Mudança de Residência como Forma de Planejamento Tributário*

Juan Zornoza

Professor de Finanças Públicas e Legislação Tributária na Universidade Carlos III de Madri.

Resumo

O artigo apresentado pelo Professor Zornoza é parte do projeto de pesquisa DER2010-20000 financiada pelo Ministério da Economia e Competitividade da Espanha e busca analisar o impacto da mudança de residência pelos contribuintes (pessoas física e jurídica) como forma de planejamento tributário internacional. Neste trabalho, o autor demonstra que a desatualização dos instrumentos jurídicos existentes, tanto no âmbito da legislação interna dos Estados como nos tratados para se evitar a bitributação, para tratar das complexas transações econômicas do mundo globalizado, onde a mobilidade de capital e de pessoas, somada à concorrência fiscal entre os países e a consequente instituição de regimes fiscais privilegiados, permite aos contribuintes adequar sua situação fática para atender aos critérios de residência de mais de uma jurisdição e, com isso, obter vantagens fiscais inesperadas por tornarem-se residentes em mais de um país ou em país algum.

Palavras-chave: acordos de bitributação, residência fiscal, Modelo ONU, Modelo OCDE.

Abstract

The article presented by Professor Zornoza is outlined in the research project DER2010-20000 financed by the Spanish Ministry of Economy and Competitiveness. It focuses on the impacts that changing residence may cause when used by taxpayers as a form of tax planning. In this paper, Professor Zornoza demonstrates that as tax treaties and domestic legislations become outdated for providing the proper treatment for current complex economic transactions, where capital and people easily circulate from one country to another; and considering that competition for inbound investment has led an increasing number of countries to offer reductions in their effective tax rates, taxpayers are able to manipulate their fact pattern in order to meet with the residence criteria of more than one jurisdiction, obtaining unexpected tax benefits from becoming resident either in more than one country or in no country at all.

Keywords: tax treaties, residence for tax purposes, UN Model, OECD Model.

1. Introdução

É bem sabido que, em 1923, o Relatório do Comitê Financeiro (Financial Committee Report), elaborado para as Nações Unidas, pelos então denominados “quatro economistas” (four economists), sob liderança de Edwin R.A. Seligman1, concluiu que a relação de pertinência econômica (economic allegiance) entre rendimentos e Estado tributante seria o fundamento para a existência das jurisdições tributárias. Critérios tão variados quanto residência, nacionalidade, domicílio e fonte dos rendimentos eram, nesta época, entendidos como sendo indicativos desta relação de pertinência econômica. Atualmente, contudo, a residência das pessoas físicas e das pessoas jurídicas (legal entity) tem sido o elemento de conexão mais importante para se definir as jurisdições fiscais tanto em âmbito nacional como no contexto dos tratados para evitar a bitributação.

No entanto, para definir residência - em função de suas tradições jurídicas, fatores históricos etc. - diferentes países usam, em suas respectivas legislações fiscais, elementos que, embora parcialmente intercambiáveis, possuem entre si distinções. Estas diferenças podem produzir conflitos de dupla residência, uma vez que dois países poderiam, concorrentemente, tratar uma pessoa física ou jurídica como seu residente para fins fiscais e, consequentemente, ambos os Estados exigiriam tributação dos rendimentos desta pessoa em bases universais. Ademais, estas diferenças também podem dar espaço a planejamentos fiscais (e.g., tax arbitrage) que produzam vantagens significativas sobre a tributação de rendimentos e heranças (inheritance tax)2, além de outros efeitos de natureza não fiscal.

A concorrência tributária internacional contribui para o aumento deste cenário devido à mobilidade do capital, a remoção da modalidade de retenção na fonte, na tributação dos rendimentos pelos países desenvolvidos, o surgimento de novos regimes fiscais favorecidos e, ainda, em função das falhas no combate aos paraísos fiscais. Estes fatores, que já possuem impactos relevantes para contribuintes pessoa física, são ainda mais evidentes para a tributação de pessoas jurídicas. De fato, a concorrência por investimentos externos levou a um aumento no número de países que oferecem reduções em suas alíquotas efetivas para investidores não residentes (ou, até mesmo, o chamado “tax holidays”)3. E dada a relativa facilidade com que grupos multinacionais conseguem realocar sua residência fiscal - se não suas unidades produtivas - em resposta às alíquotas fiscais, esta concorrência fiscal internacional permite às multinacionais obter a maior parte de seus rendimentos livre de impostos ou sujeita a uma baixa tributação.

Por esta razão, a residência é matéria de considerável importância e, possivelmente, se manterá como tal no futuro, dado que pessoas e atividades econômicas tornam-se cada vez mais móveis. E como a eleição de residência4 também é algo relevante para fins de planejamento fiscal - para contribuintes pessoa física5 e jurídica - tentaremos, neste trabalho, analisar o papel que mudanças de residência podem desempenhar no planejamento fiscal e como diferentes países estão reagindo a este respeito, desenvolvendo, primeiramente, algumas considerações sobre o papel e sentido do conceitos de residência (2), que nos permitirá apontar algumas oportunidades de planejamento fiscal advindas das assimetrias relativas à definição de residência pelas legislações domésticas em diferentes países. Tentaremos, então, apontar estas estratégias, bem como seus riscos, por meio da análise de alguns precedentes jurisprudenciais e outros casos que foram objeto do debate público (3). Este tipo de planejamento fiscal, que normalmente é resultado da competição entre os Estados na área fiscal é, também, fundamento para o desenvolvimento de medidas defensivas, i.e., alargamento do conceito de residência ou instituição de tributos sobre a saída/expatriação de residentes do país (exit taxes). O estudo destas medidas provavelmente confirmará que, para contra-atacar os planejamentos fiscais relacionados com a residência por meio de regras antiabuso, outras preocupações relacionadas com a definição de residência devem ser analisadas (4) e, por meio disto, outras medidas devem ser elaboradas para permitir à administração tributária alcançar seus objetivos.

2. Algumas Considerações sobre o Conceito de Residência Fiscal

Como já mencionado, residência é o conceito mais difundido para determinar a tributação de rendimentos em base global num determinado país, independentemente da localização da fonte dos pagamentos. Trata-se de um parâmetro razoável para estabelecer uma ligação entre uma pessoa e o sistema fiscal ao qual se submete, bem como um standard não apenas para os países signatários da OCDE como, também, para países que tradicionalmente a rejeitam; portanto o uso de outros critérios - e.g., nacionalidade6 - é excepcional no presente momento7.

Isto provavelmente ocorre porque residência é um fator de conexão que pode refletir uma relativa relação íntima entre o país e a pessoa, dependendo precisamente do conceito de residência que se emprega, mesmo quando a residência é vista, como no caso de empresas, como algo de certa forma artificial8.

Devemos deixar um pouco de lado a análise dos critérios definidos na legislação doméstica dos países9 para focar em considerações mais gerais sobre este elemento de conexão.

Neste sentido, é relevante estressarmos que, na área tributária, o tratamento distinto dos parâmetros de residência é regra ao invés da exceção. O uso de critérios de permanência, de centro de interesses vitais, domicílio, uso habitual da moradia, o local da constituição da companhia, o local onde se localiza sua diretoria ou onde se opera sua efetiva administração ilustram esta realidade. Em outras palavras, embora residência seja basicamente o único conceito que existe para alocar jurisdições para a tributação de rendimentos em bases globais, existe uma considerável diversidade de elementos usados para a sua determinação, que são empregados pelos países de forma independente e não coordenada10. Provavelmente, esta é a razão porque o artigo 4(1) do Modelo de Convenção Tributária sobre o Rendimento e o Capital da OCDE (OECD Model Tax Convention on Income and on Capital - doravante “OECD MTC”) define residência não pela referência às circunstâncias que a determinam - isto deve ser definido pela legislação doméstica - mas pelo efeito que ela produz, i.e., a sujeição à tributação em âmbito global11.

De qualquer forma, sob uma ótica teórica, o conceito de residência deveria ser igualitário, administrável e de difícil manipulação12. Do ponto de vista da equidade, a tributação é justificável na medida da capacidade contributiva de cada contribuinte, particularmente com relação à tributação da renda dos indivíduos, porque equidade - seja ela vertical ou horizontal - é mais bem satisfeita a partir da tributação dos residentes uma vez que possibilita igual tratamento legal independentemente de onde os rendimentos são provenientes13. A relação entre residência e o princípio da capacidade contributiva tem sido criticada, uma vez que o último não indica qual parte de um rendimento derivado de uma operação transnacional (cross-border) seria tributada pelo Estado de residência e qual parte o seria pelo Estado da fonte dos pagamentos (source State). Entretanto, mesmo que se aceite esta crítica, porque a tributação dos residentes é mais bem justificada pelo princípio do benefício (benefits principle), se considerarmos o efetivo ou potencial benefício que o contribuinte recebe do Estado14, parece ser verdade que as circunstâncias que dão causa à averiguação da residência deveriam ser consistentes com ambos os princípios. Em outras palavras, embora o artigo 4(1) da OECD MTC permita um campo amplo para que os países estabeleçam as circunstâncias capazes de definir a residência, estes critérios não podem ser selecionados aleatoriamente, pois é necessário considerar exclusivamente o Estado com quem o contribuinte mantém maior ligação a partir da perspectiva do princípio do benefício e, portanto, o Estado que possui melhores condições de estabelecer a capacidade contributiva deste contribuinte.

Embora o princípio da capacidade contributiva não desempenhe nenhum papel na determinação do quanto compete a cada estado tributar de um rendimento gerado numa operação transnacional, é verdade que o Estado de residência possui legitimação especial para considerar o rendimento a ser tributado como um todo, incluindo a fonte do rendimento localizado fora de seu território, tanto por questões de isonomia, como porque a residência do indivíduo se relaciona, em certo grau, com sua relação de pertinência política, um fator que liga a incidência tributária com o princípio da não tributação sem representação (non taxation without representation principle), um dos principais pilares do princípio da legalidade em matéria tributária.

Adicionalmente, o conceito de residência deve ser administrável, i.e., os critérios para sua determinação devem ser claros para não produzirem conflitos excessivos quando da sua aplicação. Desta perspectiva, a tributação baseada na jurisdição de residência faz sentido para o contribuinte pessoa física, uma vez que residência é critério relativamente fácil de se determinar neste caso; a maioria dos indivíduos é parte de uma única comunidade, e residência em parte se confunde com a pertinência política, sendo um indicativo da tributação com representação15. De fato, mesmo havendo casos mais complexos, a residência do indivíduo pode ser definida em regras objetivas, tais como o número de dias de permanência - denominada teste dos 183 dias - alguns testes sobre fatos e circunstâncias relativos ao indivíduo - domicílio, casa, centro familiar ou interesses econômicos - ou outros critérios específicos, tais como contratação para serviços governamentais, atividades diplomáticas etc. não obstante todas as dificuldades - que serão analisadas abaixo - a verdade é que os contribuintes pessoa física somente podem estar em um determinado lugar num determinado tempo, então sua residência é um conceito relativamente fácil de se estabelecer. Isto se torna ainda mais evidente quando confrontamos o conceito de residência com o conceito de fonte, porque a definição do último exige maior análise16, uma vez que o conceito de fonte é, em si mesmo, controverso devido à falta de conexões com a realidade econômica, i.e., com os fatos que deram causa a sua determinação, dado que, na maioria dos casos, os rendimentos serão de mais de uma fonte. Ademais, é bastante relevante que os critérios para a determinação da residência sejam de fácil administração, i.e., numa operação transnacional, o atual e o antigo Estado de residência disponham das informações necessárias para avaliar a base de cálculo e exigir a parcela tributável que lhes é pertinente.

O mesmo não se aplica para a residência de contribuintes pessoa jurídica, não apenas porque a justificação da residência fiscal está sujeita a inúmeras dificuldades17, mas, também, porque é muito complicado especificar critérios que possam ser adequadamente administrados para que a residência destes contribuintes seja determinada. A partir desta ótica, a residência das empresas é uma matéria complexa porque o choque entre as regras estabelecidas pela legislação doméstica e aquelas estabelecidas nos tratados de muitos países pode causar incertezas, especialmente para empresas multinacionais. Empresas não são como as pessoas físicas, e a consciência desta básica diferença é essencial quando se busca uma regra ou um conjunto de regras aceitável para se definir sua residência. De fato, empresas podem estar presentes em diferentes jurisdições a um mesmo tempo, um fato que aumenta a dificuldade em se determinar sua residência para fins fiscais.

De qualquer forma, é importante enfatizar que a maioria dos Estados usa uma combinação de critérios formais e materiais para determinar a residência fiscal das empresas. Os testes formais utilizados são tanto o local de sua constituição ou o local onde a diretoria da companhia esteja localizada; e os testes materiais realizados pela maioria dos países dizem respeito ao local onde efetivamente a gestão da companhia está localizada, teste esse baseado num cenário onde todos os fatos e circunstâncias sejam conhecidos ou acessíveis18 (all facts and circumstances test). Todos estes critérios foram criticados porque a residência das empresas é difícil de se definir e relativamente desprovida de sentido quando estabelecida a partir de critérios como o local de sua constituição, conceito muito formal e sujeito ao controle do contribuinte - da mesma forma que o critério da localização do conselho diretor da companhia -; não obstante, a residência baseada na localização da efetiva administração e do controle societário também pode ser manipulado19.

Do ponto de vista prático, o local da constituição da companhia e o local onde se verifica a diretoria da companhia são critérios de definição de residência que possuem a vantagem de serem simples e previsíveis para os contribuintes, para a administração pública e para os tribunais. Entretanto, estes critérios tem sido alvo de muitas críticas, uma vez que estudos empíricos demonstram que as decisões sobre constituir ou não uma companhia e sobre onde constituí-la, bem como onde alocar sua administração e conselho diretor, são influenciadas por motivações fiscais e, portanto, oportunidades para planejamento tributário e elisão fiscal podem surgir20. Ademais, quando uma companhia busca critérios formais para estabelecer residência num país que possua regimes fiscais favorecidos, certos riscos podem surgir, i.e., companhias podem ser incentivadas a constituir uma empresa para se beneficiar de regimes fiscais favorecidos sem que, necessariamente, haja um nexo genuíno com a jurisdição onde a empresa foi constituída21. Neste sentido, a utilização do local de constituição de uma companhia como elemento de conexão é um dos principais fatores para a adoção das cláusulas de limitação de benefícios, denominadas limitation on benefits (LoB clauses), em um número crescente de tratados internacionais para se evitar a bitributação22. Estas previsões são, de fato, um sintoma que evidencia que a mera constituição de uma empresa ou a localização da sua diretoria mostram-se como critérios que, em si mesmos, são inaceitáveis. A concorrência com outros elementos de suporte é necessária para que seja possível abrigar-se sobre o manto da proteção de um tratado para evitar a bitributação.

O ponto é que, mesmo se estes critérios formais não sejam suficientes, também não o são os critérios relativos à definição do local da efetiva gestão da companhia, uma vez que estes últimos critérios exigiriam uma análise caso a caso de todos os fatos e circunstâncias e, portanto, deixariam uma enorme margem de interpretação para as autoridades fiscais e para os tribunais23. Mais que isto, o local da efetiva gestão da companhia não é um critério fácil de se administrar uma vez que ele demanda que todos os fatos e circunstâncias relevantes sejam conhecidos, exigência que nem sempre será atendida facilmente pela administração tributária e pelos tribunais ao decidir o tema.

Por fim, o conceito de residência deveria ser de difícil manipulação para que não fosse ela (residência) facilmente disposta por um contribuinte num país e readquirida noutro, ou pelo menos, o conceito deveria garantir que mudanças na residência do contribuinte não alterassem facilmente o seu regime tributário. A partir desta perspectiva, constatamos que o uso de critérios formais possibilita manipulação do local de residência do contribuinte, forçando os Estados a estabelecerem restrições ou regras antiabuso que acabam por aumentar o nível de complexidade destas regras. Adicionalmente, a classificação formal pode dar causa a situações de dupla residência, o que pode gerar riscos de bitributação ou oportunidades para planejamentos fiscais, conforme demonstraremos abaixo. Como critérios formais aumentam a prática eletiva da residência por parte dos contribuintes por meio da definição do local a ser constituída uma companhia ou onde deve ser localizado o seu conselho diretor - especialmente quando se considera as empresas “star-ups” -, novas e mais severas regras para a definição da residência das empresas tem sido propostas24. Ademais, o Tesouro dos Estados Unidos da América (US Treasure), em seu Discussion Paper on Taxation of Electronic Commerce, sugeriu que “pode ser apropriada uma revisão da atual definição de residência e das regras de tributação”, mesmo sendo muito difícil estabelecer definições de residência fiscal para empresas que sejam adotadas e que evitem estes problemas25.

Embora a manipulação do critério de residência por pessoas físicas seja mais difícil, isto não significa que não podem surgir problemas, especialmente hoje em dia, em que a avaliação de permanência é virtualmente impossível em função do aumento da mobilidade dos indivíduos e da ausência de fronteiras em certas áreas geográficas. Portanto, oportunidades para planejamento tributário podem surgir e são de grande interesse para fins de tributação sobre herança e outras riquezas, que frequentemente usam um conceito de residência similar àquele utilizado para os fins da tributação sobre rendimentos. Esta é a razão porque também no campo da tributação das pessoas físicas o critério de residência e de residência ficta (fictious residence) sofreram alterações a fim de evitar mudanças oportunistas de residência para fins de obtenção de vantagens fiscais, embora novos problemas possam surgir destas alterações.

Considerações similares poderiam ser feitas com relação ao conceito de residência estabelecido pelas convenções internacionais sobre a dupla tributação, isto porque estas convenções incumbem a definição de residência às legislações domésticas e, portanto, uma diversidade de critérios também está presente nestes cenários. Neste sentido, o artigo 4(1) da OECD MTC lista um número de critérios tipicamente usados pelas legislações domésticas para definir residência e que devem ser interpretadas de acordo com as regras definidas pelas legislações locais26. Isto inevitavelmente produz - em adição à bitributação ou à dupla não tributação - problemas de dupla residência que devem ser resolvidos por meio da aplicação dos artigos 4(2) e 4(3) da OECD MTC, em que uma série de testes foram introduzidos a fim de atribuir residência exclusivamente a um dos Estados para fins de aplicação do tratado. Estes conflitos não são de fácil resolução porque, embora se assuma que as regras estabelecidas para a resolução destes conflitos de diferente conceitos de residência na legislação doméstica deva ser interpretado de maneira independente da própria legislação doméstica, a prática demonstra que há diferentes posições sobre as regras de resolução de conflitos (tiebreaker rule), mas geralmente baseadas ou influenciadas pelas regras de legislação doméstica27.

Ademais, a solução para os conflitos de dupla residência serão sempre controversos porque frequentemente dependem de dois conceitos vagos e amplos, i.e., o centro de vital interesse dos indivíduos e o local da efetiva gestão da companhia para empresas. Embora outras regras de resolução de conflitos para indivíduos sejam menos problemáticas e de sua aplicação surjam apenas problemas de prova, com respeito ao centro de interesse viral sua interpretação é mais frequentemente controversa. De fato, já foi sugerido que o centro de interesse vital dos indivíduos somente deveria ser declarado como ocorrido num dado Estado se suas relações econômicas e pessoais apontassem diretamente àquele Estado; se qualquer tipo de incerteza remanescesse, um terceiro critério de preferência deveria então ser aplicado28. Estas considerações também são relevantes com relação ao local da efetiva gestão de uma companhia, sobre cuja implementação repousam uma série de problemas em casos complexos, como companhias holding com um conselho diretor internacional que se encontra em diferentes locais, companhias multinacionais com subsidiárias localizadas em diversas partes do globo que são, de fato, administradas direta e completamente por sua matriz, ou companhias não operacionais com atribuições meramente de repasse de direitos de royalties, direitos financeiros e afins29 (conduit companies).

Em síntese, a determinação da residência deve ser realizada por meio de regras da legislação doméstica - devido à referencia feita pelo artigo 4(1) - através da aplicação de critérios heterogêneos cuja interpretação pelas autoridades fiscais e tribunais pode não ser idêntica e, inevitavelmente, isso pode dar causa a conflitos de residência e oportunidades de planejamento fiscal que devem ser examinados.

3. Residência Fiscal como um Elemento de Planejamento Fiscal

As interações entre conjuntos independentes de regras para a definição da residência fiscal estabelecido pelos países pode dar causa a fricções, incluindo potenciais conflitos de dupla residência, mas também criar lacunas em casos onde estas interações podem levar a uma dupla não tributação ou a um cenário de menor tributação. A interpretação dos países varia com relação a definição de residência e as circunstâncias que devem ser consideradas na sua determinação. Como se espera que contribuintes com maiores recursos financeiros tentem diminuir a carga tributária a que são submetidos ao mínimo possível, é natural que eles - ou mais provavelmente seus assessores tributários - estudem as regras fiscais de cada país e procurem utilizá-las em benefício próprio, elegendo, de alguma maneira, a sua residência fiscal. Portanto, a então denominada “eletividade” fiscal30 (residence electivity) pode ser um elemento importante para a busca por de vantagens fiscais em âmbito internacional (e.g., tax arbitrage), em função das diferentes definições de residência estabelecidas pelas legislações domésticas de cada país31.

A habilidade de eleger a residência e - como consequência - o seu uso como forma de planejamento fiscal é bastante diferente para indivíduos e companhias. Para os primeiros, residência é de certa forma uma circunstância dada que geralmente depende do local de nascimento, local da residência dos pais, ou nacionalidade. Em outras palavras, planejamento fiscal para indivíduos consiste em mover-se de um país para outro, transferindo residência e dando ensejo a problemas de alocação de jurisdição entre os Estados da antiga (adiante tratado como Estado de emigração) e da nova residência (adiante tratado como Estado de imigração). Por outro lado, companhias tem a oportunidade de selecionar o local de sua constituição e de seu conselho diretor, um fato que lhes possibilita analisar as consequências fiscais da eleição de um dado Estado, bem como definir o local de sua efetiva administração. Ademais, as empresas podem escolher alterar sua residência - não apenas sob um prisma fiscal - para mudar para outras jurisdições, seja por meio de uma mudança efetiva ou por meio de reestruturações complexas.

3.1. Transferência da residência por indivíduos e planejamento fiscal

Tomando a residência de um indivíduo como um fato dado, o seu uso para fins de planejamento fiscal é possível apenas por meio da sua transferência de um país para outro. A princípio, isto daria a entender que a forma mais fácil e eficiente de evitar a tributação interna num dado Estado seria simplesmente deixar esta jurisdição e mudar-se para outro Estado. Esta opção é mais clemente para o contribuinte, pois esta fórmula não requereria planejamentos fiscais sofisticados para ser implementada. Contudo, na prática, esta assunção não está correta, pois as implicações não fiscais de uma emigração, tais como o impacto emocional no contribuinte - e em sua família - que deve abandonar sua casa e seu país (e, portanto, amigos, parentes, trabalho, meios sociais etc.) não justificariam uma mudança apenas por motivações fiscais. Ademais, uma série de preparativos deveria ser providenciada (novo registro de seguridade social, plano de saúde, médicos, dentistas, numero de telefone etc.), e uma mudança de residência pode ainda ter um significativo impacto jurídico para o indivíduo, em seu regime matrimonial, regime de sucessão, pensões alimentícias, divórcio, a capacidade jurídica de suas crianças e regras sobre seu acesso a elas32.

Por esta razão, mesmo se ninguém discute que a transferência da residência pode também ter motivações fiscais33, este tipo de planejamento parece ser muito drástico e radical, pois implica numa emigração de fato. Portanto, este tipo de planejamento ocorre normalmente para indivíduos que possuem muita fortuna, que pensam não apenas em termos de tributação sobre seus rendimentos mas, também, na tributação sobre sua riqueza e herança34; ou para indivíduos que percebam altos rendimentos e que viajem muito em função da profissão que exercem, tipicamente esportistas e artistas. De fato, existem alguns casos notórios que merecem destaque: o famoso tenista alemão Boris Becker, cuja mudança de residência para Mônaco foi caracterizadas como simulação e, por isso, foi condenado por evasão fiscal35; o tenista espanhol Arantxa Sánchez Vicario, cuja residência em Andorra foi questionada pelas autoridades fiscais espanholas que aplicaram o conceito doméstico de residência36; ou o cantor de ópera Luciano Pavarotti, um caso de dupla residência que foi bastante controversa37. Nestes casos, a transferência da residência para um paraíso fiscal parece ter motivações fiscais. Se considerarmos suas fontes de renda, este tipo de contribuinte pode facilmente minimizar sua carga fiscal sobre a renda e também sobre suas riquezas, que normalmente segue os mesmos critérios de fixação de residência que o imposto sobre a renda dos indivíduos. Mas assumindo que a transferência de residência não é meramente simulada, estes tipos de mudanças de residência são legalmente inquestionáveis, mesmo se fortemente rejeitadas pela opinião popular38. Provavelmente, por esta razão, alguns países adotaram certos mecanismos de defesa a fim de dilatar o período de residência para os contribuintes nacionais que se movem para paraísos fiscais, medidas que produzem inevitáveis problemas.

De qualquer forma, problemas usualmente aparecem quando mudanças na residência ocorrem sem uma apropriada reestruturação dos ativos detidos pelos indivíduos. Se uma casa fica disponível e fontes de renda permanecem no país de emigração, as autoridades fiscais podem usar estes fatos como evidências para provar que o indivíduo ainda mantém sua residência naquele país. Esta é a razão pela qual conflitos de dupla residência surgem e a sua solução pode ser incerta e pode nem sempre ser baseada em regras de solução de conflitos (tie breaker rules) ou interpretações pertinentes destas regras.

Embora mudanças na residência estejam cercadas de relevantes implicações não tributárias e podem constituir uma medida radical, muitas alternativas podem ser encontradas pelos indivíduos para que eles possam diminuir sua carga tributária dependendo da jurisdição envolvida e, especialmente considerando os impostos sobre riquezas, herança e doações. Neste sentido, ativos podem ser realocados para outras jurisdições para evitar dupla tributação39, riqueza pode ser reorganizada para ser investida em jurisdições com regimes fiscais favorecidos, ou podem ser transferidas para entidades submetidas à baixa tributação caso as regras de CFC em sua residência não afete indivíduos. De qualquer forma, para fins de tributação sobre rendimentos, as possibilidades para a redução de carga tributária são menores, embora certos regimes que em combinação com regras de outras jurisdições podem produzir resultados significativos.

A este respeito, no Reino Unido e na Irlanda40, uma pessoa que seja residente mas não domiciliada nestes países é tipicamente submetida apenas à tributação sobre os rendimentos derivados de fontes situadas nestes territórios; enquanto fontes estrangeiras de rendimentos são tributáveis somente na medida em que estes rendimentos são repatriados41. Este regime fiscal foi objeto de debates políticos, mas apesar das propostas para sua reforma, fato é que ele continua em vigor e atrai para estas regiões novos contribuintes, convertendo o seu país num tipo de paraíso fiscal sob a proteção da União Europeia42, mesmo após as reformas de 2008 e 201143. Ademais, este regime pode levar a potenciais conflitos de dupla residência, porque como um sujeito residente mas não domiciliado geralmente mantém ativos e fontes de rendimento em regiões fora do Reino Unido, seu país de imigração poderia facilmente considerá-lo como residente. Ainda mais, como o não domiciliado é tributado somente nos rendimentos gerados por fontes domésticas, poder-se-ia questionar os fundamentos para ele ser considerado residente nesta região para fins de aplicação de tratados de bitributação, dado o texto normativo do artigo 4(1) da OECD MTC que prescreve que residência para fins de aplicação dos tratados “não inclui qualquer pessoa que é sujeita à tributação no país em função somente de rendimentos gerados por fonte situada no mesmo Estado ou por capital ali aplicado”. E não há uma solução comum para a questão, porque isto dependerá da visão adotada pelos Estados envolvidos quando da interpretação sobre o que significaria a expressão “sujeito à tributação”44.

De qualquer forma, a fim de resolver a questão, em 2003, as Revisões dos Comentários feitos a OECD MTC adicionaram o parágrafo 26.1 no artigo 4, tentando esclarecer que, nos casos de tributação sobre rendimentos gerados por fonte pagadora não residente, os contribuintes não estão sujeitos à potencial dupla tributação desde que o rendimento não seja enviado ao país de residência do indivíduo. Se, neste caso, é considerado inapropriado dar a eles o benefício da aplicação dos tratados, os comentários recomendam que os Estados signatários que acordem em restringir a aplicação do tratado aos rendimentos que são efetivamente tributados nos indivíduos não domiciliados, devem fazê-lo por meio da adição de previsões específicas neste sentido em seus tratados.

3.2. Residência das companhias e planejamento fiscal

Com relação às companhias, a primeira decisão motivada por questões fiscais - e portanto a primeira a ser detalhadamente planejada - é escolher o local da constituição da empresa e a localização de sua diretoria, porque estes elementos são decisivos para determinar a residência fiscal num dado país. Obviamente, a decisão sobre onde constituir uma empresa é influenciada por outras razões de natureza não fiscal, mas a carga tributária imposta desenvolve um importante papel45. Isto é uma consequência lógica se considerarmos a concorrência fiscal entre os países e os heterogêneos e assimétricos critérios das legislações domésticas para definir a residência fiscal da companhia, criando espaço para planejamentos fiscais e tax arbitrage. Algumas destas possibilidades, i.e., as entidades de propósito especial, como empresas conduit, sociedades holding etc., já foram analisadas e uma solução apropriada já foi desenvolvida tanto em âmbito de legislação interna como em tratados para evitar a bitributação46-47. Portanto, nós não iremos nos referir a este tipo de problema em planejamentos fiscais, mas àqueles relacionados à determinação da residência e os critérios utilizados para este fim.

A primeira e mais evidente alternativa para reduzir a carga tributária é constituir companhias ou estabelecer seu conselho diretor em paraísos fiscais. Entretanto, esta opção está longe de ser ótima, não apenas porque a luta contra paraísos fiscais é uma das grandes questões do Direito Tributário internacional48, mas também porque operar naqueles territórios pode criar uma série de preocupações com relação à falta de um adequado sistema jurídico e dificuldades em levantar fundos junto a terceiros. Portanto, não obstante a existência de medidas fiscais para combater o uso de paraísos fiscais49, problemas relacionado a questões legais, financeiras e matérias afins, limitam severamente o seu uso.

Isto ocorre principalmente porque a adoção de manobras em paraísos fiscais de fato não são necessárias para reduzir a carga tributária em função da existência de regimes tributários favorecidos em muitos dos países membros da OCDE e planejamentos fiscais sofisticados que permitem usufruir deles.

Neste sentido, o local da incorporação perde relevância em função das estruturas descentralizadas que caracterizam as companhias multinacionais (que estão crescentemente perdendo sua conexão com o local onde elas foram constituídas ou onde a sua diretoria está localizada), e dos locais onde elas administram seu caixa e as finanças do grupo, seus ativos intangíveis, ou de onde as atividades de P&D são desenvolvidas. De fato, nos últimos anos a maioria dos casos notórios discutidos é relacionada com o então denominado “low tax branches”50, um conceito definido no OECD Report on Base Erosion and Profit Shifting.

Neste tipo de estrutura uma companhia pode ser constituída e deter seu conselho diretor numa jurisdição de alta tributação, alcançando uma baixa tributação em seus rendimentos por meio da concessão de empréstimos, licenças ou serviços por meio de uma filial (branch) que é submetida a um regime de baixa tributação. Este planejamento tributário é especialmente conveniente porque não é necessário nem mesmo acesso a um país que seja formalmente reconhecido como uma jurisdição de regime fiscal favorecido (low tax jurisdiction), uma vez que uma análise detalhada dos regimes especiais de tributação oferecidos pelos países membros da OCDE permitiria a obtenção de vantagens fiscais para juros, royalties etc. no país em que a filial se localiza. O único requerimento a ser preenchido para se obter a economia fiscal é estabelecer a matriz (parent company) num país com regime de isenção para os rendimentos percebidos pela filial (branch), seja em função da legislação doméstica deste local ou seja em função de tratados.

Voltando aos problemas relativos à eleição de residência, o uso de diferentes elementos de conexão no âmbito da legislação doméstica pode causar dois países a concorrentemente tratar uma companhia como sua residente para fins fiscais. Além das dificuldades de aplicação do critério do local da efetiva administração como meio de resolução do conflito no âmbito dos tratados (tie breaker rule) - de acordo com o artigo 4(3) OECD MTC - deve-se ainda enfatizar que estes efeitos de dupla residência podem, às vezes, ser desejados para fins de planejamento tributário internacional. A princípio, a companhia pode querer evitar ser considerada residente em mais de um país, especialmente na ausência de um tratado. Entretanto, uma companhia pode desejar ser tratada desta forma para, por exemplo, se beneficiar de uma dupla consolidação de prejuízos, sendo este um exemplo bastante conhecido de tax arbitrage51.

Nestes casos, a duplicidade dos benefícios fiscais é obtida por meio do uso intencional de uma companhia constituída nos Estados Unidos, mas administrada e controlada por entidades localizadas em outro país e, portanto, residente (a companhia) em ambos os países conforme define as respectivas legislações tributárias. Por meio de empréstimos ou outros meios, a companhia com dupla residência é colocada numa posição de perda e esta perda é declarada em cada país por meio das regras de consolidação de resultados do grupo, sendo compensada com rendimentos obtidos em cada país. Como informado, não há elementos difusos, indiretos ou incidentais neste planejamento52, que poderia ser desenvolvido apenas em alguns poucos países e, portanto, serve como um incentivo para dirigir investimentos nesta direção. Este cenário está diretamente ligado com as regras de residência para companhias, que varia de maneira ampla e, que no caso dos Estados Unidos, é essencialmente eletiva53.

Outra razão pela qual a dupla residência pode ser interessante para fins de planejamento fiscal diz respeito à aplicação dos tratados para evitar a bitributação. Como o artigo 4(1) OECD MTC define o termo “residente de um Estado contratante” por meio de referência à legislação doméstica, uma companhia pode tentar acesso a uma rede de tratados (mais benéfica) de um outro país por meio de uma companhia de dupla residência. É óbvio que mudar o status da companhia de residência única para dupla residência cria acesso aos tratados do país de residência secundária e qualquer alíquota mais baixa de tributação na fonte estabelecida nestes tratados sem necessariamente aumentar a carga tributária total54. Neste contexto, pode-se entender as tentativas da OCDE para conter estas práticas por meio da atualização dos seus comentários feitos em 200855 em que uma interpretação ampla do segundo trecho do artigo 4(1) OECD MTC foi introduzido. Ainda mais, seria possível admitir que o conflito de dupla residência deveria ser resolvido de acordo com a regra de resolução de conflito (tie breaker rule) do artigo 4(3) OECD MTC. Entretanto, há muitos argumentos contrários ao método estabelecido pelo parágrafo 8.2 dos Comentários da OCDE ao artigo 4 OECD MTC, que é baseado numa incorreta interpretação deste segundo trecho do artigo 4(1) OECD MTC, uma previsão que claramente não foi destinada a lidar com estas situações56. Neste sentido, deve-se ter em mente que, ao lidar com este problema, John Avery Jones declarou que a solução “requer uma adição ao artigo 4 que deve ser contida em todos os tratados”57. Esta declaração é bastante significativa se considerarmos que - de maneira semelhante ao parágrafo 8.2 dos Comentários ao artigo 4(1) - ele propôs que o artigo 4 “preveria que o residente de um Estado, no âmbito de um tratado, seria a pessoa sujeita à obrigação tributária naquele estado consoante sua legislação interna, em função de uma lista de critérios que não incluiria um Estado que fosse derrotado num conflito de dupla residência no âmbito de qualquer outro tratado58. Não obstante, quer parecer óbvio que, sob a ótica legal, uma solução que requeira a modificação de uma rede de tratados não pode ser obtida por meio da modificação nos Comentários da OCDE no OECD MTC.

Consequentemente, mesmo se algumas vezes as companhias com dupla residência poderiam levantar certas dúvidas, uma oportunidade de planejamento fiscal pode também estar presente devido a uma assimetria na determinação da residência fiscal pelas legislações domésticas. Ademais, o uso de diferentes elementos de conexão da legislação doméstica pode gerar lacunas que poderiam ser usadas para desenvolver planejamentos fiscais resultando em, por exemplo, não residência (non-residence) ou ausência de Estado tributante (tax stateleness). Precisamente, o memorando elaborado pelo Senado dos Estados Unidos59 relativo ao caso da Apple Inc. descreve a inesperada consequência da conexão entre a definição de residência na legislação doméstica dos Estados Unidos e Irlanda. Embora constituídas na Irlanda, Apple Operations International (uma socidade holding offshore) e Apple Sales International (recipiente para os direitos de propriedade intelectual), são geridas e controladas a partir dos Estados Unidos. Com esta estrutura, Apple tira vantagem das disparidades entre as regras de residência irlandesas e norte americanas, porque as companhias não são residentes na Irlanda - onde a residência é determinada pelo local da efetiva gestão e controle da companhia - e nem nos Estados Unidos - onde a residência é determinada pela constituição da companhia em qualquer de seus Estados federados - e, portanto, declaram não possuírem residência fiscal em nenhuma das jurisdições. Citando as declarações dos subcomitês “Apple vem realocando seus lucros para suas subsidiárias irlandesas que não possuem residência fiscal em lugar nenhum, não para beneficiar-se de um regime fiscal irlandês de baixa tributação, mas para tomar vantagem de uma disparidade entre as regras de residência irlandesa e norte americana e, assim, evitar o recolhimento de impostos a qualquer um dos Estados.”60

Embora os dados disponíveis sejam insuficientes para estudar apropriadamente este caso, é de fato surpreendente que após uma declaração sobre a necessidade de se colocar um fim às companhias que não detêm residência para fins fiscais em qualquer país, as recomendações do Subcomitê não tenham feito referência às regras de residência, i.e., o Memorandum definiu cinco passos relativos a regras de preço de transferência, as regras de “check the box” e “look through”, regras de CFC, da exceção do mesmo país (same country exception) e da regra da exceção da industrialização (manufacturing exception), mas renunciou a desenvolver guideliness com relação ao conceito de residência, um aspecto que, no final, se mostra essencial.

Diferenças nos critérios domésticos também dão causa a planejamentos fiscais por meio da alteração da residência fiscal. Entretanto, exceto reestruturações societárias complexas sujeitas a restritas regras de garantia de sua substância61, vantagens hipotéticas de alteração de residência são reduzidas em razão da adoção de medidas antielisivas e da tributação na saída por muitos países. Estas regras são controversas, pois podem oferecer certa constrição na livre iniciativa que, fora a presença nos sistemas jurídicos da União Europeia, constitui um standard mútuo entre a maioria dos países.

4. Enfrentando o Planejamento Fiscal por Meio de Residência

Como os planejamentos fiscais são elaborados a partir da natureza heterogênea das definições de residência, o resultado é quase sempre um uso inapropriado dos tratados e, portanto, pode-se optar por combater estas condutas por meio de métodos tradicionais de contenção de práticas de treaty shopping, que existem desde 1977, quando a OCDE editou o OECD MTC 1977. Ainda que sucessivas alterações no OECD MTC tenham incluído algumas medidas para permitir benefícios fiscais somente a entidades que possuíssem nexo suficiente com o país de residência, a maioria das previsões antitreaty-shopping da OCDE tendem a ser amplas e vagas, com tendência a gerar dificuldades de interpretação quando aplicadas na prática62.

A análise destas medidas está fora do escopo deste trabalho, onde o nosso foco serão duas previsões específicas, diretamente ligadas com alteração na residência: extensão da responsabilidade tributária como medida protetiva (extended tax liabilities ou trailing taxes) e tributação na saída (exit taxes). De um lado, a extensão ilimitada da responsabilidade tributária baseia-se na premissa de que o contribuinte emigrante continua passível de ser considerado residente do país do qual se mudou apesar do fato de que ele já estabeleceu residência para fins fiscais noutro país. Por outro, a tributação na saída trata o ato de emigração como sendo um fato jurídico tributável, resultando na ficção de que todos (ou alguns) os seus bens foram alienados, afetando as obrigações tributárias latentes que existiam ao tempo da emigração63. De qualquer forma, as duas medidas, quando aplicados pelos países de emigração conflitariam com os tratados para evitar dupla tributação sendo, de alguma forma, controversas.

4.1. A extensão de residência

Obviamente, o país de emigração pode sempre contra-atacar supostas transferências de residência considerando-as simuladas, de acordo com sua legislação interna ou doutrina. Neste caso está fora de questão que, ao aplicar regras ou precedentes relativos à simulação, as autoridades fiscais estão determinando quais os fatos que dão causa à responsabilidade tributária e agindo, portanto, de acordo com os tratados para evitar bitributação64. De fato, as autoridades fiscais vem aumentado suas atenções para este campo, especialmente quando os indivíduos mudam-se para paraísos fiscais ou países vizinhos conhecidos por permitir que contribuintes percebam rendimentos isentos de tributação sendo que, não houvesse a transferência de residência, tal isenção não ocorreria.

Mesmo se considerarmos uma transferência de residência de fato, os países de emigração podem aplicar mecanismos de defesa a fim de desincentivar comportamentos motivados por interesses meramente fiscais. Neste sentido, países escandinavos editaram normas para negar status de não residência para não residentes temporários (short-term leaves) no contexto da responsabilidade fiscal ilimitada dos contribuintes (unlimited extended tax liabilities). Assim, as regras basicamente preveem uma inversão do ônus da prova, i.e., cabe ao contribuinte, ao invés das autoridades fiscais, fornecer evidências de que ele está rompendo com todos os laços relevantes anteriormente mantidos com seu país de antiga residência. Ainda que se possa compreender a política fiscal por detrás destas regras, e conquanto os limites à responsabilidade fiscal apliquem-se somente a pessoas que efetivamente deixaram o país de emigração, o conteúdo destas regras está sujeito a críticas.

Em primeiro lugar, não está claro qual os tipos de evidência que os contribuintes devem fornecer a fim de comprovar sua efetiva saída do país e, especialmente, qual o peso que um certificado de residência teria como um tipo de evidência. O princípio da proporcionalidade deveria desempenhar seu papel na busca por soluções que sejam compatíveis com o sistema jurídico, especialmente levando em consideração o quanto varia a importância do certificado de residência entre as diversas jurisdições. Isto deveria ser uma preocupação no âmbito dos tratados internacionais para se evitar a bitributação, porque se as autoridades fiscais impuserem um ônus de prova maior nos contribuintes que tentam determinar sua residência entre várias jurisdições que o exigido num caso ocorrido inteiramente em ambiente interno (pure domestic case), haverá um problema relacionado ao quão compatível esta situação seria com os objetivos e propósitos de um tratado65.

Em segundo lugar, este tipo de regra não parece ser muito compatível com os tratados internacionais que são normalmente baseados em residência e que não oferecem nenhum tipo poder de tributar adicional ao Estado em que o contribuinte seja nacionalizado (national). Neste sentido, a aplicação deste tipo de regras pelo país de emigração certamente resultará num conflito de residência com o país de imigração, que geralmente será resolvido em benefício do último, consoante as regras de resolução de conflitos dos tratados (tiebreaker rules). Ademais, a atribuição de responsabilidade tributária ilimitada nos termos da legislação interna não pode ser imposta de forma eficaz aos emigrantes no âmbito dos tratados, a não ser que o tratado traga previsão expressa para tanto. De fato, responsabilidade tributária ilimitada é efetiva somente - no âmbito dos tratados - conquanto o país de emigração tenha preservado seu direito de aplicar a referida regra no tratado em questão. Portanto, países que aplicam este tipo de regra celebraram tratados para permitir ao Estado de emigração o poder de tributar seus emigrantes em conformidade com estas regras66.

Em terceiro lugar, mesmo que um tratado permitisse a extensão da residência, este tipo de medida dá causa a bitributação internacional uma vez que ambos os países de emigração e imigração considerarão o contribuinte como sendo seu residente, sujeitando-o à tributação em sua renda global (worldwide income). Provavelmente os países garantirão ao contribuinte a compensação do imposto pago (crédito ou isenção) em outro país em função de renda percebida neste outro país67. Mas este fato ainda não está devidamente claro porque o país de imigração pode dar causa ao conflito de dupla residência e, uma vez tendo resolvido em seu favor, conceder a compensação do imposto pago pelo contribuinte somente com relação aos rendimentos produzidos no país de emigração (sourced in the emigration country). Ademais, como também não está claro se o país de emigração permitirá a compensação do imposto exigido pelo país de imigração em função de renda produzida num terceiro país, então deve-se concluir que é necessário refletir sobre o significado e justificação destas regras.

De qualquer modo, deve ser enfatizado que também neste campo, diferenças entre regras criadas pelos países em suas legislações internas se dão em diversos aspectos: (i) há regras que se aplicam somente se o país de imigração é um paraíso fiscal, mas outros fatores do país de imigração são irrelevantes; (ii) em alguns casos a prova pelo contribuinte da mudança efetiva de residência é permitida, enquanto que em outros casos a regra de residência ficta estabelece uma presunção iuris et de iure de residência; e (iii) o período de extensão da responsabilidade tributária é geralmente limitado a três, cinco ou dez anos, mas há alguns cenários em que a extensão da residência se dá em caráter perpétuo, o que pode ser considerado um pleno abuso.

Por fim, as medidas em questão apresentam problemas de administração, porque se um contribuinte emigrante não tem nenhum ativo no país de onde emigrou, será difícil para este último exigir seus tributos, exceto nos casos em que haja mecanismos de cooperação entre as administrações públicas. Portanto, é notável que, quando se analisa a transferência de residência do contribuinte pessoa física, nenhum mecanismo de recuperação de tributos do contribuinte emigrante foi reportado. Isto é relevante porque os países de emigração são geralmente deixados com poucos ou nenhum ativo contra os quais estes países poderiam exigir os tributos devidos pelo contribuinte emigrante e, exceto dentro da União Europeia, estes países não podem se valer de sua rede de tratados para recuperações internacionais de impostos devidos pelo emigrante (cross-border recovery of taxes) devido à falta de cooperação entre os países neste campo68.

4.2. Impostos na saída (emigração)

O segundo tipo de medida adotada pelos países de emigração para con­tra-atacar a transferência de residência para fins fiscais denomina-se “tributação na saída” (exit taxes) que trata o ato de emigrar como hipótese de incidência resultante da alienação ficta dos bens e direitos do contribuinte emigrante, afetando a obrigação tributária latente e existente à época da emigração. Como nesta área um grande número de situações toma lugar em diferentes configurações, parece ser impossível realizar uma análise apropriada69 e, portanto, considerações gerais devem ser feitas levando-se em conta o tipo de medida e seus efeitos para contribuintes pessoa física e jurídica.

Dentre elas, o primeiro que deve ser considerado diz respeito à antecipação do pagamento de obrigações fiscais que o contribuinte incorreu no país de onde emigrou; mesmo que não haja propriamente tributação na saída. Neste sentido, para garantir que um emigrante não tenha obrigações pendentes, muitos países introduziram o conceito de pagamento na saída (pay as you go) e, seja ex officio ou seja em função do poder discricionário das autoridades fiscais, esta regra exige que o contribuinte que deixa sua residência no país atenda a uma série de formalidades administrativas a fim de se estabelecer uma avaliação prévia do imposto devido no ano da saída e o seu devido pagamento70.

A razão de ser da tributação geral na saída e da tributação na saída limitada a certos ganhos de capital - geralmente advindo de valores mobiliários e afins - está relacionada com a interconexão existente entre a tributação de não residentes no país de emigração e os tratados para evitar a bitributação71. A tributação geral na saída tem por foco a exação dos rendimentos que não poderiam ser tributados após a mudança de residência porque esta prática poderia ofender o regime de tributação aplicável aos não residentes ou os tratados internacionais. Entretanto, se a tributação na saída somente afeta os rendimentos não realizados pelo antigo residente que não poderiam ser tributados após uma mudança de residência em função da existência de um tratado, esta medida certamente poderia contrariar o tratado em vigência. Portanto, parece sem sentido aplicar a regra geral de tributação na saída para ganhos de capital latentes que correspondam a ativos que permaneceriam no país de emigração onde a tributação poderia ser aplicada com base no regime fiscal doméstico atribuído a não residentes e nos tratados em vigência. Esta medida pode parecer desproporcional, pois o poder de tributar do Estado de emigração e sua capacidade de efetivamente recolher os tributos devidos parecem adequadamente garantidos.

Considerando esta justificativa, a alocação balanceada dos direitos de tributar entre as jurisdições parece ser a única motivação para se aplicar a tributação na saída, o que implicaria em dirigir esta tributação aos ganhos efetivamente acumulados pelo contribuinte enquanto ele ainda era residente no país de emigração e que não poderiam ser tributados após a transferência de residência72. Isto exige uma série de articulações na forma como a tributação na saída ocorre para que esta se limite aos ganhos sobre os quais o país de emigração não teria mais acesso após a transferência de residência, em função dos tratados em força. Esta seria uma forma apropriada de proteger o princípio da territorialidade no campo internacional ao mesmo tempo em que obriga os Estados a tomarem responsabilidade em estabelecer formas eficientes para que os não residentes sejam tributados. Portanto, nenhuma tributação imediata dos ganhos não realizados deveria ser permitida se, em âmbito doméstico, o país de emigração não tributa os ganhos; não apenas por questões de consistência - esta tributação não poderia ser justificada pela necessidade de se alocar adequadamente o poder de tributar entre os Estados - mas também por respeito às regras de não discriminação. Ademais, como a tributação na saída se aplica aos ganhos ainda não realizados, é duvidoso se o país de emigração deveria considerar ou não qualquer decréscimo do valor dos ativos após a transferência da residência. Mesmo que a Corte de Justiça Europeia tenha sugerido esta posição em “n” casos, não se pode concordar com este entendimento porque não é coerente com a alocação do poder de tributar, uma vez que o país de emigração não poderá tributar eventuais acréscimos no valor dos ativos após a transferência de residência73. Por último, a fim de se submeter adequadamente os ganhos de capital latentes à tributação, faz-se necessária a observância de regras de avaliação (valuation rules) porque, como não se está diante de uma real transação, discussões sobre a base de cálculo do imposto sempre existirão.

Na tributação na saída, os ganhos de capital acumulados são tributados no Estado de residência de seus proprietários instantes antes de eles deixarem de ser residentes, muito embora não exista nenhuma transação real envolvendo a alienação dos ativos, com base numa ficção legal. Portanto, esses impostos incidem em ganhos de capital não realizados, o que pode causar ofensa ao princípio da capacidade contributiva e gerar problemas de liquidez74. Isto pois, não está claro se a necessidade de uma alocação balanceada no poder de tributar entre os Estados poderia dar causa à tributação na saída, sob a ótica constitucional interna de países onde a capacidade contributiva é um princípio constitucional informativo da ordem tributária. Mesmo se o argumento da iliquidez não seja convincente, porque as autoridades fiscais podem facilitar o pagamento dos impostos - i.e., diferimentos ou programas de parcelamento - existem preocupações muito sérias com relação ao problema das regras de avaliação75. Caso a tributação na saída não seja perfeitamente definida, pode ocorrer a tributação de ganhos de capital que jamais poderiam existir.

O aspecto mais controverso na tributação na saída é, no entanto, relacionado com a sua compatibilidade com os tratados internacionais e o risco de dupla tributação que pode surgir de sua aplicação. A este respeito, nem a OCDE nem a ONU estabeleceram previsões específicas, seja para contribuinte pessoa física ou jurídica; mesmo em anos recentes, Estados começaram a fazer emendas aos seus tratados bilaterais numa tentativa de eliminar a dupla tributação nestes casos. É verdade que o Direito Tributário internacional não proíbe os países de impor tributos na saída de seus residentes e, por esta razão, os países de emigração acreditam que a introdução deste tipo de tributação não configura violação aos tratados (treaty override). Os principais argumentos neste sentido são os seguintes: (i) como o imposto incide pouco antes da residência ser alterada, pode-se dizer que o contribuinte ainda é residente do país de emigração no momento da exação; (ii) como os tratados alocam o poder de tributar no caso da alienação de ativos, não há que se falar em conflitos de jurisdição na imposição da tributação na saída, pois o fato gerador do tributo não envolve alienação; e (iii) não há dupla tributação - ao menos em seu sentido técnico - uma vez que a dupla tributação implica em dois diferentes países exigindo impostos sobre um mesmo fato ocorrido ao mesmo tempo, o que não seria o caso na tributação na saída que incide apenas no país de emigração.

Não obstante, estes argumentos não são suficientemente persuasivos, isto porque a tributação na saída se mostra contrária a ratio de alocação da jurisdição tributária presente nos tratados. Neste sentido, ambos os comentários da OCDE e da ONU alocam as jurisdições tributárias para fins de tributação do ganho de capital na alienação de ativos (que não bens imóveis, ativos de estabelecimento permanente, aviões e navios) de maneira muito clara. O direito exclusivo de tributar os ganhos de capital obtidos com a alienação de bens de propriedade pessoal é atribuído ao Estado de residência do alienante, exceto, com base no modelo de tratado da ONU, onde o direito de tributar os ganhos de capital na alienação de participação societária relevante recai sobre o Estado onde a companhia está localizada. Pode-se assumir que países que usam este modelo, sem qualquer reserva, aceitam que contribuintes poderiam um dia transferir sua residência e, portanto, aceitam que os países de emigração poderiam perder sua jurisdição tributária sobre em virtude destas previsões76.

De fato, o parágrafo 7 dos Comentários ao artigo 13 do OECD MTC estabelece que “há, (...), legislações tributárias em que a valorização do capital e a reavaliação de ativos são tributadas mesmo se não há qualquer alienação envolvida”. Ademais, como o termo “alienação” deve ser interpretado extensivamente a fim de cobrir todas as transações ou eventos que produzam ganhos nos termos da legislação doméstica, seria possível entender que os casos de alienação ficta estariam abarcados pelo artigo 1377. Entretanto, uma vez devidamente contextualizada, esta previsão normativa não daria suporte a este entendimento de que países estariam permitidos a tributar ganhos não realizados que foram acumulados durante o período anterior à emigração. Primeiro porque se considerarmos as versões anteriores do OECD MTC não seria fácil afirmar que a transferência de residência seria uma alienação, nos termos do que define o artigo 13 do OECD MTC78. Em segundo lugar, os parágrafos 8, 9 e 10 dos Comentários, ao lidar com a tributação de valorização de um ativo que não foi alienado, mencionam que tal tributação somente ocorreria no caso de uma reavaliação contábil de ativos ou na transferência de um ativo do estabelecimento permanente de uma empresa num Estado para outro estabelecimento permanente ou matriz da mesma companhia num outro Estado. Portanto, se somente estas duas hipóteses foram tratadas como similares à alienação de propriedade, torna-se difícil de se aceitar que outras opções para se estabelecer a tributação na saída contra ganhos de capital obtidos em operações de alienação ficta se encaixariam no referido artigo 13 da OECD MTC.

De qualquer forma, não há dúvidas de que a tributação na saída do contribuinte cria situações de dupla tributação e pode ser questionada quando a noção de dupla tributação mencionada acima não é definida de forma tão restrita: o que importa não é ter dois impostos incidindo no mesmo ano, mas se estes impostos se relacionam com rendimentos acumulados em períodos idênticos79. A partir deste ponto de vista, fica claro o bastante que o evento de expatriação que resulta na alienação ficta de propriedade possui o potencial de gerar uma dupla tributação, ou mesmo tripla, pois além da tributação no país de emigração, ainda há de se considerar a tributação do ganho de capital no país de imigração - como país de residência - e, ocasionalmente, a tributação incidente no país da fonte dos rendimentos onde os ativos alienados estão localizados no caso de o tratado aplicável assim permitir80. Portanto, a edição de novas normas para a tributação da saída do contribuinte, no âmbito da legislação interna, sem tomar qualquer medida para evitar a dupla tributação internacional, deixando esta função para o país de imigração de forma unilateral ou, no máximo, por meio de um acordo mútuo, via tratado internacional, não parece ser aceitável81.

Finalmente, mesmo que se considere que um dos objetivos da tributação na saída seja a prevenção da elisão fiscal, esta intenção antielisiva não seria suficiente para justificar a imposição deste tipo de tributação. De fato, o parágrafo 9 dos Comentários ao artigo 1 da OECD MTC considera que a emigração para realizar ganhos de capital sem a incidência de impostos num outro país de residência constitui uma violação abusiva dos tratados. No entanto, mesmo que se aceite que os Comentários da OCDE seriam um parâmetro suficiente para dar o suporte legal necessário à legislação interna para estabelecer este tipo de medida antiabuso, num contexto de tratados para evitar a dupla tributação82, o parágrafo 10 dos Comentários sugere que os Estados contratantes deveriam acordar que o tratado em questão não afetaria a aplicação da regra da legislação interna. Não obstante, a tributação na saída é introduzida unilateralmente sem a devida observação ao regime tributário aplicado fora do país e muito poucos tratados expressamente autorizam a sua aplicação em âmbito bilateral, portanto esta forma de tributação continuaria contrária à intenção manifestada no parágrafo 10 dos Comentários da OCDE ao artigo 1.

Como o número de países que estabelecem a tributação na saída deve aumentar, parece necessário reconsiderar este tipo de tributação para que se possa alinhar os seus objetivos com aqueles dos tratados internacionais para se evitar a bitributação. Para tanto, a determinação de um valor comum à propriedade dos ativos analisados, quando da transferência de residência, deveria desempenhar um papel crítico. Portanto, este sistema só terá sucesso se desenvolvido em âmbito bilateral ou multilateral. Ainda, é altamente recomendável a inclusão de procedimentos para se determinar um valor comum entre as autoridades competentes dos dois países envolvidos e o contribuinte, talvez por meio de um procedimento de apelação ou arbitragem83. Ademais, se a razão de ser da tributação na saída do contribuinte é baseada na alocação balanceada dos poderes de tributar entre os Estados, é possível buscar mecanismos mais adequados para se alcançar este propósito. Em princípio, a troca de informação e procedimentos de assistência administrativa deveria ser suficiente para se garantir a chance de o país de emigração avaliar o ganho de capital gerado durante o período de residência, evitando os efeitos indesejáveis da tributação na saída do contribuinte do país.

5. Conclusão

Como mencionado, a interconexão entre os diversos critérios aplicados pelas legislações domésticas para definir residência pode gerar oportunidades de planejamento fiscal (dentre as quais, tax arbitrage) incentivadas em razão da concorrência fiscal entre os países. Tentativas de limitar estas possibilidades de planejamento tributário forçaram os Estados a adotar certas medidas que frequentemente dão causa a problemas de compatibilidade com tratados internacionais para se evitar a bitributação ou comportamentos que violam estes tratados (tax treaty override).

A análise desenvolvida nos permitiu verificar como a consciência sobre estes problemas não produziu uma maior reflexão sobre o conceito de residência utilizado nos tratados, que parece deter um conteúdo vazio e, portanto, somente relacionado com a produção de uma responsabilidade tributária ilimitada do contribuinte. Entretanto, está claro que deve ser desenvolvida uma ampla reconsideração sobre a definição de residência e sobre a possibilidade de se manter estes critérios atuais, que não são mais adequados para se buscar resultados efetivos. Não acreditamos que a residência deveria deixar de ser utilizada como um elemento de conexão, porém o critério atualmente utilizado para sua definição não parece ser o mais apropriado num mundo em que a mobilidade de pessoas e de fatores de produção está maior do que nunca.

Mudanças significativas numa economia altamente globalizada, em que mercados e agentes estão interconectados e interagem de forma bastante natural, não foram devidamente refletidas nos tratados ou, pelo menos, não na estrutura e no conteúdo sugeridos pela OCDE e ONU. A frequência com que as mudanças ocorrem nos Comentários aos tratados contrastam com a imutável natureza dos textos de seus modelos, que refletem categorias de rendimentos desatualizadas - típicos dos antigos impostos impessoais - que não correspondem a atual realidade. De fato, os Modelos de Convenção como conhecemos são de todo incompatíveis com o tratamento dado pelas transações econômicas internacionais, conforme demonstrado pelas dificuldades no tratamento de produtos financeiros híbridos, entidades híbridas etc.

Apesar do fato de não estarmos otimistas sobre as possibilidades de sucesso das propostas por cooperação global e coordenação de assuntos tributários84, é verdade que parece necessário uma reconsideração profunda destes Modelos. Uma reconsideração que provavelmente requererá uma harmonização das instituições e conceitos dos tratados internacionais e que parece particularmente necessária quando se considera a determinação da residência dos contribuintes como o principal pilar na definição do escopo subjetivo dos tratados. Este tipo de harmonização pode permitir limitações mais efetivas às possibilidades de planejamento tributário que as medidas já analisadas, cuja adequação ao sistema tributário internacional é muito mais questionável.

1 Tem se tornado comum atribuir-se a este Report um papel fundamental na formatação do moderno regime de tributação internacional; cf. AVI-YONAH, Reuven S. “The Structure of International Taxation: a Proposal for Simplification”. Texas Law Review v. 74. Texas, 1995/1996, p. 1.305.

2 Isto porque algumas vezes o conceito de residência é usado para fins de tributação sobre rendimentos, heranças e outras riquezas. Cf. RUST, A. “The Concept of Residence in Inheritance Tax Law”. In: MAISTO, Guglielmo (ed.). Residence of Individuals under Tax Treaties and EC Law. Amsterdã: IBFD, 2010, p. 87.

3 Cf. AVI-YONAH, Reuven S. “Globalization, Tax Competition, and the Fiscal Crisis of the Welfare State”. Harvard Law Review v. 113, 2000, pp. 1.576-1.579.

4 Cf. SHAVIRO, Daniel. “The Rising Tax-Electivity of U.S. Corporate Residence”. Tax Law Review v. 64. Nova York: 2011, p. 377.

5 Note que o IFA dedicou seu Congresso de 2002 a este assunto, cf. “IFA The Tax Treatment of the Transfer of Residence by Individuals”. Cahiers de Droit Fiscal International v. 87b. Holanda: Kluwer, 2002.

6 Que ainda é utilizada por Estados Unidos, cf. VACOVEC, Kenneth J.; e BEUTLER, Todd M. “United States”. “IFA The Tax Treatment of the Transfer of Residence by Individuals”. Cahiers de Droit Fiscal International, v. 87b. Holanda: Kluwer, 2002, p. 597.

7 Cf. CARRERO, J. M. Calderón. La doble imposición internacional y los métodos para su eliminación. Madri: McGraw-Hill, 1997, pp. 27-28.

8 Cf. NIKOLAKAKIS, A. “Civil Law and Common Law Perspectives: a vie from the left”. In: MAISTO, Guglielmo (ed.). Residence of Individuals under Tax Treaties and EC Law. Amsterdã: IBFD, 2010, pp. 76-77.

9 Em adição às referências que se podem encontrar no IFA Branch Reports, 2005, ob. cit., p. 97; e “IFA Source and residence: new configuration of their principles”. Cahiers de Droit Fiscal Internacional, v. 90a. Holanda: Kluwer, 2005, p. 58. E The Branch Reports; vide para contribuintes pessoa física The Country Reports. In: MAISTO, Guglielmo (ed.). Residence of Individuals under Tax Treaties and EC Law. Amsterdã: IBFD, 2010, p. 197; e para contribuintes pessoa jurídica The Country Reports, cf. MAISTO, Guglielmo (ed.). Residence of Companies under Tax Treaties and EC Law. Amsterdã: IBFD, 2009, p. 311.

10 Cf. CARRERO, J. M. Calderón, ob. cit., p. 28.

11 Cf. WHEELER, Joanna. “The missing keystone of income tax treaties”. World Tax Journal v. 3. Amsterdã, 2011, p. 251; neste sentido também, cf. OECD. “Addressing base erosion and profit shifting”. OECD Publishing, 2013, p. 34, que declara “residência, para os fins do tratado, depende da sujeição à tributação nos termos da legislação doméstica do país do contribuinte”.

12 Cf. RUST, A., ob. cit., p. 85.

13 Cf. SCHINDEL, Angel; e ATCHABAHIAN, Adolfo. “General report. IFA Source and residence: new configuration of their principles”. Cahiers de Droit Fiscal International v. 90a. Holanda: Kluwer, 2005, p. 31.

14 Cf. MÖSSNER, Manfred. “Source versus Residence: and EU perspective”. Bulletin for International Taxation v. 60. Amsterdã: IBFD, 2006, p. 505.

15 Cf. AVI-YONAH, Reuven S. “Tax competition, tax arbitrage and the international tax regime”. Bulletin for International Taxation v. 61. Amsterdã: IBFD, 2007, p. 134.

16 Cf. AVI-YONAH, Reuven S. 1995/96, ob. cit., pp. 1.311-1.312; e SCHIDEL, Angel; ATCHABAHIAN, Adolfo, ob. cit., p. 31.

17 Cf. AVI-YONAH, Reuven S. “The structure of international taxation: a proposal for simplification”. Texas Law Review v. 74. Texas, 1995-1996, p. 1.313.

18 Cf. BROE, Luc de. “Corporate tax residence in civil law jurisdictions”. In: MAISTO, Guglielmo. 2010, ob. cit., p. 96.

19 Cf. AVI-YONAH, Reuven S. “Tax competition, tax arbitrage and the international tax regime”. Bulletin for International Taxation v. 61. Amsterdã: IBFD, 2007, p. 134.

20 Cf. WEBER-FAZ, Rudoph. “Corporate residence rules for international tax jurisdictions: a study of American and German law”. Harvard Journal on Legislation v. 5, 1967-1968, p. 228.

21 Cf. BROE, Luc de. 2010, ob. cit., p. 101.

22 Cf. WHEELER, Joanna. 2011, ob. cit., pp. 294-295.

23 Cf. BROE, Luc de. 2010, ob. cit., p. 102.

24 Cf. SHAVIRO, Daniel. 2011, ob. cit., p. 413.

25 Cf. AVI-YONAH, Reuven S. 1995/96, ob. cit., p. 1.596.

26 Cf. WIDRIG, Marcel. “The expression ‘by reason of his domicile, residence, place of management...’ as applied to the Companies”. In: MAISTO, Guglielmo. 2010, ob. cit., pp. 273-274.

27 Cf. SASSEVILLE, Jacques. “History and interpretation of the tiebreaker rule in the Art. 4(2) of the OECD Model Tax Convention”. In: MAISTO, Guglielmo. 2010, ob. cit., p. 162.

28 Cf. BAKER, Philip. “The expression ‘Centre of Vital Interest’ in Art. 4(2) of the OECD Model Convention”. In: MAISTO, Guglielmo. 2010, ob. cit., p. 173.

29 Cf. WEEGHEL, Stef van. “Article 4(3) of the OECD Model Convention: an Inconvenient truth”. In: MAISTO, Guglielmo. 2010, ob. cit., p. 305.

30 Nos termos utilizados por SHAVIRO, Daniel. 2011, ob. cit., p. 377.

31 Para mais sobre residência como um elemento de tax arbitrage, cf. ROSENBLOOM, H. David. “International tax arbitrage and the international tax system”. Tax Law Review v. 53, 1999/2000, p. 140.

32 Cf. ZANTBEEK, Anton van. “Tax-Driven relocation of high net worth individuals: where to run to?” European Taxation v. 50. Amsterdã: IBFD, 2010, p. 196.

33 Cf. BROE, Luc de. General report. 2002, ob. cit., p. 28.

34 Para mais exemplos de expatriados famosos dos Estados Unidos, veja: HALABI, Oz. “Expatriation tax - renouncing a tax treaty”. Bulletin for International Taxation v. 66, n. 9. Amsterdã: IBFD, 2012, p. 377.

35 Uma descrição detalhada e precisa do caso pode ser encontrada no site da BBC. Disponível em http://news.bbc.co.uk/2/hi/europe/2355147.stm. Acesso em 5 de setembro de 2013.

36 Veja o caso 7270/2009 do Tribunal Supremo, 11 de Novembro de 2009; e ZANTBEEK, Anton van. 2010, ob. cit., p. 197. Com relação à aplicação de tie breaker rules pelo tribunal espanhol veja IBARROLA, Aitor NAVARRO. “Los critérios para dirimir la doble residência internacional en la jurisprudencia spañola”. Quincena Fiscal nº 9, 2012.

37 A controvérsia surgiu em razão de uma interpretação da tie breaker rule pela Corte Fiscal de Segunda Instância. Ao rejeitar o recurso apresentado pelo contribuinte a Corte desconsiderou evidências relacionadas com sua residência em Mônaco, considerando apenas os fatos e circunstâncias que ligavam o cantor com a Itália. A razão principal parece estar relacionada com o fato de que as atividades produtoras de renda do artista levariam à conclusão paradoxal de um indivíduo não deter um domicílio para fins fiscais e, portanto, não ter qualquer responsabilidade fiscal senão com relação a sua residência em Mônaco, onde não há tributação sobre a renda auferida pelos indivíduos. Cf. ROTONDATO, Carmine. “The Pavarotti Case”. European Taxation v. 40. Amsterdã: IBFD, 2000, p. 388.

38 Reações no caso Gerard Depardieu: um ator francês que recusou submeter-se a tributação de 75% dos franceses milionários - finalmente impedida pelo Conselho Constitucional Francês - anunciou sua mudança para a Bélgica e depois para a Rússia, onde obteve cidadania. O primeiro ministro francês definiu o comportamento de Depardieu como avarento (miserly) começando um pesado debate sobre o então chamado “exilados fiscais” (tax exiled). Cf. WOOD, Robert W. “New ‘tax residence’ means moving (just ask Gerard Depardieu)”, no site da Forbes. Disponível em http://forbes.com/sites/robertwood/2013/03/05/new-tax-residence-means-moving-just-ask-gerard-depardieu/. Acesso em 5 de setembro de 2013.

39 Este resultado é frequentemente alcançado na área da tributação sobre rendimentos em função do grande número de tratados (treaty network) para garantir, na maioria dos casos, a eliminação de qualquer dupla tributação. Entretanto, com respeito aos impostos sobre doações e heranças, a dupla tributação internacional geralmente ocorre, porque cada país possui seus próprios critérios para definir a incidência do imposto sobre a transmissão de herança (por exemplo, residência do falecido, residência do herdeiro, nacionalidade do falecido e localização de certos ativos), que não levam em consideração os critérios de outros países. A partir destes diferentes critérios para a incidência do imposto sobre a transmissão de herança, que também é aplicado de maneiras diferentes em cada país, a dupla ou mesmo tripla tributação pode facilmente ocorrer; cf. ZANTBEEK, Anton van. 2010, ob. cit., p. 197.

40 E também Singapura e Japão e outros países com a intenção de atrair mão de obra móvel e qualificada; cf. DIRKIS, Michael. “The Expression ‘liable to tax by reason of his domicile, residence’ under Article 4(1) of OECD Model Conventions”. In: MAISTO, Guglielmo. 2010, ob. cit., pp. 147-148. “The last country in to enact a similar regime has been Portugal by Decree-Law nr. 249/2009, of September 23, for non-habitual resident individuals. The regime would be granted to individuals who became resident for tax purposes in Portugal without having had this status in the five years preceding its acquisition, and would apply for a ten year period.”

41 Cf. BROE, Luc de. 2002, ob. cit., p. 25.

42 Veja as críticas a este regime fiscal, e uma descrição de seus efeitos em atrair indivíduos com grandes fortunas, cf. LANGER, Marshall J. “Harmfull tax competition: who are the real tax havens?” Tax Notes International, dezembro de 2000, pp. 6-7.

43 Em 2008 uma nova legislação foi introduzida para estabelecer que um indivíduo que foi residente no Reino Unido por sete anos ou mais nos últimos dez anos seria obrigado a pagar uma taxa anual de £30.000 caso ele decidisse por continuar a usufruir do regime de não tributação dos rendimentos não remetidos ao território britânico. Em 2011, o governo britânico revisou novamente o regime de tributação dos não domiciliados. Conquanto tenha reconhecido a contribuição que os não domiciliados oferecem à economia, o governo considerou que as regras da forma como estavam poderia desencorajar repatriação dos rendimentos e, por esta razão, não haverá mais a incidência do imposto sobre os rendimentos aplicados pelo não domiciliado em negócios no território britânico.

44 Cf. DIRKIS, Michael, 2010, ob. cit., p. 149; para a solução do Reino Unido para esta questão LEMOS, Marika. “United Kingdom”. In: MAISTO, Guglielmo. 2010, ob. cit., p. 617. A maioria dos tratados celebrados pelo Reino Unido contém previsão para limitar o benefício do Estado da fonte dos pagamentos nestes casos até o montante que seria tributado - pós envio - para o Reino Unido.

45 Como SHAVIRO, Daniel. (2011, ob. cit., p. 404) apontou, há evidências no campo das empresas start-ups, pois o número de constituição de empresas em paraísos fiscais cresceu para 10% das empresas norte americanas no período de 2005-2009 (com pico de 30% em 2008).

46 Provavelmente, por esta razão, no documento Addessing Base Erosion and Profit Shifting, OECD Publishing 2013, disponível em http://dx.doi.org/10.1787/9789264192744-en. Acesso em 5 de setembro 2013, há apenas uma referência a empresas conduit que são estruturadas para canalizar investimentos e financiamentos intragrupo de um país para outro, bem como uma menção na p. 22, nota 6, como exemplo de entidades de propósito especial. Para maiores informações sobre este tema, veja: OECD R96). “Double taxation conventions and the use of conduit companies”. Model Tax Convention on Income and on Capital 2010. Full Version, OECD Publishing 2012, disponível em http://dx.doi.org/10.1787/9789264175181-99-en. Acesso em 5 de setembro de 2013; e BROE, Luc de. International tax planning and prevention of abuse. Amsterdã: IBFD, 2008, p. 5. Bem como referências.

47 Provavelmente, por esta razão, no documento Addessing Base Erosion and Profit Shifting, OECD Publishing 2013, disponível em http://dx.doi.org/10.1787/9789264192744-en. Acesso em 5 de setembro de 2013; há apenas uma referência a empresas conduit que são estruturadas para canalizar investimentos e financiamentos intragrupo de um país para outro, bem como uma menção na p. 22, nota 6, como exemplo de entidades de propósito especial. Para maiores informações sobre este tema, veja: OECD R96). “Double taxation conventions and the use of conduit companies”. Model Tax Convention on Income and on Capital 2010. Full Version, OECD Publishing 2012, disponível em http://dx.doi.org/10.1787/9789264175181-99-en; e BROE, Luc de. International Tax Planning and Prevention of Abuse. Amsterdã: IBFD, 2008, p. 5. Bem como referências.

48 Fato, apesar dos desenvolvimentos na troca de informação com alguns paraísos fiscais, permanecemos céticos com relação ao desejo genuíno de combate aos paraísos fiscais, cujo desaparecimento já foi anunciado por muitas vezes. Cf. HISHIKAWA, Akiko. “The death of tax havens?” Boston College International and Comparative Law Review v. 25, 2002, p. 389.

49 Analisado em ARNOLD, Brian J.; e DIBOUT, Patrick. “General report”. IFA Limits on the use of low-tax regimes by multinational businesses: current measures and emerging trenes. Cahiers de Droit Fiscal International v. 86 b. Holanda: Kluwer, 2011.

50 OECD Addressing Base Erosion and Profit Shifting, OECD Publishing 2013, p. 40, disponível em http://dx.doi.org/10.1787/9789264192744-en. Acesso em 5 de setembro de 2013. Como um exemplo destas práticas, pode-se citar a estrutura implementada pelo Google onde a empresa desenvolvia seus serviços de propaganda e marketing no Reino Unido a partir do Google Ireland, em função do baixo imposto incidente sobre os rendimentos das empresas naquele país. Vide House of Commons Comittee of Public Accounts, Tax Avoidance - Google. Ninth Report of Session 2013-2014, disponível em http://www.publications.parliament.uk/pa/cm201314/cmpubacc/112/112.pdf. Acesso em 5 de setembro de 2013.

51 Cf. DAELE, Jan van. “Tax residence and the mobility of companies: borderline cases under private international law”. European Taxation v. 51. Amsterdã: IBFD, 2011, p. 194. “This kind of tax arbitrage achieves a tax ‘advantage’ in one jurisdiction that is doubled in another jurisdiction; in Germany it is well know the case of the so called double dip leasing structure with Switzerland, due to the differences in the rules for to decide on when a taxpayer has the economic ownership of an asset. The Finance Bill 2013 has enacted new dual consolidation loss rules according to which a loss in a German Tax group (Organschaft) is to be disregarded -without carry forward - for Germany tax purposes to the extent it is taken into account under a foreign tax regime applied to the controlling entity, the controlled entity or any other related party.”

52 Cf. ROSENBLOOM, H. David, 1999/2000, ob. cit., p. 148, making reference to the Dual Resident Companies in the United States.

53 Cf. RING, Diane M. “One Nation among many: policy implications of cross border tax arbitrage”. Boston College Law Review v. 44, 2002, pp. 116-117.

54 Cf. RAAD, Kees van. “Dual residence”. European Taxation v. 8. Amsterdã: IBFD, 1988, p. 245, apud DAELE, Jan van, 2011, ob. cit., p. 194.

55 A modificação do parágrafo 8.2 dos comentários ao artigo 4(1) OECD MTC foi introduzida para declarar que “de acordo com o seu texto e espírito, o segundo trecho também exclui das definições de um residente de um Estado (...) companhias e outras pessoas que não estejam sujeitas a obrigações fiscais consideráveis em um dos Estados contratantes porque estas pessoas, enquanto residentes deste Estado nos termos da legislação interna deste Estado, são considerados como residentes do outro Estado segundo as regras do tratado celebrado entre os dois Estados”.

56 Cf. DAELE, Jan van. 2011, ob. cit., p. 195.

57 Cf. JONES, Jhon F. Avery. “Are tax treaties necessary?” Tax Law Review v. 53, 1999-2000, pp. 35-36.

58 Cf. JONES, Jhon F. Avery. 1999/2000, ob. cit., p. 35.

59 Permanent Subcomitee on Investigations U.S. Senate Offshore Profit Shifting and the U.S. Tax Code - Part 2 (Apple Inc.), 013, disponível em http://www.hsgac.senate.gov/subcomitees/investigations/hearings/offshore-profit-shifting-and-the-us-tax-code-part-2. Acesso em 5 de setembro de 2013.

60 Permanent Subcomitee on Investigations U.S. Senate Offshore Profit Shifting and the U.S. Tax Code - Part 2 (Apple Inc.), 013, ob. cit., p. 28.

61 Cf. SHAVIRO, Daniel. 2011, ob. cit., p. 409.

63 Para maiores informações nestes tópicos, cf. BROE, Luc de. 2002, ob. cit., p. 29; e Branch Reports in IFA The Tax Treatment of the Transfer, 2002, ob. cit., p. 97.

64 Como em todos os casos de simulação, vide ZORNOZA, Juan J.; e BAÉZ, Andrés. “The 2003 revisions on the Commentary to the OECD Model on tax treaties and Gaars: a mistaken Starting Point”. In: LANG, Michael; et.al. (ed.), 2010, ob. cit., p. 135.

65 Cf. LANG, Michael. “General Report”. IFA double non-taxation. Cahiers de Droit Fiscal International v. 89ª. Holanda: Kluwer, 2004, p. 92.

66 Cf. BROE, Luc de. 2002, ob. cit., pp. 45 e 68; HELMINEM, Marjaana. “Finland”. IFA the tax treatment of the transfer, 2002, ob. cit., pp. 238-239.

67 Cf. BROE, Luc de. 2002, ob. cit., p. 61.

68 Cf. BROE, Luc de. 2002, Ob. cit., p. 32. Houve um importante progresso neste campo, porque desde 1º de Janeiro de 2012 a assistência de recuperação mútua é tratada pela Diretiva do Conselho 2010/24/EU que estende o escopo da assistência de recuperação para todos os tributos (taxes and duties) administrados pelos Estados membros da União. A Diretiva também introduz um instrumento europeu que permite a sua aplicação (enforcement) em outro Estado Membro com base nas medidas tomadas somente pelo Estado Membro requerente.

69 Cf. BROE, Luc de. 2002, ob. cit., p. 32; e “Branch Reports”. IFA The Tax Treatment of the Transfer, 2002, ob. cit., p. 97.

70 Cf. BROE, Luc de. 2002, p. 32.

71 Mesmo que a tributação limitada na saída (limited exit taxes) pareça ser relativa ao fato de alguns países terem renunciado ao seu direito de tributar o ganho de capital na participação ao país de residência dos investidores seja em âmbito de legislação interna ou por meio de previsões nos tratados.

72 Cf. DAELE, Jan van. 2011, ob. cit., pp. 274-275, com base nos precedents da Corte Europeia de Justiça caso C-9/02, Hugher de Lasteyrie du Saillant v. Ministère de l’Économie, des Finances e de L’Industrie, e caso C-470/04, N v Inspecteur van de Belastingdienst Oos/Kantoor Almelo.

73 Cf. DAELE, Jan van. 2011, p. 275.

74 Cf. MORENO, Andrés Báez. “El ‘valor razonable’ y la imposicion societária: um apunte sobre la idoneidade fiscal de las normas internacionales e de informacion financeira”. Nueva Fiscalidad nº 10, 2006, p. 115.

75 Que é a mais importante preocupação na relação com o princípio da capacidade contributiva; cf. MORENO, Andrés Báez. 2006, p. 133 e referências.

76 Neste sentido, BROE, Luc de. 2002, ob. cit., p. 65.

77 Cf. SIMONTACCHI, Stefano. Taxation of capital gains under the OECD Model Conventions: with special. Holanda: Kluwer, 2007, p. 185.

78 Neste sentido, DAURER, Veronika. “Áustria”. In: MAISTO, Guglielmo (ed.). 2010, ob. cit., p. 275, informa que o conceito de ganho de capital é baseado na troca de titularidade. Portanto, a tributação na saída do contribuinte não pode ser abarcada pelo artigo 13 da OECD MTC.

79 Cf. BROE, Luc de. 2002, ob. cit., p. 67.

80 Cf. HALABI, Oz. 2012, ob. cit., p. 380 traz um bom exemplo.

81 Cf. BROE, Luc de. 2002, p. 68; e HALABI, Oz. 2012, p. 380.

82 Que não é o caso pelas razões explicadas em ZORNOZA, Juan J.; e BÁEZ, Andrés. 2010, ob. cit., p. 138.

83 Conforme sugere BROE, Luc de. 2002, ob. cit., p. 67.

84 Como, por exemplo, aquele feito por BRAUNER, Yariv. “An international tax regime in crystallization”. Tax Law Review v. 56, 2003, pp. 263-264 e 294.

* Tradução de Vinícius Nogueira.