A Isenção Outorgada aos Dividendos e Integração da Tributação das Pessoas Jurídicas e das Pessoas Físicas: o Pagamento de Dividendos à Conta de Reserva de Capital e a Influência da Recente Edição da Lei nº 12.973/2014

Ramon Tomazela Santos

Mestrando em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Universidade de São Paulo (USP). Master of Laws (LL.M.) Candidate em Tributação Internacional na Universidade de Viena (Wirtschaftsuniversität Wien - WU). Professor-assistente do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Advogado em São Paulo.

Resumo

O presente artigo analisa as justificativas para a isenção concedida aos dividendos pelo artigo 10 da Lei nº 9.249/1995, na condição de mecanismo de integração da tributação das pessoas jurídicas e das pessoas físicas. Em seguida, o autor examina a influência da Lei nº 12.973/2014 na interpretação do alcance da norma de isenção, para sustentar que os dividendos pagos à conta de reserva de capital são isentos de imposto de renda.

Palavras-chave: dividendos, mecanismo de integração, dupla tributação econômica ações preferenciais, reserva de capital.

Abstract

This article analyzes the justifications for granting a tax exemption to dividends as set forth in article 10 of Law 9.249/1995, on the condition of a mechanism to integrate personal and corporate income taxes. Subsequently, the author examines the influence of Law 12.973/2014 in interpreting the scope of the exemption rule, in order to argue that dividends paid out of capital reserve account are exempt from the income tax.

Keywords: dividends, personal and corporate tax integration, economic double taxation, preferred shares, capital reserve.

1. Introdução

Como se sabe, o artigo 10 da Lei nº 9.249/1995 prevê que os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda retido na fonte (IRRF), tampouco integrarão a base de cálculo do imposto de renda devido pelo beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no país ou no exterior.

No contexto das recentes alterações legislativas realizadas para a extinção do Regime Tributário de Transição (RTT), com a consequente adaptação do Direito Tributário brasileiro às regras contábeis internacionais, o artigo 9º da Lei nº 12.973/20141 incluiu um parágrafo 2º no artigo 10 da Lei nº 9.249/1995, segundo o qual a desoneração tributária citada acima alcança os lucros ou dividendos pagos ou creditados aos beneficiários de todas as espécies de ações previstas no artigo 15 da Lei nº 6.404/1976, ainda que os recursos aportados sejam objeto de classificação contábil no passivo (passivo financeiro, em vez de patrimônio líquido), ou que a respectiva remuneração seja classificada como despesa financeira.

O dispositivo legal acima foi inserido para disciplinar o tratamento tributário conferido aos instrumentos financeiros compostos, assim considerados os títulos ou instrumentos de financiamento corporativo que conjugam direitos ou obrigações com características típicas de capital próprio (investimento) e de capital de terceiros (dívida)2.

A despeito da clara intenção do legislador de regulamentar o tratamento tributário dos instrumentos financeiros compostos, é interessante notar que a redação do citado parágrafo 2º pode desempenhar um papel importante na determinação do âmbito de aplicação do artigo 10 da Lei nº 9.249/1995, na medida em que o seu enunciado normativo prevê claramente que a isenção de imposto de renda aplica-se aos dividendos provenientes de todas as espécies de ações disciplinadas na Lei das S/A, o que pode ser fundamental para o reconhecimento da desoneração dos dividendos pagos aos titulares de ações preferenciais à conta de reserva de capital.

No presente estudo, apresentaremos breves reflexões a respeito da alteração legislativa mencionada acima e da sua possível influência para o reconhecimento da possibilidade de aplicação da isenção de imposto de renda sobre os dividendos pagos à conta de reserva de capital, bem como para a correta determinação do escopo normativo do artigo 10 da Lei nº 9.249/1995.

2. A Distribuição de Dividendos e os Mecanismos de Integração Adotados pela Legislação Tributária Brasileira

A isenção de imposto de renda concedida aos dividendos distribuídos foi instituída como um método de integração da tributação da pessoa jurídica e da pessoa física, com o objetivo de eliminar a bitributação econômica dos resultados da atividade empresarial. É o que anuncia a Exposição de Motivos MF nº 325/1995, que acompanhou a Lei nº 9.249/1995:

“Com relação à tributação dos lucros e dividendos, estabelece-se a completa integração entre a pessoa física e a pessoa jurídica, tributando-se esses rendimentos exclusivamente na empresa e isentando-os quando do recebimento pelos beneficiários. Além de simplificar os controles e inibir a evasão, esse procedimento estimula, em razão de equiparação de tratamento e das alíquotas aplicáveis, o investimento nas atividades produtivas.”

Em uma primeira aproximação, pode-se dizer que a intenção do legislador brasileiro é louvável, tendo em vista que, nos dizeres de Jeffrey L. Kwall, a dupla tributação econômica sobre o resultado da atividade empresarial, tanto no âmbito da pessoa jurídica, quanto na distribuição dos dividendos aos sócios, pode ofender o princípio da igualdade sob o enfoque horizontal, em virtude da imposição de ônus tributário mais pesado sobre os indivíduos que percebem dividendos, em comparação com aqueles que recebem salário3. Contudo, sob outro ângulo, é possível sustentar que a tributação dos lucros empresariais pelo imposto de renda da pessoa jurídica (IRPJ) e pela contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL) exclusivamente no nível das pessoas jurídicas, seguida da desoneração total na esfera das pessoas físicas, impede a individualização do imposto e, consequentemente, a adequação da tributação ao princípio da capacidade contributiva subjetiva dos sócios. Ademais, a isenção concedida aos dividendos distribuídos, ou a sua tributação mediante a aplicação de alíquotas inferiores àquelas aplicáveis aos rendimentos do trabalho, pode gerar um efeito regressivo no sistema tributário, semelhante ao experimentado na tributação sobre o consumo, tendo em vista que a carga tributária mais elevada seria suportada pelas pessoas físicas que auferem rendimentos do trabalho, atingindo em maior escala os indivíduos de baixa renda, o que malfere os objetivos de justiça social e de redistribuição de renda (assumindo-se como premissa que, como regra geral, os rendimentos do capital são comumente auferidos por indivíduos de alta renda, enquanto que os rendimentos do trabalho compõem a maior parte da renda dos indivíduos com baixo poder aquisitivo).

Recorde-se, a propósito, que os tributos incidentes sobre a renda consumida4 são naturalmente regressivos, tendo em vista que a sua onerosidade relativa cresce na razão inversa do crescimento da renda do contribuinte5. Assim, como forma de equilibrar o sistema tributário e evitar que a distribuição da carga tributária apresente característica regressiva, a progressividade das alíquotas do imposto de renda pode ser considerada como um instrumento adequado para mitigar os efeitos da oneração excessiva dos indivíduos de baixa renda. Em outras palavras, a tributação progressiva pode ser considerada um remédio para contrabalancear a regressividade dos impostos sobre o consumo. O problema é que esse mecanismo de compensação do efeito regressivo da tributação do consumo acaba perdendo parte de sua eficácia quando a lei tributária onera de forma progressiva apenas o rendimento do trabalho, que geralmente é auferido por indivíduos de baixa renda, deixando-se de lado os rendimentos provenientes do capital, como é o caso dos dividendos.

Henry Tilbery, autor de estudo pioneiro a respeito da integração da tributação entre a sociedade e os sócios, sustentava que a isenção de imposto de renda concedida aos lucros distribuídos, no método da exclusão dos dividendos, beneficiava diretamente as pessoas físicas situadas nos degraus mais elevados da tabela progressiva, em detrimento do princípio da equidade vertical6. Realmente, a isenção concedida aos dividendos pode se mostrar incompatível com equidade vertical, uma vez que o lucro apurado no âmbito corporativo é tributado de modo uniforme pelo IRPJ e pela CSLL, independentemente da capacidade contributiva de seus beneficiários finais. Daí afirmar-se que a tributação dos dividendos apenas na órbita da pessoa jurídica impede a individualização do imposto de renda no âmbito da pessoa física, em consonância com o princípio da capacidade contributiva7.

Além da potencial violação à equidade vertical, pode-se dizer que a imposição de tratamento diferenciado aos rendimentos decorrentes do exercício de atividade econômica por meio de pessoas jurídicas, submetendo-os à tributação corporativa, em comparação à tributação aplicável aos rendimentos provenientes de outras fontes de produção (como o trabalho assalariado), que estão sujeitos à tabela progressiva, pode representar grave violação à equidade horizontal8. Sob o prisma da capacidade contributiva, como corolário da igualdade, os rendimentos provenientes de diferentes fontes de produção (capital, trabalho ou a combinação de ambos) devem ser submetidos ao mesmo regime de tributação, às alíquotas da tabela progressiva, a menos que outro critério de discriminação justifique a distinção. Nesta linha, Natalie M. Silva verbera que, embora a capacidade contributiva não seja o único critério de discriminação a ser levado em consideração pelo legislador ordinário, não emerge da Constituição Federal uma justificativa válida para o tratamento tributário diferenciado conferido aos rendimentos do capital e do trabalho perante o imposto de renda9.

É importante revelar, neste passo, que a diferença no tratamento tributário atribuído aos rendimentos do capital e do trabalho constitui um problema recorrente nos sistemas tributários, que não encontra justificativa direta no modelo teórico de tributação da renda, que serve como uma “proxy” para alcançar o “bem-estar”. Com efeito, no plano acadêmico, a renda pode ser considerada o parâmetro mais adequado para a tributação do “bem-estar”, que se apresenta como um critério justo e equânime para a diferenciação dos contribuintes10, pois os indivíduos com maior “bem-estar” apresentam melhores condições de contribuir com as despesas do Estado11. A ideia de tributar o “bem-estar” individual encontra amparo no objetivo de construir uma sociedade mais justa e igualitária, na qual se procura aumentar o nível da coletividade como um todo, por meio da transferência dos fluxos de satisfações manifestados por determinados cidadãos em favor de outros menos afortunados12.

A despeito da importância do “bem-estar” individual como parâmetro adequado para a tributação, não se pode perder de vista que não há possibilidade prática de analisar cada contribuinte de forma individualizada, de acordo com as circunstâncias de sua vida particular. Diante da inviabilidade da adoção de procedimentos individuais de investigação do plano psíquico do contribuinte, a mensuração da renda a partir de critérios objetivos passa a ser um aspecto de fundamental importância para a aplicação prática da lei tributária13. No Direito Tributário, a utilização de parâmetros subjetivos e psíquicos para a definição do conceito de renda prejudicaria a mensuração da base de cálculo do imposto de renda, que deve ser baseada em critérios confiáveis e isonômicos, que contribuam para a promoção da certeza do direito e da segurança jurídica. A renda psíquica carece de parâmetros objetivos de quantificação, dado o alto grau de abstração de caracteres como bem-estar individual, prazer, sensação de segurança e felicidade.

Percebe-se, assim, que a evolução do conceito de renda tem um propósito eminentemente prático, que reside, basicamente, na tentativa de contornar o problema da mensuração e de encontrar critérios de aproximação (“proxys”) que, de certa maneira, reflitam o “bem-estar” individual. É o que se depreende do conceito teórico de renda mais difundido na área acadêmica (“foundation concept of income”), inicialmente concebido por Georg von Schanz e posteriormente aperfeiçoado por Robert M. Haig e Henry C. Simons (modelo SHS - Schanz-Haig-Simons), segundo o qual a renda compreende: (i) o acréscimo monetário de riqueza, mesmo que não realizado, pois o simples aumento de patrimônio aumenta a sensação de “bem-estar”; (ii) os gastos com bens e serviços, que representa a tributação da renda empregada em atos de consumo; e (iii) a renda imputada, pois a utilização de bens próprios e o autosserviço aumentam a satisfação pessoal e a sensação de “bem-estar”14. É oportuno destacar que houve a necessidade de realização de um ajuste para que o conceito de renda SHS efetivamente refletisse o “bem-estar” de modo amplo: a renda imputada foi incluída no modelo para alcançar as situações em que o contribuinte consome sem a necessidade de desembolso de valores15.

Pode-se afirmar, portanto, que o conceito teórico de renda no modelo SHS não impõe - ou sequer autoriza - a atribuição de tratamento tributário distinto aos rendimentos do capital e do trabalho, pois a sua amplitude alcança, inclusive, fluxos de satisfações não monetários16. Entretanto, deve-se ressaltar que o conceito jurídico positivo de renda, adotado em determinado país, pode ser objeto de ajustes para a introdução de políticas fiscais. Isso significa que o Estado tem liberdade para definir o conceito de renda adotado no âmbito do direito positivo, tanto para atender a parâmetros constitucionais que norteiam a tributação da renda, como a observância da capacidade contributiva, do mínimo existencial e da vedação ao confisco (v.g. possibilidade de dedução de despesas médicas), quanto para assegurar a primazia de valores sociais, econômicos e políticos do Estado. Vale dizer, a tributação pode ser uma forma de promover os valores essenciais ao Estado.

Voltando os olhos para o sistema constitucional brasileiro, é preciso ponderar que os princípios da generalidade, universalidade e progressividade não impedem que o legislador utilize a tributação como mecanismo para atingir, ao menos em parte, outros objetivos consagrados pelo Poder Constituinte, seja no próprio sistema constitucional tributário, seja na ordem econômica ou social17. O legislador poderá atribuir tratamento tributário distinto a determinados rendimentos sujeitos à tributação pelo imposto de renda, com o objetivo de atender a outros imperativos constitucionais, que podem envolver tanto questões de justiça social e distributiva, quanto finalidades regulatórias, dirigentes, intervencionistas ou instrumentais (função indutora). De qualquer modo, essa circunstância não livra o legislador da incumbência de indicar os pressupostos fáticos e jurídicos que fundamentam o tratamento tributário diferenciado, bem como de eleger uma medida adequada, necessária e proporcional para atingir a finalidade pretendida18. Isso porque, após a consagração do princípio da universalidade na Carta Magna, a atribuição de tratamento tributário diferenciado para determinados tipos de rendimento passa a depender de justificativa que encontre amparo no próprio texto constitucional. Não se pode, portanto, simplesmente distinguir os rendimentos em diferentes categorias para efeito de imposição fiscal, sem a necessidade de qualquer justificativa na ordem constitucional, tal como ocorria no antigo sistema cedular de tributação da renda, sob a égide do antigo Decreto-lei nº 5.844/194319.

Diante de tais considerações, há que se levar em conta que a isenção outorgada aos dividendos tem nítida função indutora, como instrumento para aliviar a dupla tributação econômica do lucro empresarial, tanto no âmbito da pessoa jurídica quanto na esfera da pessoa física, o que poderia desestimular o desenvolvimento de atividades empresariais, que geram empregos e impulsionam o progresso econômico e social, culminando com a evolução da própria sociedade. Caminhando na mesma direção, Paulo César Teixeira Duarte Filho acrescenta que o tratamento privilegiado conferido aos dividendos atende aos ditames do princípio da proporcionalidade e de suas diretrizes da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, tendo em vista que a finalidade almejada pelo legislador pode ser considerada vital para o desenvolvimento econômico do país, na medida em que contribui para a eliminação da bitributação econômica, a desoneração da carga tributária sobre o lucro empresarial, a competitividade das empresas brasileiras no âmbito internacional, o estímulo a constituição de empresas e a sua adequada capitalização20.

Logo, a despeito da existência de outros métodos de integração ainda não testados na realidade brasileira, a isenção de imposto de renda concedida pelo artigo 10 da Lei nº 9.249/1995 aos dividendos não pode ser considerada uma medida legislativa inadequada em termos de política fiscal, uma vez que atende de forma apropriada a sua finalidade de evitar a dupla tributação econômica do lucro empresarial21. O tratamento tributário conferido aos dividendos encontra amparo em determinados objetivos constitucionais, bem como em necessidades inerentes à política fiscal.

Seguindo nesta linha de raciocínio, pode-se dizer que o artigo 10 da Lei nº 9.249/1995, ao evitar a dupla tributação econômica do lucro empresarial, estimula o desenvolvimento da ordem econômica, na forma do artigo 170 da Constituição Federal. Isso porque a dupla tributação dos resultados empresariais poderia desencorajar a constituição de sociedades para o exercício de atividades econômicas e para a produção e circulação da riqueza. A isenção concedida aos dividendos fomenta o desenvolvimento do mercado interno e o crescimento econômico, bem como o aumento dos investimentos externos, pois os investidores estrangeiros não sofrerão tributação na fonte por ocasião das remessas de dividendos, o que contribui para as interações internacionais. Em consequência, é preciso reconhecer que há benefícios socioeconômicos colaterais decorrentes da isenção concedida aos dividendos, uma vez que o fortalecimento da atividade econômica contribui para a elevação dos níveis de empregos, bem como para o aumento dos salários pagos aos funcionários. Assim, a potencial perda de arrecadação provocada pela norma isentiva pode ser compensada com os resultados positivos obtidos em longo prazo, assim como ocorre na maior parte dos casos de renúncia fiscal.

Cumpre sublinhar, ainda, que a dupla tributação econômica da renda pode resultar em efeitos adversos para economia, como a retenção dos lucros no âmbito da própria pessoa jurídica, sem distribuição aos sócios. Logo, o artigo 10 da Lei nº 9.249/1995 evita que a lei tributária crie distorções na gestão financeira da sociedade, estimulando a retenção de lucros acima do ponto de equilíbrio para o reinvestimento dos resultados na atividade empresarial. Destaque-se que a retenção de lucros pode afetar a chamada alocação ótima de recursos financeiros, pois, como os lucros permanecem no âmbito da sociedade, os sócios ou acionistas não podem utilizar os dividendos recebidos para outras finalidades econômicas. Neste rumo, Joseph E. Stiglitz ainda acrescenta que a retenção de lucros no âmbito da pessoa jurídica, para evitar a tributação dos dividendos no nível dos sócios, pode diminuir a eficiência econômica das empresas, tendo em vista que os seus administradores terão uma grande quantidade de recursos financeiros retidos, o que exigirá menos eficiência na administração e nas decisões empresariais22.

Em reforço, acrescente-se que a dupla tributação econômica do resultado da atividade empresarial pode conduzir à tributação da renda em patamar superior à capacidade contributiva, mesmo que se considere que a carga tributária recai sobre sujeitos passivos distintos e autônomos. O problema reside no fato de que, embora a pessoa jurídica tenha existência própria, atuando como uma unidade decisória independente, o ônus econômico da tributação, em última análise, sempre irá recair sobre os indivíduos que a cercam. Sob o ponto de vista econômico, a carga tributária poderá ser suportada pelo cliente (aumento de preço de venda), pelo fornecedor (diminuição do preço de compra), pelo empregado (salários menores) ou pelos sócios (diminuição do retorno financeiro), mas sempre haverá uma pessoa física para suportar o impacto econômico do tributo23. Dessa forma, conquanto a sociedade e os sócios sejam sujeitos passivos distintos sob o ponto de vista jurídico, o efeito econômico da tributação corporativa poderá ser suportado pelos sócios, com eventuais consequências em relação à capacidade contributiva, pelo menos na hipótese em que o ônus do tributo não é repassado para terceiros.

Não se pode perder de vista, ainda, que a ausência de mecanismo de integração entre a sociedade e o sócio pode desestimular os investimentos estrangeiros, bem como intensificar o deslocamento da renda para países de baixa pressão fiscal. A dupla tributação econômica pode aguçar os anseios dos contribuintes em relação à evasão fiscal, sobretudo por meio da utilização de mecanismos para a distribuição disfarçada de lucros.

Em interessante estudo, Alberto Pinto demonstra que a isenção concedida pelo artigo 10 da Lei nº 9.249/1995 contempla um importante mecanismo para a atração de investimentos estrangeiros, evitando que a eventual incidência de IRRF sobre os dividendos distribuídos aos não residentes gere um excesso de imposto não compensável no seu país de origem. Como a maior parte dos países limita o aproveitamento do foreign tax credit ao valor do imposto devido no país sobre os lucros provenientes do exterior, a eventual cobrança do imposto de renda retido na fonte (IRRF) sobre as remessas de dividendos, em conjunto com os valores de IRPJ e CSLL recolhidos no Brasil, poderia gerar um excesso de crédito no exterior, que não seria passível de aproveitamento pelo investidor não residente. Além disso, o autor acrescenta que apenas na hipótese em que a alíquota do imposto de renda devido no país de residência do investidor for muito superior a 34% (soma das alíquotas do IRPJ e da CSLL) o artigo 10 da Lei nº 9.249/1995 poderá deixar de beneficiar o investidor estrangeiro, permitindo que o Fisco do país de residência tribute o valor relativo ao IRRF que deixou de ser cobrado pelo Brasil. Isso mostra que a isenção concedida pelo Brasil, no atual contexto de tributação na renda no mundo, não se revela um veículo de transferência de renda da Fazenda Nacional para os Estados estrangeiros. O autor apenas pondera que, ao conceder a isenção em caráter unilateral e incondicional, o Brasil perdeu um valioso elemento para a negociação de eventuais acordos de bitributação, bem como para a exigência de reciprocidade de tratamento24.

A própria mobilidade do capital financeiro, que pode ser objeto de deslocamento volátil para paraísos fiscais, bem como o aumento da competição fiscal prejudicial (harmfull tax competition), impôs aos países a necessidade de atenuar o ônus da carga fiscal sobre o capital financeiro, o que direcionou a arrecadação tributária novamente para o trabalho e o consumo. Neste sentido, Misabel Abreu Machado Derzi aponta que a globalização evidenciou a mobilidade extrema do capital (renda e lucros), muito mais ágil do que os salários e, sobretudo, do que o consumo, propiciando uma verdadeira competição, no plano internacional, pela atração do capital25. Reuven Avi-Yonah alerta que, em resposta à competição fiscal internacional, os países desenvolvidos passaram a concentrar a carga fiscal sobre a renda do trabalho e do consumo, com o consequente alívio da tributação sobre o capital móvel. O problema surge quando a tributação do trabalho esbarra em um teto máximo intransponível, que desencadeia a crise fiscal do Estado, com a consequente redução dos gastos públicos necessários à manutenção dos benefícios da seguridade social26. O que se quer dizer, com tais considerações, é que a tributação dos lucros distribuídos deve ser analisada também sob uma perspectiva econômica, sobretudo em um cenário de alta mobilidade do capital, no qual os investidores podem migrar seus recursos com facilidade para jurisdições com tributação favorecida27.

Outro aspecto a ser destacado diz respeito à atividade de administração tributária, que é bastante efetiva na imposição, fiscalização e cobrança do imposto de renda devido sobre o produto do trabalho, mas ainda pouco eficiente em relação aos rendimentos oriundos do capital financeiro. Aliás, pode-se dizer que própria realização de planejamento tributário é mais complexa em relação aos rendimentos do trabalho, que são submetidos, no país, a um sistema tributação na fonte, no qual o imposto devido é retido e recolhido aos cofres públicos pela fonte pagadora, antes do seu efetivo recebimento pelo beneficiário. De fato, Edward J. McCaffery divide os principais objetivos buscados pelos contribuintes com as operações de planejamento tributário em quatro categorias: (i) evitar a ocorrência do fato gerador (“escape”); (ii) diferir a tributação para o futuro, aproveitando-se do custo do dinheiro no tempo (“defer”); (iii) transferir a responsabilidade pelo pagamento do imposto para outro sujeito de direito (“shift”); e (iv) requalificar o rendimento para outra categoria de renda, para a qual a legislação preveja um tratamento tributário mais favorável (“convert”)28. Adiante, o autor conclui que a realização de planejamento tributário com os rendimentos oriundos do trabalho é bastante complexa, senão de impossível implantação na prática29. Por outro lado, o planejamento tributário pode ser mais facilmente estruturado em relação ao rendimento do capital. Apenas para ilustrar, cabe destacar que, caso os dividendos estivessem sujeitos à tributação na fonte, os sócios poderiam realizar operações de planejamento tributário para transformá-los em ganho de capital com relativa facilidade, o que conduziria à tributação do respectivo valor à alíquota reduzida de 15%30.

Como se não bastasse, é preciso pontuar que a ausência de isenção para os dividendos distribuídos aos sócios ou acionistas pode afetar a estrutura de capital das pessoas jurídicas, estimulando o aporte de recursos por meio de empréstimos, uma vez que as despesas com juros podem ser deduzidas para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL31. Evidentemente, o endividamento excessivo traz efeitos adversos para a economia, pois afeta a capacidade de solvência da companhia e a função de garantia do capital social, além de expor a sociedade a maiores riscos em épocas de crises econômicas32. Daí o alerta de Joseph E. Stiglitz no sentido de que a lei tributária, ao estimular indiretamente o financiamento corporativo mediante empréstimo, em razão da possibilidade de dedução das despesas com juros, pode exacerbar as flutuações econômicas, uma vez que as sociedades com alto grau de endividamento ficam mais vulneráveis ao risco de falência em caso de eventual crise econômica33. Em vista disso, a isenção de imposto de renda outorgada aos dividendos pode ser considerada uma forma de incentivar o financiamento corporativo por meio de aumento de capital, o que traz um efeito positivo para a função do capital social como elemento de garantia perante os credores. Realmente, enquanto o financiamento corporativo por meio de empréstimo tem a vantagem de permitir a dedução dos juros pagos pela pessoa jurídica, o aporte de recursos mediante aumento de capital pode ser beneficiado, na esfera da pessoa física, com a isenção de IRPF e a tributação reduzida aplicável ao ganho de capital, em caso de futura alienação do investimento.

Por último, pode-se dizer, com Andrea Lemgruber, que a dupla tributação dos lucros desestimula a formação de poupança, afetando o desenvolvimento econômico de longo prazo34. Isso porque o incentivo à poupança de longo prazo, em contraposição ao consumo, é essencial para permitir a realização de investimentos em bens de produção, com o objetivo de alavancar a capacidade produtiva da economia. Não se quer, com as considerações precedentes, relegar a importância do estímulo ao consumo como instrumento para elevar o nível de utilização da capacidade produtiva da economia. Ao contrário, sabe-se que as recentes reduções nas alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e do Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, ou relativas a Títulos e Valores Mobiliários (IOF) para fomentar determinados segmentos econômicos têm o nítido propósito de estimular o consumo interno, como forma de aquecer a economia e manter a atual taxa de crescimento econômico em um patamar razoável. Porém, não se pode desprezar a importância da poupança de longo prazo para o desenvolvimento econômico sustentável de um país.

Vale destacar que a isenção concedida aos dividendos não é o único método de integração adotado pelo Brasil. O instituto dos juros sobre o capital próprio (JCP), concebido pelo legislador pátrio no artigo 9º da Lei nº 9.249/1995, além de amenizar os efeitos tributários da distinção entre o capital próprio (“equity”) e o capital de terceiros (“debt”), estimulando a capitalização das sociedades, ainda pode ser considerado como um método misto de integração entre a pessoa jurídica e a pessoa física. Isso porque esse instituto permite que a pessoa jurídica pague determinada remuneração ao seu sócio ou acionista, reconhecendo o respectivo valor como despesa dedutível do seu lucro tributável, observados certos limites35. A dedução dos resultados distribuídos sob a forma JCP, em conjunto com a tributação na fonte à alíquota mais amena de 15% alivia a dupla tributação econômica36.

Assim, ao admitir a dedução dos valores pagos a título de JCP das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, o legislador pátrio adotou um sistema de integração similar ao “método de dedução dos dividendos”, com o alívio da carga tributária incidente sobre os lucros empresariais. Em seguida, por ocasião da distribuição dos lucros aos sócios, os respectivos valores são tributados mediante a aplicação de uma alíquota fixa de IRRF inferior à alíquota máxima da tabela progressiva (27,5%), em consonância com o método de integração denominado de “flat income tax”37.

Por fim, deve-se mencionar que a desoneração tributária dos fundos de investimento em geral, com a concentração da tributação no nível dos quotistas38, bem como a regra que permite o repasse de dividendos e JCP diretamente aos quotistas39, também podem ser consideradas mecanismos de integração adotados pela lei brasileira para evitar a dupla tributação econômica, a fim de não desestimular a utilização de veículos de investimento coletivo.

3. O Alcance do Artigo 10 da Lei nº 9.249/1995 e o Pagamento de Dividendos à Conta de Reserva de Capital

A abordagem do tema, que está relacionado ao alcance da isenção concedida aos lucros e dividendos distribuídos pelas sociedades, deve partir do próprio enunciado normativo do artigo 10 da Lei nº 9.249/1995, a seguir transcrito:

“Art. 10. Os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no País ou no exterior.”

A simples leitura do dispositivo legal acima transcrito - em particular das partes que foram destacadas no texto - evidencia que o legislador tributário concedeu isenção de imposto de renda aos lucros e aos dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, por pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado.

À primeira vista, a menção aos “dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996” pode ser compreendida como uma regra de direito intertemporal, que demonstra a opção do legislador em identificar o tratamento tributário a partir do momento de apuração do resultado contábil, deixando de lado o momento de efetivo pagamento do dividendo. Como exemplo, os dividendos calculados com base em resultados apurados em 1994 e 1995 permanecem sujeitos à tributação, ainda que o pagamento ocorra após o início da vigência da isenção concedida pelo artigo 10 da Lei nº 9.249/199540.

É comum a afirmação, no âmbito da doutrina41, de que o conceito de dividendo existente na legislação societária foi incorporado pelo legislador tributário, mediante remissão às regras societárias que disciplinam a distribuição de lucros aos sócios ou acionistas. Nessa linha, caso determinado rendimento seja qualificado como dividendo pela lei societária, caberia ao legislador tributário, tão somente, aplicar o artigo 10 da Lei nº 9.249/1995, reconhecendo a isenção do imposto de renda. Vale dizer, o legislador tributário, ao outorgar a isenção prevista no artigo 10, vinculou-se ao conceito de dividendo preexistente no âmbito do direito privado (direito societário), atribuindo-lhe determinada consequência jurídica (isenção de imposto de renda).

Apesar de subscrevermos a posição acima, é preciso ponderar que a expressão “os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados” sempre gerou inúmeras controvérsias em relação ao alcance da isenção prevista no artigo 10 da Lei nº 9.249/1995. Para evidenciar a relevância da distinção acima, tomemos como exemplo os dividendos pagos à conta de reserva de capital.

Como regra geral, os dividendos correspondem aos valores pagos aos sócios ou acionistas, em virtude da partilha dos resultados sociais, por meio da apuração de lucro líquido no exercício, lucros acumulados ou reserva de lucros, nos termos do artigo 201 da Lei nº 6.404/1976, a seguir reproduzido:

Art. 201. A companhia somente pode pagar dividendos à conta de lucro líquido do exercício, de lucros acumulados e de reserva de lucros; e à conta de reserva de capital, no caso das ações preferenciais de que trata o parágrafo 5º do artigo 17.”

Entretanto, em certas situações, a lei societária autoriza o pagamento de dividendos fixos aos acionistas titulares de ações preferenciais, em contrapartida à conta de reserva de capital, conforme se pode depreender do artigo 17, parágrafo 6º, da Lei nº 6.404/1976, abaixo transcrito:

“Art. 17. As preferências ou vantagens das ações preferenciais podem consistir:

Parágrafo 6º O estatuto pode conferir às ações preferenciais com prioridade na distribuição de dividendo cumulativo, o direito de recebê-lo, no exercício em que o lucro for insuficiente, à conta das reservas de capital de que trata o parágrafo 1º do art. 182. (Redação dada pela Lei nº 10.303, de 2001).”

De maneira geral, as ações preferenciais diferenciam-se das ações ordinárias em razão dos privilégios patrimoniais que lhe são outorgados em relação às ações ordinárias, os quais constam no artigo 17 da Lei nº 6.404/1976, a saber: (a) prioridade na distribuição de dividendo, fixo ou mínimo; (b) prioridade no reembolso do capital, com prêmio ou não; ou (c) acumulação das preferências e vantagens mencionadas nos itens (a) e (b) acima. As vantagens e os privilégios atribuídos às ações preferenciais devem estar previstos no estatuto social da companhia, incluindo eventuais restrições, as condições de resgate ou amortização, bem como a possibilidade de conversão em ações ordinárias.

A respeito do pagamento de dividendo à conta de reserva de capital, Nelson Eizirik ensina que as reservas de capital originam-se a partir de recursos recebidos pela companhia sem trânsito pelas contas de resultado do exercício, nos termos do parágrafo 1º do artigo 182 da Lei nº 6.404/1976. Sendo assim, o valor registrado pela sociedade em reserva de capital somente pode ser distribuído aos sócios ou acionistas em caráter excepcional, na hipótese em que os demais fundos legalmente previstos (lucros do exercício e reservas de lucros) não se mostrarem suficientes para cobrir o valor do dividendo devido às ações preferenciais42.

Segundo a Exposição de Motivos nº 196, de 24 de junho de 1976, que acompanhou a Lei nº 6.404/1976, esse mecanismo tem o objetivo de facilitar a colocação das ações preferenciais no mercado. Veja-se:

“Essa vantagem pode ser útil para facilitar ao empresário a colocação das ações da companhia, e embora seja exceção ao princípio geral de que os dividendos somente podem ser distribuídos à conta de lucros ou de reserva de lucros, não prejudica os credores que são garantidos pelo capital social e não pelas reservas de capital.”

Dessa forma, a possibilidade de pagamento de dividendos à conta de reserva de capital foi introduzida no direito societário brasileiro pela Lei nº 6.404/1976, com a finalidade de conferir maior flexibilidade para a estrutura de capital e a política de financiamento das sociedades anônimas, facilitando a captação de recursos no mercado de capitais mediante a emissão de ações preferenciais. Segundo relato de Maurício da Cunha Peixoto, com a criação das ações preferenciais, o legislador procurou atrair uma segunda espécie de investidor, que está mais interessado no retorno financeiro do seu investimento do que na condução da atividade empresarial. As ações preferenciais prestam-se, portanto, à captação de recursos no mercado, sem o risco de desestabilização do poder de controle43.

É justamente por isso que as reservas de capital somente podem ser distribuídas aos sócios em caráter excepcional, na hipótese em que os demais fundos legalmente previstos (lucros do exercício e reservas de lucros) não bastarem para cobrir o valor do dividendo devido às ações preferenciais. Não por acaso, o artigo 200 da Lei nº 6.404/1976 estabelece que as reservas de capital somente poderão ser utilizadas para: (i) absorção de prejuízos que ultrapassarem os lucros acumulados e as reservas de lucros; (ii) resgate, reembolso ou compra de ações; (iii) resgate de partes beneficiárias; (iv) incorporação ao capital social; (v) pagamento de dividendo a ações preferenciais, quando essa vantagem lhes for assegurada.

Face ao que precede, pode-se concluir que, sob o prisma do direito societário, não há dúvida de que os valores pagos aos acionistas titulares de ações preferenciais, à conta de reserva de capital, têm natureza jurídica de dividendos.

Ocorre que, como regra geral, as reservas de capital originam-se de recursos recebidos pela companhia, mas que não transitam por contas de resultados. Ora, conforme enfatizado acima, o artigo 10 da Lei nº 9.249/1995 dispõe expressamente que a isenção de imposto de renda alcança “os lucros e dividendos calculados com base nos resultados apurados” pela pessoa jurídica.

De fato, as reservas de capital não são constituídas com base nos lucros auferidos pela companhia, mas, sim, a partir de contribuições de acionistas ou de terceiros para o patrimônio líquido da sociedade, como ocorre nas seguintes hipóteses: ágio na emissão de ações; alienação de partes beneficiárias e bônus de subscrição44. No plano contábil, as reservas de capital compreendem valores que não transitam pelo resultado da companhia como receitas45. Como exemplo, recorde-se que o ágio na subscrição de ações46, mesmo após as alterações promovidas pela Lei nº 11.638/2007 nas regras contábeis, continua a ser creditado diretamente em conta de reserva de capital, sem transitar por contas do resultado do exercício.

Nesta linha, não é preciso grande esforço de interpretação para reconhecer que o valor de destinado à formação de reserva de capital tem natureza jurídica de transferência patrimonial, o que, em uma leitura apressada, poderia afastar a aplicação do artigo 10 da Lei nº 9249/1995, que alcança apenas os dividendos pagos com base nos resultados da pessoa jurídica. Isso porque, considerando que o valor creditado à conta de reserva de capital não foi computado no resultado do exercício e na apuração do lucro líquido contábil-societário, pode-se dizer que o artigo 10 da Lei nº 9.249/1995 não é imediatamente aplicável aos dividendos distribuídos à conta de reserva de capital.

Note-se que essa interpretação parece ter orientado a Secretaria da Receita Federal por ocasião da edição Instrução Normativa SRF nº 93/1997, que considera como dividendos apenas os valores pagos com base nos lucros apurados, lucros acumulados ou reserva de lucros. Veja-se:

“Art. 48. Não estão sujeitos ao imposto de renda os lucros e dividendos pagos ou creditados a sócios, acionistas ou titular de empresa individual.

(...)

Parágrafo 4º Inexistindo lucros acumulados ou reservas de lucros em montante suficiente, a parcela excedente será submetida à tributação nos termos do art. 3º, parágrafo 4º, da Lei nº 7.713, de 1988, com base na tabela progressiva a que se refere o art. 3º da Lei nº 9.250, de 1995.

(...)

Parágrafo 6º A isenção de que trata este artigo somente se aplica em relação aos lucros e dividendos distribuídos por conta de lucros apurados no encerramento de período-base ocorrido a partir do mês de janeiro de 1996.

Para que não paire dúvida, damo-nos pressa em esclarecer que isso não significa que apenas a parcela do resultado societário-contábil oferecida à tributação pelo IRPJ e CSLL pode ensejar a distribuição de dividendos isentos de imposto de renda. Ao contrário, não temos dúvida de que a isenção de imposto de renda alcança a totalidade do lucro contábil apurado pela pessoa jurídica, sendo o lucro real, o lucro presumido e/ou lucro arbitrado verdadeiros mecanismos para a apuração da base de cálculo da exação. A diferença é que os valores computados na apuração do resultado do exercício influenciam na apuração do lucro líquido contábil, que sofrerá os ajustes de adição, exclusão e compensação estipulados para fins de determinação do lucro tributável. Por outro lado, os valores registrados diretamente à conta de reserva de capital, como é o caso do ágio na subscrição de ações, sequer são computados na apuração do lucro contábil-societário, o que afastaria, por completo, a necessidade de aplicação da isenção de imposto de renda como um método de integração da tributação das pessoas físicas e das pessoas jurídicas.

Assim, a controvérsia acerca do pagamento de dividendos à conta de reserva de capital não se confunde com a equivocada interpretação, defendida pela Administração Tributária no Parecer PGFN/CAT nº 202/2013, no sentido de que os lucros e dividendos distribuídos pelas pessoas jurídicas sujeitas ao Regime Tributário de Transição (RTT) somente seriam considerados isentos até o montante do lucro líquido apurado em consonância com os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 200747. Em outras palavras, partindo do pressuposto de que a isenção alcança os dividendos distribuídos com base nos resultados apurados pela pessoa jurídica, a controvérsia endereçada pelo Fisco na Instrução Normativa RFB nº 1.397/2013 diz respeito apenas ao lucro contábil que deve ser considerado: aquele apurado segundo as novas regras contábeis ou aquele apurado segundo o padrão contábil vigente até 31 de dezembro de 2007.

Portanto, pode-se dizer que a questão da aplicação do artigo 10 da Lei nº 9.249/1995 aos dividendos pagos à conta de reserva de capital é anterior à edição das novas regras contábeis, não tendo qualquer relação com as discussões relativas ao RTT.

Feita essa distinção, cabe mencionar que, na esfera administrativa, a 2ª Turma Ordinária da 2ª Câmara da 1ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), no Acórdão nº 1202-00461, de 25 de janeiro de 2011, considerou que não possuem natureza jurídica de dividendos os valores recebidos pela sociedade investidora em razão de resgate de ações com a utilização de recursos provenientes da reserva de capital. Confira-se a ementa da decisão:

“Recebimentos. Desdobramento e Resgate de Ações. Dividendos. Descaracterização. Base de Cálculo da CSLL. Inclusão. Não possuem a característica de dividendos, os recebimentos percebidos pela investidora relativos ao desdobramento e resgate de ações com a utilização de lastro proveniente da Reserva Especial de Ágio, registrada como Reserva de Capital no Patrimônio Líquido da investida. Os rendimentos assim recebidos devem fazer parte do resultado do exercício apurado segundo a legislação comercial, base de cálculo da CSLL, aplicando-se à essa contribuição as mesmas normas de apuração estabelecidas para o IRPJ.”

A análise detalhada do acórdão proferido pelo Carf evidencia que o caso concreto envolve, na verdade, operação de resgate de ações com recursos registrados em reserva de capital, na forma do artigo 200, inciso II, da Lei nº 6.404/1976, o que autorizou a descaracterização da natureza jurídica de dividendos. De todo modo, o voto proferido pelo conselheiro Carlos Alberto Donassolo sinaliza que, em caso de efetiva distribuição de dividendos à conta de reserva de capital, para acionistas titulares de ações preferenciais, a isenção prevista no artigo 10 da Lei nº 9.249/1995 poderia ser aplicada.

4. A Influência da Lei nº 12.973/2014 para a Discussão

Conforme comentado acima, o artigo 9º da Lei nº 12.973/2014 incluiu um parágrafo 2º no artigo 10 da Lei nº 9.249/1995, segundo o qual a desoneração tributária citada acima alcança os lucros ou dividendos pagos ou creditados aos beneficiários de todas as espécies de ações previstas no artigo 15 da Lei nº 6.404/1976, ainda que os recursos aportados sejam objeto de classificação contábil no passivo (passivo financeiro, em vez de patrimônio líquido), ou que a respectiva remuneração seja classificada como despesa financeira. Veja-se:

“Art. 10. Os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no País ou no exterior.

(...)

§ 2º A não incidência prevista no caput inclui os lucros ou dividendos pagos ou creditados a beneficiários de todas as espécies de ações previstas no art. 15 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, ainda que a ação seja classificada em conta de passivo ou que a remuneração seja classificada como despesa financeira na escrituração comercial.”

A redação do enunciado normativo acima teve o objetivo de neutralizar eventuais impactos fiscais das novas regras contábeis que determinam o registro de determinadas ações emitidas por sociedades anônimas como passivo financeiro.

De fato, o Pronunciamento Técnico CPC nº 39 (“instrumentos financeiros”), prevê que a sociedade emissora deverá examinar os direitos atribuídos aos titulares de ações preferenciais para decidir acerca da sua classificação como passivo financeiro ou instrumento patrimonial48. Antes da edição das novas regras contábeis baseadas no padrão IFRS, as sociedades frequentemente emitiam ações preferenciais com características típicas de instrumentos financeiros passivos, mas preservam o seu registro no patrimônio líquido em razão da sua natureza jurídica (forma jurídica sobre a substância econômica), o que melhorava a estrutura de capital da companhia e reduzia os seus índices de endividamento49.

É de se acentuar que, no caso de ações preferenciais classificadas como passivo financeiro na escrituração contábil, os dividendos distribuídos devem transitar pelo resultado do exercício como despesas financeiras, com a consequente redução do lucro líquido contábil apurado no período-base em questão50.

Diante disso, a Lei nº 12.973/2014 neutralizou os impactos tributários das novas regras contábeis, ao determinar que os dividendos pagos ou creditados não serão dedutíveis na apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL, ainda que classificados como despesas financeiras na escrituração comercial. De outro lado, a mencionada lei estabeleceu que os dividendos distribuídos estão isentos de imposto de renda, independentemente de seu eventual registro como despesa financeira ou da própria classificação do valor aportado como passivo financeiro.

Feitas essas considerações gerais, passa-se a analisar a influência da alteração legislativa sobre os dividendos pagos à conta de reserva de capital.

A redação literal do parágrafo 2º no artigo 10 da Lei nº 9.249/1995 diz que “a não incidência prevista no caput inclui os lucros ou dividendos pagos ou creditados a beneficiários de todas as espécies de ações previstas no artigo 15 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976”. Tecnicamente, pode-se dizer que a expressão “não incidência” foi utilizada pelo legislador em sua acepção ampla, para considerar que a isenção nada mais é do que um caso de não incidência lato sensu51.

Como qualquer lei que verse sobre as matérias contidas nos incisos I a III do artigo 111 do Código Tributário Nacional (CTN), entre as quais se inclui a isenção, o parágrafo 2º no artigo 10 da Lei nº 9.249/1995 deve ser interpretado sem o emprego de métodos de integração (analogia, equidade, princípios gerais de Direito Tributário ou de direito público), respeitando-se os significados mínimos do texto interpretado e o quadro normativo por ele estabelecido no processo de construção da norma jurídica, que poderá levar em consideração todas as demais técnicas conhecidas de interpretação. Assim, a norma individual a ser elaborada a partir do texto legal deve consagrar pelo menos um dos significados possíveis para o enunciado normativo estabelecido pelo legislador, sem extrapolar as possibilidades semânticas traçadas pelo texto interpretado52. Porém, não é necessário, segundo a nossa visão do artigo 111, que o intérprete, dentre os resultados possíveis encontrados, adote aquele mais restritivo ou com menor abrangência. Isso porque qualquer resultado da atividade de interpretação que respeite o significado possível do texto legal, mantendo-se dentro do seu quadro normativo, será considerado, para efeito de aplicação do artigo 111 do CTN, “interpretação literal”53.

Ainda no campo da interpretação, deve-se mencionar que, segundo o artigo 11, inciso III, alínea “c”, da Lei Complementar nº 95/1998, que disciplina processo legislativo para que os textos legais sejam redigidos com clareza, precisão e ordem lógica, os parágrafos podem complementar ou excepcionar a regra enunciada no caput do dispositivo legal54. Isso traz, como consequência, a necessidade de interpretar o parágrafo 2º em conformidade com o caput do artigo 10 da Lei nº 9.249/1995.

O caput do artigo 10 da Lei nº 9.249/1995 estabelece uma regra de isenção de natureza objetiva, na medida em que ela tem como alvo direto e imediato os lucros e dividendos, sem preocupação direta com os respectivos beneficiários, que podem ser pessoas físicas ou jurídicas, residentes no país ou no exterior. Evidencia-se, com isso, que o legislador vinculou-se à natureza jurídica do dividendo (tipo de rendimento), enquanto instituto disciplinado pelo direito societário.

O preceptivo legal em análise também dispõe que os lucros ou dividendos devem ser calculados com base nos resultados apurados pela pessoa jurídica, sendo que a utilização plural da palavra “resultado” pode remeter tanto ao resultado do exercício social, apurado com base nas regras contábeis vigentes, nos termos da Lei nº 6.404/1976 e do Código Civil de 2002, quanto ao resultado econômico em sentido amplo (acréscimo patrimonial).

Outro requisito que deflui do texto legal diz respeito ao pagamento ou crédito dos dividendos por pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado. Porém, a lei não exige, em qualquer momento, que os lucros que serviram de base para a distribuição dos dividendos tenham sido previamente tributados no âmbito da pessoa jurídica. Daí se afirmar, com inteira convicção, que o legislador não condicionou a isenção de imposto de renda do beneficiário à tributação prévia dos lucros no âmbito da pessoa jurídica pelo IRPJ e pela CSLL.

É bem verdade que a finalidade buscada pela Lei nº 9.249/1995 consiste em evitar a dupla tributação econômica, por meio de mecanismo de integração entre a sociedade e os seus sócios. Entretanto, mesmo ciente de que o lucro societário jamais guardou coincidência com o lucro real, presumido ou arbitrado submetido à tributação, o legislador tributário não concedeu isenção apenas para os dividendos distribuídos até o limite da base de cálculo do imposto. Tanto é assim que, mesmo no lucro presumido ou arbitrado, a base de cálculo para distribuição dos dividendos é o lucro contábil, independentemente da base de cálculo dos tributos corporativos. É o que dispõe o artigo 51, parágrafo 2º, da Instrução Normativa SRF nº 11/1996, segundo o qual o valor distribuído a título de dividendos que exceder o valor da base de cálculo do imposto poderá ser distribuído com isenção, desde que apurado por meio de escrituração contábil feita com observância da lei comercial. Vale mencionar que o inverso também é verdadeiro. Se o lucro fiscal eventualmente superar o lucro líquido contábil, em razão de ajustes fiscais (v.g. adição de receitas ou despesas), o contribuinte não poderá distribuí-lo aos sócios ou acionistas, pois o excesso não pode ser caracterizado como lucro sob o enfoque do direito societário.

Por tais razões, afigura-se equivocada a interpretação de que apenas o lucro tributado na pessoa jurídica pode ser distribuído com isenção de imposto de renda. Ainda que o propósito inicial da norma seja evitar a dupla tributação econômica, é inegável que a lei não condicionou a desoneração dos dividendos à tributação anterior do lucro. Para ilustrar, imagine-se a hipótese de uma sociedade holding, que mantém investimento em uma sociedade operacional. Os lucros apurados no exercício da atividade econômica, submetidos à tributação na sociedade operacional, serão distribuídos com isenção de imposto de renda para investidora, que não precisará submetê-los à tributação corporativa (IRPJ e CSLL). De qualquer forma, isso não impede que a sociedade holding distribua esses resultados com isenção para os seus sócios, mesmo que tais valores nunca tenha sido submetidos à tributação no âmbito da própria sociedade investidora. Isso é assim justamente porque o legislador não condicionou a isenção de imposto de renda à efetiva tributação dos resultados na sociedade que efetuou a distribuição55. Observe-se que o fato de o lucro ter sido tributado na sociedade operacional não afeta de maneira decisiva o raciocínio, pois se a sociedade holding decidir remunerar os seus sócios mediante o pagamento de JCP, o tratamento tributário seguirá a natureza jurídica do respectivo instituto, com a tributação do respectivo rendimento no nível do beneficiário. Dessa forma, percebe-se que o tratamento tributário decorre da natureza jurídica do rendimento (dividendos), independentemente da tributação porventura realizada no nível anterior da cadeia de investimento.

É imperioso enaltecer que, a rigor, a existência de diferenças entre o lucro societário e o lucro real, presumido ou arbitrado não significa que houve um suposto excesso de lucro distribuído sem tributação no plano corporativo. Ao contrário, pode-se dizer que o valor total do resultado societário foi submetido à tributação, pois não se deve confundir a realização de ajustes para a apuração das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL com a ausência de tributação de determinados valores. Logo, o lucro apurado por determinada pessoa jurídica, assim entendido o resultado positivo gerado a partir da exploração de determinada atividade econômica, é integralmente submetido à tributação pelo IRPJ e pela CSLL no encerramento do ano-calendário, ainda que, para efeito de apuração das bases de cálculo de tais exações, a lei imponha a realização de ajustes de adições, exclusões ou compensações.

Em suma, a realização dos ajustes prescritos para a apuração das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, em livros auxiliares, não implica a ausência de tributação de parte do lucro societário.

Passando para a análise do parágrafo 2º, constata-se que o seu enunciado normativo claramente complementa o caput do artigo 10 da Lei nº 9.249/1995, ao prescrever que a isenção de imposto de renda alcança os lucros ou dividendos distribuídos aos titulares de todas as espécies de ações previstas na Lei nº 6.404/1976, o que, inequivocamente, inclui as ações preferenciais. A própria alteração legislativa, que procurou alcançar as ações registradas na contabilidade como passivo financeiro, tem como principal objeto as ações preferenciais resgatáveis.

Com relação ao pagamento de dividendos à conta de reserva de capital, o primeiro aspecto a ser destacado é que o legislador não fez qualquer restrição, limitando-se a dizer que “a não incidência prevista no caput inclui os lucros ou dividendos pagos ou creditados a beneficiários de todas as espécies de ações previstas no art. 15 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976”.

O parágrafo 2º deve ser interpretado em consonância com o caput, o que exige um exame mais acurado da expressão “lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados”. Diante da alteração legislativa examinada acima, que fortalece as nossas considerações anteriores a respeito do tema, a interpretação mais razoável para o termo “resultados” indica que o legislador tributário fez alusão ao resultado econômico da sociedade em caráter amplo, incluindo a reserva de capital.

Claramente, o legislador tributário não fez alusão à demonstração do resultado do exercício (DRE), que é relatório contábil que evidencia a formação do resultado líquido de um exercício, através do confronto das receitas, custos e despesas, apuradas segundo o regime de competência. Afinal, o artigo 201 da Lei nº 6.404/1976 dispõe que “a companhia somente pode pagar dividendos à conta de lucro líquido do exercício, de lucros acumulados e de reserva de lucros; e à conta de reserva de capital, no caso das ações preferenciais”. As contas contábeis em questão, nas quais o valor do dividendo distribuído é registrado mediante lançamento contábil a débito, integram o patrimônio líquido da companhia, que atualmente encontra-se subdividido em capital social, reserva de capital, ajuste de avaliação patrimonial, reserva de lucros, ações em tesouraria e prejuízos acumulados. Frise-se que a Lei nº 11.638/2007 alterou o artigo 178, inciso III, da Lei nº 6.404/197656, excluindo do patrimônio líquido a conta de lucros acumulados, que passou a ter natureza transitória, tendo em vista que, ao final do exercício, o valor nela registrado deve ser transferido para as reservas de lucros ou para a destinação de resultados57. Assim, no encerramento do exercício social, as companhias devem destinar o valor total do lucro líquido do exercício para a constituição de reservas de lucros58 ou para a distribuição de dividendos59.

Isso nos levar a crer que, ao mencionar os “lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados”, o legislador tributário pretendeu destacar que o valor a ser distribuído deve possuir lastro na escrituração contábil da pessoa jurídica, o que abrange as demonstrações financeiras em geral, especialmente o balanço patrimonial e a DRE. Não se exige, portanto, o trânsito do valor distribuído por contas de resultado. Além disso, repise-se a existência de uma regra de direito intertemporal, por meio da qual o tratamento tributário depende do momento de apuração do resultado contábil, independente do exercício social de efetivo pagamento dos dividendos. Tanto é assim que os dividendos pagos com base em resultados apurados em 1994 e 1995 permanecem sujeitos à incidência do imposto de renda, ainda que a distribuição ocorra na vigência do artigo 10 da Lei nº 9.249/1995.

Acresça-se, por fim, que a Lei nº 12.973/2014 corrobora a interpretação acima ao tratar das ações preferenciais registradas como passivo financeiro da pessoa jurídica, tendo em vista que a regra contábil antecipa a contabilização do dividendo como despesa financeira, em linha com o regime de competência. Assim, os dividendos registrados como despesa financeira não podem ser considerados como destinação do lucro líquido, uma vez que o resultado do exercício já foi afetado no momento da contabilização da despesa financeira. Por consequência, o lucro líquido passível de destinação na escrituração contábil, no momento da assembleia geral da sociedade anônima, estará líquido dos dividendos registrados como despesas financeiras. Isso mostra que, com a edição da Lei nº 12.973/2014, até mesmo o dividendo que não é distribuído com base no resultado social da pessoa jurídica, por não ter integrado o lucro líquido do período-base, faz jus ao reconhecimento da isenção de imposto de renda prevista no artigo 10 da Lei nº 9.249/1995.

Diante do exposto, conclui-se que a edição da Lei nº 12.973/2014 fortalece a concepção de que os dividendos pagos aos titulares de ações preferenciais, à conta de reserva de capital, são isentos de imposto de renda, tendo em vista que o legislador tributário incorporou o conceito de dividendo previsto na lei societária, sem condicionar a isenção ao trânsito de valores por contas de resultado, tampouco à tributação prévia dos respectivos valores no âmbito da pessoa jurídica.

5. Conclusões

As ideias expostas no presente trabalho podem ser assim sintetizadas:

- a isenção outorgada aos dividendos tem nítida função indutora, como instrumento para aliviar a dupla tributação econômica, além de encontrar amparo em objetivos constitucionais, bem como em necessidades relativas à política fiscal;

- a lei societária autoriza o pagamento de dividendos fixos aos acionistas titulares de ações preferenciais, em contrapartida à conta de reserva de capital, nos termos do artigo 17, parágrafo 6º, da Lei nº 6.404/1976;

- as reservas de capital originam-se a partir de recursos recebidos pela companhia sem trânsito por sua conta de resultado do exercício, o que pode suscitar dúvidas a respeito da possibilidade de aplicação da isenção prevista no artigo 10 da Lei nº 9.249/1995, segundo o qual a isenção de imposto de renda alcança “os lucros e dividendos calculados com base nos resultados apurados” pela pessoa jurídica;

- a edição da Lei nº 12.973/2014 fortalece a concepção de que os dividendos pagos aos titulares de ações preferenciais, à conta de reserva de capital, são isentos de imposto de renda, tendo em vista que o legislador tributário incorporou o conceito de dividendo previsto na lei societária, sem condicionar a isenção ao trânsito de valores por contas de resultado do exercício, tampouco à tributação prévia dos respectivos valores no âmbito da pessoa jurídica.

1 Resultado de conversão da Medida Provisória nº 627/2013.

2 Em sentido amplo, os instrumentos híbridos podem alcançar atos ou negócios jurídicos, institutos jurídicos ou operações estruturadas de financiamento corporativo que conjugam direitos ou obrigações com características típicas de capital próprio (investimento) e capital de terceiros (dívida). Entretanto, sob a perspectiva da contabilidade, o instrumento financeiro híbrido contém um derivativo embutido ao contrato principal, ao passo que o instrumento financeiro composto contém elementos de passivo (“debt”) e patrimônio líquido (“equity”) dento de um único título (cf. LOPES, Tatiana. “Instrumentos financeiros híbridos, compostos e derivativos embutidos: impactos fiscais da não regulamentação do tema pela MP 627/2013”. Controvérsias jurídico-contábeis (aproximações e distanciamentos). 5º volume. Coord. de Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2014, pp. 394-396). Cabe mencionar, ainda, que a dinâmica do mercado financeiro tem proporcionado o surgimento de novos produtos financeiros com características híbridas. É o que noticia Sven-Eric Bärsch ao mencionar os contratos derivativos que apresentam características de contratos futuros e de contratos de opções (“forward/option”), bem como os contratos derivativos com elementos de outros instrumentos financeiros (“mezzanine/structured financial instruments”) (BÄRSCH, Sven-Eric. Taxation of hybrid financial instruments and the remuneration derived therefrom in an international and cross-border context. Heidelberg: Springer-Verlag, 2012, pp. 9-12). De qualquer forma, ao incluir o parágrafo 2º no artigo 10 da Lei nº 9.249/1995, pode-se dizer que a Lei nº 12.973/2014 focou especificamente nas ações registradas como passivo financeiro na escrituração contábil da pessoa jurídica.

3 KWALL, Jeffrey L. “The uncertain case against the double taxation of corporate income”. North Carolina Law Review volume 68, 1990, p. 633.

4 A rigor, a tributação sempre recaíra sobre a renda, que pode ser captada em diferentes momentos (auferida, poupada ou consumida) Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 3ª edição. São Paulo: Saraiva, 2013, pp. 51-66.

5 AMARO, Luciano. Direito Tributário brasileiro. 15ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009, pp. 90-91.

6 TILBERY, Henry. Imposto de Renda - pessoas jurídicas: integração entre sociedade e sócios. São Paulo: Atlas, 1985, pp. 43-44.

7 SILVA, Natalie Matos. “A integração da tributação das pessoas jurídicas e das pessoas físicas: análise dos modelos teóricos e de sua adequação ao princípio da capacidade contributiva”. Revista Direito Tributário atual nº 23. São Paulo: Dialética, 2009, p. 389.

8 CAVALCANTI, Flávia. “A integração da tributação das pessoas jurídicas e das pessoas físicas - uma análise calcada na neutralidade, equidade e eficiência”. Revista Direito Tributário atual nº 24. São Paulo: Dialética, 2010, pp. 239-279.

9 Confira-se o entendimento da autora: “considerando que não existe uma justificativa válida para a tributação dos rendimentos de capital de maneira menos gravosa do que os rendimentos do trabalho, a tributação dos dividendos de acordo com a tabela progressiva seria mais justa e apta a aferir a tributar a renda global do contribuinte (...)” (SILVA, Natalie Matos. Op. cit., p. 386).

10 HOLMES, Kevin. The concept of income - a multi-disciplinary analysis. Amsterdã: IBFD, 2001, pp. 4-6.

11 POLIZELLI, Victor Borges. O princípio da realização da renda - reconhecimento de receitas e despesas para fins do IRPJ. Série Doutrina Tributária. Volume VII. São Paulo: IBDT/Quartier Latin, 2012, p. 67.

12 MARTINS, Ricardo Lacaz. Tributação da renda imobiliária. São Paulo: Quartier Latin, 2011, p. 54.

13 CHANCELLOR, Thomas. “Imputed income and the ideal income tax”. Federal Income Tax Anthology. Paul L. Caron, Karen C. Burke, Grayson M. P. McCouch. Cincinnati, Ohio: Anderson Publishing Co., 2003, pp. 142-149.

14 HOLMES, Kevin. Op. cit., p. 35

15 Segundo Willian D. Andrews, assim como ocorre na hipótese em que o contribuinte consome sem a necessidade de desembolso de valores, em que foi preciso incluir esse montante na renda a ser tributada (renda imputada), as deduções de despesas também servem para ajustar discrepâncias que o conceito de renda SHS (“consumo mais acumulação”) pode vir a produzir (ANDREWS, William D. “Personal deductions in an ideal income tax”. Federal income tax anthology. Paul L. Caron, Karen C. Burke, Grayson M. P. McCouch. Cincinnati, Ohio: Anderson Publishing Co., 2003, pp. 277-282).

16 HOLMES, Kevin. Op. cit., pp. 521-525.

17 Para uma análise mais detalhada do tema, conferir: SANTOS, Ramon Tomazela. “O princípio da universalidade na tributação da renda: análise acerca da possibilidade de atribuição de tratamento jurídico-tributário distinto a determinados tipos de rendimento auferidos pelas pessoas físicas”. Revista Direito Tributário atual nº 28. São Paulo: Dialética e IBDT, 2012, pp. 264-294.

18 ÁVILA, Humberto. Conceito de renda e compensação de prejuízos fiscais. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 29.

19 Na vigência do Decreto-lei nº 5.844/1943, a base de cálculo do imposto de renda da pessoa física (IRPF) correspondia aos rendimentos brutos, classificados em cédulas identificadas pelas letras A a H, menos as deduções das despesas necessárias à percepção dos rendimentos e os abatimentos autorizados pela lei, como seguros, juros, dependentes, despesas médicas, dentre outras (PENHA, José Ribamar Barros. Imposto de Renda Pessoa Física: norma, doutrina, jurisprudência e prática. 2ª edição. São Paulo: MP, 2011, pp. 85-86).

20 DUARTE FILHO, Paulo César Teixeira. A bitributação econômica do lucro empresarial. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2011. pp. 142-143.

21 A alternativa de tributar os dividendos recebidos no âmbito da pessoa física, às alíquotas da tabela progressiva, poderia se mostrar viável caso se admitisse a dedução do valor relativo ao lucro distribuído das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, para aliviar o efeito econômico da tributação na esfera da pessoa jurídica. O problema é que a alternativa em questão fica restrita às sociedades submetidas ao regime do lucro real, sendo complexa a implantação de um regime alternativo para as pessoas jurídicas tributadas no lucro presumido ou arbitrado, nos quais não se admite, em regra, a dedução de custos ou despesas.

22 STIGLITZ, Joseph E. Economics of the public sector. 3ª edição. Nova York/Londres: WW. Norton, 2000, p. 663.

23 MUSGRAVE, Richard A.; e MUSGRAVE, Peggy B. Finanças públicas. Teoria e prática. Rio de Janeiro: Campus, São Paulo: Edusp, 1980, pp. 248-249.

24 PINTO, Alberto. “Tratamento tributário dos lucros distribuídos e o RTT e outras questões relevantes”. Controvérsias jurídico-contábeis (aproximações e distanciamentos). 4º volume. Coord. de Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2013, pp. 15-17.

25 DERZI, Misabel Abreu Machado. “Concorrência tributária e seus efeitos nos conceitos de renda e consumo”. Grandes questões atuais do Direito Tributário. 17º volume. Coord. de Valdir de Oliveira Rocha. São Paulo: Dialética, 2013, p. 210.

26 AVI-YONAH, Reuven. “Globalization, tax competition and the fiscal crisis of the welfare state”. Harvard Law Review volume 113. 1999-2000, pp. 1.573-1.676.

27 PINTO, Alberto. Op. cit., p. 12.

28 MCCAFFERY, Edward J. Income tax law. Nova York: Oxford University Press, 2011, p. 27.

29 MCCAFFERY, Edward J. Op. cit., pp. 31-32.

30 Vale lembrar, inclusive, que o artigo 380 do RIR/1999 contém uma regra de registro de dividendos como redução do custo de aquisição, justamente para os casos em que a participação societária é vendida com lucros acumulados passíveis de distribuição. Veja-se: “Art. 380. Os lucros ou dividendos recebidos pela pessoa jurídica, em decorrência de participação societária avaliada pelo custo de aquisição, adquirida até seis meses antes da data da respectiva percepção, serão registrados pelo contribuinte como diminuição do valor do custo e não influenciarão as contas de resultado (Decreto-Lei nº 2.072, de 1983, art. 2º).”

31 CALIJURI, Mônica Sionara Schpallir. “Tributação dos lucros ou dividendos: uma contribuição à reflexão em um ambiente globalizado”. Controvérsias jurídico-contábeis (aproximações e distanciamentos). 5º volume. Coord. de Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2014, p. 289.

32 Para uma análise mais detalhada, conferir: SANTOS, Ramon Tomazela. “As regras tributárias de subcapitalização: entre a antielisão e o estímulo à capitalização societária. A influência das teorias econômicas (trade-off e pecking-order) na estrutura de capital das pessoas jurídicas”. Revista Dialética de Direito Tributário nº 225. São Paulo: Dialética, junho de 2014, pp. 147-162.

33 STIGLITZ, Joseph E. Op. cit., p. 666.

34 LEMGRUBER, Andréa. “A tributação do capital: o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e o Imposto sobre Operações Financeiras”. Economia do setor público no Brasil. Coord. de Ciro Biderman e Paulo Arvate. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004, pp. 221-222.

35 Artigo 9º da Lei nº 9.249/1995.

36 DUARTE FILHO, Paulo César Teixeira. Op. cit., pp. 108-121.

37 A respeito do método do “Flat Income Tax”, confira-se a observação de Natalie Matos Silva: “a incidência de uma alíquota única sobre os dividendos que seja menor que a alíquota mais alta da tabela progressiva tem o efeito de proporcionar um alívio mais que total para os sócios e acionistas de alta renda, e menos que total para os sócios e acionistas tributados na tabela progressiva por uma alíquota menor que a aplicável aos dividendos” (SILVA, Natalie Matos. Op. cit., pp. 392).

38 Artigo 68, I, da Lei nº 8.981/1995 e artigo 14, I, da IN RFB nº 1.022/2010.

39 Artigo 22 da IN RFB nº 1.022/2010.

40 LAULETTA, Andrea Bazzo. “Os impactos das novas regras contábeis na isenção tributária dos dividendos”. Controvérsias jurídico-contábeis (aproximações e distanciamentos). 5º volume. Coord. de Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2014, pp. 13-14.

41 À guisa de ilustração, confira-se a afirmação de Matheus Bertholo Piconez: “Ademais, à ausência de um conceito tributário de dividendos na brasileira, os dividendos devem ser calculados com base nas normas societárias atualmente em vigor.” (PICONEZ, Matheus Bertholo. “Dividendos e juros sobre o capital próprio no novo modelo contábil e seu tratamento tributário”. Controvérsias jurídico-contábeis (aproximações e distanciamentos). 3º volume. Coord. de Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2012, p. 265) Na mesma linha, Andrea Baz­zo Lauletta: “O conceito de dividendo ora apresentado é, portanto, decorrente das disposições societárias previstas na LSA. Nesse tocante, nota-se que não há na legislação tributária qualquer conceito de ‘dividendo’ para fins de aplicação da isenção tratada pela Lei nº 9.249/1995.” (LAULETTA, Andrea Bazzo. Op. cit., p. 16)

42 EIZIRIK, Nelson. A Lei das S/A comentada. Volume III. Artigos 189 a 300. São Paulo: Quartier Latin, 2011, p. 85.

43 PEIXOTO, Maurício da Cunha. “Sociedades anônimas - algumas considerações sobre as ações preferenciais, o Conselho de Administração e o acordo de acionista após a reforma implementada pela Lei 10.303/01”. Sociedades anônimas e mercado de capitais - homenagem ao Prof. Osmar Brina Corrêa-Lima. Coord. de Arnoldo Wald, Fernando Gonçalves e Moema Augusta Soares de Castro. São Paulo: Quartier Latin, 2011, p. 514.

44 Antes da edição da Lei nº 11.638/2007, também integravam as reservas de capital o prêmio recebido na emissão de debêntures e as subvenções para investimento.

45 IUDÍCIBUS, Sérgio de et al. Manual de contabilidade societária. São Paulo: Atlas, 2010, p. 349.

46 Artigo 182, parágrafo 1º, alínea “a”, da Lei nº 6.404/1976 e artigo 442 do Regulamento do Imposto de Renda, instituído pelo Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999 (RIR/1999).

47 A interpretação exarada no ato administrativo em epígrafe está alicerçada, basicamente, nos argumentos a seguir resumidos: (i) o artigo 16 da Lei nº 11.941/2009 prescreve que as alterações introduzidas pelas novas regras contábeis, que modifiquem o critério de reconhecimento de receitas, custos e despesas computadas na apuração do lucro líquido contábil, não terão efeitos para fins de apuração do lucro real das pessoas jurídicas sujeitas ao RTT, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007; (ii) a expressão “lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados”, presente no artigo 10 da Lei nº 9.249/2010, deve ser interpretada como alusiva aos resultados positivos apurados conforme os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007.

48 Vide itens AG25 e AG26 do Pronunciamento Técnico CPC nº 39.

49 LOPES, Tatiana. “Instrumentos financeiros híbridos, compostos e derivativos embutidos: impactos fiscais da não regulamentação do tema pela MP 627/2013”. Op. cit., p. 396.

50 Vide item 36 do Pronunciamento Técnico CPC nº 39: “Assim, os dividendos a pagar de ações, que são inteiramente reconhecidos como passivo, devem ser reconhecidos como despesa, da mesma forma que os juros em um título (‘bond’).”

51 Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2011, pp. 224-234.

52 Além da impossibilidade de utilização da integração, Thomas da Rosa de Bustamante e Henrique Napoleão Alves mencionam que, em observância ao artigo 111 do CTN, (i) a interpretação da norma de isenção deve respeitar os significados mínimos do texto interpretado, mantendo-se dentro do quadro normativo por ele estabelecido; (ii) a norma individual a ser elaborada pelo intérprete deve consagrar pelo menos um dos significados literais possíveis para o enunciado normativo estabelecido pelo legislador; (iii) por consequência, não há a possibilidade de criação de uma norma individual cujo sentido esteja fora do quadro de possibilidades semânticas traçadas pelo texto interpretado (BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de; e ALVES, Henrique Napoleão. “A intepretação literal no Direito Tributário brasileiro: uma proposta de interpretação para o art. 111 do CTN”. Fundamentos do Direito Tributário. Org. de Humberto Ávila. Madri: Marcial Pons, 2012, pp. 331-363).

53 BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de; e ALVES, Henrique Napoleão. Op. cit., p. 353.

54 A respeito da importância da Lei Complementar nº 95, pede-se vênia para transcrever o seguinte excerto de voto proferido pela Ministra Cármen Lúcia na ADIn nº 4.876-DF, de 26 de março de 2014: “A Lei Complementar nº 95, que é tão pouco lida no Brasil, e que é a lei que afirma e afirmou como se devem fazer as leis, para que a gente superasse formas de elaboração legislativa que querem se fazer desentender, ao invés de se fazer entender (...). Eu faço menção a essa norma, porque essa lei complementar veio logo após a Constituição, em 93, porque tínhamos uma técnica infeliz de fazer leis no Brasil, especialmente na área da Administração Pública.” Na recente Solução de Consulta Cosit nº 181, de 25 de junho de 2014, a Administração Tributária utilizou a Lei Complementar nº 95 para afirmar que as disposições de um parágrafo devem ser analisadas em consonância com o disposto no caput, destacando, ainda, a sua importância para que os textos legais sejam redigidos com clareza, precisão e ordem lógica.

55 PICONEZ, Matheus Bertholo. “Tratamento tributário dos lucros distribuídos e o RTT e outras questões relevantes”. Controvérsias jurídico-contábeis (aproximações e distanciamentos). 4º volume. Coord. de Roberto Quiroga Mosquera e Alexsandro Broedel Lopes. São Paulo: Dialética, 2013, p. 207.

56 A atual redação do artigo 178, inciso III, da Lei nº 6.404/1976 é determinada pelo artigo 37 da Lei nº 11.941/2009.

57 Vide item 42 do CPC 13 - “Adoção Inicial da Lei nº 11.638/2007”.

58 De acordo com o artigo 182, parágrafo 4º, da Lei nº 6.404/1976, serão classificados como reservas de lucros as contas constituídas pela apropriação de lucros da companhia. Em geral, as reservas de lucro admitidas são as seguintes: reserva legal (artigo 193), reservas estatutárias (artigo 194), reservas para contingências (artigo 195), reserva de lucros para expansão ou reserva de planos para investimentos (artigo 196), reserva específica de prêmios de emissão de debêntures (artigo 19 da Lei nº 11.941/2009) e reserva especial de lucros para dividendos obrigatórios (artigo 202, parágrafo 5º).

59 Artigo 192 da Lei nº 6.404/1976. “Juntamente com as demonstrações financeiras do exercício, os órgãos da administração da companhia apresentarão à assembléia-geral ordinária, observado o disposto nos artigos 193 a 203 e no estatuto, proposta sobre a destinação a ser dada ao lucro líquido do exercício.”

Artigo 132 da Lei nº 6.404/1976. “Anualmente, nos 4 (quatro) primeiros meses seguintes ao término do exercício social, deverá haver 1 (uma) assembléia-geral para: (...)

II - deliberar sobre a destinação do lucro líquido do exercício e a distribuição de dividendos.”