Contributo para o Estudo da Extrafiscalidade: a Importância da Finalidade na Identificação das Normas Tributárias Extrafiscais

Contribution to the Study of Extrafiscality: the Importance of the Purpose in the Identification of Extrafiscal Tax Rules

Martha Leão

Doutoranda e Mestre em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo - USP. Advogada. E-mail: martha.leao@humbertoavila.com.br.

Resumo

O artigo aborda o tema da identificação das normas tributárias extrafiscais, como aquelas nas quais a finalidade precípua é a promoção de um princípio político, econômico ou social, e não a mera arrecadação de tributos. Defende-se, desse modo, a viabilidade da classificação das normas tributárias como fiscais e extrafiscais, analisando a importância da definição da finalidade extrafiscal objetivada na lei para o devido controle sobre a utilização instrumental do Direito Tributário. Analisa-se ainda a relação da finalidade extrafiscal com os critérios de controle da extrafiscalidade, justificando a importância da sua identificação e afastando a possibilidade de uma identificação baseada meramente em efeitos (potenciais ou concretos).

Palavras-chave: extrafiscalidade, finalidade, efeitos, controle, proporcionalidade.

Abstract

The article approaches the theme of identification of extrafiscal tax rules such as those in which the main purpose is the promotion of a political, economic or social principle and not mere collecting custom duties. It is argued, therefore, the viability of the classification of tax rules as fiscal and extrafiscal, analyzing the importance of defining the extrafiscal objectified purpose in the law for the proper control of the instrumental use of the Tax Law. It still analyzes the relationship of extrafiscal purpose with the extrafiscality control criteria, justifying the importance of identification and eliminating the possibility of an identification merely based on effects (potential or concrete).

Keywords: extrafiscality, purpose, effects, control, proportionality.

“Wird das Steuergesetz zu Lenkungszwecken eingesetz, sollte sich die Frage stellen, ob das Steuergesetz das geeignete Mittel ist und nicht über das Ziel hinausschiesst. Ziel in diesem Sinne ist nicht der fiskalische, sondern der ‚sonstige‘ Zwecke.“ (TRZASKALIK, Christoph)1

“(...) importa apenas dizer que a interpretação do Direito demanda, além de textos, o exame de outros elementos, dentre os quais estão fatos, atos, costumes, finalidades e efeitos.” (ÁVILA, Humberto)2

Introdução

O debate acerca da extrafiscalidade vem ganhando cada vez mais projeção no cenário jurídico e político. Nesse contexto, cresce o número de trabalhos que tratam do tema, ora enfrentando algum tipo específico de benefício fiscal ou norma tributária extrafiscal (como as normas tributárias ambientais ou os incentivos regionais), ora enfrentando o tipo de controle que é (ou que deveria ser) feito quando se está diante da utilização instrumental do Direito Tributário para outras finalidades que não a mera arrecadação de receitas.

O tema é alvo de uma série de discussões bastante polêmicas: é possível identificar normas tributárias extrafiscais ou apenas efeitos extrafiscais? Normas tributárias extrafiscais estão sujeitas ao regime tributário? A capacidade contributiva é aplicável à extrafiscalidade? Qual o tipo de controle a que estas normas devem estar sujeitas?3 Estas são apenas algumas perguntas, dentre tantas outras que permeiam o debate acerca da extrafiscalidade - um debate que por muito tempo tentou ser afastado das questões centrais da Ciência do Direito Tributário, marcada pelo reducionismo do seu objeto ao estudo da norma, sem se atentar para os temas vinculados a finalidades e efeitos, como este.4

Nesse contexto, o presente artigo tem a pretensão de contribuir para este debate cada vez mais presente, focando em uma das controvérsias a ele atinentes: a questão da identificação das normas tributárias extrafiscais e da importância da definição da sua finalidade. Esta questão, bastante tormentosa na doutrina, tem dividido opiniões. De um lado, há autores que defendem a possibilidade de identificação de normas tributárias extrafiscais, reconhecendo a existência de uma finalidade extrafiscal objetivada na lei e vinculada a um princípio político, econômico ou social.5 A identificação destas normas, ainda que muitas vezes seja difícil de ser realizada em “zonas cinzentas”, seria fundamental para o seu devido controle. De outro lado, há autores que defendem a impossibilidade de se realizar este tipo de “corte” a partir de uma finalidade, defendendo na verdade a existência de efeitos (potenciais ou concretos) extrafiscais e não propriamente de normas tributárias extrafiscais.6 Para este segundo grupo, não seria possível identificar uma finalidade extrafiscal objetivada na lei, mas tão somente a existência de efeitos extrafiscais, o que impediria a divisão entre normas tributárias fiscais (ou arrecadatórias) e extrafiscais.

Adiantando a filiação à primeira corrente, destaca-se desde já que o objetivo será demonstrar a importância da identificação das normas tributárias extrafiscais no ordenamento jurídico com o intuito de permitir o seu controle não apenas pelos seus efeitos extrafiscais concretos, mas também pela intensidade da restrição dos direitos fundamentais a partir da finalidade extrafiscal objetivada na lei. O que se pretende, portanto, é demonstrar a correção da identificação destas normas e a necessidade de um duplo controle sobre elas: primeiro, no plano da validade (através de um controle baseado no princípio da igualdade e no postulado da proporcionalidade), e, segundo, no plano da eficácia (através de um controle sobre os efeitos concretos da norma).

Para isso, o artigo será dividido em dois capítulos. No primeiro, analisaremos a dualidade deste debate, enfrentando as duas correntes existentes e seus principais argumentos doutrinários, apresentando desde já nossa crítica à teoria de que o mais correto seria a mera identificação de efeitos extrafiscais e não de normas tributárias extrafiscais. No segundo capítulo, aprofundaremos o tema a partir da demonstração da importância da identificação da finalidade extrafiscal para a aplicação dos critérios de controle das normas tributárias extrafiscais, assim como analisaremos os riscos desta não identificação. Ao final, espera-se demonstrar a importância do controle sobre a finalidade deste tipo de norma, contribuindo - assim como aqueles que propõem o debate em outra linha - para o estudo cada vez mais aprofundado sobre o tema da extrafiscalidade.

1. A Controvérsia acerca da Identificação das Normas Tributárias Extrafiscais

É evidente a dificuldade que o tema da identificação das normas tributárias extrafiscais levanta para o intérprete e o aplicador da legislação tributária. Isso decorre de uma série de fatores, que passam não apenas pela nossa dificuldade de lidar com questões tão subjetivas como as causas, finalidades e efeitos, como também pela forma, muitas vezes criticável e demasiada, com que a tributação tem sido usada de instrumento para alterações no cenário econômico, social e político. Nesse cenário, crescem de importância os estudos que atentam exatamente para esta utilização instrumental do Direito Tributário, incluindo aí exatamente a questão (tormentosa) acerca da possibilidade ou não de identificação destas normas marcadas pela extrafiscalidade.

Conforme referido, a questão da identificação das normas tributárias extrafiscais é bastante polêmica e tem gerado posições antagônicas na doutrina. Diante desta questão, duas principais correntes têm sido adotadas: por um lado, a defesa da identificação destas normas a partir de uma finalidade objetivada na lei de perseguir uma finalidade precipuamente não arrecadatória; e, por outro lado, a negativa desta possibilidade e a defesa da identificação da extrafiscalidade apenas a partir de efeitos extrafiscais. Esta segunda posição subdivide-se ainda entre aqueles que defendem a verificação de efeitos concretos e aqueles que defendem a verificação de efeitos meramente potenciais. Passamos a analisar de forma mais detida estas duas posições.

1.1. A identificação pela finalidade

A primeira corrente defende a possibilidade de identificação das normas tributárias extrafiscais a partir da existência de uma finalidade precipuamente não arrecadatória, mas sim vinculada a fins políticos, econômicos ou sociais, tais como, a promoção do meio ambiente, o incentivo (ou desincentivo) ao consumo de determinados bens ou de determinado setor industrial, a redistribuição de riquezas, o incentivo a determinadas regiões menos favorecidas, dentre outras inúmeras possibilidades, cada vez mais presentes no cenário brasileiro. A existência de uma finalidade que se sobressai à finalidade arrecadatória, no entanto, não ilide o regime tributário destas normas, o que é evidente pelo próprio nome que se confere a esta categoria: a extrafiscalidade pressupõe a fiscalidade, daí o desacerto de se falar em “extrafiscalidade no Direito Tributário”, uma vez que tal expressão leva à equivocada ideia de que existiria uma extrafiscalidade não tributária, o que não é verdadeiro.

Foi a própria Constituição quem determinou (e até mesmo incentivou) a utilização instrumental dos tributos para fins extrafiscais, a partir inclusive da mitigação de determinadas limitações constitucionais ao poder de tributar para tributos cuja utilização se mostrou preferencialmente extrafiscal. Tal utilização instrumental, contudo, de forma nenhuma afasta o regime tributário destas normas, na medida em que elas seguem sujeitas a todas as outras limitações típicas ao Direito Tributário. A finalidade extrafiscal, porém, soma um outro tipo de controle a estas normas, sem afetar os controles típicos das normas tributárias em geral, ou seja, as normas tributárias fiscais propriamente ditas.Isso significa dizer que é evidente que a norma tributária (fiscal ou extrafiscal) sempre terá efeito arrecadatório, porque o conceito de tributo é exatamente de prestação pecuniária compulsória, que leva à arrecadação. Além disso, superada a questão da neutralidade da tributação, que é um mito,7 também será evidente que o tributo sempre gerará algum efeito extrafiscal nos contribuintes e cidadãos em geral, a partir do momento em que ele passa a ser um critério de consideração para a tomada de decisões econômicas. Exatamente por isso, conforme já reconhecido na doutrina, não existe uma extrafiscalidade e uma fiscalidade pura, porque os efeitos dos tributos não são identificados em separado, coexistindo na prática funções arrecadatórias e reguladoras com intensidade distintas.8 É no meio termo entre esses extremos inexistentes que se deverá buscar as características que indiquem a existência de um tributo extrafiscal, daí porque Barbosa Correa reconhece a dificuldade de afastar a “zona cinzenta” que existe entre a extrafiscalidade e a tributação.9

O reconhecimento da dificuldade dessa tarefa e do fato de que muitas vezes as funções fiscais e extrafiscais se mostrarão indissociáveis,10 contudo, não são suficientes para afastar, primeiro, a necessidade desta distinção, e, segundo, a sua importância. É preciso, portanto, procurar alguma forma de empreendê-la, através da busca por características que indiquem a presença de uma norma tributária que, premeditada e intencionalmente, atua sobre o comportamento dos contribuintes, em detrimento daquelas em que este efeito, ainda que existente, seja secundário diante do objetivo arrecadatório. Estas normas são exatamente aquelas cuja função precípua não seja arrecadatória, mas sim indutora.11 As normas tributárias extrafiscais, assim, são aquelas cujo efeito extrafiscal não é acidental, mas proposital, vinculado à finalidade que justifica a existência do próprio tributo.

Nesse sentido, o primeiro passo para o reconhecimento das normas tributárias extrafiscais é a verificação de uma orientação primordial e específica a um fim distinto do arrecadatório. Para Alonso González, um tributo extrafiscal em seu estado mais puro se caracteriza pela predominância do elemento extrafiscal sobre o fiscal, que chega, senão a prescindir, pelo menos a sacrificar parte da arrecadação, na medida em que o fracasso arrecadatório será exatamente um sintoma de que o fim perseguido está sendo alcançado.12 Há que se buscar, por isso, os tributos pensados e nascidos expressamente para a realização de um fim não fiscal, ainda que de forma secundária ele proporcione ingressos públicos.13 Nessa mesma linha, o posicionamento de Ataliba, para quem o conceito de extrafiscalidade estaria exatamente no “uso de instrumentos tributários para obtenção de finalidades não arrecadatórias, mas estimulantes, indutoras ou coibidoras de comportamentos, tendo em vista outros fins, a realização de outros valores constitucionalmente consagrados.”14

Nesse contexto, é preciso definir as notas características das normas tributárias extrafiscais, para permitir a sua identificação. Destaca-se, nesse ponto, a linha defendida por Varona Alabern ao estabelecer três critérios para a identificação destas normas.15 Primeiro, o tributo deve perseguir com clareza uma finalidade não arrecadatória, que deve ser deduzida do texto da lei reguladora. Segundo, a estrutura interna do tributo deve ser impregnada aos aspectos extrafiscais, de tal forma que não se caracterizem como um acessório, mas sim que marquem seus elementos essenciais com tal intensidade que sem essas notas extrafiscais o tributo perderia sua lógica interna e estaria notadamente desfigurado. E, terceiro, o tributo deve fomentar as condutas e operações de acordo com a finalidade extrafiscal perseguida, sendo para tanto necessário que se incorporem mecanismos que reduzam a carga tributária quando os contribuintes realizem os atos que promovem a finalidade extrafiscal e vice-versa, ou seja, que a carga tributária também aumente quando o contribuinte mostrar uma atitude contrária a ela.16

Assim, mesmo que se reconheça que as normas tributárias extrafiscais são, em alguma medida, também arrecadatórias, nos parece possível identificá-las como aquelas em que este objetivo é minimizado diante da intenção de realizar outras finalidades estatais, que não a arrecadação dos recursos necessários à manutenção do Estado. E, se a legitimação e a finalidade são outras, o corte entre elas é imprescindível para permitir que o controle também seja outro. Reconhecemos, portanto, as normas tributárias extrafiscais como aquelas cuja função precípua seja a utilização do tributo como mecanismo de intervenção sobre o domínio econômico, social ou político, cabendo-lhes servir de instrumento para a concretização das finalidades públicas preconizadas pela Constituição de 1988.17 Em outras palavras, nos filiamos à corrente que reconhece e identifica as normas tributárias extrafiscais através da existência de uma finalidade precipuamente extrafiscal, que se sobressai frente à arrecadação e marca os elementos essenciais do tributo.

Quando se está no campo da extrafiscalidade, o estímulo ao contribuinte não é ocasional, mas premeditado, ou seja, existe a intenção consciente de provocar uma ação ou omissão do indivíduo, ambas consideradas de interesse coletivo, por motivos sociais, econômicos ou até políticos.18 Como destacado por Folloni, a extrafiscalidade, em sentido estrito, está vinculada àqueles tributos concebidos com finalidade diversa da arrecadação: seu objetivo principal é induzir os contribuintes a fazerem ou a não fazerem algo.19 No mesmo sentido, Mendes destaca que a extrafiscalidade caracteriza-se justamente na “intenção (jurídica)” de adoção da regra tributária com finalidades diversas daquela de simplesmente arrecadar recursos aos cofres públicos e, por esta razão, “nem todos os efeitos produzidos pelas regras tributárias podem ser considerados como extrafiscais”.20

Essa diferenciação é fundamental conforme se reconhece que todos os tributos, em maior ou menor grau, causam estímulos ou desestímulos para os contribuintes, gerando assim outros efeitos, que não a mera arrecadação de recursos. A diferença, porém, é que quando se trata da extrafiscalidade este desejo não é uma simples consequência da imposição tributária, mas sim uma deliberada intenção do legislador, que usa o tributo como mecanismo dessa intervenção, premeditando, dessa forma, os efeitos esperados (e desejados) a partir dessa imposição. Por isso, no caso das normas tributárias indutoras, mais do que instituir uma regra tributária, o legislador ou o executivo (quando autorizado para tanto, no caso das alíquotas de determinados tributos) firma autênticos trabalhos em parceria com os destinatários das normas. Com isso, cria-se uma relação de reciprocidade com o contribuinte: se este agir de acordo com a finalidade, será recompensado; se agir de forma contrária, não o será.21

Ainda neste ponto, contudo, é preciso esclarecer que esta finalidade não se confunde com a intenção do legislador histórico, o que traria, com razão, as críticas atinentes ao subjetivismo envolto na definição desta intenção histórica de um legislador que poderia, inclusive, já estar falecido. A finalidade extrafiscal deve estar consubstanciada na própria vontade objetivada na lei (elemento sistemático-teleológico), e não na vontade subjetiva do legislador (elemento genético-subjetivo).22 Isso significa dizer, como destaca Ávila, que esta finalidade objetivada na lei não se confunde com o argumento psicológico ou genético semântico-subjetivo, de acordo com o qual se deve atribuir a uma disposição o significado que corresponda à vontade do legislador.23

Com efeito, ao tratar dos argumentos de interpretação, a Teoria do Direito distingue, de um lado, o argumento psicológico ou genético vinculado à “intenção do legislador”, e, de outro lado, o argumento teleológico objetivo, vinculado ao propósito objetivado na própria disposição.24 As diferenças entre esses argumentos merecem análise pormenorizada. Chiassoni define o argumento psicológico ou genético como aquele na qual se remete à mente, à vontade ou à intenção do legislador, relacionando-o à ideia de que a uma disposição se deve atribuir o significado que corresponder à vontade do legislador.25 O próprio autor italiano, contudo, apresenta a crítica e as dificuldades inerentes a este tipo de interpretação, em virtude da dificuldade de se “penetrar na mente de outro ser humano”, muitas vezes já falecido, assim como a dificuldade de se definir esta intenção diante de um órgão colegiado, que demandaria o reconhecimento de uma “vontade coletiva”.26

No mesmo sentido, a advertência de Guastini, para quem não seria possível acessar a “mente” do legislador, especialmente quando se trata (como usualmente) de um órgão colegiado. Considerando que a intenção é um estado mental individual, resta duvidoso que se possa defender a existência de estados mentais “colegiados”.27 A vontade do legislador seria a intenção do legislador histórico, “de carne e osso”, ou seja, do ser humano (hipoteticamente identificável) que participou da redação e aprovação do texto normativo. Por isso, apelar para a intenção do legislador em sentido estrito é fazer uso de argumento psicológico. O argumento intencional subjetivo, portanto, é fruto de uma interpretação que apela a uma conjectura em torno da intenção do legislador, intenção esta não derivada do texto enquanto tal, mas sim de elementos extralinguísticos.28

Este argumento subjetivo, vinculado à intenção do legislador histórico, porém, não se confunde com a interpretação teleológica, vinculada à finalidade objetivada no próprio texto. Nesse sentido, Chiassoni destaca que cada disposição legal tem um significado sugerido pela pertinente norma final, explícita ou implícita, do instituto, setor ou subsetor ao qual a disposição pertence. Em outras palavras, a interpretação teleológica vincula-se a fins assumidos como objetivos, na medida em que são próprios da disposição isoladamente ou enquanto parte de um determinado todo.29 Guastini, por sua vez, define a vontade da lei “como a razão, o motivo, o fim, o ‘resultado prático’, pelo qual uma determinada norma tenha sido editada”. Por isso, para constatar esta ratio legis é preciso se atentar não (ou pelo menos não tanto) para os trabalhos preparatórios, mas sim para o texto da lei enquanto tal, além das circunstâncias sociais e políticas na qual ela foi editada.30

É exatamente esta finalidade objetivada na lei que consubstancia a finalidade extrafiscal. O fato de que haverá situações em que o intérprete terá dificuldade de identificá-la, não a torna inexistente, nem menos necessária. A identificação da finalidade será fundamental para o seu controle. Nessa linha, a advertência de Ávila no sentido de que a “a referência obscura e contraditória à finalidade buscada impede o controle intersubjetivo da realização da igualdade na exata medida em que obsta a verificação da relação fundada e conjugada de pertinência entre a finalidade e a medida de comparação”.31 Daí a conclusão do autor no sentido de que, por um lado, o Poder Legislativo deve fornecer critérios objetivos e coerentes que permitam, mediante análise objetiva da lei, compreender a sua finalidade, e, por outro lado, o Poder Judiciário deve examinar, de modo objetivo e coerente, os objetivos da lei, de modo a permitir o controle intersubjetivo da igualdade.32 A importância da identificação da finalidade para o controle das normas tributárias extrafiscais será retomada no segundo capítulo do trabalho.

1.2. A identificação pelos efeitos

A defesa pela impossibilidade de reconhecimento de normas tributárias extrafiscais tem como críticas centrais à teoria da identificação pela finalidade o fato de que não seria possível identificar esta finalidade objetivada na lei e o fato de que todas as normas tributárias têm efeitos extrafiscais, o que tornaria a classificação não apenas impossível, como inútil. Dentro desta linha, podemos destacar o posicionamento de Schoueri, cuja obra foi precursora do debate aprofundado sobre o tema da indução pela via tributária. Ao enfrentar o tema, o autor reconhece que todo o tributo possui em alguma medida efeitos indutores, já que ele passa a ser um elemento a ser considerado pelo contribuinte quando da tomada de uma decisão, e, por isso, trata a indução como um dos possíveis efeitos da norma.33 Todo tributo, nesse sentido, tem efeito indutor e pode causar distorções (positivas ou negativas) sobre os contribuintes. Em virtude disso, não se deveria falar em normas tributárias extrafiscais ou indutoras, mas tão somente em efeitos extrafiscais ou indutores. Assim como a arrecadação, a indução seria meramente um efeito da tributação e como tal deveria ser tratada e analisada.34

Em linha semelhante, também se destaca o posicionamento de Rocha, ao defender um controle de efeitos que independeria da classificação em abstrato, uma vez que normas tradicionalmente consideradas fiscais poderiam gerar efeitos extrafiscais. Por isso, critica a busca da finalidade objetivada na lei, defendendo que se percorra o caminho inverso, para identificar quais os “efeitos repartidores e/ou não repartidores produzidos pelas regras (ao menos potencialmente)”.35 Nessa linha, o autor também critica a classificação tradicional de normas como fiscais ou extrafiscais, defendendo que seria a “identificação concreta de efeitos fiscais e extrafiscais” que seria imposta pelo princípio formal da igualdade e que tal identificação deveria ser feita “independentemente da finalidade abstrata que seja atribuída à norma”.36

A defesa pelo reconhecimento apenas de efeitos extrafiscais (e não de uma finalidade extrafiscal) pode ser subdividida em duas vertentes: na primeira, com relação à identificação de efeitos extrafiscais meramente potenciais nas normas, e, na segunda, com relação à identificação de efeitos extrafiscais concretos. Ambas as posições, contudo, parecem criticáveis.

Em primeiro lugar, critica-se a posição de reconhecer a extrafiscalidade tão somente a partir de efeitos meramente potenciais porque este entendimento leva, em última análise, a simplesmente trocar o termo finalidade por efeitos, sem qualquer consequência ou justificativa teórica. Evidente que a finalidade extrafiscal refere-se exatamente aos efeitos potenciais que se visa a promover, daí a possibilidade, aparente, de mera troca de um termo pelo outro. No entanto, há razões jurídicas para a utilização do termo finalidade e não de efeitos potenciais. Primeiro, porque a troca dos termos, embora traduza a mesma ideia semântica, pode levar a uma confusão entre os planos da validade e da eficácia, o que pode comprometer o controle em abstrato desta norma. Segundo, porque a troca dos termos ignora que os efeitos (desejados) pela norma tributária extrafiscal não podem ser antecipados de forma precisa.

Uma das maiores dificuldades da extrafiscalidade reside exatamente no fato de que não é possível prever se a tributação será de fato eficaz para a promoção dos efeitos visados. A extrafiscalidade, nesta linha, está ligada a conjecturas e expectativas.37 O tributo indutor atua como um prêmio ou uma vantagem para o contribuinte que passa a atuar de acordo com a promoção de determinada finalidade, havendo um âmbito discricionário para a escolha do contribuinte de agir ou não daquela forma. Mas, como não é proibido ou ilícito atuar em sentido contrário ao critério determinado pela norma, é possível que o contribuinte escolha não alterar o seu comportamento.38 Esta margem de discricionariedade para o destinatário da norma dificulta a possibilidade de antecipação dos seus efeitos. Os efeitos desejados, em um primeiro momento, existem apenas no âmbito da expectativa ou da idealização de um cenário. Por essa razão, Adamy destaca que a própria ocorrência dos fins desejados não é certa e a ocorrência de fins não previstos é possível.39 Nessa mesma linha, a postura de Luhmann ao defender a imprevisibilidade do cálculo dos efeitos futuros, afirmando que “as dificuldades de previsão das consequências e do seu controle em situações complexas (realistas) são de conhecimento público”.40

Por essas razões, privilegia-se o termo finalidade extrafiscal, em detrimento da menção aos efeitos potenciais. Até mesmo porque, a menção tão somente aos efeitos potenciais, sem que se indique que estes efeitos são aqueles desejados pela norma tributária, leva à classificação de todas as normas como extrafiscais, na medida em que se aceita como premissa que a neutralidade é um mito e que, portanto, todas as normas (potencialmente) gerarão efeitos extrafiscais.41 Considerando, porém, que defendemos um controle duplo sobre a extrafiscalidade, a desconsideração da sua classificação e identificação inviabilizaria o controle da finalidade e do critério de discriminação adotados, tal como será adiante analisado.

Em segundo lugar, critica-se a posição de reconhecer a extrafiscalidade apenas a partir de efeitos concretos, porque com isso a norma perde a possibilidade de ser controlada no momento da sua edição, já que, neste momento, nem mesmo se poderia falar em extrafiscalidade. Esta só passaria a existir em um segundo momento, diante dos efeitos concretos da norma, inviabilizando um controle no plano da validade, da norma em abstrato. O controle só aconteceria em um momento posterior, depois da produção de efeitos, sem que se especifique que momento será este: um mês de vigência? Um ano? O prazo dependeria de uma escolha discricionária. Consequentemente, diminui-se o controle do judiciário sobre estes atos, que é exatamente o que a classificação visa a garantir.

Estas considerações demonstram que a identificação da extrafiscalidade somente a partir de seus efeitos confunde os planos de validade e eficácia, gerando como consequência uma perda de controle sobre a utilização instrumental da via tributária - o que, em última análise, é exatamente o objetivo de seu estudo e classificação. Esta falta de identificação da norma tributária extrafiscal, portanto, anda para trás em termos de controle, afastando a aplicação dos critérios de controle vinculados à finalidade e ao elemento de discriminação escolhidos pelo legislador. Aprofundaremos estes pontos no capítulo subsequente.

Antes, contudo, é importante destacar que a defesa pela importância da finalidade não significa a desconsideração dos efeitos. Muito pelo contrário: o que se pretende é um duplo controle sobre as normas tributárias extrafiscais. De um lado, um controle de finalidade, vinculado à sua mera edição, para que se verifique a legitimidade do fim extrafiscal, a pertinência do critério de discriminação adotado e a proporcionalidade da restrição dos demais princípios envolvidos. De outro lado, um controle permanente de eficácia, vinculado aos efeitos concretos produzidos pela norma, para que se verifique se, no plano fático, a norma se mostrou apta para a produção dos efeitos visados e, portanto, se ela se mostra eficaz e proporcional ante a utilização instrumental do tributo para este fim. Sendo assim, é preciso reiterar que a importância da finalidade em nada altera a importância do controle de efeitos sobre estas normas, uma vez que, conforme já referido: não há função indutora sem eficácia indutora.42

2. A Importância da Identificação pela Finalidade para Fins de Controle

A definição da finalidade extrafiscal objetivada na lei se mostra fundamental na medida em que se verifica a necessidade de controle da utilização instrumental do Direito Tributário. Isso decorre do fato de que a utilização dos tributos para fins precipuamente não arrecadatórios de qualquer forma envolve a tributação, que carrega consigo restrições a direitos fundamentais, tais como a liberdade e a propriedade. Além disso, ao discriminar os contribuintes com base em uma finalidade extrafiscal, o legislador acaba se afastando do critério de discriminação escolhido pelo constituinte (no caso dos impostos, a capacidade contributiva) o que também gera a necessidade de um controle acerca do critério de discriminação escolhido e do respeito à aplicação da capacidade contributiva, ainda que mitigada.43 Os critérios de controle da extrafiscalidade, nesse sentido, passam exatamente pela sua finalidade extrafiscal.

2.1. A proporcionalidade enquanto critério de controle da extrafiscalidade

A extrafiscalidade está sujeita a uma série de critérios de controle. O principal deles, e mais recorrente na própria doutrina sobre o tema, é exatamente o controle de proporcionalidade, que está diretamente vinculado à definição da finalidade extrafiscal perseguida pela norma. A própria definição da proporcionalidade como “postulado estruturador da aplicação de princípios que concretamente se imbricam em torno de uma relação de causalidade entre um meio e um fim”,44 já demonstra por quê a finalidade da norma tributária extrafiscal não é somente importante, como fundamental para seu controle.

Com efeito, a proporcionalidade é considerada o critério de controle por excelência destas normas exatamente porque diante de normas tributárias extrafiscais se imbricam não apenas uma finalidade política, social ou econômica, como também a finalidade de proteção dos direitos fundamentais dos contribuintes que são naturalmente restringidos a partir da opção pela via tributária para a promoção daquela finalidade. As normas tributárias extrafiscais tangenciam os direitos de liberdade do cidadão e, exatamente por esta razão, devem ser analisadas quanto à sua compatibilidade com os direitos fundamentais (por exemplo, liberdade, propriedade, esfera privada) através do exame da proporcionalidade.45 É este exame que vai apurar se a finalidade extrafiscal e o critério que ela traz consigo leva a uma medida proporcional e não excessiva.46 Nessa linha, Schoueri defende que a compatibilização entre a capacidade contributiva e outros valores constitucionalmente prestigiados impõe que diferentes tratamentos tributários devam ter por base uma proporcionalidade.47

No mesmo sentido, Folloni destaca que o controle sobre a extrafiscalidade deverá ser feito pela proporcionalidade, que incide como metanorma, a estruturar o modo de aplicação, sobre aquela lei, tanto dos princípios que prescrevem os fins visados pela tributação extrafiscal quanto das normas que prescrevem os direitos fundamentais por ela restringidos: a igualdade e os direitos de liberdade. Por isso, a proporcionalidade concorre, com outras normas, para definir a validade da tributação extrafiscal: a tributação extrafiscal será válida se, além de outros requisitos, resistir ao teste da proporcionalidade.48 Em sentido semelhante, Papadopol sustenta que a finalidade perseguida pela medida estatal interventiva é fundamental para o exame da proporcionalidade, na medida em que este se refere exatamente ao nexo entre meio e fim. Assim, se houver dificuldade de se apontar tal finalidade na lei, caberá ao Poder Judiciário o ônus argumentativo de definir esta finalidade, que deveria ser indicada pelo próprio ente público para o controle de adequação, integrante do exame de proporcionalidade.49 Em outras palavras, a verificação acerca da adequação da medida escolhida, enquanto parte integrante da aplicação do postulado da proporcionalidade, depende da indicação clara da finalidade da norma, porque depende exatamente desta relação de pertinência entre critério e fim.

Em uma analogia simplória, não há como se saber se o remédio é adequado para combater a doença, se a própria doença não está definida. Isto é, se a finalidade é desconhecida, não se poderá analisar se a medida é a adequada para promovê-la. Além disso, o exame da proporcionalidade exige tanto uma racionalidade entre meio e fim,50 como um exame do nível de restrição aceito para os direitos fundamentais restringidos.51 O objetivo da aplicação do postulado da proporcionalidade é exatamente legitimar uma restrição proporcional dos direitos fundamentais, tendo em vista uma racionalidade entre um determinado meio e sua finalidade. Assim, sua aplicação envolve a análise de três aspectos distintos: (i) adequação (Geeignetheit, rational connection): a medida deve ser capaz de promover a finalidade almejada; (ii) necessidade (Erforderlichkeit, necessity): dentre todas as medidas adequadas, deve ser escolhida aquela que menos restrinja os demais princípios envolvidos; e (iii) proporcionalidade em sentido estrito (Verhältnismäßigkeit i.e.S, proportionality stricto sensu): a medida deve trazer mais benefícios do que malefícios no que tange a promoção dos direitos fundamentais.52

Para os fins deste trabalho, não há necessidade de adentrarmos detidamente em cada um destes aspectos. As considerações anteriores já são suficientes para demonstrar que o exame de proporcionalidade depende da identificação de uma finalidade na norma, uma vez que ele se pauta exatamente por esta racionalidade entre finalidade e critério, assim como na restrição de outros princípios e direitos igualmente protegidos. Ávila é enfático ao definir a aplicação do postulado da proporcionalidade: “sua aplicação depende de elementos sem os quais não pode ser aplicada. Sem um meio, um fim concreto e uma relação de causalidade entre eles não há aplicabilidade do postulado da proporcionalidade em seu caráter trifásico”.53

Isso significa dizer que a identificação da finalidade extrafiscal é fundamental para legitimar o controle sobre estas normas através do postulado da proporcionalidade. É a finalidade que vai pautar a aplicação dos aspectos da proporcionalidade para responder às perguntas aplicáveis: (i) a medida é adequada para a promoção daquela finalidade? (ii) dentre as medidas possíveis e adequadas, ela é a que menos restringe os demais direitos fundamentais envolvidos? (iii) a medida causa, em geral, maiores benefícios ou malefícios ao sistema? Veja-se que todas estas perguntas estarão necessariamente pautadas pela finalidade visada pela norma tributária extrafiscal, uma finalidade, reitera-se, precipuamente não arrecadatória, mas sim vinculada à promoção de um fim econômico, social ou político.

2.2. A vinculação da finalidade com outros critérios de controle da extrafiscalidade

Embora a proporcionalidade seja o critério de controle por excelência das normas tributárias extrafiscais, cabe brevemente destacar que a finalidade também se mostra essencial para a aplicação de outros critérios vinculados ao controle da extrafiscalidade. Mais três deles, pelo menos, merecem destaque pormenorizado, por sua estreita vinculação com a finalidade objetivada na norma tributária extrafiscal.

O primeiro diz respeito ao controle de aplicação do princípio da igualdade. Isso porque o critério de discriminação eleito pelo legislador deve possuir uma relação de pertinência e coerência com a finalidade almejada pela norma tributária extrafiscal para que não seja considerado arbitrário ou irrazoável. Conforme o critério da capacidade econômica perde seu protagonismo no campo da extrafiscalidade, o princípio da igualdade passa a utilizar um critério de diferenciação vinculado à finalidade extrafiscal, já que a diferença de carga tributária levará em conta não apenas (ou melhor, não como critério geral) a capacidade contributiva, e sim o cumprimento ou não da finalidade extrafiscal perseguida.54

Ainda que este exame se aproxime do critério de adequação previsto no postulado da proporcionalidade, com ele não se confunde, sendo, na verdade, anterior. O controle pelo princípio da igualdade tem a intenção de verificar se a finalidade extrafiscal é legítima e se seu critério é constitucionalmente permitido. Em outras palavras, o importante neste momento é estabelecer a necessidade de respeito à igualdade tributária, no sentido de que a medida de comparação e a finalidade extrafiscal almejada estejam de acordo com o Sistema Constitucional Tributário. Estas considerações evidenciam a importância da análise da finalidade da tributação. A aplicação do princípio da igualdade mantém estreita vinculação com as finalidades estatais, já que elas podem funcionar como fundamentos justificadores de um tratamento diferenciado entre os contribuintes. Como destaca Schoueri, a questão não é, pois, se ocorre uma distinção, e sim se o parâmetro que a criou se legitima constitucionalmente.55

O segundo critério que merece destaque se refere ao controle de eficácia da norma tributária extrafiscal. Embora possa parecer paradoxal, o fato é que o controle acerca dos efeitos concretos da norma só poderá ser feito na medida em que se souber qual era a sua finalidade. Em outras palavras, não há como se falar em norma eficaz, se não se sabe afinal quais eram os efeitos desejados por ela, ou seja, qual era a sua finalidade no momento da sua edição. Nesse ponto, portanto, a finalidade intervém no próprio plano da eficácia, a fim de auxiliar no controle de efeitos da norma tributária extrafiscal. Conforme se reconhece que a medida tributária extrafiscal precisa, necessariamente, produzir efeitos na realidade econômica e social vigente para ser legítima, é preciso também reconhecer que este controle dependerá, necessariamente, da identificação da finalidade. Este controle de eficácia será constante e também dependerá da aplicação do postulado da proporcionalidade, com a diferença de que, neste momento, os efeitos da medida são concretos e, portanto, a análise não ocorrerá em abstrato. De qualquer modo, a finalidade objetivada na norma será fundamental, na medida em que ela é que determinará a existência ou não de eficácia e de proporcionalidade desta norma diante de seus efeitos concretos.

Também no plano da eficácia, o terceiro critério de controle vinculado especificamente à finalidade refere-se ao critério do cumprimento da finalidade, que exige a verificação constante da necessidade de manutenção da norma tributária extrafiscal, uma vez que ela só se justifica enquanto estiver produzindo efeitos e enquanto a finalidade para a qual ela foi instituída ainda não foi realizada. Assim que implementado o fim a que ela se destinava, não há mais justificativa para a sua manutenção. Se o objetivo é o atendimento de um fim, a norma tributária extrafiscal não pode perdurar no tempo de forma eterna, devendo ser temporária, até o cumprimento do objetivo que justificou sua criação.

Ainda que nem sempre isso seja tão claro, haja vista o grau de dificuldade para a promoção de algumas das finalidades públicas perseguidas pelos mecanismos tributários, como o caso da diminuição das desigualdades regionais ou da distribuição de riquezas, há situações em que o cumprimento do fim pode ser mais facilmente verificado, como é o exemplo do equilíbrio da balança comercial brasileira (no caso da utilização do imposto de importação), ou do enfrentamento de crises financeiras e do incentivo ao consumo nessas épocas (como nos casos recentes de utilização de isenções ou de reduções de alíquota do imposto sobre produtos industrializados).

Nesse caso, é possível fazer um paralelo com as contribuições, que já possuem um desenvolvimento maior na doutrina e na jurisprudência acerca da invalidade de sua manutenção diante do cumprimento da finalidade que justificava a sua incidência. Nessa linha, destaca-se o posicionamento adotado por Paulsen em acórdão paradigmático sobre o tema: “as contribuições têm como característica peculiar a vinculação a uma finalidade constitucionalmente prevista, atendidos os objetivos fixados pela norma, nada há que justifique a cobrança dessas contribuições”.56 A manifestação foi feita em decisão referente à cobrança das polêmicas contribuições instituídas pela Lei Complementar nº 110/2001, cujo objetivo era viabilizar o pagamento correto da atualização monetária das contas vinculadas ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS, que sofreram expurgos por ocasião do Plano Verão (janeiro de 1989) e do Plano Collor (abril de 1990). A constitucionalidade destas contribuições foi definida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 2.556 e n° 2.568, em 2012.57 A decisão proferida no âmbito do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, porém, refere-se à discussão acerca da inconstitucionalidade superveniente destas contribuições, exatamente por que a finalidade para o qual elas foram instituídas já teria sido cumprida.

O reconhecimento da possibilidade de uma inconstitucionalidade superveniente foi feito pelo próprio Supremo Tribunal Federal, ao admitir novas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs nos 5.050, 5.051 e 5.053) sobre o tema. Em decisão proferida nestas ações, o Ministro Relator Roberto Barroso indeferiu a medida cautelar pleiteada, mas admitiu as ações sobre o argumento de que há possibilidade teórica de que o Supremo Tribunal Federal reexamine a validade de ato normativo declarado constitucional em sede de controle abstrato, considerando a existência de alterações supervenientes na realidade fática ou na percepção jurídica dominante.58 Admitindo-se, desse modo, a necessidade de um controle constante acerca do cumprimento da finalidade tanto das contribuições, como das normas tributárias extrafiscais, apenas reforça-se a importância da identificação da sua finalidade.

2.3. Os riscos da desconsideração da finalidade

A análise dos critérios de controle aplicáveis às normas tributárias extrafiscais demonstra a importância de sua devida classificação e da identificação da sua finalidade. A verdade é que, por mais difícil que determinadas situações limites se apresentem para a identificação desta finalidade precípua extrafiscal, as exceções não servem para invalidar a necessidade desta classificação, como forma de permitir o devido controle sobre a utilização instrumental do Direito Tributário para outros fins, que não aqueles arrecadatórios previstos no regime geral da tributação.

A classificação, portanto, serve a um critério bastante específico: ela garante que a utilização do tributo para outros fins esteja sujeita não apenas aos controles gerais atinentes ao regime tributário, como também aos controles relativos ao regime da extrafiscalidade, que envolve critérios próprios e mais severos com o propósito de garantir que a tributação extrafiscal não sirva de simples propósito arrecadatório, apenas rotulado por outras finalidades - muitas vezes, bastante caras à sociedade em geral. Este reconhecimento acerca da necessidade de controle é reiterado por Nabais, que, tratando especificamente do tema da extrafiscalidade ambiental, chega a definir uma categoria de tributos ambientais “atécnicos ou impróprios”, cuja verdadeira intenção seria o mero aumento de arrecadação, sem qualquer vinculação com a finalidade ambiental e a geração de efeitos positivos nesse sentido.59

Desconsiderar a importância da classificação e da identificação da finalidade extrafiscal leva, portanto, a uma perda no controle sobre estas normas, porque passa a lidar apenas com o controle de efeitos, que é necessário, porém, não suficiente para o devido controle sobre estas normas. A postura equivoca-se não apenas por afastar a importância da finalidade para o controle de efeitos, como também porque este controle (ainda que pudesse ser feito sem a finalidade) não é capaz de suprir a necessidade de que se controle também a finalidade e seu critério com base no princípio da igualdade e na aplicação do postulado da proporcionalidade. Identificar apenas efeitos extrafiscais desconsidera que é a finalidade que vai pautar a aplicação destes critérios e que ela mesma precisa ser controlada com base na sua legitimidade a partir da Constituição.

Além disso, a desconsideração da finalidade para o controle de efeitos o torna ainda mais frágil, porque permite a busca de qualquer finalidade para justificar a norma tributária. Com efeito, nossa Constituição é tão rica em princípios e objetivos estatais que permite uma ampla gama ao intérprete para justificar qualquer tipo de efeito. Assim, se é o efeito quem vai determinar a proporcionalidade da medida, é coerente supor que ela provavelmente se mostrará adequada e proporcional porque será fácil encontrar alguma finalidade constitucional que a suporte. Tal controle, contudo, subverte a ordem natural das coisas. A medida precisa ser em abstrato controlável com base em sua finalidade, e os efeitos precisam ser controlados tendo em vista exatamente os efeitos visados pela própria norma - que serviram exatamente como justificativa para o afastamento do critério de discriminação adotado pelo legislador e para a restrição dos direitos fundamentais do contribuinte por meio da utilização instrumental da via tributária.

Não suficiente, a desconsideração da finalidade impossibilita a aplicação do postulado da proporcionalidade, uma vez que não permite que se verifique a adequação da medida (se não há fim, não há controle de meio: qualquer meio é adequado quando não se tem finalidade, até mesmo a mera arrecadação); a sua necessidade (não há como se comparar medidas igualmente adequadas se não se sabe qual a finalidade: todas ou qualquer uma será adequada); e a sua proporcionalidade em sentido estrito (se não se conhece a finalidade visada pela medida extrafiscal, não há como sopesar suas vantagens e desvantagens). O controle, portanto, se torna absolutamente discricionário, sem critérios objetivos que possam ser conhecidos e controlados pelos contribuintes em geral, gerando não apenas menos controle sobre a restrição dos direitos fundamentais dos cidadãos, como maior insegurança jurídica para o sistema como um todo. Isso significa dizer que a finalidade é crucial para o controle das normas tributárias extrafiscais e, por isso, a importância da sua identificação e classificação. Embora seja permitida - e até mesmo incentivada - pela Constituição, a utilização instrumental do Direito Tributário precisa e deve ser controlada, o que depende necessariamente da sua identificação.

Conclusões

Diante de todo o exposto, algumas conclusões foram alcançadas e merecem destaque. Inicialmente, a norma tributária extrafiscal pode ser identificada como aquela na qual o objetivo arrecadatório é minimizado diante de uma finalidade precípua de realizar outros objetivos estatais. Este tipo de norma, portanto, possui uma legitimação e uma finalidade diversa das normas tributárias fiscais (ou arrecadatórias), o que demonstra a necessidade deste corte classificatório, ainda que se reconheça a dificuldade de se empreendê-lo em alguns casos limites. De qualquer forma, a identificação das normas tributárias extrafiscais é imprescindível para permitir um maior controle sobre estas normas, na medida em que, embora a utilização instrumental dos tributos seja permitida (e, por vezes, até estimulada) pelo texto constitucional, sua utilização envolve necessariamente a restrição a direitos fundamentais dos contribuintes que precisam ser controlados.

A identificação das normas tributárias extrafiscais passa, necessariamente, pela identificação da finalidade extrafiscal objetivada na norma. E esta finalidade não se confunde com o argumento de interpretação subjetivo, vinculado à intenção do legislador histórico, correspondendo, na verdade, ao argumento de interpretação teleológico, vinculado à finalidade objetivada no próprio texto. Assim, não procede a alegação de que a identificação destas normas pelos seus efeitos potenciais traria maior objetividade e afastaria um suposto subjetivismo na identificação da finalidade. Primeiro, porque não há qualquer diferença de sentido entre finalidade e efeitos potenciais: semanticamente, estes termos significam a mesma coisa. Segundo, porque há razões para que se utilize o termo finalidade: não apenas ele é mais preciso, como ainda se evita qualquer confusão entre os planos da validade e da eficácia.

Além disso, a identificação da extrafiscalidade apenas a partir de efeitos concretos torna, primeiro, todas as normas tributárias como extrafiscais, na medida em que se assume que a neutralidade é um mito e que, portanto, todas as normas tributárias geram algum tipo de efeito concreto. Embora aumente a quantidade de normas tributárias extrafiscais, este entendimento inviabiliza o devido controle sobre elas, porque desconsidera que a finalidade é essencial para a aplicação dos critérios de controle atinentes à extrafiscalidade. Nesse sentido, a aplicação do postulado da proporcionalidade, o controle por meio do princípio da igualdade e do critério de discriminação escolhidos, assim como o controle de eficácia e de cumprimento da finalidade se tornam inaplicáveis, porque dependem exatamente do reconhecimento da finalidade como requisito essencial de aplicação.

Todas as considerações anteriores demonstram que a classificação das normas tributárias como fiscais e extrafiscais não tem finalidade meramente didática. Muito pelo contrário, sua finalidade está justamente em permitir o devido controle sobre a utilização do tributo para outros fins, que não aquele precipuamente arrecadatório. Dessa forma, a dificuldade de empreender esta classificação e de identificar a finalidade extrafiscal objetivada na norma não afasta a necessidade desta classificação para fins de controle. Da dificuldade não decorre a inexistência, nem a desnecessidade. A simplificação, neste caso, leva apenas à perda de controle.

É preciso, por conseguinte, reconhecer que o Direito é um instrumento para a realização de finalidades, e o Direito Tributário não foge a esta realidade.60 No entanto, mesmo que esteja autorizado constitucionalmente a promover outros fins que não à mera arrecadação dos encargos necessários à manutenção da máquina pública, o fato é que o Poder Legislativo e o Poder Executivo não detêm um “cheque em branco” no que se refere ao modo como isso deve ser feito. Apesar da dificuldade de se estabelecer o limite de aplicação deste tipo de norma finalística, reconhecendo-se a complexidade de se determinar “até onde se pode ir na busca do fomento de determinada finalidade constitucional”,61 o objetivo do estudo da extrafiscalidade é definir, ao máximo, os limites dessa utilização, estabelecendo critérios para que isso seja feito sem restringir de forma desproporcional os direitos fundamentais dos contribuintes. A identificação da finalidade extrafiscal é fundamental para isso.

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1 Em tradução livre: “Se a lei tributária é definida com finalidade de indução, a questão que se coloca é se a lei tributária é o meio adequado e não ultrapassa seu objetivo. O objetivo neste sentido não é o fiscal, mas outros fins.” (TRZASKALIK, Christoph. Inwieweit ist die Verfolgung ökonomischer, ökologischer und anderer öffentlicher Zwecke durch Instrumente des Abgabenrechts zu empfehlen? Gutachten E für den 63. Deutschen Juristentag. Munique: Verlag C .H. Beck, 2000, pp. 24-25)

2 ÁVILA, Humberto. “Função da ciência do Direito Tributário: do formalismo epistemológico ao estruturalismo argumentativo”. Direito Tributário atual v. 29. São Paulo: Dialética/IBDT, 2013, pp. 181-204 (188).

3 Algumas destas questões foram tratadas com maior profundidade em obra específica sobre o tema do controle da extrafiscalidade: LEÃO, Martha Toribio. Controle da extrafiscalidade. São Paulo: Quartier Latin/IBDT, 2015.

4 Nesse sentido: FOLLONI, André. Ciência do Direito Tributário no Brasil: crítica e perspectivas a partir de José Souto Maior Borges. São Paulo: Saraiva, 2013, pp. 72 e ss.; ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 140; “Função da ciência do Direito Tributário: do formalismo epistemológico ao estruturalismo argumentativo”. Revista Direito Tributário atual vol. 29 São Paulo: Dialética/IBDT, 2013, pp. 181-204 (188-189); MARINS, James; e TEODOROVICZ, Jeferson. “Rumo à extrafiscalidade socioambiental: tributação diante do desafio social e ambiental contemporâneo”. Anais do IX Simpósio Nacional de Direito Constitucional. Curitiba: ABDConst., 2011, pp. 170-199 (187-188).

5 No Brasil, a título exemplificativo: CORREA, Walter Barbosa. Contribuição ao Estudo da Extrafiscalidade. São Paulo, 1964; TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 15ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 187; ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 138; FOLLONI, André. “Isonomia na tributação extrafiscal”, Revista direito GV v. 10, junho de 2014, pp. 201-220; ADAMY, Pedro. “Instrumentalização do Direito Tributário”. In: ÁVILA, Humberto (org.). Fundamentos do Direito Tributário. São Paulo: Marcial Pons, 2012, pp. 301-329.

6 No Brasil, a título exemplificativo: SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras. Rio de Janeiro: Forense, 2005, pp. 86 e ss.; ROCHA, Paulo Vitor Vieira da. “Fiscalidade e extrafiscalidade: uma análise crítica da classificação funcional das normas tributárias”. Revista Direito Tributário atual nº 32. São Paulo: Dialética, 2014, pp. 256-274.

7 SCHOUERI, Luís Eduardo. “Tributação e indução econômica: os efeitos econômicos de um tributo como critério para sua constitucionalidade”. In: FERRAZ, Roberto (coord.). Princípios e limites da tributação - 2. São Paulo: Quartier Latin, 2009, pp. 139-164 (142). No mesmo sentido, destaca ATALIBA que não há imposto neutro, uma vez que não é possível engendrar um imposto cuja aplicação não altere ou modifique, de algum modo, a situação econômica geral e a individual dos envolvidos direta ou indiretamente nos fatos imponíveis, daí porque do recolhimento de imposto sempre resultam modificações nas posições relativas dos atingidos. (ATALIBA, Geraldo. “IPTU - Progressividade”. Revista de Direito Tributário nº 56, ano 15. São Paulo, abril/junho de 1991, pp. 75-83 (75)).

8 GONZÁLEZ, Luis Manoel Alonso. Los impuestos autonomicos de carácter extrafiscal. Madri: Marcial Pons, 1995, p. 21.

9 CORREA, Walter Barbosa. Contribuição ao estudo da extrafiscalidade. São Paulo, 1964, p. 60.

10 OLLERO, Gabriel Casado. “Los fines no fiscales de los tributos”. Comentários a la Ley General Tributaria y líneas para su reforma - Libro-homenaje al Professor Sainz de Bujanda v. 1. Madri: Instituto de Estudios Fiscales, 1991, pp. 103-152 (104).

11 No mesmo sentido, o posicionamento de Rothmann: Para o autor, seria possível distinguir um grupo de normas tributárias que não possuem a finalidade precípua de arrecadar os recursos necessários ao custeio da despesa pública, mas, sim a finalidade de promoção pelo Estado de outros fins da política social (inclusive a redistribuição de renda), econômica, cultural, sanitária, ambiental etc. (ROTHMANN, Gerd Willi. “Natureza, finalidade, interpretação e aplicação das normas tributárias extrafiscais - conceitos de lucro da operação e de resultado operacional - classificação dos alugueis como receita operacional”. Revista Direito Tributário atual nº 23. São Paulo: Dialética/IBDT, 2009, pp. 192-206 (195).

12 GONZÁLEZ, Luis Manoel Alonso. Los impuestos autonomicos de carácter extrafiscal. Op. Cit., pp. 22-23.

13 MATEO, Luis Rodriguez. “Análisis y crítica de un impuesto de ordenamiento moral”. Revista española de Derecho Financiero nº 39. Civitas, 1983, pp. 343-364 (344).

14 ATALIBA, Geraldo. “IPTU - Progressividade”, Revista de Direito Tributário nº 56, ano 15. São Paulo, abril/junho de 1991, pp. 75-83 (81).

15 ALABERN, Juan Enrique Varona. Extrafiscalidad y dogmática tributaria. Madri: Marcial Pons, 2009, pp. 28-29.

16 Ibidem, pp. 28-29.

17 No mesmo sentido: OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. “O conteúdo da extrafiscalidade e o papel das Cides. Efeitos decorrentes da não-utilização dos recursos arrecadados ou da aplicação em finalidade diversa”. Revista Dialética de Direito Tributário nº 131. São Paulo: Dialética, agosto de 2006, pp. 45-59 (45).

18 CORREA, Walter Barbosa. Contribuição ao Estudo da Extrafiscalidade. São Paulo, 1964, p. 51.

19 FOLLONI, André. “Isonomia na tributação extrafiscal”. Revista Direito GV v. 10. junho de 2014, pp. 201-220 (205).

20 MENDES, Guilherme Adolfo dos Santos. “Extrafiscalidade: análise semiótica”. Tese de Doutorado apresentada ao Departamento de Direito Econômico e Financeiro da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo - USP, São Paulo, ed. do autor, 2009, pp. 301-302.

21 STÖTZEL fala em “kooperative Hand-in-Hand-Arbeiten von Staat und Normadressaten“.(STÖTZEL, Martin. Vertrauensschutz und Gesetzesrückwirkung. Frankfurt am Main: Peter Lang, 2002, p. 194)

22 ÁVILA, Humberto. Teoria da igualdade tributária. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 75.

23 ÁVILA, Humberto. “Argumentação jurídica e a imunidade do livro eletrônico”. Revista de Direito Tributário v. 79. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 173. “Teoria giuridica dell’argomentazione”. In: GUASTINI, Riccardo; e COMANDUCCI, Paolo (orgs.). Analisi e Diritto 2012. Madri: Marcial Pons, 2012, pp. 10-40.

24 CHIASSONI, Pierluigi. Técnicas de interpretación jurídica - breviario para juristas. Traduzido por Pau Luque Sanchez e Maribel Narváez Mora. Madri Marcial Pons, 2011, p. 94, pp. 103-104.

25 Ibidem, pp. 94-95.

26 Ibidem, p. 96.

27 GUASTINI, Riccardo. “Defeasibility, axiological gaps, and interpretation”. In: BELTRÁN, Jordi Ferrer; e RATTI, Giovanni Battista (coord.). The logic of legal requirements: essays on defeasibility. Oxford: Oxford Press University, 2012, pp. 182-192 (188); Interpretar y argumentar. Traduzido por Silvina Álvarez Medina. Madri: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2014, p. 372.

28 GUASTINI, Riccardo. Interpretar y argumentar. Traduzido por Silvina Álvarez Medina. Madri: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2014, p. 106, pp. 266-267, 269.

29 CHIASSONI, Pierluigi. Técnicas de interpretación jurídica. Op. cit., p. 104.

30 GUASTINI, Riccardo. Interpretar y argumentar. Traduzido por Silvina Álvarez Medina. Madri: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2014, p. 267.

31 ÁVILA, Humberto. Teoria da igualdade tributária. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 74.

32 Ibidem, pp. 74-75.

33 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 40.

34 SCHOUERI, Luís Eduardo. “Tributação e indução econômica: os efeitos econômicos de um tributo como critério para sua constitucionalidade”. In: FERRAZ, Roberto (coord.). Princípios e limites da tributação - 2. São Paulo: Quartier Latin, 2009, pp. 139-164 (142).

35 ROCHA, Paulo Vitor Vieira da. “Fiscalidade e extrafiscalidade: uma análise crítica da classificação funcional das normas tributárias”. Revista Direito Tributário atual n° 32. São Paulo: Dialética, 2014, pp. 256-274 (264-266).

36 Ibidem, p. 269.

37 ÁVILA, Humberto. “Função da ciência do Direito Tributário: do formalismo epistemológico ao estruturalismo argumentativo”. Revista Direito Tributário atual v. 29. São Paulo, Dialética, 2013, pp. 181-204 (188-189).

38 LEÃO, Martha Toribio. Controle da extrafiscalidade. São Paulo: Quartier Latin/IBDT, 2015, p. 123.

39 ADAMY, Pedro. “Instrumentalização do Direito Tributário”. In: ÁVILA, Humberto (org.). Fundamentos do Direito Tributário. São Paulo: Marcial Pons, 2012, pp. 301-329 (317).

40 LUHMANN, Niklas. Sistema juridico y dogmatica juridica. Tradução de Ignacio de Otto y Pardo. Madri: Centro de Estudios Constitucionales, 1983, p. 68.

41 Por todos: ZILVETI, Fernando Aurélio. “Variações sobre o princípio da neutralidade no Direito Tributário Internacional”. Revista Direito Tributário atual v. 19. São Paulo: IBDT, 2005, pp. 24-40 (26); SCHOUERI, Luís Eduardo. “Tributação e indução econômica: os efeitos econômicos de um tributo como critério para sua constitucionalidade”. In: FERRAZ, Roberto (coord.). Princípios e limites da tributação - 2. São Paulo: Quartier Latin, 2009, pp. 139-164 (142).

42 LEÃO, Martha Toribio. Controle da extrafiscalidade. São Paulo: Quartier Latin, 2015, p. 115; LEÃO, Martha Toribio. “A (des)proporcionalidade da progressividade do imposto de renda da pessoa física no sistema brasileiro”. Revista Direito Tributário atual v. 28. São Paulo: IBDT, 2012, pp. 188-205 (201).

43 Vale referir que há posicionamento doutrinário contrário à aplicação da capacidade contributiva, ainda que mitigada, à extrafiscalidade. Nesse sentido, por todos: ZILVETI, Fernando Aurélio. Princípios de Direito Tributário e capacidade contributiva. São Paulo: Quartier Latin, 2004, p. 196; YAMASHITA, Douglas; e TIPKE, Klaus. Justiça fiscal e princípio da capacidade contributiva. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 64.

44 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios. 16ª ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 205.

45 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 138; Conceito de renda e compensação de prejuízos fiscais. São Paulo: Malheiros, 2011, pp. 25-27. No mesmo sentido: TABOADA, Carlos Palao. “El principio de capacidad contributiva como criterio de justicia tributaria: aplicación a los impuestos directos e indirectos”. In: TÔRRES, Heleno Taveira (coord.). Tratado de Direito Constitucional Tributário: estudos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho. São Paulo: Saraiva, 2005, pp. 285-303 (299-300).

46 NABAIS, José Casalta. O dever fundamental de pagar impostos. Coimbra: Almedina, 1998, p. 658.

47 SCHOUERI, Luís Eduardo. “Livre concorrência e Tributação”. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Grandes questões atuais do Direito Tributário. 11º v. São Paulo: Dialética, 2007, pp. 241-271 (252); ; e RUBINSTEIN, Flávio. “O fato gerador da CPMF e as operações alheias ao sistema financeiro”. In: CÔELHO, Sacha Calmon Navarro (coord.). Contribuições para a seguridade social. São Paulo: Quartier Latin, 2007, pp. 623-633 (629).

48 FOLLONI, André. “Isonomia na tributação extrafiscal”. Revista Direito GV v. 10, junho de 2014, pp. 201-220 (212).

49 PAPADOPOL, Marcel. “Um passo adiante: contributo para a compreensão do controle de medidas tributárias extrafiscais e do papel desempenhado pela capacidade contributiva neste contexto.” In: ÁVILA, Humberto (org.). Fundamentos do Direito Tributário. São Paulo: Marcial Pons, 2012, pp. 273-299 (280).

50 Lang destaca que este princípio exige uma racionalidade na relação entre meio e fim (Rationalität der Zweck-Mittel-Relation): TIPKE, Klaus; e LANG, Joachim. Steuerrecht, 20. Auflage. Colônia: Otto Schmidt, 2010, pp. 127-128, parágrafo 4/209.

51 BARAK, Aharon. Proportionality: constitutional rights and their limitation. Nova York: Cambridge University Press, 2012, pp. 131-132.

52 MAURER, Hartmut. Staatsrecht. Munique: Beck, 1999, pp. 234-236; BARAK, Aharon. Proportionality: constitutional rights and their limitation. Nova York: Cambridge University Press, 2012, pp. 303-370; TIPKE, Klaus; e LANG, Joachim. Steuerrecht, 20. Auflage. Colônia: Otto Schmidt, 2010, pp. 127-128, parágrafo 4/209-212.

53 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios. 16ª ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 205.

54 ALABERN, Juan Enrique Varona. Extrafiscalidad y dogmática tributaria. Madri: Marcial Pons, 2009, p. 74.

55 SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 277.

56 Assim, o trecho do voto citado: “Ocorre que a finalidade para a qual foram instituídas essas contribuições (financiamento do pagamento dos expurgos do Plano Verão e Collor) era temporária e já foi atendida. Como as contribuições têm como característica peculiar a vinculação a uma finalidade constitucionalmente prevista, atendidos os objetivos fixados pela norma, nada há que justifique a cobrança dessas contribuições. Por isso, entendo que não se pode continuar exigindo das empresas, ad eternum, as contribuições instituídas pela Lei Complementar nº 110”. (Brasil, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Agravo de Instrumento nº 2007.04.00.024614-7, Segunda Turma, Relator Leandro Paulsen, D.E. de 27.8.2007)

57 Brasil, Supremo Tribunal Federal, Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.556, Relator Ministro Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, julgado em 13.6.2012.

58 Brasil, Supremo Tribunal Federal, Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 5.050, Relator Ministro Roberto Barroso, Despacho de 11.10.2013 (DJe 208, divulgado em 18.10.2013).

59 NABAIS, José Casalta. “Direito Fiscal e tutela do ambiente em Portugal”. In: TÔRRES, Heleno Taveira (org.). Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005, pp. 412-444 (424).

60 ADAMY, Pedro. “Instrumentalização do Direito Tributário”. In: ÁVILA, Humberto (org.). Fundamentos do Direito Tributário. São Paulo: Marcial Pons, 2012, pp. 301-329 (302).

61 SCHOUERI, Luís Eduardo; e RUBINSTEIN, Flávio. “O fato gerador da CPMF e as operações alheias ao sistema financeiro”. In: CÔELHO, Sacha Calmon Navarro (coord.). Contribuições para a seguridade social. São Paulo: Quartier Latin, 2007, pp. 623-633 (629).