Compensação Tributária: Renúncia Fiscal? Análise Crítica à Jurisprudência do STJ

Fábio Henrique Ribeiro

Advogado no Paraná.

Resumo

Neste artigo pretende-se proceder a uma análise crítica da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que atribuiu à compensação tributária a natureza de renúncia fiscal. O caminho a ser seguido será a reconstrução de suas premissas a partir do conceito de suporte fático amplo, objetivando sugerir um enfoque diferente daquele dado pela Corte Especial à regra contida no art. 170 do CTN, para possibilitar mais eficácia na proteção do direito fundamental de propriedade a casos concretos.

Palavras-chave: compensação, direito fundamental, proporcionalidade.

Abstract

In this article we intend to undertake a critical analysis of the jurisprudence of the Superior Court of Justice that awarded compensation to the nature of tax revenue foregone. The way forward will be the reconstruction of its premises from the broad concept of factual support, aiming to suggest a different approach to rule in the CTN 170 to enable greater efficiency in protecting the fundamental right to property cases.

Keywords: compensation, fundamental right, proportionality.

1. Introdução

Inicialmente, cuidaremos de perquirir a natureza do instituto da compensação, a fim de demonstrar que, não obstante a limitação à sua utilização na seara tributária, permanece incólume a sua qualidade ínsita para a liquidação do crédito, e, por conseguinte, de promover, nesse aspecto, a otimização ou estado ideal de coisas exigidos pelo princípio da propriedade privada.

Não obstante, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a excluiu do “âmbito temático” do princípio da propriedade privada. Dessa premissa, deriva o entendimento pacificado naquela Corte de que a compensação, no Direito Tributário, traduz uma renúncia fiscal, e, como tal, deve ser autorizado conforme o juízo político de conveniência e oportunidade do legislador ordinário.

A partir desse postulado, nossos Tribunais consagraram o entendimento de que, fora das hipóteses estritamente permitidas pela lei de cada ente federado, o Judiciário não pode intervir para determinar a compensação no caso concreto, sob pena de ofensa ao princípio da separação dos poderes da União.

Contudo, a consolidação desse discurso jurídico conduz a soluções inaceitáveis em situações como a exemplificada no final do item 3 do texto, tornando insuficiente uma efetiva proteção do direito fundamental da propriedade a um grande número de casos nos quais as peculiaridades do fato são decisivas para o controle da proporcionalidade do ato normativo no caso concreto, como preceitua a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

O trabalho se propõe a evidenciar que a base teórica que deu sustentação à linha argumentativa do STJ está alicerçada no conceito teórico de suporte fático restrito. A partir de então, passará a empreender uma análise crítica a essa opção teórica em vista de suas consequências práticas para a proteção do direito fundamental da propriedade, visando demonstrar as vantagens de sua substituição pelo conceito de suporte fático amplo, especialmente pela necessidade de garantir a efetivação do entendimento do Supremo Tribunal Federal de que toda ação do poder público em sede de tributação que limite a atividade privada deve passar pelo referido controle de proporcionalidade.

2. A Compensação como Instrumento Apto a fomentar o Direito de Propriedade

A compensação, consoante a doutrina assente, insere-se nas categorias gerais do Direito. É figura das mais conhecidas e estudadas secularmente no âmbito de trabalho dos civilistas.1 O Ilustre Hugo Barroso Uelze, lastreado nas clássicas lições de Washington de Barros Monteiro e Sílvio Rodrigues, lembra que o fundamento do instituto está no princípio que proíbe o enriquecimento sem causa de uma parte à custa do empobrecimento injustificado da outra.2 Por essa razão, se duas ou mais pessoas forem reciprocamente credora e devedora, as obrigações extinguem-se até onde se compensarem, independentemente da vontade dos sujeitos, conforme positivado no art. 368 de nosso Código Civil.3

No campo do Direito Tributário, está prevista como causa extintiva do crédito, no art. 156, inciso II do Código Tributário Nacional. Todavia, dispõe o art. 170 desse estatuto que a compensação será autorizada nos termos da lei ordinária. Atualmente, o encontro de contas da Fazenda Pública e do contribuinte é regulado pelo art. 74 e parágrafos da Lei nº 9.430/1996.

O indigitado dispositivo permite ao sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo administrado pela Secretaria da Receita Federal, a utilizá-lo na compensação de tributos devidos e administrados por esse órgão fazendário.

Assim, os benefícios desse mecanismo de extinção da obrigação tributária para a atividade econômica é de elevada importância. A título exemplificativo, é uníssona a opinião de economistas que o crescimento econômico sustentável depende de medidas públicas para estimular a capacidade de investimento e a produtividade, para o que a autorização da compensação tributária é de grande proveito, pois propicia à empresa manter dinheiro em caixa para a formação do seu capital de giro, evitando, por exemplo, recorrer ao sistema financeiro para “realizar a venda de sua produção”.4

Ainda quanto à utilidade do instituto, a Emenda Constitucional nº 30, de 13 de setembro de 2000, ao introduzir o parágrafo 2º no art. 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, atestou a eficiência da compensação para a satisfação do crédito declarado judicialmente, na hipótese de inadimplemento pelo Estado da parcela do precatório.

A ideia que desejamos fundar nessas primeiras linhas é a de que as limitações havidas no campo do Direito Tributário não desnaturam a qualidade da compensação, isoladamente considerada, de promover a otimização ou estado de coisas exigidos pelo princípio da propriedade privada.5

Permita-nos breve ilustração para auxiliar no esclarecimento de nosso pensamento. Figuremos que os fins a serem atingidos pelo direito fundamental da propriedade (a livre iniciativa, a proteção da posse, a repetição do indébito, a satisfação do crédito, o lucro, entre muitos outros) fossem destinos de uma viagem. O primeiro passo seria conhecer o local aonde deveríamos chegar. Num segundo momento, estudaríamos todas as vias alternativas que lhe dessem acesso, escolheríamos o caminho mais curto ou com trânsito menor, e verificaríamos se a melhor rota eventualmente não estivesse interditada.

Na hipótese da restituição do pagamento indevido, o ordenamento confere caminhos alternativos para a sua consecução. Com efeito, assim como no exemplo da viagem, num primeiro momento a compensação comparece entre os comportamentos possíveis para a satisfação do crédito, ao lado da “ação” judicial de reparação de danos. Apenas no segundo momento ocorrerá a análise sobre a existência de eventual impedimento legal para que o credor possa escolher essa modalidade para a extinção de sua dívida.

Desse modo, a compensação, malgrado a vedação ou condicionamento pela lei em algumas situações, mantém incólume a sua natureza, servindo de instrumento com aptidão para fomentar o direito de propriedade,6 como descrito pela teoria geral do Direito e positivado no art. 368 do Código Civil.

Noutros termos, a compensação, isoladamente considerada, integra o “âmbito temático” 7 do direito de propriedade, conforme será oportunamente aduzido no item 5 deste trabalho.

Na sequência, passaremos à análise da jurisprudência do STJ, cujas premissas excluem a compensação tributária do referido “âmbito temático”, e a apontar as consequências negativas desse posicionamento.

3. A Compensação Tributária como Renúncia Fiscal segundo a Jurisprudência do STJ. Consequência da Exclusão da Compensação do “Âmbito Temático” do Princípio da Propriedade

Em torno do art. 146, inciso III, da CR e do art. 170 do CTN, surgiu forte debate sobre a fonte normativa do direito à compensação no sistema tributário. Prevaleceu na jurisprudência e na doutrina o entendimento de que é necessária lei que autorize o encontro de contas na ordem tributária.8

Exemplo de restrição ao exercício da compensação se deu através da Lei nº 9.032, de 28 de abril de 1995, e da Lei nº 9.129, de 20 de novembro de 1995, as quais modificaram o parágrafo 3º da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, estabelecendo, respectivamente, que o encontro de contas deveria respeitar o limite de 25% e de 30% do valor das contribuições devidas pelo contribuinte em cada competência.

A questão foi muito discutida no Judiciário.9 A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, através do Recurso Especial nº 796.064/RJ, julgado em 22 de outubro de 2008, pacificou a posição de que as Leis nos 9.032/1995 e 9.129/1995 são de observância obrigatória, enquanto não declarada a sua inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle difuso ou concentrado.10

Importa-nos, para os lindes deste ensaio, concentrar nossa atenção na estratégia argumentativa utilizada pelo Superior Tribunal de Justiça para fundamentar a decisão, identificar os pressupostos teóricos a ela subjacentes, e perquirir sobre a sua eficiência para a solução de todos os casos apresentados, especialmente aqueles que exigem a análise da peculiaridade das circunstâncias para o efetivo controle de constitucionalidade da norma.11

Da análise do voto prolatado pelo Ilustre Ministro Luiz Fux, acolhido por unanimidade pelo Colegiado,12 destacam-se quatro premissas importantes para esclarecer as razões que motivaram o acórdão do E. Tribunal:

1ª) a compensação no Direito Tributário é proibida sem lei que a autorize expressamente, por força do princípio da indisponibilidade do interesse público;

2ª) condicionada à discricionariedade do Tesouro Público;

3ª) possui a natureza de renúncia fiscal, permitida a cada ente federado nos termos do art. 170 do Código Tributário Nacional;

4ª) é faculdade do contribuinte se submeter às regras impostas pelo legislador ordinário para a compensação, ou, então, optar pela restituição do indébito pela via do precatório.

Por conseguinte, segundo a exegese realizada pelo STJ, a compensação tributária se traduz num favor fiscal ao contribuinte,13 e como tal deve ser autorizado conforme o juízo político de conveniência e oportunidade do legislador ordinário. A partir desse postulado, nossos Tribunais consagraram o entendimento de que, fora das hipóteses estritamente permitidas pela lei de cada ente federado, o Judiciário não pode intervir para determinar a compensação no caso concreto, porque se o fizesse ofenderia o princípio da separação dos poderes inserto no art. 2º da Constituição.

Ademais, o STJ averba que o disposto no art. 170 do CTN apenas legitima o ente federado a autorizar a compensação, vale dizer, o Código Tributário vincularia norma regulamentadora, em caráter geral, da outorga da renúncia fiscal pelo legislador ordinário. Por conseguinte, deflui desse argumento que a compensação em matéria tributária está fora do âmbito de proteção do direito de propriedade do contribuinte.

Tanto é assim que, se o Tribunal não tivesse excluído a compensação desse âmbito de proteção, forçosamente deveria reconhecer que o art. 170 do CTN operou, em verdade, uma restrição ao direito da propriedade. Nessa hipótese, a regra do Código seria o produto do sopesamento feito pelo legislador das normas conflitantes, com a prevalência do princípio da indisponibilidade do interesse público.

Ainda que não alterado o resultado do julgamento (a regra do art. 170 é constitucional), o fundamento que admitisse a restrição do exercício da compensação em favor do interesse público da arrecadação é diferente do argumento que, ao revés, vê na compensação uma renúncia fiscal em favor do contribuinte.14

Assim, chegamos a um ponto determinante para a continuidade dos demais itens deste trabalho: ainda que não assumido explicitamente, a decisão do STJ partiu do pressuposto da exclusão da compensação tributária do “âmbito temático” do direito de propriedade do contribuinte.

De conseguinte, os juízes de primeiro grau de jurisdição, os Tribunais de Justiça dos Estados e os Tribunais Regionais Federais passaram a resolver todos os conflitos envolvendo o tema compensação tributária, tomando o acórdão da Primeira Seção do STJ como a única solução nessa matéria, sem maiores ônus argumentativos.

Todavia, a consolidação desse discurso jurídico leva a soluções inaceitáveis em determinadas situações. Para facilitar a exposição, utilizaremos de uma hipótese perfeitamente possível na prática:15 determinada indústria possuía vultoso crédito em face da Fazenda Pública Federal, originado de pagamentos indevidos a títulos de contribuições a autônomos, diretores e administradores, reconhecidos por decisão judicial transitada em julgado. Contudo, enfrentando grave crise financeira, em dois anos a empresa viu os resultados de sua atividade reduzirem substancialmente, somando-se a isso um débito tributário acumulado, o qual poderia ser quitado se lhe fosse permitida a compensação com os aludidos créditos reconhecidos judicialmente. Ao revés, por força do então parágrafo 3º da Lei nº 8.212/1991, e da posição do Superior Tribunal de Justiça, teve seu pleito indeferido pelo Fisco.

Com efeito, sobrou àquela empresa apenas a morosa via dos precatórios. Em contrapartida a Fazenda Pública aforou a execução fiscal dos débitos inadimplidos, levando grande parte do ativo imobilizado daquela pessoa jurídica à alienação judicial. Resultado: a empresa foi à bancarrota, mesmo possuindo créditos com o Fisco, cuja compensação, se lhe fosse permitida, propiciaria as condições que precisava para a continuidade da atividade social.

Se aplicados a esse caso hipotético os pressupostos teóricos firmados pela Primeira Seção do STJ acima analisados, a sentença seria apenas uma: a compensação não é direito subjetivo da empresa, porque esse instrumento de extinção da obrigação tributária é uma renúncia fiscal, e, como tal, está condicionado à discricionariedade do legislador ordinário, consoante declarado pelo art. 170 do CTN. Desse modo, fica vedado ao Judiciário invadir a esfera de competência do Legislativo, sob pena de ofensa ao princípio da separação e harmonia entre os poderes da União (art. 2º da CR).

No entanto, a nosso ver, o emprego iterativo desse posicionamento pelos Tribunais ordinários em todas as situações16 torna insuficiente uma efetiva proteção do direito fundamental de propriedade a um grande número de casos nos quais as peculiaridades do fato são decisivas para o controle da constitucionalidade do ato do poder público, à luz do postulado normativo da proporcionalidade.17

Por outro lado, causa um déficit na fundamentação dos julgados, pois são tidas como irrelevantes na motivação das decisões inúmeros conflitos entre a regra e o núcleo essencial dos princípios de direitos fundamentais enfocados pelo contribuinte, levando em conta as circunstâncias especiais do caso.

Assim, no item 5 buscaremos demonstrar que a base teórica que deu sustentação à linha argumentativa do E. STJ está alicerçada no conceito de suporte fático restrito. Em seguida, empreenderemos uma análise crítica a essa opção teórica em face de suas consequências práticas, visando apresentar as vantagens de sua substituição pelo conceito de suporte fático amplo, especialmente pela necessidade de garantir a efetividade do entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal de que toda ação do poder público em sede de tributação que limite a atividade privada deve passar pelo controle de proporcionalidade.18

4. Ponto de Partida: a Transparência das Decisões na Análise dos Direitos Fundamentais

Antes, porém, parece-nos indispensável esclarecer as concepções ideológicas de que partimos, para auxiliar na compreensão do motivo de assumirmos o pressuposto teórico defendido no tópico seguinte.

Lembra o professor Marco Aurélio Greco que é altamente produtiva ao discurso jurídico a explicitação da postura ideológica assumida pelo emitente, pois a partir dessa premissa se conhecerá abertamente a base do seu discurso e a razão de suas conclusões.19

Podemos dizer que o ponto primordial de nossa exposição reside no ensinamento do mestre Miguel Reale de que o Direito é feito para o homem, e não o homem para o Direito. Marco Aurélio Greco escreve que a temática do Direito atual é a pluralidade de interesses, os seus conflitos, e a necessidade de compatibilizá-los na medida do possível, onde assume papel de suma importância o enfoque da norma jurídica “construída” no caso concreto.20

É marcante nessa realidade o debate em torno de princípios fundamentais. A solução de conflitos dessa natureza, sublinha Daniel Sarmento, “terá de ser casuística, pois estará condicionada pelo modo com que se apresentarem os interesses e disputa, e pela alternativas pragmáticas viáveis para o equacionamento do problema”.21

Com efeito, tanto mais democrática e racional será a decisão, quanto forem apreciados explicitamente pelo Judiciário as questões e enfoques trazidos ao debate pelas partes.

Pensamos que é consentâneo com o princípio democrático que o julgador desça até os argumentos esposados pelo jurisdicionado, tomando-os por relevantes no processo decisório. No campo da proteção dos direitos fundamentais, o suporte fático amplo (a ser abordado no próximo tópico) é um pressuposto teórico com aptidão de maximizar esse diálogo, na medida em que afasta a exclusão, de antemão (por justificativas não raras vezes intuitivas), de inúmeras situações, bens ou condutas que poderiam, em verdade, ser alocadas no âmbito de proteção desses princípios.

Com efeito, a nossa preferência por esse pressuposto e os conceitos a ele circundantes, justifica-se por criarem condições mais favoráveis a um efetivo diálogo intersubjetivo entre contribuinte, juiz e Fazenda, e exigirem ônus argumentativos explícitos em face de “qualquer atividade que implique restrição a um direito fundamental ou para qualquer omissão que implique uma não realização de um desses direitos.”22

5. Reconstruindo o Pressuposto Teórico Subjacente nas Decisões do Superior Tribunal de Justiça, para buscar Maior Eficácia na Proteção ao Direito Fundamental de Propriedade em Casos Concretos

A) A efetividade dos princípios

Não há espaço neste breve ensaio para examinar as doutrinas que versam sobre a natureza do direito de propriedade expresso no texto constitucional. Impende sublinhar que é uníssono na doutrina e na jurisprudência que, em relação a sua estrutura, trata-se de princípio, e, quanto ao seu conteúdo ético, qualifica-se como norma de direito fundamental.23

É ponto importante neste trabalho apresentar a definição de princípio corrente na dogmática. Virgílio Afonso da Silva ensina que o traço distintivo entre regra e princípio está na estrutura dos direitos que essas categorias normativas garantem. “No caso das regras, garantem-se direitos (ou se impõem deveres) definitivos, ao passo que no caso dos princípios são garantidos direitos (ou são impostos deveres) prima facie.24

Ainda, segundo a teoria construída por Robert Alexy, princípios são normas que exigem que algo seja realizado na maior medida possível diante das possibilidades fáticas e jurídicas presentes no momento da decisão.25

O notável Humberto Ávila, por sua vez, indica as seguintes notas dos princípios: (a) estabelecem o dever de adoção de comportamentos necessários à promoção de um estado ideal de coisas; (b) o aplicador dessa espécie normativa procederá a uma avaliação de correlação entre os efeitos desses comportamentos e a realização do estado de coisas exigido; e (c) a aplicação de um princípio necessita da complementação de outras razões a serem avaliadas pelo intérprete para a solução adequada no caso concreto.26

Por conseguinte, para a maior efetividade possível dos fins estabelecidos por direitos fundamentais - dentre os quais está o princípio da propriedade privada27 - é preciso reconhecer a essas normas um suporte fático o mais amplo, “o que significa dizer que qualquer ação, fato, estado ou posição jurídica que, isoladamente considerados, possam ser subsumidos ao ‘ambito temático’ de um direito fundamental devem ser considerados como por ele prima facie protegidos”.28

B) Suporte fático e âmbito de proteção dos direitos fundamentais

O conceito de suporte fático aplicado aos direitos fundamentais ainda é pouco pesquisado na doutrina nacional. Em síntese, trata-se de uma figura lógica normativa,29 com a descrição de um evento ou posição jurídica no seu antecedente, que, concretizado no plano das realidades materiais, irrompe os efeitos jurídicos previstos no consequente (a proteção ao direito fundamental violado). No campo do Direito Penal corresponde ao tipo, assim como no Direito Tributário ao conceito de hipótese de incidência.

De plano, percebe-se que o direito fundamental protege algo contra intervenções indevidas. Esse algo está contido no âmbito de proteção dessa norma. Se ele for atingido por qualquer ato do poder público, a consequência será, de duas, uma: (a) o reconhecimento da inconstitucionalidade da restrição, ou (b) a legitimidade da limitação, justificada por outra norma constitucional que mereceu prevalecer diante das possibilidades fáticas e jurídicas existentes.30

A questão está em saber definir quais atos, comportamentos, fatos, ou posições jurídicas estão contidos no âmbito de proteção da norma que garante o direito fundamental. 31

O tema diz respeito à amplitude do suporte fático dos direitos fundamentais. Como se perceberá, a opção do julgador pelo conceito de suporte fático amplo ou pelo conceito de suporte fático restrito terá efeitos práticos relevantes para o controle de constitucionalidade dos atos do legislativo no momento da aplicação do Direito, especialmente sobre a forma da argumentação jurídica da decisão.

C) O suporte fático restrito subjacente na decisão do STJ

A escolha de um suporte fático restrito para as normas de direito fundamental implica a exclusão, a priori, de algumas ações, estados ou posições jurídicas do seu âmbito de proteção.

Assim, por meio desse pressuposto teórico, apesar da aptidão da compensação, isoladamente considerada, de promover um dos fins do princípio da propriedade (a satisfação do crédito), ela foi considerada pela Primeira Seção do STJ fora do seu campo de proteção, em matéria tributária.

Em todas as formas de argumentação que pressuponham um suporte fático restrito não há que se falar em limitação ao direito fundamental, pelo simples motivo de que aquilo que não está protegido por uma norma não pode ser ofendido com base nela. Como se percebe, eliminando-se a possibilidade do conflito normativo, também não haverá espaço para se falar em ponderação de bens no momento concreto da aplicação do Direito.32

Constata-se, pois, que o suporte fático restrito está na base do acórdão prolatado pela Primeira Seção do STJ no REsp nº 796.064/RJ. Consoante a exegese da Corte Especial, em decorrência do princípio da indisponibilidade do interesse público, a compensação, na seara tributária, traduz-se numa renúncia fiscal. Como tal, somente pode ser autorizada por lei, conforme o juízo político de conveniência e oportunidade do legislador ordinário (cf. item 3 acima).

Admitindo tratar-se de um benefício fiscal outorgado ao contribuinte conforme as conveniências e oportunidades do “Tesouro Público” - assim como ocorre com o parcelamento ou a isenção - o Tribunal afastou o argumento de que o art. 170 do CTN opera uma restrição ao direito a compensação.

Ao contrário do que pode aparentar à primeira vista, a decisão em comento não enunciou a validade do art. 170 do CTN à luz de um sopesamento entre princípios. Se esse fosse o discurso tomado pela decisão, pressuporia a compensação protegida pelo direito de propriedade, o qual, desse modo, sofreria uma restrição constitucionalmente fundamentada pela prevalência da indisponibilidade do interesse público.33

Outra evidência de que o acórdão da Primeira Seção do STJ foi alicerçado no suporte fático restrito reside na afirmação de que a compensação é uma opção concedida ao contribuinte, ao qual sempre estará garantida a via do precatório para exercer o seu direito de restituição do indébito.

Essa estratégia argumentativa foi desenvolvida por Friedrich Müller na tentativa de fornecer critérios para a definição de um suporte fático restrito aos direitos fundamentais. Na delimitação de seu conteúdo, o autor recorre ao conceito de especificidade, vale dizer, toda ação que não seja indispensável ao exercício do direito fundamental, e por isso possa ser substituída por outra, não está protegida pelo âmbito dessa norma,34 exatamente como exposto na decisão da Primeira Seção do STJ.

A decorrência imediata de um suporte fático restrito na base da decisão do STJ foi, como se viu, permitir a exclusão, a priori, da compensação da área de incidência do princípio da propriedade. Bastou, para isso, a invocação do princípio da indisponibilidade do interesse público.

Como já referido, a partir desse entendimento houve a padronização das decisões do Judiciário no mesmo sentido, tomando o acórdão da Primeira Seção do STJ como razão para a solução de todos os casos, sem maiores ônus argumentativos.

Esse pensamento, todavia, conduz a situações inaceitáveis. Casos como a hipótese descrita no item 3 supra restariam sem um exame adequado pelo Judiciário. Portanto, é preciso assumir outro pressuposto teórico capaz de garantir, em todas as situações, a inclusão da compensação na temática do direito de propriedade, favorecendo o maior grau possível de proteção a essa norma fundamental na seara tributária, como orienta a jurisprudência do STF.

D) Suporte fático amplo. Caminho alternativo para a compatibilização da validade do art. 170 do CTN e a necessidade da proteção da propriedade no caso concreto

O Supremo Tribunal Federal desenvolveu jurisprudência no sentido de que o princípio do art. 150, IV, da Constituição significa a vedação de “qualquer pretensão governamental[35] que possa conduzir, no campo da fiscalidade, à injusta apropriação estatal, no todo ou em parte, do patrimônio ou dos rendimentos dos contribuintes”.36

Por outro lado, na ADI nº 2.551-1, de relatoria do Ministro Celso de Mello, o Supremo enunciou que o postulado da proporcionalidade traduz limitação material à ação normativa do Poder Público na seara tributária, cujo instrumento constitucional deve necessariamente, em todas as situações, ser aplicado para o controle de eventuais excessos que possam comprometer o exercício da atividade profissional lícita.37

Portanto, na esteira da jurisprudência do STF, o exame do excesso das ações tributárias na vida da empresa38 depende da verificação do conjunto de circunstâncias concretas que possam revelar o efetivo cerceamento da atividade econômica, como averbado pelo Ministro Joaquim Barbosa no voto prolatado no RE nº 448.432.39

Como exposto no item anterior, o modelo do suporte fático restrito não se conforma com a jurisprudência da Suprema Corte, pois permitiu que a compensação fosse excluída do âmbito de proteção da propriedade privada, de maneira que a restrição do art. 170 do CTN não estaria sujeita ao teste da proporcionalidade.

Diversamente, o conceito de suporte fático amplo tem a virtude de garantir a maior eficácia possível ao estado de coisas vinculado por normas de direito fundamental,40 pois inclui no seu âmbito de proteção “toda ação, estado ou posição jurídica que tenha alguma característica que, isoladamente considerada, faça parte do ‘âmbito temático’ de um determinado direito fundamental (...) independentemente da consideração de outras variáveis”.41

Por esse modelo, a compensação tributária (haja vista a sua aptidão para fomentar o direito de propriedade) deve ser incluída, ainda que prima facie, no âmbito de proteção da norma fundamental.

Isso não significa admitir um direito absoluto à compensação. Uma das características do suporte fático amplo é a distinção entre aquilo que é protegido prima facie e aquilo que é protegido definitivamente. Conforme leciona o professor Virgílio: “condutas ou situações abarcadas pelo âmbito de proteção de um direito fundamental ainda dependerão eventualmente de um sopesamento em situações concretas antes de se decidir pela sua proteção definitiva, ou não”.

Como se pode perceber, o modo da argumentação jurídica muda por completo quando se parte do paradigma do suporte fático amplo.42 A sua definição aberta enseja que: (i) toda intervenção estatal; (ii) a qualquer conduta ou situação que tenha pertinência temática com o estado ideal de coisas de um direito fundamental; (iii) seja considerada uma restrição; e (iv) por conseguinte, impõe ao aplicador do Direito condicioná-la ao teste da proporcionalidade, conforme preceitua a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Se aplicado o suporte fático amplo no acórdão da Primeira Seção do STJ, a consequência seria a inclusão da compensação no âmbito de proteção da propriedade privada. Dessa forma, estabeleceria um conflito entre o substrato da regra do art. 170 do CTN (princípio da indisponibilidade do interesse público43) e a norma de direito fundamental também em jogo, cuja solução exigiria o sopesamento dos vetores.44 Nessa hipótese, a validade da regra do art. 170 do CTN seria fundamentada numa restrição constitucionalmente legítima ao direito de compensar, pela prevalência do princípio da indisponibilidade do interesse público.

Ressalta-se que esse modelo não implicou, necessariamente, a alteração do resultado da decisão da Primeira Seção do STJ (validade do art. 170 do CTN). Todavia, houve profunda modificação nas premissas de sua fundamentação: a norma do Código, antes considerada legitimadora de renúncia fiscal por conveniência e oportunidade do legislador ordinário, após a reconstrução do problema a partir do conceito de suporte amplo, tornou-se uma restrição ao direito de propriedade, justificada constitucionalmente pelo princípio da indisponibilidade do interesse público.

Considerando o caráter restritivo do art. 170 do CTN à propriedade privada, o modo de sua aplicação passa, necessariamente, pelo controle do postulado da proporcionalidade.

Passemos, agora, a empregar o suporte fático amplo no caso hipotético enunciado na parte final do item 3, para evidenciar a sua eficácia para a proteção da atividade econômica do contribuinte.

A aplicação do suporte fático restrito, conforme adotado pela Primeira Seção do STJ, conduziria à sentença de improcedência do pedido da empresa, sob o argumento de que a compensação é uma renúncia fiscal, e, como tal, estaria condicionada à discricionariedade do legislador ordinário, consoante declarado no art. 170 do CTN.

O suporte fático amplo inclui a compensação no âmbito de proteção do princípio da propriedade privada. De conseguinte, o art. 170, ao invés de legitimar ao ente federado uma renúncia fiscal, em verdade causa restrição ao direito subjetivo de compensar, ainda que considerado constitucional no plano abstrato das normas.

O exemplo formulado indica que a empresa possui crédito com a União, que decorrente de contribuições indevidamente pagas, conforme reconhecido por decisão transitada em julgado. O montante do credito é suficiente para compensar a totalidade dos débitos objeto das execuções fiscais. As peculiaridades do caso indicam que o encontro de contas é indispensável, sob pena do comprometimento da atividade econômica pela desapropriação judicial do ativo imobilizado.

Assim, constatada a restrição ao direito fundamental da propriedade, o julgador deve proceder ao teste da proporcionalidade, nos seus três aspectos: (a) adequação, (b) necessidade, e (c) proporcionalidade em sentido estrito.

Quanto à adequação, a restrição à compensação promove os fins constitucionalmente perseguidos pelo art. 170 do CTN - indisponibilidade do interesse público e controle sobre o equilíbrio orçamentário. Em relação ao requisito da necessidade, dificilmente se poderia pensar numa medida com a mesma eficácia para promover os fins visados pelos diplomas legislativos, e, ao mesmo tempo, com menor intensidade sobre o direito de propriedade.

Por fim, o exame da proporcionalidade em sentido estrito. Essa última etapa consiste num sopesamento pelo julgador entre os direitos e interesses envolvidos, com a finalidade de evitar que uma medida, apesar de adequada e necessária, possa restringir o direito fundamental “além daquilo que a realização do objetivo perseguido seja capaz de justificar”.45

Surge ao julgador a seguinte situação: se mantiver a restrição prevista pelas Leis nos 9.032/1995 e 9.129/1995, o efeito será a paralisação da empresa. Se, ao contrário, determinar a compensação integral dos créditos do contribuinte em face da União, preservará a continuidade da atividade social.

Nesse ponto, a jurisprudência do STF fornece as diretivas para a solução do caso analisado.46 Do estudo das decisões da Suprema Corte, importa ressaltar o reconhecimento de que nenhuma medida estatal pode: (a) proibir o exercício de um direito fundamental, inviabilizando-o substancialmente, independentemente do motivo dessa medida; e (b) restringir em excesso o livre exercício da atividade econômica - a qual pressupõe a propriedade privada -, ainda que a medida não inviabilize por completo a atividade empresarial.47

Assim, fundada nessa orientação jurisprudencial, seria legítima a sentença que permitisse a compensação integral dos créditos, sob o fundamento de que a aplicação da regra do art. 170 do CTN e as limitações das Leis nos 9.032/1995 e 9.129/1995 implicariam a eliminação do exercício da atividade econômica do contribuinte.

Portanto, a adoção de um suporte fático amplo no tema da compensação tributária tem a grande vantagem de abrir espaço para a proteção do direito fundamental de propriedade a um grande número de casos nos quais as circunstâncias concretas são decisivas para o controle da proporcionalidade na aplicação da regra do art. 170 do CTN, criando meio para garantir a efetivação da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre a limitação da atividade tributária, além de exigir do órgão julgador ônus argumentativo explícito em favor da segurança e da transparência no discurso jurídico.

6. Conclusões

O Superior Tribunal de Justiça, como se depreende do acórdão prolatado pela Primeira Seção no REsp nº 796.064/RJ, firmou a posição de que a compensação tributária se traduz numa renúncia fiscal, e, como tal, deve ser autorizada conforme o juízo político de conveniência e oportunidade do legislador ordinário.

Desse modo, o Tribunal afastou o argumento de que o art. 170 do CTN opera uma restrição do direito de compensação.

Como se denota da análise do voto condutor do acórdão, está alicerçado no conceito de suporte fático restrito para os direitos fundamentais. A decorrência dessa opção teórica foi permitir a exclusão, a priori, da compensação do âmbito de proteção do princípio da propriedade privada.

Todavia, essa exegese é insuficiente para uma efetiva proteção ao direito fundamental de propriedade a um grande número de casos nos quais as peculiaridades do fato são decisivas para o controle da proporcionalidade da ação fiscal do Estado.

Diversamente, o conceito de suporte fático amplo impõe a inclusão da compensação, ainda que prima facie, no campo de incidência do direito de propriedade.

Foi demonstrado que a adoção do suporte fático amplo no tema da compensação tributária não implica, necessariamente, alteração do resultado da decisão da Primeira Seção do STJ (validade do art. 170 do CTN). Todavia, modifica profundamente as premissas do discurso: a norma do Código, inicialmente considerada legitimadora de renúncia fiscal por conveniência e oportunidade do legislador ordinário, torna-se restrição ao direito de propriedade, justificada constitucionalmente pelo princípio da indisponibilidade do interesse público.

Como restrição ao direito de propriedade, a aplicação do art. 170 do CTN deve, necessariamente, passar pelo teste da proporcionalidade, em consonância com a jurisprudência do STF.

A adoção de um suporte fático amplo pelos juízes e Tribunais Ordinários no tema da compensação tributária teria a grande vantagem de abrir espaço ao controle da proporcionalidade na aplicação do art. 170 do CTN a casos especiais, criando meio para garantir a efetivação da jurisprudência do STF sobre os limites da atividade tributária, além de exigir do órgão julgador ônus argumentativo explícito em favor da segurança e da transparência no discurso jurídico.

1 CARRAZZA, Roque Antonio. In: ALVIM, Teresa Arruda; MARINS, James; e ALVIM, Eduardo Arruda (coords.). Repertório de jurisprudência e doutrina sobre processo tributário. 1ª ed. São Paulo: RT, 1994, pp. 209-210.

2 UELZE, Hugo Barroso. “Compensação tributária. Uma proposta de conceituação à luz das categorias gerais de Direito e do Novo Código Civil”. Revista tributária e de finanças públicas nº 57. São Paulo: RT, julho/agosto de 2004, pp. 147-179.

3 A afirmação é referida à compensação legal, conforme DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro V. 2. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

4 NETTO, Antônio Delfim. “Atenção ao investimento”. Carta Capital nº 699. Ano XVII. São Paulo, 30 de maio de 2012, p. 31.

5 O conceito de princípio e sua relação com o direito da propriedade será abordado no item 5 infra.

6 Isoladamente considerada.

7 SILVA. Virgílio Afonso. Direitos fundamentais - Conteúdo essencial, restrições e eficácia. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 73.

8 Paulo de Barros Carvalho ensina que o fundamento da necessidade de lei autorizativa decorre do princípio da indisponibilidade do interesse público (CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário - Fundamentos jurídicos da incidência. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 267). Em sentido diverso, Hugo de Brito Machado defende que o direito à compensação tributária possui fundamento diretamente nos princípios constitucionais da propriedade e da igualdade (MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional. Vol. III. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, pp. 450-452). Alexandre Tavares Macedo invoca, ainda, o postulado da máxima efetividade dos direitos fundamentais para sustentar que a Constituição é a fonte direta do direito de compensar (TAVARES, Alexandre Macedo. Compensação do indébito tributário. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 851).

9 O tema chegou ao STF. Todavia, a Suprema Corte averbou que “as questões relativas à compensação tributária não transbordam os limites do âmbito infraconstitucional, sendo que eventual incompatibilidade com a Constituição Federal, caso ocorresse, dar-se-ia de forma meramente reflexa ou indireta”, deixando ao STJ o enfrentamento do debate (Supremo Tribunal Federal, Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 637.541/SP, Matéria Tributária, Rel. Min. Dias Toffoli, Brasília/DF, j. em 7.2.2012).

10 Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 796.064/RJ, Matéria Tributária, Rel. Min. Luiz Fux, Brasília/DF, j. em 22.10.2008.

11 Nos quais se exige a ponderação das circunstâncias concretas para aferir a proporcionalidade da restrição a direitos fundamentais, cujo controle se impõe ao julgador, conforme assentado em diversos arestos do Supremo Tribunal Federal, a exemplo do RE nº 448.432 AgR/CE, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe de 27.5.2010.

12 Ausentes os Senhores Ministros Francisco Falcão e Denise Arruda.

13 Efeito da renúncia fiscal.

14 Incompatível com a ideia de restrição a direito.

15 A hipótese descrita foi colhida de uma situação concreta, a cujos dados não tivemos acesso.

16 Na maioria das vezes justificado simplesmente pelo argumento de autoridade dos precedentes da Corte Superior.

17 Usamos o termo “postulado”, colhido das lições do professor Humberto Ávila, mas sem o compromisso de um estudo mais detido sobre a divergência doutrinária acerca do conceito da proporcionalidade (princípio, regra ou postulado normativo aplicativo). O objetivo, para este trabalho, é traduzir a ideia de que a sua aplicação pelo julgador é obrigatória.

18 Supremo Tribunal Federal, Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.551-1/MG, Matéria Tributária, Rel. Min. Celso de Mello, Brasília/DF, j. em 2.4.2003.

19 Temos essa frase de memória lida de um artigo escrito pelo mestre, mas, infelizmente, não conseguimos encontrar a sua fonte.

20 GRECO, Marco Aurélio. Planejamento tributário. São Paulo: Dialética, 2008, p. 33.

21 TORRES, Ricardo Lobo. Teoria dos direitos fundamentais. 2ª ed. São Paulo: Renovar, 2009, p. 56.

22 SILVA, Virgílio Afonso. Ob. cit., p. 38. Nesse mesmo trecho, o notável mestre diz que esse ganho em transparência na análise dos direitos fundamentais é, segundo a tese que aqui se defende, exigência de uma constituição de um Estado Democrático de Direito.

23 Sobre a natureza de direito fundamental, vide TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário. V. III, 3ª ed. São Paulo: Renovar, 2005, p. 157; quanto à estrutura de norma principiológia, MACHADO, Hugo de Brito. Direitos fundamentais do contribuinte e a efetividade da jurisdição. 1ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 134.

24 SILVA, Virgílio Afonso. Ob. cit., p. 45.

25 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. de Virgílio Afonso da Silva. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 90.

26 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, passim.

27 Adotamos, para os fins desse trabalho, o conceito de propriedade privada no sentido de proteção ao exercício da empresa. Hugo de Brito Machado vincula o princípio da propriedade ao da livre iniciativa (Direitos fundamentais do contribuinte e a efetividade da jurisdição. Ob. cit., p. 134). Por sua vez, Eros Grau doutrina que “a moderna legislação econômica considera a disciplina da propriedade como elemento que se insere no processo produtivo”, vale dizer, na aplicação dos bens de produção postos em regime de empresa (Ordem econômica na Constituição de 1988. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 42).

28 SILVA, Virgílio Afonso. Ob. cit., p. 40.

29 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 310.

30 Não é nosso objetivo descrever as várias hipóteses em que poderia ocorrer essa restrição. Citemos, por corresponder ao problema tratado neste trabalho, que a regra contida no art. 170 do CTN pode restringir o direito fundamental de propriedade (se considerarmos incluída a compensação no âmbito de proteção desse princípio). Mas essa intervenção do legislador complementar não significa a automática inconstitucionalidade do ato do poder público. Ela dependerá da análise, no caso concreto, do exame da proporcionalidade para aferir a adequação, a necessidade, e o equilíbrio da limitação sobre o direito fundamental.

31 SILVA, Virgílio Afonso. Ob. cit., p. 72.

32 A principal tarefa das teses que se baseiam num suporte fático restrito é justificar o que se inclui e o que não deve ser incluído no âmbito de proteção dos direitos fundamentais. A maior dificuldade é a apresentação de critérios na definição desse suporte, em geral baseado pura e simplesmente numa intuição, conforme aduz o professor Virgílio (SILVA, Virgílio Afonso. Ob. cit., p. 97).

33 Cf. subitem “C” deste texto.

34 Apud SILVA, Virgílio Afonso. Ob. cit., p. 88.

35 Heleno Taveira Tôrres ensina que não só a instituição do tributo pode configurar o efeito confiscatório, mas a própria técnica de tributação, a exemplo de restrições para devoluções de créditos ao desamparo da legalidade, das exigências excessivas de garantias formais para autorizar o exercício de direitos (TÔRRES, Heleno Taveira. Direito Constitucional Tributário e segurança jurídica. 1ª ed. São Paulo: RT, 2011, p. 667).

36 Supremo Tribunal Federal, Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.075, Matéria Tributária, Rel. Min. Celso Mello, Brasília/DF, j. em 17.6.1998, DJ de 24.11.2006.

37 Supremo Tribunal Federal, Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.551-1/MG, Matéria Tributária, Rel. Min. Celso de Mello, Brasília/DF, j. em 2.4.2003.

38 Aferida conforme os critérios fornecidos pelo postulado da proporcionalidade.

39 Supremo Tribunal Federal, RE nº 448.432/CE, Matéria Tributária, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Brasília/DF, j. em 20.4.2010.

40 ÁVILA, Humberto. Ob. cit., passim.

41 SILVA, Virgílio Afonso. Ob. cit., p. 109.

42 SILVA, Virgilio Afonso. Ob. cit., p. 111.

43 Cf. entendimento do Tribunal.

44 A regra do art. 170 é o produto do sopesamento realizado pelo legislador.

45 SILVA, Virgílio Afonso. Ob. cit., p. 175.

46 Sobre as diretrizes para a análise e a aplicação dos princípios ao caso concreto, vide ÁVILA, Humberto, Teoria dos princípios. São Paulo: Malheiros, 2010, pp. 91 a 96.

47 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 341.