procedimental, como nos casos de consulta fiscal ou de reconhecimento de isenções. Em conceito amplo, por outro lado, o processo administrativo fiscal poderia ser definido como o conjunto ordenado de atos administrativos do qual decorre manifestação da Administração Tributária “a respeito de uma relação sua com um contribuinte, ou responsável tributário ou mesmo com um terceiro, ou simplesmente interpreta a legislação tributária”8.
Sob a concepção adotada, o processo tem-se por concluído com a expedição de decisão imutável na esfera administrativa, atacável junto ao Poder Judiciário quando desfavorável ao sujeito passivo da relação jurídico-tributária. Por outro lado, quando favorável à pretensão fiscal, a decisão administrativa irreformável constitui definitivamente o crédito tributário e serve como marco temporal do início da contagem do prazo prescricional (art. 174 do CTN). A decisão final que confirma o lançamento, assim, legitima a inscrição do crédito em dívida ativa, tornando-o exequível judicialmente de acordo com as disposições concernentes à execução da dívida ativa da Fazenda (Lei n. 6.830/1980).
A RENÚNCIA À ESFERA ADMINISTRATIVA PELO CONTRIBUINTE INGRESSANTE DE AÇÃO JUDICIAL: LIMITES
Por tratar o processo administrativo tributário de instrumento de autotutela, ainda que desencadeado por provocação e com a participação dos particulares interessados, o seu resultado definitivo vincula plenamente o ente tributante. Desta forma, é impensável a
provocação do Judiciário, pela Administração, para a contestação da legalidade de atos por si praticados, já que inexistiria interesse de agir para a ação.
É evidentemente diversa a conclusão quanto à possibilidade de provocação do Judiciário pelo contribuinte, seja para discussão da legalidade do crédito tributário, seja para atuação a fim de garantir o regular exercício do direito ao devido processo legal administrativo.
O amplo acesso à justiça e a garantia de inafastabilidade da jurisdição, de fulcro constitucional, acarretam a inexistência de obrigatoriedade de prévio esgotamento de via administrativa para ajuizamento de ações judiciais que ataquem a legalidade de atos administrativos. Não é diferente quanto à discussão do crédito tributário: o processo administrativo tributário é derivado de requerimento facultativo de revisão da legalidade do ato de lançamento, de modo que ao contribuinte cabe optar diretamente pela litigância judicial ou pela prévia contestação administrativa da exigência fiscal que entenda ilegal, sem prejuízo de posterior ajuizamento de ação perante o Judiciário, em caso de não acolhimento das suas razões na esfera administrativa.
Assim, ao contribuinte muitas vezes interessa o prévio questionamento administrativo da legalidade do lançamento em face do aumento de possibilidades de provimentos favoráveis causado pela discussão em mais de uma esfera de cognição, inclusive com o maior conhecimento, dos órgãos administrativos, para apreciação dos fatos e para aplicação do direito ordinário, especialmente em questões relativas às legislações tributárias específicas9. Demais disso, razões várias elencadas pela literatura, tais como a maior celeridade, a menor formalidade, a menor onerosidade e a assistência facultativa por advogado, tudo isso enquanto a exação tributária tem a sua exigibilidade suspensa, estimulariam o prévio acesso à via administrativa, a despeito da limitação do escopo do controle de legalidade efetuado10.
Para que não sobressaiam decisões contraditórias para um mesmo caso, no entanto, a provocação do particular ao Judiciário para exame de determinada matéria controversa implica renúncia à sua discussão na esfera administrativa. Considerando a ampla possibilidade de controle judicial dos atos emanados pelos demais Poderes, o provimento jurisdicional deve prevalecer: por isso, caso tenham o mesmo objeto, o processo administrativo e o judicial não podem correr paralelamente.
A instauração do processo judicial, assim, retira o interesse à decisão administrativa, que não produziria efeitos frente ao conteúdo da tutela jurisdicional prestada11. É esta a
inteligência do art. 38, parágrafo único, da LEF, ainda que a disposição literal se refira apenas à discussão judicial de débito já inscrito em dívida ativa12. Desta forma, a previsão legal de renúncia à esfera administrativa pelo ajuizamento de ação para discussão do crédito tributário é consentânea com as garantias e faculdades do contribuinte, ainda que gere o efeito de fazer operar a preclusão lógica do seu direito de instar a Administração à autotutela13.
Por outro lado, é interessante pontuar que a renúncia à litigância administrativa ocorre apenas em relação ao objeto da ação judicial. Em outras palavras, para se operar a preclusão administrativa, os limites da lide, estabelecidos pelo pedido na petição inicial, devem compreender o objeto do processo administrativo – ou seja, devem envolver o ataque à legalidade do crédito tributário constituído pelo lançamento. A renúncia, assim, se refere apenas “à matéria questionada judicialmente, a ser deslindada pelo dispositivo da sentença, e não a todo e qualquer aspecto relacionado ao ato impugnado”14.
Assim, em primeiro lugar, como já introduzido anteriormente, inexiste óbice à discussão judicial da validade de atos integrantes do procedimento preparatório considerados autonomamente, sem que necessariamente tenham redundado em exigência fiscal relativa a obrigações tributárias principais (v.g. a apreensão de mercadorias regularmente transportadas, a inutilização de livros comerciais em curso de fiscalização, a interdição de estabelecimento sem observância das formalidades).
Para além disso, porém, é possível imaginar a coexistência do processo judicial e do processo administrativo em situações nas quais se discutam matérias relacionadas, mas inconfundíveis. Exemplificativamente, o questionamento judicial ao cabimento da aplicação de penalidade pecuniária por descumprimento de determinada obrigação que tenha ensejado lançamento tributário15, dada a ausência de identidade entre os atos de imposição de multa e de exigência de tributo, mesmo que formalizados em um mesmo auto de infração16.
De igual forma, não há necessária renúncia à instância administrativa com o ingresso de ação judicial para a discussão de atos ou omissões praticados no curso do processo administrativo tributário.
Aqui, é de se notar a submissão do processo administrativo ao princípio do formalismo moderado, inclusive na sua vertente que visa à celeridade e à economicidade do trâmite17. Por isso, não há garantia de recursos contra atos praticados incidentalmente no processo, que não sejam consubstanciados em decisões aptas a confirmar ou extinguir o crédito tributário – estas, sim, sujeitas a necessário duplo grau de cognição18.
Nestes casos, assim como em outras situações acima exemplificadas, sobressai a idoneidade do mandado de segurança para a tutela dos interesses dos contribuintes, com o fito de garantir o direito ao devido processo legal administrativo:
“Emprego ainda pouco frequente, mas assaz relevante, do mandado de segurança, é o destinado a garantir o devido processo legal administrativo. Imagine-se, por exemplo, que um contribuinte que tenha negado, na esfera administrativa, o direito à produção de uma determinada prova que considera importante, ou tenha indevidamente obstaculizado o uso de um recurso. Nesses casos, poderá questionar judicialmente o ato que entende haver malferido o seu direito a um devido processo administrativo, pedindo a continuidade desse processo após a correção do vício. Note-se que o contribuinte não submeterá ao crivo do Poder Judiciário, nesse momento, a questão ‘de mérito’ discutida no processo administrativo. Caso se trate de um processo administrativo de controle da legalidade do ato de lançamento, não questionará no mandado de segurança a legalidade do tributo exigido, mas a higidez do processo administrativo correspondente. Corrigido o vício apontado (determinada a produção da prova, ou o conhecimento do recurso), o processo administrativo seguirá seu trâmite e será julgado pela autoridade administrativa.”19
A prolação de decisão administrativa acerca da legalidade do lançamento, enquanto possibilidade para adequada solução dos conflitos tributários, constitui direito do contribuinte amparável pelo mandado de segurança20. A ação mandamental prevista no art. 5º, LXIX, da CF/1988, e regulamentada pela Lei n. 12.016/2009 (Lei do Mandado de Segurança – LMS), merece as brevíssimas considerações a seguir.
O MANDADO DE SEGURANÇA NO PROCESSO TRIBUTÁRIO: ALGUMAS NOTAS
Em primeiro lugar, é útil a definição do mandado de segurança como:
“[...] instituto processual de raiz constitucional em norma de eficácia absoluta plena, com natureza jurídica de garantia individual, destinado à proteção das prerrogativas do indivíduo ou de coletividade em face do Estado, de atuação necessariamente célere e eficaz, que colima a correção jurídica de abusos do Poder Público iminentes (função preventiva) ou já perpetrados (função repressiva), por agente coator ou autoridade coatora, cometidos diretamente ou por interposta pessoa física ou jurídica, não estancáveis por habeas corpus ou habeas data, ilimitável e incondicionado a qualquer espécie de contracautela, senão pelos seus pressupostos constitucionais específicos.”21
Por estas características, o mandado de segurança é considerado por muitos a ação tributária por excelência, dada a sua vocação para servir como “instrumento judicial de proteção do cidadão-contribuinte diante do exercício da função fiscal, campo propício para a conflituosidade entre Estado e cidadão”22. Na seara tributária, serve tanto para a tutela do direito material do contribuinte, quanto para assegurar o direito a decisões administrativas relativas a questões derivadas das relações tributárias23.
O dispositivo constitucional que prevê a ação mandamental, neste sentido, estabelece que a segurança será concedida “para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”.
As condições necessárias e suficientes para a concessão do mandado de segurança são, portanto, a existência de um direito líquido e certo e a sua violação ou ameaça por um ato ilegal ou abusivo de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições públicas24. O mandado de segurança representa, assim, exclusiva garantia do cidadão em face do Poder Público, insuscetível de manejo pelo próprio Estado ou por particular em face de outro particular, no âmbito de relações privadas25.
Por sua vez, a liquidez e certeza do direito a que se refere o dispositivo legal tem relação, na verdade, com os fatos aduzidos pela parte autora, que devem ser comprovados no momento da propositura da ação, com o fornecimento dos documentos necessários para tanto, a servir como provas pré-constituídas capazes de elidir a presunção de legitimidade dos atos administrativos atacados26. A exceção, neste caso, refere-se à impossibilidade de fornecimento imediato da prova documental por razões imputáveis à autoridade administrativa que a detenha, que pode ser ou não a autoridade coatora cujo ato tenha ensejado o ingresso da ação, hipótese na qual a determinação para a sua apresentação constará como medida preliminar a ser adotada pelo juízo competente (art. 6º, §§ 1º e 2º, da LMS).
Assim, cabe o writ quando o autor, além de ofendido em sua esfera de direitos subjetivos, for capaz de demonstrar de plano que a ofensa decorre diretamente de ato de autoridade, que não se confunde com mera disposição legal abstrata27. O mandado de segurança, portanto, é um remédio jurídico processual, ou, dito de outro modo, um direito a um procedimento específico – “sumário, abreviado, expedito, destinado à obtenção de uma sentença em pouco tempo, já que tudo já está provado, não havendo necessidade de instrução probatória”28.
A legitimidade passiva pertence à pessoa jurídica da qual tenha emanado a lesão ou a ameaça de lesão, sobre a qual, afinal, recairão as consequências financeiras da demanda29. À autoridade coatora, responsável pelos atos ou pela ordem para a prática dos atos tidos por ilegais (art. 6º, § 3º, da LMS), incumbe a prestação das informações, equivalentes a um depoimento em juízo, e o cumprimento da eventual decisão mandamental proferida; a sua identificação, ademais, serve para definição da competência do juízo30.
A decisão no mandado de segurança tem natureza mandamental, visto consistir na expedição de uma ou mais ordens em face da autoridade administrativa coatora para que pratique ou deixe de praticar um ato determinado, ainda que a partir de uma declaração incidental – por exemplo, que não seja exigido determinado tributo (objeto da ação) em função da inconstitucionalidade da lei que o instituiu (declaração incidental). Por isso, em matéria tributária,
“[...] o mandado de segurança é um excelente instrumento que nossa ordem jurídica coloca à disposição do contribuinte para o controle da validade jurídica da
tributação. Não apenas para o controle da legalidade e da constitucionalidade da exigência do tributo, mas também do lançamento tributário em todas as suas fases e ainda de todo e qualquer ato praticado por autoridade da Administração Tributária. Desde que o direito a ser defendido seja líquido e certo, é cabível o mandado de segurança contra ato desprovido de validade jurídica, praticado por qualquer autoridade da Administração Tributária, de qualquer dos níveis governamentais.”31
A lei que regula o mandado de segurança, entretanto, nos seus exatos termos, veda a concessão da medida pleiteada “quando se tratar de ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução” (art. 5º, I, da LMS). A previsão tem substrato lógico, já que a suspensão da eficácia do ato ilegal por força de interposição de recurso administrativo faz cessar a eventual lesão, ou ameaça de lesão, durante o período em que vigorar32.
O dispositivo tem evidentes implicações no processo administrativo tributário, considerando que “as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo” são causas de suspensão de exigibilidade do crédito tributário constituído pelo lançamento (art. 151, III, do CTN). Em outras palavras, o lançamento ou a decisão administrativa que o confirma no todo ou em parte não são capazes de produzir os seus regulares efeitos enquanto pendente análise de impugnação ou recurso, conforme previsto nas leis específicas e à luz do princípio do duplo grau de cognição – uma vez impugnado, o crédito tributário volta a ser exigível apenas com a sua constituição definitiva, quando finalizado o contencioso administrativo.
Desta forma, em princípio, a interpretação literal da limitação contida no art. 5º, I, da LMS parece inviabilizar o ajuizamento de mandado de segurança para a discussão judicial do crédito enquanto não concluído o processo administrativo. Apesar disso, dada a incompatibilidade de tal interpretação do dispositivo com o princípio da inafastabilidade da jurisdição, a questão é resolvida com a perda superveniente de objeto do eventual recurso administrativo quando ingressado mandado de segurança para discussão da mesma matéria33.
De uma forma ou outra, também em consonância com o art. 38, parágrafo único, da LEF, longe de impedir a propositura do mandado de segurança (já que inexiste obrigatoriedade de prévio esgotamento da instância administrativa), o ingresso em juízo para a discussão de crédito tributário pendente de análise pela Administração implica a renúncia do
interessado à discussão da matéria neste âmbito. Se não há interesse de agir para o ingresso da ação na pendência de revisão de ato com efeitos suspensos, tampouco existe óbice à desistência do recurso administrativo para imediata discussão da matéria no bojo do procedimento judicial especial34.
Neste sentido, eventuais desistências de recursos administrativos interpostos a fim de impetração de mandado de segurança podem ter como razão de fundo a possibilidade de consecução de medidas liminares, com a antecipação da tutela em questões de direito que, de outro modo, obedeceriam ao trâmite normal do processo administrativo. No procedimento especial do mandado de segurança, inclusive, a liminar é medida diretamente ligada à finalidade do writ, tanto mais por ser comum que o direito liminarmente assegurado seja exaurido em si próprio35.
Ainda sobre a liminar no mandado de segurança, cumpre anotar brevemente que a Lei n. 12.016/2009 veda a sua concessão, no que tange à matéria tributária, para a compensação de créditos e para a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior (art. 7º, § 2º), em disposição sobre a qual pairam questionamentos acerca da sua constitucionalidade36. Ponderações da mesma natureza existem quanto à possibilidade de exigência de caução, fiança ou depósito para a concessão de medida liminar, prevista no art. 7º, III, da LMS37.
De qualquer maneira, verificada a possibilidade de ajuizamento de mandado de segurança para prevenir ou reprimir atos de diversos matizes oriundos das relações jurídicas tributárias, há que se ter em conta a plena possibilidade de concessão de medidas liminares também no bojo da discussão da legalidade dos atos integrantes das diversas fases do processo de controle administrativo da legalidade do lançamento.
O MANDADO DE SEGURANÇA COMO INSTRUMENTO DE CONTROLE DE LEGALIDADE DOS ATOS DO PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO: FASES DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO FISCAL
O Código de Processo Civil de 2015, para além da previsão expressa de aplicabilidade supletiva e subsidiária aos processos eleitorais, trabalhistas e administrativos (art. 15), tem, pela sua importância e completude, vocação para servir como norma estruturante do sistema processual nacional. Desta forma, a análise das fases do processo administrativo tributário passa pela analogia com a estrutura das fases do procedimento comum, já que
servem como espelho – apesar da óbvia necessidade de adaptações e mitigações – para a organização dos demais ramos do direito processual. Neste sentido,
“O procedimento comum, em si e como método subsidiário que complementa os procedimentos especiais (art. 318, parágrafo único), costuma ser dividido, pedagogicamente, em quatro fases básicas: de postulação (arts. 319 a 346), de saneamento (arts. 347 a 357), de instrução (arts. 358 a 484) e de decisão (arts. 485 a 508). Eventualmente, podem-se agregar duas outras fases: a de liquidação, quando a sentença condenatória se apresentar como genérica ou ilíquida (arts. 509 a 512), e a satisfativa, quando houver necessidade de promover o cumprimento forçado do comando sentencial (arts. 513 a 538).”38
Especificamente quanto às etapas do processo administrativo fiscal, conquanto a disciplina da matéria pertença à competência dos entes federados, há uma convergência, em linhas gerais, da regulação do tema com a legislação federal, consolidada no Decreto n. 70.235/1972, recepcionado pela Constituição Federal como lei ordinária39. Em comparação com a legislação estadual de Pernambuco (Lei n. 10.654/1991), é possível perceber o acerto da afirmativa, bem como a possibilidade de estabelecimento de paralelos com as fases do procedimento comum no direito processual civil.
Como anteriormente delineado, o processo administrativo tributário tem início com a impugnação do sujeito passivo à exigência contra si formulada: antes disso, não há litígio instaurado, nem exercício de autotutela, mas apenas pretensão unilateralmente veiculada pelo Poder Público.
Neste ponto, no entanto, a lei pernambucana que regula o processo administrativo tributário adota conceito diverso, ao prever que o processo é iniciado de ofício com o lançamento do crédito tributário (art. 2º, I, da Lei n. 10.654/1991). É de se notar, entretanto, que, ao tratar do exercício do direito de defesa do sujeito passivo (art. 41, caput), a mesma lei trata da possibilidade de impugnação parcial de valores relativos ao procedimento de ofício – concluído com o lançamento, como antes visto.
Pode-se considerar, desta forma, que a fase postulatória do contencioso administrativo fiscal tem início com a defesa apresentada pelo sujeito passivo, seja ela em referência à totalidade do lançamento ou apenas parcial, hipótese na qual será instaurado verdadeiro processo apenas em relação a esta parcela. Na fase postulatória do processo administrativo tributário, cabe ao sujeito passivo apresentar impugnação ao lançamento no prazo
preclusivo estabelecido em lei, e o objeto da defesa administrativa é a desconstituição total ou parcial do crédito tributário constituído.
Assim, se, notificado do lançamento, o contribuinte opta por efetuar o pagamento dos valores exigidos, opera-se a extinção do crédito tributário decorrente (art. 156, I, do CTN), sem que haja contraposição de interesses formalizada. Por outro lado, se decorrido o prazo para defesa sem que haja impugnação ou pagamento, opera-se a preclusão para o exercício do direito à discussão administrativa e ocorre a constituição definitiva do crédito tributário, dado o caráter facultativo da instauração do contencioso administrativo.
Desta forma, o conhecimento da defesa tempestiva apresentada pelo contribuinte é responsável por suspender a exigibilidade do crédito e a garantir a sua revisão administrativa: é o ponto fundante do devido processo legal administrativo, já que representa o início do contraditório e da possibilidade de exercício de ampla defesa. O direito à impugnação administrativa do lançamento, assim, pode ser devidamente resguardado pela via judicial, sem incompatibilidade com a norma veiculada pelo art. 38, parágrafo único, da LEF, quando não haja o conhecimento da defesa apresentada, ou não sejam processados os efeitos da sua protocolização. Neste caso, a tutela visaria justamente à garantia da discussão do crédito tributário no processo administrativo, e não à discussão do crédito em si.
Considerando, portanto, o direito à impugnação administrativa e aos efeitos dele decorrentes (v.g. suspensão de exigibilidade do crédito), o mandado de segurança pode ser manejado nos casos em que haja a negativa de recebimento da defesa pela repartição fazendária. É idêntica a conclusão quanto ao cabimento da ação mandamental quando a defesa apresentada seja indevidamente não conhecida pelo órgão de julgamento, seja por erro na apreciação da tempestividade, por não atendimento a comprovadas situações de cerceamento do direito de defesa ou mesmo por invalidade da notificação do lançamento impugnado, situação na qual este não estará apto à produção dos seus regulares efeitos enquanto dele não tomar conhecimento o sujeito passivo da exigência.
Demais disso, o mandado de segurança serve também para garantir o exercício do direito de defesa eventualmente obstado em dissonância com o princípio da gratuidade do processo administrativo, derivado da natureza constitucional do direito de petição e da característica do processo administrativo fiscal de instrumento de autotutela tributária40.
A apresentação da impugnação é o momento adequado para o fornecimento das provas documentais idôneas a confirmar as razões de defesa do sujeito passivo, salvo hipóteses excepcionais, já que “o direito à prova, assegurado constitucionalmente pela previsão do
devido processo legal e da ampla defesa, não se apresenta irrestrito ou infinito”41. É certo, no entanto, que, em vistas do princípio do formalismo moderado que rege o contencioso administrativo, eventuais requisitos estabelecidos para o exercício do direito constitucional de petição do particular devem ser analisados de forma ponderada, sob pena de desvirtuar o próprio escopo do processo de revisão do lançamento tributário. A juntada de documentos comprobatórios das razões de defesa, portanto, também pode ser garantida em ação mandamental, caso sofra restrições desproporcionais.
Ainda na fase analogicamente denominada como postulatória, inclui-se a participação da repartição fiscal responsável pelo lançamento, a fim de apresentar manifestação acerca da impugnação – em Pernambuco, conforme disciplina da informação fiscal no art. 44 da Lei
n. 10.654/1991. Neste sentido, considerando as hipóteses exaustivas de alteração do lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo (art. 145 do CTN), a manifestação da autoridade fiscal tem caráter meramente opinativo, a não ser que a lei estabeleça a competência da própria autoridade para julgamento da impugnação em primeiro grau.
Aqui, é válida a ressalva de que elementos novos veiculados nesta oportunidade, ainda que na forma de esclarecimentos a respeito do ato impugnado, devem ensejar a possibilidade de manifestação do impugnante42. A sua participação nesta etapa, na analogia com o procedimento comum estatuído no CPC/2015, seria incluída na fase de saneamento, dentre as providências preliminares previstas para “manter o processo sob o domínio completo do princípio do contraditório”, sem que houvesse decisão proferida sem oportunidade do interessado para manifestação acerca de questões deduzidas43.
Nesta fase, é relevante anotar que, no processo administrativo vigora o princípio da oficialidade, oposto ao princípio dispositivo. Tal norma, também denominada de princípio do impulso oficial, obriga a autoridade administrativa à promoção das providências relacionadas ao processo, independentemente de provocação do interessado, dada a submissão da atividade à legalidade objetiva, ao dever de investigação e à autotutela vinculada44.
Por isso, a presteza na distribuição dos feitos às autoridades julgadoras, a prática célere dos atos incumbentes a outros órgãos fiscais (tais como informações fiscais ou diligências) e a permanente integração do sujeito passivo ao contraditório pela autoridade responsável pela instrução processual constituem deveres da Administração no processo administrativo tributário. A sua observância, assim, configura direito subjetivo do
contribuinte interessado, também passível de resguardo judicial por meio de mandado de segurança com o objetivo de determinar a supressão de omissões no processo – tema mais bem abordado mais adiante.
Ainda quanto à fase saneadora, é fácil verificar que a maior simplicidade do trâmite administrativo é incompatível com a realização de audiências prévias ou julgamentos antecipados, já que todas as matérias são enfrentadas em conjunto em decisão que pode ter como objeto apenas a confirmação ou anulação total ou parcial do lançamento, independentemente da natureza formal ou material dos vícios eventualmente verificados. No processo administrativo tributário, assim, a fase de saneamento – quando existente – é bastante abreviada, dado o formalismo moderado e a menor complexidade do trâmite processual. Em síntese, deve consistir somente em garantir o contraditório (quando veiculados fatos novos), em suprir irregularidades formais eventualmente verificadas e em determinar a produção das provas necessárias à solução do processo, caso estas já não constem dos autos.
As provas de interesse do lançamento tributário, na linha do anteriormente tratado, são objeto de coleta e catalogação no curso do procedimento administrativo preparatório. Uma vez que o procedimento integra o ato de lançamento em seu aspecto formal, a prova documental dos fatos que tenham ensejado a exigência fiscal formulada deve necessariamente acompanhá-la – é o que dispõe, aliás, a Lei Estadual de Pernambuco n. 10.654/1991 (art. 6º, I). De igual forma, como também já salientado, a impugnação ao lançamento deve seguir acompanhada dos documentos que infirmem as razões fiscais responsáveis por constituir o crédito tributário.
Apesar da garantia de admissão ampla de provas, estatuída no art. 3º da Lei Estadual de Pernambuco n. 10.654/1991, a previsão literal é mesmo despicienda, em virtude da submissão do processo administrativo ao princípio da ampla defesa, desdobrado no princípio da ampla instrução probatória, ou no “direito à utilização de todos os meios de prova pertinentes à lide submetida a julgamento administrativo”45. Assim mesmo, a resolução de questões tributárias que envolvam controvérsia fática depende majoritariamente – sem embargo da possibilidade de valoração de quaisquer elementos de prova veiculados por outros meios – do exame de prova documental. A este respeito, é acurada a análise:
“[...] no direito tributário elegem-se, como fatos desencadeadores de vínculos obrigacionais, atividades que, por sua peculiaridade, originam uma documentação própria. A isso se alia a existência de deveres instrumentais impostos aos sujeitos passivos, implicando a realização de registros contábeis, ou seja, documentação.
Disso decorre a importância da examinada modalidade probatória na esfera tributária, prescrevendo o art. 195 do CTN a indispensabilidade de o contribuinte conservar e manter os livros obrigatórios de escrituração comercial e fiscal e os comprovantes dos lançamentos neles efetuados até que ocorra a prescrição dos créditos tributários procedentes das operações a que se refiram.”46
No processo tributário, a prova pericial guarda estreita conexão com a documental. A necessidade de perícia advém da importância de exame da matéria controvertida por especialistas, com o acesso do julgador ao fato jurídico por meio das declarações dos peritos47. Por isso, em matéria tributária, a prova pericial é normalmente produzida em perícia contábil, que consiste justamente no exame técnico de documentos que dependem de conhecimento especial contábil48.
Não obstante a prevalência da prova pericial contábil para o processo administrativo tributário, é possível vislumbrar a importância da realização de perícias e diligências não circunscritas a especialidades contábeis, como no caso da necessidade de comprovação de moléstias graves para fins de concessão de isenções em tributos diretos, ou para cálculo de perdas na atividade industrial a fim de apuração de omissões de saída de mercadorias sujeitas à incidência tributária em sua circulação49. É de se notar, neste ponto, inexistir óbice à produção e ao fornecimento de prova documental de natureza similar pelo interessado, na forma de laudos técnicos a acompanhar as suas manifestações, o que é até mesmo desejável por possibilitar a resolução mais célere do processo.
Em Pernambuco, conforme o art. 4º, § 1º, da Lei n. 10.654/1991, as diligências e perícias podem ser determinadas de ofício ou a pedido. Além do eventual descumprimento de requisitos legais específicos para a formulação do pedido, como a identificação precisa da matéria controvertida ou a indicação de quesitos, devem ser indeferidos os requerimentos de diligências e perícias prescindíveis ou impraticáveis, tidas, respectivamente, como aquelas destinadas a elucidar fatos já provados ou irrelevantes para o processo e como aquelas que requeiram meios inexistentes50. Independentemente de previsão legal expressa, razões lógicas e decorrentes do princípio da economia processual impedem a prática de atos desnecessários ou impossíveis de serem efetivados no processo.
De qualquer maneira, o indeferimento da produção da prova requerida pelo contribuinte não prescinde de regular fundamentação, mormente como forma de possibilitar o controle
da sua legalidade. Tal controle é passível de realização em sede de duplo grau de cognição administrativa, enquanto parte integrante da decisão proferida relativa à higidez do crédito tributário, mas também por via judicial, na qual a decisão que indefere a realização da prova poderá, ademais da hipótese aventada para o processo administrativo, ser impugnada de forma autônoma.
Em tais situações, parece acurada a percepção de que o controle judicial, especialmente pela via do mandado de segurança, deve se cingir à existência e à qualidade da fundamentação da decisão que denega a produção da prova requerida pelo interessado: afinal, não cabe ao Judiciário determinar quais provas devem influir no convencimento da autoridade julgadora, ou quais provas são necessárias para tanto.
Em outras palavras, não existe direito subjetivo do contribuinte a ver deferida a produção de determinada prova ou a realização de uma certa diligência. Existe, sim, um direito a requerer a produção de provas e a receber uma resposta adequada, na forma de decisão devidamente fundamentada a este respeito.
É nulo, assim, ato não motivado que indefere o requerimento do sujeito passivo, ou ato cuja motivação é contraditória, insuficiente ou incoerente com a situação tratada. É anulável, ademais, decisão administrativa que julga a higidez do lançamento sem que haja manifestação da autoridade julgadora acerca de requerimento de produção de provas efetuado pelo sujeito passivo, ou sem que ao mesmo tenha sido oportunizada a ciência e a manifestação acerca de prova produzida no curso da instrução. Nestes casos, por haver cerceamento ao direito de defesa administrativa, o mandado de segurança é via idônea para assegurar o contraditório e a ampla dilação probatória.
Instruído o processo e adotadas as providências necessárias para sanar as irregularidades eventualmente existentes, o julgamento em primeiro grau é realizado por órgãos administrativos dispostos conforme a legislação específica dos entes federados – comumente de forma monocrática, embora, no âmbito federal, a competência caiba a Turmas Julgadoras integrantes das Delegacias de Julgamento51. Em Pernambuco, o julgamento em primeira instância, antes de competência de Turmas Julgadoras, passou a incumbir a julgadores singulares por alteração legislativa realizada em 2019 (art. 71, I e II, da Lei Estadual n. 10.654/1991).
A decisão no processo administrativo é nada mais que ato administrativo de conteúdo vinculado formado através de procedimento regido pelo princípio do contraditório52. Desta forma, no processo administrativo tributário, que tem o lançamento como objeto, a decisão é o ato que confirma, modifica ou extirpa do mundo jurídico o crédito tributário
anteriormente constituído, após enfrentadas as razões formuladas pelo contribuinte frente à exigência fiscal originalmente formulada. Para assegurar a sua validade, a decisão, assim como os demais atos de carga decisória praticados no processo, deve ser devidamente motivada, sobretudo para assegurar o seu posterior controle de validade53, administrativo ou judicial.
As decisões, por sua vez, estão sujeitas ao duplo grau de cognição. Este, enquanto garantia do interessado, é definido a partir da “necessidade de o juízo de mérito sobre determinada pretensão ser realizado por mais de um órgão julgador”54. Representa, ademais, desdobramento do princípio da ampla defesa, visto que desobriga o sujeito de aceitar a primeira decisão proferida, contrária aos seus interesses55. Por isso, a estrutura dos órgãos administrativos responsáveis pela revisão provocada do lançamento deve comportar ao menos uma etapa de revisão hierárquica dos julgamentos56.
Desta forma, para o recebimento dos recursos ordinários, com a produção dos efeitos a ele atinentes, cabem as razões anteriormente expostas a respeito da possibilidade de controle judicial pelo mandado de segurança do direito à impugnação do lançamento. Quanto ao direito ao duplo grau de cognição e a possibilidade de garantia do seu exercício em ação mandamental, tem, ainda, especial relevância a disposição da Súmula Vinculante n. 21, que reconhece a inconstitucionalidade da exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo. Interessa anotar, neste ponto, que o enunciado foi editado após julgado em ação movida em face de dispositivo inserido no Decreto n. 70.235/1972, que regula o processo administrativo tributário federal (ADI n. 1.976/DF).
A Lei n. 10.654/1991 de Pernambuco prevê instâncias recursais ordinárias (art. 78) e especiais (art. 78-A), ademais de hipóteses de remessa necessária (art. 75). Ainda de acordo com a legislação pernambucana (Lei n. 15.683/2015), a instância recursal ordinária é composta por Turmas Julgadoras integradas por três membros (art. 13), e a instância especial, pelo Tribunal Pleno integrado por dez membros (art. 6º c/c o art. 11, I). A colegialidade dos órgãos de julgamento de segundo grau existe na maior parte dos entes tributantes, à exceção de pequenos municípios57.
No julgamento efetuado por tais órgãos, é garantido a advogado regularmente habilitado o direito à realização de sustentação oral e de suscitação de questão de ordem para
esclarecimento de questões de fato no curso do julgamento (art. 95 da Lei n. 10.654/1991). A previsão legal que garante a participação de representante dos interessados no julgamento é em tudo consonante com o princípio do contraditório e da ampla defesa, já que permite influência direta na formação do convencimento do colegiado, independentemente do trabalho desenvolvido pelo relator58.
Por isso, a eventual supressão de tais prerrogativas acarreta a nulidade dos atos decisórios decorrentes, e legitima o controle judicial tanto sobre o ato de violação do direito em si, quanto sobre os julgamentos efetuados. Nestes casos, pode ser determinada a repetição de sessões de julgamento após sanado o vício verificado, sem que haja renúncia à esfera administrativa pelo contribuinte que ingresse em juízo.
Em vistas disso, eventuais restrições ao exercício da ampla defesa, ora consubstanciado no direito de participação no julgamento, ou mesmo de intimação na forma legal de acórdão proferido, podem ser igualmente coibidas em mandado de segurança, pois plenamente cabível para o controle de legalidade de atos colegiados, com a ressalva de que a autoridade coatora corresponde ao dirigente do órgão59.
Superadas as etapas previstas na legislação, o processo administrativo tributário é encerrado com a publicação de decisão imutável na esfera administrativa. Caso remanescente crédito tributário, este é considerado definitivamente constituído; levanta- se a suspensão da sua exigibilidade oriunda da impugnação ao lançamento e permite-se a sua inscrição em dívida ativa para posterior execução judicial, com o início do prazo prescricional para tanto.
Aqui, é certo que as eventuais nulidades nas decisões proferidas podem ser reconhecidas em sede de mandado de segurança, sem prejuízo de nova análise da matéria na seara administrativa, independentemente de já ter sido finalizado o processo. Nestas hipóteses, busca-se resguardar o direito a uma decisão administrativa proferida de acordo com regular procedimento, ou, em outras palavras, “o direito de ter essa questão resolvida pela autoridade da Administração Tributária, com observância do devido processo legal administrativo”60.
A constituição definitiva, por representar condição para a inscrição em dívida ativa, também é pressuposto para a exequibilidade do crédito (art. 201, caput, do CTN c/c o art. 2º, da LEF). Cumpre, neste ponto, ressaltar a evidente inaplicabilidade por analogia das fases do procedimento comum de liquidação e cumprimento de sentença ao processo administrativo tributário: considerando que o crédito tributário deve ser líquido e certo,
eventual liquidação é necessariamente etapa anterior, ou, quando muito, concomitante à decisão definitiva. A execução do crédito, por sua vez, é efetuada junto ao Poder Judiciário, em fase precedida da inscrição em dívida ativa e, desta forma, logicamente posterior à conclusão do contencioso administrativo.
O processo administrativo tributário, assim, é a atividade desempenhada entre a impugnação ao ato administrativo que originalmente constitui o crédito tributário (lançamento) e o ato administrativo que expurga o crédito tributário do mundo jurídico, ou o constitui definitivamente, ainda que modificado (decisão administrativa irreformável). É
o trâmite iniciado com o ataque ao lançamento e finalizado com a decisão administrativa que, no exercício do controle interno de legalidade dos atos administrativos, retira, modifica ou confirma os efeitos previstos no ato vergastado.
Por disposição constitucional (art. 5º, LXXVIII), é garantida a razoável duração do processo administrativo: significa que este “deve ser rápido o suficiente para dar resposta apropriada à lide, porém adequadamente longo para garantir a segurança jurídica da demanda”61. O interesse público é certamente observado na tramitação em tempo razoável do contencioso administrativo fiscal, à luz do princípio da eficiência administrativa (art. 37 da CF/1988). Tem forte substrato lógico, ademais, o interesse da Administração (interesse público secundário) na célere conclusão do processo, condição para que possa proceder à cobrança dos valores eventualmente confirmados como devidos.
É certo, no entanto, que a suspensão da exigibilidade do crédito tributário no curso do processo administrativo configura fator de fundamental interesse para que vários contribuintes apelem à instância administrativa, muitas vezes com o fim único de adiar o cumprimento de obrigações. Apesar disso, para os contribuintes que adotam a via administrativa como instrumento para a discussão legítima da sua resistência à pretensão fiscal, a garantia da razoável duração do processo administrativo tributário é importante para que sejam desincumbidos imediatamente de cobranças indevidas, ou para que possam planejar o impacto dos débitos no fluxo de caixa, quando afinal convencidos do acerto do lançamento revisado, ou mesmo para fazer cessar a incidência dos juros de mora previstos no art. 160 do CTN.
Ainda do ponto de vista prático, a demora para a conclusão do processo pode acarretar para
o contribuinte aumento de despesas com representação jurídica, perigos quanto a erros da Administração quando necessite declarações de regularidade fiscal, ou até a inércia para a adaptação a entendimentos veiculados pelo fisco em lançamento, mas ainda não confirmados pela instância revisora, gerando riscos de futuras novas exigências62. Para
estes casos, é legítima a provocação ao Judiciário para que intervenha no processo a fim de fazer observar a garantia constitucional de razoável duração.
Ocorre que os prazos previstos na legislação para a prática de atos no processo administrativo tributário são geralmente tidos por impróprios, “aqueles fixados em lei como mero parâmetro a ser seguido, sem que de sua inobservância exsurja qualquer tipo de preclusão”63 – é, aliás, o que dispõe o art. 16 da Lei Estadual de Pernambuco n. 10.654/1991, que veda a cominação de nulidade pela inobservância de prazos por parte de servidores fazendários. Assim, não há qualquer consequência ex lege para o descumprimento dos prazos de 15 dias para a prestação de informações fiscais (art. 44, § 2º, da Lei n. 10.654/1991), de 90 dias para instrução e julgamento de primeira instância administrativa (art. 71, II, da Lei n. 10.654/1991) ou de 60 dias para julgamentos de segunda instância (art. 73, II, da Lei n. 10.654/1991).
Tais prazos, no entanto, podem servir como importante parâmetro para a aferição da razoabilidade da duração do processo administrativo, como mínimo ponto de partida para que se avalie a pertinência do tempo levado para a prática de atos tendentes à conclusão do processo. O mandado de segurança, portanto, é instrumento idôneo para a preservação da razoável duração do processo administrativo tributário, já que cabível para coibir a inércia da Administração, com a imposição judicial para a prática de ato indevidamente retardado64. Neste ponto, segundo entendimento sumulado pelo Supremo Tribunal Federal (Súmula n. 429), a existência de recurso administrativo com efeito suspensivo não impede o manejo do writ para fazer frente a omissões da Administração.
Finalmente, como se percebe, o mandado de segurança é instrumento idôneo para o controle de legalidade dos atos do processo administrativo tributário – ou, dito de outro modo, para efetuar o controle de legalidade do processo de controle administrativo de legalidade do lançamento. Conforme os exemplos elencados, há possibilidade de concessão de segurança a particular interessado no processo administrativo para interferência em todas as fases do contencioso, sem que haja necessária renúncia, pelo autor da ação, à discussão da higidez do crédito tributário na esfera administrativa.
CONCLUSÃO
À semelhança do processo judicial, e a despeito da menor complexidade do seu trâmite, o processo administrativo tributário é composto por fases diversas, nas quais são praticados atos administrativos pelas autoridades envolvidas no contencioso e garantida a participação do particular interessado.
No curso do processo administrativo, devem ser observadas as garantias do contribuinte atinentes ao devido processo legal, a fim de conferir concretude ao direito de petição dos particulares frente a atos ilegais da Administração. A intervenção judicial para assegurar o exercício destes direitos, portanto, guarda perfeita compatibilidade com o princípio da inafastabilidade da jurisdição, sem que necessariamente deva ensejar a renúncia do contribuinte à impugnação do lançamento no âmbito administrativo.
Neste sentido, o manejo do mandado de segurança para observância do devido processo legal administrativo é em tudo compatível com o andamento do processo de revisão provocada do lançamento em suas diversas fases, desde a postulação à decisão definitiva, e mesmo para garantir a conclusão do processo em prazo razoável.
Por isso, o controle de legalidade do processo de controle administrativo da legalidade dos atos de lançamento tributário pela via do writ é instrumento idôneo ao resguardo dos direitos e garantias dos contribuintes, mas também ao aprimoramento e à preservação da tramitação do processo administrativo, prestigiando-o como instrumento eficaz de resolução de questões tributárias.
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