A Importância do “Propósito Negocial” no Planejamento Tributário: Análise à Luz dos Recentes Julgamentos do Carf sobre Amortização Fiscal de Ágio

Pedro Augusto do Amaral Abujamra Asseis

Advogado em São Paulo.

Resumo

O presente artigo se propõe a examinar, com base na metodologia do “normative systems”, o recente posicionamento da jurisprudência administrativa a respeito da necessidade ou não da presença de “propósito negocial” em estruturas que envolvam amortização fiscal de ágio. Como será visto, esse critério, além de não se revelar instrumento eficaz para determinação das circunstâncias sob as quais uma estrutura pode ser considerada válida, muitas vezes nem chega a ser discutido no caso concreto, em detrimento de outros requisitos. Especificamente nos casos em que se discute a validade da amortização fiscal de ágio, o presente artigo demonstrará que pode haver outros critérios tão ou mais eficientes para a análise da validade da estrutura.

Palavras-chave: “propósito negocial”, ágio, “normative systems”, planejamento tributário.

Abstract

This article proposes to examine, based on the “normative systems” methodology, the current guidelines of administrative case law regarding the possible requirement of the presence of “business purpose” in structures involving tax amortization of goodwill. As it will be seen, this criterion, besides not proving itself to be an effective tool for determining the circumstances under which a structure may be considered valid, in many cases is not even discussed, to the detriment of other criteria. Specifically for the cases in which the validity of the tax amortization of goodwill is discussed, the present article will demonstrate that there may be other criteria as or more efficient to analyze the validity of the structure.

Keywords: “business purpose”, goodwill, “normative systems”, tax planning.

1. Introdução

Ao longo dos últimos anos, tem-se visto com relativa frequência na doutrina jurídica textos versando sobre a necessidade do chamado “propósito negocial” como fundamento de validade para estruturas que resultam em economia fiscal aos contribuintes, tornando-se esse critério, atualmente, um dos principais norteadores e referência quando da análise sobre a legitimidade de estruturas de planejamento tributário.

Referido conceito, originado a partir de uma construção jurisprudencial norte-americana1-2, é costumeiramente definido como a necessidade da presença de algum objetivo, propósito ou utilidade, de natureza material ou mercantil e não exclusivamente tributária, que leve o contribuinte a optar por organizar seus negócios de uma determinada forma (que resulte em menor carga fiscal) em detrimento de outra (mais onerosa).

A introdução e difusão dessa doutrina no Brasil teve grande contribuição de Hermes Marcelo Huck3, João Dácio Rolim4 e, especialmente, de Marco Aurélio Greco, segundo o qual “é preciso existir em caráter exclusivo ou predominante um motivo extratributário”5. A esses autores sucederam diversos outros reafirmando a validade da teoria do “propósito negocial”, especialmente quando alguns casos passaram a ser decididos pelo antigo Conselho de Contribuintes (atual Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - Carf) com base nessa técnica6.

A despeito das possíveis críticas que possam ser feitas à aplicação do “propósito negocial” como instrumento para aferição da validade e da legitimidade de estruturas de planejamento tributário7, tem-se visto, de fato, nos últimos anos, uma maior utilização do chamado “business purpose test”8 nas discussões sobre a matéria travadas na esfera administrativa.

Diante desse cenário, levando em consideração especialmente os resultados da análise empreendida pelo grupo de estudos de Legislação Tributária Brasileira e Comparada pertencente ao Departamento de Direito Econômico e Financeiro da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, consubstanciados em obra publicada no ano de 2010 sob a coordenação de Luís Eduardo Schoueri9, procedemos a uma revisão de recentes casos julgados pelo Carf a respeito da validade de estruturas de amortização fiscal de ágio, a fim de verificar se, efetivamente, o “propósito negocial” mostra-se uma ferramenta adequada e eficaz não apenas para aferir a legitimidade de determinada estrutura, mas também para, preventivamente, determinar de forma contundente se uma dada forma poderia ser considerada válida ou não, apenas ou principalmente com base nesse requisito. Para tanto, empregamos a mesma metodologia utilizada no estudo acima referido, a dos “normative systems”10.

Por meio da presente análise, pretendemos também verificar se, após a publicação das conclusões do referido grupo de estudos, as decisões proferidas pelo Carf passaram a adotar uma linha distinta em relação ao “propósito negocial”, pois, como se pode notar a partir do material publicado, “embora a falta do propósito se revelasse como a efetiva razão para a recusa do planejamento, os julgadores procuravam justificar sua decisão com base em teorias como o abuso de direito, a fraude à lei, o negócio jurídico indireto e quejandas, chegando-se à situação paradoxal de que circunstâncias semelhantes eram afastadas, por fundamentos diversos”11.

2. Colocação da Problemática: a Amortização Fiscal de Ágio e os Casos Julgados pelo Carf sobre a Matéria

Partindo da definição dada por Luís Eduardo Schoueri, “o ágio se forma quando uma empresa adquire participação relevante em outra sociedade, sujeitando-se, daí, ao método da equivalência patrimonial”12. Desse modo, ao adquirir um investimento considerado relevante, nos termos do artigo 247, parágrafo único, da Lei nº 6.404, de 15.12.1976 (Lei das S.A.)13, o investidor passa a ser obrigado a avaliar esse investimento com base no chamado Método da Equivalência Patrimonial (MEP)14, previsto pelo artigo 248 da mesma lei.

Visando regulamentar a aplicação do MEP, face à ausência de normatização pela Lei das S.A. que possibilitasse sua adoção, o Governo Federal publicou o Decreto-lei nº 1.598, em 26.12.197715. Especificamente no que interessa ao presente estudo, o referido Decreto-lei, em seu artigo 20, determinou que quando da aplicação do MEP, a pessoa jurídica deve desdobrar o seu custo de aquisição nas seguintes subcontas (a) valor do patrimônio líquido; e (b) ágio ou deságio, que será a diferença entre o custo de aquisição do investimento e o valor do patrimônio líquido. Esse, portanto, é o fundamento de validade jurídica da figura que será objeto da presente análise.

No que diz respeito ao ágio (item (b), acima), o mesmo artigo 20 do Decreto-lei nº 1.598 determinou que a pessoa jurídica deverá manter demonstração que justifique sua fundamentação econômica, dentre as seguintes: (b.1) valor de mercado de bens do ativo da coligada ou controlada superior ou inferior ao custo registrado na sua contabilidade; (b.2) valor de rentabilidade da coligada ou controlada, com base em previsão dos resultados nos exercícios futuros; e/ou (b.3) fundo de comércio, intangíveis e outras razões econômicas.

A princípio, os valores contabilizados a título de ágio pela pessoa jurídica em razão da aplicação do MEP não seriam passíveis de dedução, com base no disposto no artigo 25 do Decreto-lei nº 1.598. Exceção a essa regra poderia ser o caso de liquidação do investimento por incorporação, fusão ou cisão com extinção de ações ou quotas de capital, situação em que a “perda de capital” decorrente da diferença entre o valor contábil e o valor do acervo líquido avaliado a preços de mercado poderia ser considerada dedutível para fins fiscais, nos termos do artigo 34 do Decreto-lei nº 1.59816.

Como explica grande parte da doutrina17, diante do contexto do Programa Nacional de Desestatização (PND), o Governo Federal publicou a Lei nº 9.532, em 10.12.1997 (fruto da conversão da Medida Provisória nº 1.602, de 14.11.1997), conferindo, em seus artigos 7º e 8º, um novo regime tributário para os valores computados pelas pessoas jurídicas a título de ágio em razão da avaliação de investimentos relevantes feita por vias do MEP. De acordo com o entendimento de grande parte da doutrina, visando facilitar as privatizações que ocorriam no período, o Governo Federal passou a permitir, com esses dois dispositivos, a dedução fiscal de certos ágios antes indedutíveis.

A despeito das possíveis críticas que possam ser feitas em relação a essa finalidade ou à influência que o PND possa ter tido no tratamento atribuído ao ágio pela Lei nº 9.532, fato é que, após a publicação do referido diploma normativo, especificamente dos artigos 7º e 8º (posteriormente consolidados nos artigos 385 e 386 do Regulamento do Imposto de Renda aprovado pelo Decreto nº 3.000, de 26.3.1999), o ágio apurado em razão da aplicação do MEP passou a ter tratamento diferenciado na legislação fiscal, não mais se sujeitando apenas às disposições gerais previstas pelo Decreto-lei nº 1.598, que, como visto, tinha por função primordial tornar a aplicação dessa forma de avaliação de investimento factível, e não regulamentar especificamente questões tributárias possivelmente relacionadas ao assunto.

Assim, a partir do ano-calendário de 1998, a sociedade adquirente de participação societária relevante com ágio continuaria a ter o dever legal de justificar economicamente o lançamento desse valor com base em uma das categorias previstas pelo artigo 20 do Decreto-lei nº 1.598, devidamente embasado por demonstrações, laudos, ou estudos18.

Entretanto, caso a sociedade que tivesse apurado valores de ágio passasse por processo de fusão, cisão ou incorporação, o tratamento fiscal19 aplicável passaria a ser o seguinte, de acordo com os artigos 7º e 8º da Lei nº 9.532:

a) o valor do ágio justificado economicamente com base no valor de mercado de bens do ativo superior ao custo registrado na sua contabilidade deveria ser registrado em contrapartida à conta que classificasse o bem ou o direito que lhe deu causa, integrando o custo do bem ou do direito para efeitos de apuração de futuro ganho ou perda de capital e de depreciação, amortização ou exaustão;

b) o valor do ágio cujo fundamento fosse o valor de rentabilidade da investida, com base em previsão dos resultados nos exercícios futuros, poderia ser tratado como ativo diferido e amortizado nos balanços correspondentes à apuração de lucro real, levantados em pelo menos cinco anos-calendários subsequentes à incorporação, fusão ou cisão, à razão de 1/60, no máximo, para cada mês do período de apuração; e

c) caso o valor do ágio tivesse como fundamento o fundo de comércio, intangíveis e outras razões econômicas da sociedade investida, ele deveria ser registrado em contrapartida a conta de ativo permanente, não sujeita à amortização. Assim, o ágio com esse fundamento não seria dedutível.

Luís Eduardo Schoueri20 esquematiza de forma bastante didática as situações acima descritas:

1806.png

Como aponta Ricardo Mariz de Oliveira, “a prática revela a ocorrência quase que exclusiva de ágios de aquisição, na maior parte das vezes baseados em expectativa de rentabilidade ou no valor de mercado dos bens”21. E, justamente em razão desse cenário, as operações societárias que implicam a apuração de parcelas de ágio pelo sujeito passivo, em geral, têm sido por vezes consideradas como estruturas de planejamento tributário, e, nessa condição, têm sido objeto de intensa fiscalização por parte das autoridades fiscais22, levando, em muitos casos, a autuações de “cifras astronômicas”, nas palavras de Luís Eduardo Schoueri23.

Nesses questionamentos, vale notar, é frequente as autoridades fiscais questionarem fatos que Marco Aurélio Greco denomina como “operações preocupantes”24, por exemplo, “ágio interno”, estruturação de operações em sequência (step transactions), operações invertidas, operações entre partes relacionadas, uso de sociedades efêmeras, fictícias, aparentes etc. Por sua vez, a fundamentação jurídica dessas autuações costuma indicar suposta ocorrência de simulação, abuso de direito, abuso de forma, ou mesmo a ausência de propósito negocial (business purpose).

Assim, especialmente nos últimos três anos, o Carf passou a julgar diversos casos resultantes desses questionamentos pelas autoridades fiscais, versando sobre a validade e a legitimidade da constituição de ágio e seu aproveitamento para fins fiscais, de modo que a disciplina do ágio e seus efeitos fiscais passaram a ter especial atenção na doutrina jurídica.

Com base nesse panorama, o presente artigo se propõe a analisar as decisões proferidas pelo Carf a respeito do tema, levando em consideração especialmente a possível adoção, por parte dos julgadores, da teoria do propósito negocial acima referida, a fim de aferir, especialmente, se esse critério pode se mostrar adequado a indicar a validade de uma reorganização societária da qual decorra a apuração de ágio.

Para tanto, levamos em especial consideração as conclusões do grupo de estudos de Legislação Tributária Brasileira e Comparada pertencente ao Departamento de Direito Econômico e Financeiro da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo a respeito da aplicação da teoria do propósito negocial pelo Carf, obtidas a partir do mapeamento de decisões proferidas pelo antigo Conselho de Contribuintes no período de 2002 a 2008, posteriormente documentado em obra publicada no ano de 2010 sob a coordenação de Luís Eduardo Schoueri25.

Em rápida síntese, naquele primeiro mapeamento efetuado pelo grupo de estudos, chegou-se à conclusão de que a aplicação da teoria do “propósito negocial”, embora perceptível em diversas decisões, muitas vezes acabava sendo confundida com as figuras da simulação, fraude à lei, abuso de direito, abuso de forma etc. Por outro lado, foram identificadas decisões, sobretudo proferidas no período inicial mapeado, em que o propósito negocial não chegou a ser discutido, uma vez que, no entendimento do órgão colegiado, os princípios constitucionais da legalidade e da tipicidade deveriam orientar os debates acerca da validade de estruturas de planejamento tributário26.

Assim, passados três anos daquele estudo e selecionados julgados recentes sobre o assunto, passamos a investigar novamente, com base em metodologia semelhante, que será abaixo discriminada, se a aplicação da teoria do “propósito negocial” passou a se fazer mais presente em julgamentos administrativos ao longo desse tempo, e, além disso, se esse critério, no tocante especificamente às discussões a respeito da validade de estruturas que resultaram na apuração de valores de ágio amortizáveis para fins fiscais, pode ser considerado legítimo e eficaz para aferir não apenas a validade de determinada estrutura, mas também para, preventivamente, determinar de forma contundente se uma dada forma poderia ser considerada válida ou não, apenas com base nesse requisito.

3. Os Casos Analisados e a Metodologia Empregada: os “Normative Systems”

Para fins do presente estudo, foram analisados 21 Acórdãos disponibilizados pelo Carf em seu sítio eletrônico27, selecionados a partir de “palavras-chave” que tratassem sobre os temas “amortização fiscal de ágio” e “propósito negocial”. Do universo de decisões encontrado, foi realizado um corte, a fim de selecionar as decisões que se enquadrassem nos seguintes critérios: (i) decisões que tivessem sido proferidas a partir do ano de 201028; e (ii) que versassem efetivamente a respeito da matéria objeto de estudo.

Devemos deixar claro desde o início que, pelo presente estudo, não temos como objetivo analisar o mérito do entendimento adotado pelo Carf nas suas decisões sobre o assunto, mas tão somente o de demonstrar, por meio da observância de padrões comuns, qual tem sido a orientação adotada por esse órgão administrativo na análise dos casos concretos que versem sobre a dedução fiscal de despesas de amortização de ágio, e, especialmente, qual a importância que o Carf, de forma geral, tem dado ao “propósito negocial” em seus julgamentos e qual a influência dessa teoria para a formação do resultado.

Selecionados os Acórdãos que se adequassem a esses requisitos29, passamos a aplicar a metodologia dos “normative systems” para delimitar as propriedades que seriam analisadas de modo específico.

Segundo Cassio Sztokfisz30, referido método surgiu em 1971, com a publicação do livro “Introducción a la metodología de las ciencias jurídicas y sociales”, sendo traduzido para o inglês pela denominação atualmente conhecida (“normative systems”). Trata-se de uma forma eficaz de sistematizar análises empíricas, por meio da determinação prévia de propriedades sistêmicas e combináveis entre si.

De fato, de acordo com o “normative systems” define-se primeiramente o âmbito do problema, que, no nosso caso, seria a delimitação das condições pelas quais uma dada estrutura da qual resulte a apuração de valores amortizáveis de ágio para fins fiscais poderia ser considerada válida. O conjunto dessas condições perfaz o chamado “Universo de Discurso” (UD).

Dentro do UD está contido um subconjunto denominado de “Universo de Propriedades” (UP), que é composto por elementos predeterminados com base em recorrência observável, podendo esses elementos estar presentes ou ausentes no Conjunto Amostral (CA). Essa característica (presença ou ausência) será determinante para a modelagem de pesquisa.

Por sua vez, o número total de possibilidades de casos possivelmente existentes em UP é definido pela combinação do possível número de respostas para cada propriedade integrante de UP (que, no presente caso, são três - ausência, presença ou indefinição), elevado pelo número de propriedades definidas (que no presente estudo serão quatro, como será comentado a seguir).

Com base nos dados acima extraídos a partir do CA, é possível construir uma matriz que facilitará a identificação de Regras de Frequência (RF), que, por seu turno, levarão às conclusões do sistema normativo.

Assim, com base na análise dos acórdãos selecionados, definimos as seguintes propriedades:

Propriedade 1 (P1)

Segundo o Carf, houve efetivo “propósito negocial” na estrutura que deu origem aos valores amortizáveis a título de ágio31?

Propriedade 2 (P2)

A aquisição foi originalmente realizada entre partes independentes (isto é, não relacionadas)32?

Propriedade 3 (P3)

Houve efetivo fluxo de recursos na aquisição feita com ágio?

Propriedade 4 (P4)

De acordo com a Fiscalização, as formalidades expressamente previstas pela legislação (como, por exemplo, o laudo de avaliação para fundamentação do ágio) foram devidamente observadas pelo sujeito passivo?

Tabela 1: Propriedades definidas para a análise de decisões que integram o CA3132

4. Os Resultados Obtidos com Base na Metodologia dos “Normative Systems”

Com base na metodologia acima definida (“normative systems”) e das premissas acima indicadas, foi realizada a análise individual de cada julgado integrante do CA, de modo a aferir a presença (+ Pn), a ausência (- Pn) ou a indeterminação (0) de cada uma das propriedades previamente definidas. Ao final, foram alcançados os seguintes resultados:

Acórdão nº

Data

P1

P2

P3

P4

Resultado

1

9101-00.483/CSRF 01-06.015

25/01/2010

–P1

+P2

–P3

+P4

Inválida

2

1101-00.354

02/09/2010

0

+P2

+P3

+P4

Válida

3

1402-00.342

15/12/2010

0

+P2

+P3

+P4

Válida

4

1401­00.584

29/06/2011

–P1

+P2

+P3

+P4

Inválida

5

1103-00.501

30/06/2011

–P1

–P2

–P3

+P4

Inválida

6

1201-00.548

04/08/2011

+P1

+P2

+P3

–P4

Válida

7

1301-000.711

19/10/2011

+P1

+P2

+P3

+P4

Válida

8

1402-00.802

21/12/2011

+P1

+P2

+P3

–P4

Válida

9

1302-00.834

14/03/2012

0

+P2

+P3

–P4

Inválida

10

1201-00.659

15/03/2012

+P1

+P2

+P3

+P4

Válida

11

1101-00.708

11/04/2012

–P1

–P2

–P3

+P4

Válida

12

1402-00.993

11/04/2012

+P1

+P2

+P3

+P4

Válida

13

1202-00.753

12/04/2012

–P1

–P2

–P3

-P4

Inválida

14

1201-00.689

08/05/2012

+P1

+P2

+P3

+P4

Válida

15

1402-001.029

09/05/2012

0

+P2

+P3

–P4

Inválida

16

1402-01.080

14/06/2012

0

–P2

–P3

+P4

Inválida

17

1101-00.766

05/07/2012

–P1

–P2

–P3

+P4

Inválida

18

1202-000.878

03/10/2012

0

0

–P3

–P4

Inválida

19

1402-001.211

03/10/2012

–P1

–P2

–P3

–P4

Inválida

20

1402-001.278

04/12/2012

–P1

–P2

–P3

–P4

Inválida

21

1402-001.264

04/12/2012

0

+P2

+P3

+P4

Válida

Tabela 2: Resultados das propriedades P1, P2, P3 e P4 no CA e resultados proferidos pelo Carf

Com base nos dados acima indicados, já é possível identificar as seguintes frequências relativas:

Propriedade

Resultado inválido

Resultado válido

+ P1

0% (0/6)

100% (6/6)

– P1

87,5% (7/8)

12,5% (1/8)

0 P1

57,14% (4/7)

42,86% (3/7)

+ P2

30,77% (4/13)

69,23% (9/13)

– P2

85,71% (6/7)

14,29% (1/7)

+ P3

25% (3/12)

75% (9/12)

– P3

88,89% (8/9)

11,11% (1/9)

+ P4

38,46% (5/13)

61,54% (8/13)

– P4

75% (6/8)

25% (2/8)

Tabela 3: Frequência relativa das propriedades no CA analisado

A partir dos dados acima, já se pode concluir, preliminarmente, que:

i) em todos os casos nos quais foi constatada a efetiva ocorrência do “propósito negocial”, a dedução fiscal das despesas de amortização de ágio foi considerada válida pelo Carf (+ P1 produzindo resultado válido);

ii) com relação à análise empreendida pelo grupo de estudos de Legislação Tributária Brasileira e Comparada pertencente ao Departamento de Direito Econômico e Financeiro da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo a respeito da aplicação da teoria do propósito negocial pelo Carf, é possível também notar que, proporcionalmente, houve uma ligeira redução no número de casos considerados válidos, ainda que expressamente sendo reconhecido que no caso concreto não houve “propósito negocial” (– P1 produzindo resultado válido)33;

iii) também em comparação aos resultados do estudo anteriormente conduzido sob coordenação de Luís Eduardo Schoueri, pode-se notar que, de modo proporcional, o número de casos em que a ocorrência de “propósito negocial” foi de fato examinada pelo Carf se manteve estável (correspondendo a, aproximadamente, 66% dos casos analisados34), mesmo após decorridos três anos da publicação daquele estudo, o que nos leva a acreditar que a aplicação da teoria do “propósito negocial” pelo Carf permanece a mesma em relação ao período compreendido entre 2002 e 2008, ao menos se comparados apenas aos casos atuais em que o órgão analisou a validade da dedução de despesas de amortização fiscal de ágio;

iv) a independência das partes foi uma questão que exerceu considerável influência sobre a discussão a respeito da validade da dedução fiscal de despesas de amortização de ágio35; e

v) outra questão ainda mais decisiva que levou o Carf a decidir pela validade das estruturas analisadas foi a existência de efetivo fluxo de recursos entre as partes (pagamento efetivo do ágio), questão essa que foi examinada em todos os casos e, em aproximadamente 89% das situações nas quais esse requisito não estava presente, a estrutura foi considerada inválida pelo Carf.

E, para que possamos determinar outras regras e frequências a respeito dos casos examinados, a fim de traçar padrões gerais e definir as conclusões para o presente estudo, reorganizamos os dados acima, conforme a seguinte tabela:

Acórdão nº

Data

P1

P2

P3

P4

Resultado

Regra

1

1401­00.584

29/06/2011

–P1

+P2

+P3

+P4

Inválido

1

2

9101-00.483/CSRF 01-06.015

25/01/2010

–P1

+P2

–P3

+P4

Inválido

1

3

1103-00.501

30/06/2011

–P1

–P2

–P3

+P4

Inválido

1

4

1101-00.766

05/07/2012

–P1

–P2

–P3

+P4

Inválido

1

5

1202-00.753

12/04/2012

–P1

–P2

–P3

–P4

Inválido

1

6

1402-001.211

03/10/2012

–P1

–P2

–P3

–P4

Inválido

1

7

1402-001.278

04/12/2012

–P1

–P2

–P3

–P4

Inválido

1

8

1302-00.834

14/03/2012

0

+P2

+P3

–P4

Inválido

2

9

1402-001.029

09/05/2012

0

+P2

+P3

–P4

Inválido

2

10

1402-01.080

14/06/2012

0

–P2

–P3

+P4

Inválido

3

11

1202-000.878

03/10/2012

0

0

–P3

–P4

Inválido

3

12

1101-00.354

02/09/2010

0

+P2

+P3

+P4

Válido

4

13

1402-00.342

15/12/2010

0

+P2

+P3

+P4

Válido

4

14

1402-001.264

04/12/2012

0

+P2

+P3

+P4

Válido

4

15

1201-00.548

04/08/2011

+P1

+P2

+P3

–P4

Válido

5

16

1402-00.802

21/12/2011

+P1

+P2

+P3

–P4

Válido

5

17

1301-000.711

19/10/2011

+P1

+P2

+P3

+P4

Válido

5

18

1201-00.659

15/03/2012

+P1

+P2

+P3

+P4

Válido

5

19

1402-00.993

11/04/2012

+P1

+P2

+P3

+P4

Válido

5

20

1201-00.689

08/05/2012

+P1

+P2

+P3

+P4

Válido

5

21

1101-00.708

11/04/2012

–P1

–P2

–P3

+P4

Válido

X

Tabela 4: Resultado analítico de freqüências percebidas no CA analisado

Com a reorganização dos dados obtidos a partir da análise das decisões integrantes do CA pudemos agrupá-las de acordo com cinco propriedades distintas. Entretanto, antes de delimitar cada uma delas, faz-se necessário tecer breves considerações preliminares a respeito do Acórdão nº 1101-00.708. Nesse caso, em que a dedução das despesas de amortização de ágio para fins fiscais foi considerada válida pelo Carf, verificamos o seguinte conjunto de ocorrências: (– P1), (– P2), (– P3) e (+ P4), exatamente o mesmo conjunto de propriedades verificadas nos Acórdãos nos 1103-00.501 e 1103-00.501, considerados inválidos por aquele órgão.

Diante dessa aparente contradição, e tomando por base o padrão médio encontrado nos demais casos, especialmente no de nº 1401-00.584, em que a simples ocorrência de (– P1) foi suficiente para a estrutura ser considerada inválida pelo Carf, optamos por excluir da análise de propriedades o caso nº 1101-00.708, mantendo, todavia, os Acórdãos nos 1103-00.501 e 1103-00.501.

Com isso, chegamos às seguintes propriedades:

i) Regra 1: ocorrendo (– P1), a dedução das despesas de amortização de ágio para fins fiscais será considerada inválida, independentemente da análise dos demais critérios (7 ocorrências);

ii) Regra 2: nos casos em que não houve o exame do “propósito negocial”, foi dada especial importância à observância dos requisitos formais expressamente previstos pela legislação. Nesse sentido, nos casos em que isso não foi verificado (– P4), a dedução das despesas de amortização de ágio para fins fiscais foi considerada inválida (2 ocorrências);

iii) Regra 3: não havendo efetivo fluxo de recursos financeiros (– P3), a dedução das despesas de amortização de ágio para fins fiscais será considerada inválida, independentemente da análise das demais propriedades P1, P2 e P4 (2 ocorrências);

iv) Regra 4: havendo partes independentes (+ P2), efetivo fluxo de recursos financeiros (+ P3) e devido cumprimento das formalidades expressamente previstas na legislação aplicável (+ P4), a dedução das despesas de amortização de ágio para fins fiscais será considerada válida, independentemente da análise do “propósito negocial” (P1) (3 ocorrências);

v) Regra 5: havendo efetivo “propósito negocial” (+ P1), partes independentes (+ P2) e fluxo de recursos financeiros (+ P3), a dedução das despesas de amortização de ágio para fins fiscais será considerada válida (6 ocorrências), sendo que em alguns casos a presença desses elementos chegou a bastar para suprir eventuais inobservâncias de requisitos de natureza formal apontadas pela Fiscalização (P4) (2 ocorrências).

A partir da combinação das regras 3, 4 e 5, acima, podemos tomar uma posição ainda mais incisiva, no sentido de dizer que havendo (+ P1) e (+ P3), a dedução das despesas de amortização de ágio para fins fiscais será considerada válida.

Com isso, pode-se concluir que, muito embora a teoria do “propósito negocial” tenha se mostrado relevante para a análise da validade de estruturas nas quais tenha ocorrido a dedução de valores amortizáveis a título de ágio, em diversos casos referida teoria deixou de ser levada em consideração, não tendo sido objeto de análise pelos julgadores. Nesses casos, o presente estudo mostra que existem outros critérios tão relevantes quanto, e que podem levar, com base no levantamento feito a partir dos “normative systems”, às mesmas conclusões.

De fato, nos casos em que as operações foram conduzidas entre partes relacionadas (- P2) e sem efetivo fluxo de recursos quando da aquisição de investimentos que justificassem os valores contabilizados pelo sujeito passivo a título de ágio (– P3), pode-se verificar, com base nos “normative systems”, que o Carf considerou inválidos os efeitos da dedução dos valores de ágio em quase a totalidade dos casos (exceção feita apenas ao Acórdão nº 1101-00.708). Esses critérios, portanto, têm se revelado bastante decisivos para a tomada de decisão a respeito da validade ou não de determinado caso.

Ressalte-se que esses dois critérios - independência de partes (P2) e efetivo fluxo de recursos (P3) -, foram analisados em praticamente todos os casos integrantes do CA (em apenas um caso a propriedade P2 deixou de ser examinada). Por seu turno, o “propósito negocial”, como se pode notar, deixou de ser objeto de análise em praticamente um terço dos casos. Diante dessa constatação, concluímos que essas duas propriedades - negociações entre partes independentes e pagamento efetivo pela aquisição do investimento com ágio - podem se mostrar até mesmo mais eficazes para a aferição da validade da dedução fiscal de valores de ágio do que a existência de “propósito negocial” por si só.

Por fim, pela presente análise pudemos também constatar que, de modo diverso do que alguns textos vêm pontuando na doutrina sobre o assunto, a questão do “propósito negocial” tem se mantido estatisticamente a mesma desde 2002, uma vez que, proporcionalmente, o número de casos em que essa questão foi discutida - dois terços (66%) - é muito próximo dos valores obtidos no ano de 2010 pelo grupo de estudos coordenado por Luís Eduardo Schoueri, quando foram examinadas decisões proferidas pelo antigo Conselho de Contribuintes no período compreendido entre os anos de 2002 e 2008.

5. Conclusões

Pelo presente estudo, pode-se verificar, com base na utilização dos “normative systems”, que a teoria do “propósito negocial” tem, de fato, se mostrado uma ferramenta útil para o balizamento de decisões pelo Carf, no que diz respeito à análise da validade da dedução de despesas de amortização de ágio, sendo que a ocorrência dessa propriedade, em diversos casos examinados, foi decisiva para a tomada de posição pelos conselheiros daquele órgão administrativo.

Contudo, a aplicação desse método às recentes decisões analisadas indicou também que o exame da questão envolvendo a validade da dedução de despesas de amortização de ágio pode ser mais eficiente se levadas em consideração outras propriedades, como, por exemplo, a independência das partes (ou, sob outra perspectiva, a ocorrência ou não do chamado “ágio interno”) e a efetiva utilização de recursos para a aquisição do investimento.

Além disso, pudemos também verificar que, estatisticamente, a frequência de utilização da teoria do “propósito negocial” para balizar os julgamentos administrativos tem se mostrado a mesma que no período de 2002 a 2008, conforme estudos realizados pelo grupo de estudos coordenado por Luís Eduardo Schoueri. Portanto, ainda que passados três anos da publicação do referido estudo, temos visto um posicionamento ainda muito semelhante àquele do período compreendido entre 2002 e 2008.

Mais uma vez, vale ressaltar que, pelo presente estudo, não pretendemos analisar o mérito das decisões proferidas pelo Carf, ou sob quais circunstâncias os valores apurados a título de ágio pelo sujeito passivo podem ser considerados dedutíveis para fins fiscais. O objetivo do presente estudo foi o de verificar a eficácia na aplicação da teoria do “propósito negocial” a esses casos, bem como avaliar padrões e tendências do Carf em julgamentos sobre o assunto, a partir de recentes julgados disponibilizados no sítio eletrônico do órgão, tendo, para tanto, empregado o método dos “normative systems” que também orientou estudo semelhante coordenado por Luís Eduardo Schoueri.

1 Caso “Gregory vs. Helvering”, julgado pela Suprema Corte Americana em 7.1.1935. Disponível em: <http://caselaw.lp.findlaw.com/cgi-bin/getcase.pl?court=US&vol=293&invol=465>. Acesso em: 24 de março de 2013. Nesse julgamento, apesar de a Suprema Corte Americana ter reconhecido o direito de o contribuinte organizar seus negócios de forma a se submeter a uma carga fiscal menor, chegou-se também à conclusão de que a escolha dentre as várias espécies de transações passíveis de serem realizadas deve ocorrer apenas entre as estruturas que tiverem propósito negocial ou econômico independentemente da economia fiscal a ser obtida. Cf. GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes.Interpretação Econômica do Direito Tributário: o caso Gregory v. Helvering e as doutrinas do propósito negocial (business purpose) e da substância sobre a forma (substance over form)”. Revista Fórum de Direito Tributário - RFDT. Belo Horizonte, ano 8, n. 43, p. 55-62, jan./fev. 2009.

2 Muito embora o conceito de “propósito negocial” tenha se originado a partir de uma construção jurisprudencial da Suprema Corte Americana, atualmente essa questão é regulamentada por diversos instrumentos normativos do ordenamento norte-americano. Nesse sentido, por exemplo, destaca-se o disposto no parágrafo 779.213 do Regulamento do Imposto de Renda nor­te-americano (Income Tax Regulations), segundo o qual o termo “propósito negocial” abrange as atividades realizadas por uma pessoa ou por mais de uma pessoa, ou empresa, ou organização outro negócio, que são direcionados para o objetivo de negócio ou mesmo para objetivos semelhantes em que o grupo tem um interesse, devendo esse requisito ser examinado a partir de um juízo prático a respeito dos fatos. Disponível em: <http://www.gpo.gov/fdsys/pkg/CFR-2012-title29-vol3/pdf/CFR-2012-title29-vol3-sec779-214.pdf>. Acesso em: 24 de março de 2013.

3 HUCK, Hermes Marcelo. Evasão e Elisão. São Paulo: Saraiva, 1997.

4 ROLIM, João Dácio. Normas Antielisivas Tributárias: texto atualizado com a Lei Complementar nº 104, de 10 de janeiro de 2001. São Paulo: Dialética, 2001.

5 GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Tributário. 3ª ed. São Paulo: Dialética, 2011, p. 235.

6 Como, por exemplo, o caso do Acórdão nº 101-77.837, proferido pela antiga 1ª Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes, e do Acórdão nº 01-05.413, proferido pela 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais.

7 Cf. FREITAS, Rodrigo. “É legítimo economizar tributos? Propósito negocial, causa do negócio jurídico e análise das decisões do antigo Conselho de Contribuintes”. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.); e FREITAS, Rodrigo de (org.). Planejamento Tributário e o “Propósito Negocial”: Mapeamento de Decisões do Conselho de Contribuintes de 2002 a 2008. São Paulo: Quartier Latin, 2010.

8 Definido pelo International Bureau of Fiscal Documentation (IBFD) como um “teste utilizado em certos países como uma arma contra estruturas de planejamentos tributários. Esquemas artificiais que criam circunstâncias nas quais nenhum ou o mínimo possível de tributos é pago, podem ser desconsideradas se não servirem a um propósito negocial.” IBFD. International Tax Glossary. Amsterdã: IBFD, 1988.

9 SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.); FREITAS, Rodrigo de (org.). Ob. cit. (nota 7).

10 Para fins do presente artigo, não serão analisadas, de modo específico, as figuras usualmente utilizadas para questionar estruturas ditas “elisivas” (como, por exemplo, simulação, fraude à lei, abuso de direito, abuso de forma etc). O corte epistemológico abrange apenas a figura do “propósito negocial”, mesmo nos casos em que outras dessas figuras tenham sido empregadas de forma subsidiária na decisão examinada.

11 SCHOUERI, Luís Eduardo. “O desafio do planejamento tributário”. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.); e FREITAS, Rodrigo de (org.). Planejamento tributário e o “propósito negocial”: mapeamento de decisões do Conselho de Contribuintes de 2002 a 2008. São Paulo: Quartier Latin, 2010.

12 SCHOUERI, Luís Eduardo. Ágio em reorganizações societárias: aspectos tributários. São Paulo: Dialética, p. 11, 2012.

13 De acordo com esse dispositivo, considera-se relevante o investimento: (a) em cada sociedade coligada ou controlada, se o valor contábil é igual ou superior a 10% do valor do patrimônio líquido da companhia; ou (b) no conjunto das sociedades coligadas e controladas, se o valor contábil é igual ou superior a 15% do valor do patrimônio líquido da companhia.

14 De acordo com a definição contida no item 3 do Pronunciamento Contábil nº 18, emitido pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis, o MEP corresponde ao “método de contabilização por meio do qual o investimento é inicialmente reconhecido pelo custo e posteriormente ajustado pelo reconhecimento da parte do investidor nas alterações dos ativos líquidos da investida”. Pronunciamento disponível em: <http://www.cpc.org.br/pdf/CPC_18_(R2)_final.pdf>. Acesso em: 25 de março de 2013. Sobre essa questão, confira-se também IUDÍCIBUS, Sérgio de; et al. Manual de contabilidade societária: aplicável a todas as sociedades. De acordo com as normas internacionais e do CPC. São Paulo: Atlas, 2010.

15 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, p. 730, 2008. No mesmo sentido, SCHOUERI, Luís Eduardo. Ob. cit., (nota 12).

16 Nesse sentido, por exemplo, estavam alguns julgamentos proferidos pelo antigo Conselho de Contribuintes, como o consubstanciado no Acórdão nº 107-05.875, de 22.2.2000.

17 Nesse sentido, por exemplo, estão OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Ob. cit., (nota 15), p. 763; MOSQUERA, Roberto Quiroga; e FREITAS, Rodrigo de. “Aspectos polêmicos do ágio na aquisição de investimento: (i) rentabilidade futura e (ii) ágio interno”. In: MOSQUERA, Roberto Quiroga; e LOPES, Alexsandro Broedel (coords.). Controvérsias jurídico-contábeis: aproximações e distanciamentos. V. 2. São Paulo: Dialética, p. 248, 2011; MELHEM, Michel Gulin. “Ágio na incorporação - Necessidade de propósito negocial (business purpose) - Utilização de empresa veículo (conduit company) - Criação de ágio intragrupo”. Revista de estudos tributários. São Paulo: IOB, n. 73, p. 110-111, 2011; ROLIM, João Dácio; FONSECA, Frederico de Almeida. “Reorganizações societárias e planejamento fiscal. O ágio de investimentos e o uso de “empresas-veículo” (conduit company)”. Revista Dialética de Direito Tributário nº 158. São Paulo: Dialética, p. 65, 2008; ABRAHAM, Marcus. “Os 10 anos da norma geral antielisiva e as cláusulas do propósito negocial e da substância sobre a forma presentes no Direito brasileiro”. Revista Dialética de Direito Tributário nº 192. São Paulo: Dialética, p. 90, 2011; dentre outros. Por outro lado, há também críticas na doutrina a respeito desse entendimento, como, por exemplo, Luís Eduardo Schoueri, para quem “tal posicionamento não deixa de ser curioso”, na medida em que, a seu ver, a Lei nº 9.532 veio, na verdade, restringir as hipóteses para a dedução dos valores registrados a título de ágio pela pessoa jurídica, a fim de coibir a prática de planejamentos tributários inconsistentes, conforme indicado pela própria Exposição de Motivos da Lei nº 9.532. SCHOUERI, Luís Eduardo. Ob. cit., (nota 12), p. 67.

18 Sobre essa questão, é importante destacar que a norma não chega a fazer qualquer tipo de exigência ou imposição de requisitos para a validade das demonstrações elaboradas para justificar economicamente a parcela de ágio, dispondo apenas sobre a necessidade de o contribuinte manter demonstração que comprove a referida fundamentação. Muito embora esse ponto seja recorrente em autuações fiscais, ao comentar essa situação a doutrina se posiciona majoritariamente no sentido de que esse documento não necessita de formalidades específicas, uma vez que, além de a legislação mencionar apenas “demonstração”, conceito esse bastante amplo, nos casos em que os estudos ou laudos devam ter formalidades específicas, essa exigência é expressa no ordenamento, conforme ilustram diversos dispositivos da Lei das S.A. Sobre essa questão, confira-se também o posicionamento de SCHOUERI, Luís Eduardo. Ob. cit., (nota 12), p. 33-40.

19 Cf. GALHARDO, Luciana Rosanova; e LOPES JUNIOR, Jorge Ney de Figueirêdo. “As novas normas contábeis e a amortização fiscal de ágio”. In: MOSQUERA, Roberto Quiroga; e LOPES, Alexsandro Broedel (coords.). Controvérsias jurídico-contábeis: aproximações e distanciamentos. V. 1. São Paulo: Dialética, 2010; SCHOUERI, Luís Eduardo. Ob. cit., (nota 12); e BIFANO, Elidie Palma. “Reorganizações societárias e combinação de negócios: temas atuais”. Revista Dialética de Direito Tributário nº 198. São Paulo: Dialética, p. 47-55, 2011. Após a publicação da Lei nº 11.638, de 28.12.2007, o tratamento contábil conferido ao ágio passou a ter tratamento distinto daquele previsto na legislação fiscal. Entretanto, não entraremos nessa análise para fins do presente artigo.

20 SCHOUERI, Luís Eduardo. Ob. cit., (nota 12), p. 74.

21 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Ob. cit., (nota 15), p. 763, 2008.

22 De acordo com informações disponibilizadas pela própria Receita Federal do Brasil em seu sítio eletrônico, no primeiro semestre de 2011, por exemplo, um dos principais focos de fiscalização no tocante a “planejamentos tributários abusivos” (conforme definição contida no sítio eletrônico) foram operações nas quais o contribuinte tenha gerado “ágio interno (dentro do mesmo grupo econômico)”. Cerca de 46% das principais fiscalizações sobre o assunto versavam sobre ágio, sendo que apenas no primeiro semestre de 2011, essa ação fiscal resultou no lançamento de créditos que totalizaram R$ 7.340.133.138,72. Dados disponíveis em: <http://www.receita.fazenda.gov.br/srf/ResultFiscalizacao.htm>. Acesso em: 26 de março de 2013.

23 SCHOUERI, Luís Eduardo. Ob. cit., (nota 12), p. 9.

24 GRECO, Marco Aurélio. Ob. cit., (nota 5), p. 460-479.

25 SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.); e FREITAS, Rodrigo de (org.). Ob. cit., (nota 7).

26 É interessante notar que essa tendência confirma o entendimento de Marco Aurélio Greco, ao definir algumas “fases do debate” a respeito do planejamento tributário, sendo a primeira delas justamente pautada pela aplicação dos princípios da legalidade e da tipicidade em sentido estrito, tendo essa fase perdurado até meados do ano de 2004, a partir de quando esses princípios passaram a ser relativizados, com base na aplicação das teorias do abuso de direito, abuso de forma e outros tipos de vícios de consentimento. A esse respeito, confira-se GRECO, Marco Aurélio. Ob. cit., (nota 5), p. 133-142; 194-288; e 388.

27 Disponível em: <http://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/index.jsf>. Acesso em: 25 de março de 2013.

28 Adotamos como critério temporal para a seleção de decisões o ano de 2010, por se tratar do ano de publicação das conclusões do estudo realizado pelo grupo de estudos de Legislação Tributária Brasileira e Comparada pertencente ao Departamento de Direito Econômico e Financeiro da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Com isso, podemos avaliar se essas conclusões influenciaram a forma como o Carf passou a lidar com a questão do “propósito negocial” nos planejamentos tributários.

29 Acórdão nº 9101-00.483, de 25.1.2010; Acórdão nº 1101-00.354, de 2.9.2010; Acórdão nº 1402-00.342, de 15.12.2010; Acórdão nº 1401­00.584, de 29.6.2011; Acórdão nº 1103-00.501, de 30.6.2011; Acórdão nº 1201-00.548, de 4.8.2011; Acórdão nº 1301-000.711, de 19.10.2011; Acórdão nº 1402-00.802, de 21.12.2011; Acórdão nº 1302-00.834, de 14.3.2012; Acórdão nº 1101-00.708, de 11.4.2012; Acórdão nº 1402-00.993, de 11.4.2012; Acórdão nº 1202-00.753, de 12.4.2012; Acórdão nº 1201-00.689, de 8.5.2012; Acórdão nº 1402-001.029, de 9.5.2012; Acórdão nº 1402-01.080, de 14.6.2012; Acórdão nº 1101-00.766, de 5.7.2012; Acórdão nº 1202-000.878, de 3.10.2012; Acórdão nº 1402-001.211, de 3.10.2012; Acórdão nº 1402-001.278, de 4.12.2012; e Acórdão nº 1402-001.264, de 4.12.2012.

30 SZTOKFISZ, Cassio. “Breve análise teórica do ‘normative systems’”. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.); FREITAS, Rodrigo de (org.). Ob cit., (nota 7), p. 505.

31 Para fins do presente estudo, assumimos que o “propósito negocial” tenha sido examinado caso as motivações para a estruturação do negócio do qual resultou o ágio amortizado tenham sido examinadas durante o julgamento - ainda que, juridicamente, referidas motivações tenham posteriormente sido justificadas com base em outras construções teóricas, como, por exemplo, abuso de direito.

32 Dizemos “aquisição originalmente realizada entre partes independentes” pelo fato de que a posterior transferência de investimento com ágio a pessoas relacionadas, a princípio, não caracterizaria uma limitação ao seu aproveitamento para fins fiscais. Esse entendimento, aliás, chegou a ser expressamente validado em diversos dos casos examinados, como, por exemplo, nos Acórdãos nos 1301-000.711, 1402-00.802, 1101-00.708, 1201-00.689, 1402-00.993, dentre outros.

33 Como se pode concluir, a partir das conclusões apresentadas por Carlos Eduardo Peroba Angelo para o estudo baseado nas decisões proferidas pelo antigo Conselho de Contribuintes entre 2002 e 2008, o número de casos em que a estrutura foi considerada válida, mesmo tendo sido reconhecida a ausência de “propósito negocial” era de 17% (7 casos em 41).

34 No estudo anterior, o número de decisões em que o propósito negocial chegou a ser examinado (definido como “0 P1”, no presente caso), correspondeu a, aproximadamente, 65% [(51 decisões examinando + P1 ou - P1)/78 decisões analisadas no total]. ANGELO, Carlos Eduardo Peroba. “Análise de decisões: resultados obtidos com o ‘normative systems’”. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.); e FREITAS, Rodrigo de (org.). Ob. cit., (nota 7), p. 436.

35 No presente estudo, não entraremos no mérito a respeito da validade ou não da dedução de despesas de ágio geradas decorrentes de operações conduzidas entre partes relacionadas (ágio interno). Apenas salientamos que parte da doutrina entende que o mero fato de um ágio ser apurado a partir de negociações realizadas com partes relacionadas não tem o condão, por si só, de invalidar os efeitos fiscais decorrentes de sua origem a partir da aplicação do MEP. Cf. ANDRADE FILHO, Edmar Oliveria. Planejamento tributário. São Paulo: Saraiva, p. 271, 2009; FREITAS, Rodrigo de; e MOSQUERA, Roberto Quiroga. Ob. cit., (nota 17), p. 278-279.; SCHOUERI, Luís Eduardo. Ob. cit., (nota 12), p. 105-112; TAKATA, Marcos Shigueo. “Ágio interno sem causa ou ‘artificial’ e ágio interno com causa ou real - distinções necessárias”. In: LOPES, Alexsandro Broedel; e MOSQUERA, Roberto Quiroga. (coords). Controvérsias jurídico-contábeis: Aproximações e Distanciamentos. V. 3. São Paulo: Dialética, p. 194-209, 2012. E, sob o ponto de vista contábil, há ainda entendimento de que o chamado “ágio interno” somente encontra restrições ao aproveitamento para fins estritamente contábeis, e não fiscais, como concluem Eliseu Martins e Jorge Vieira Costa Júnior, em COSTA JÚNIOR, Jorge Vieira; e MARTINS, Eliseu. A incorporação reversa com ágio gerado internamente: conseqüências da elisão fiscal sobre a contabilidade. Disponível em: <http://www.congressousp.fipecafi.org/artigos42004/13.pdf>. Acesso em: 27 de março de 2013. Sobre essa questão, já concluímos, em outro estudo, que “muitas vezes, por exemplo, empresas que, na forma, poderiam ser consideradas pertencentes a um mesmo grupo econômico, são levadas por razões corporativas e não tributárias a negociarem nas chamadas condições ‘arm’s length’, ou seja, a valores justos de mercado, como se fossem partes independentes. Nesses casos, abstraídas as particularidades de cada operação, os valores de ágio assim gerados não necessariamente seriam considerados artificiais para fins tributários.” LOPES JR., Jorge N. F.; e ASSEIS, Pedro Augusto A. Abujamra. “O aproveitamento fiscal do ágio e o ofício CVM 1/2007”. Revista Eletrônica de Direito Tributário n. 2, p. 13, 2012. Disponível em: <http://sachacalmon.wpengine.netdna-cdn.com/wp-content/uploads /2012/07/REVISTA-ELETR%C3%94NICA-DE-DIREITO-TRIBUT%C3%81RIO-JUNHO-2012.pdf>. Acesso em: 28 de março de 2013.