A Aplicabilidade do Princípio da Verdade Material e o Controle de AVJs em Subcontas
The Applicability of the Principle of Material Truth and the Control of Fair Value Adjustments on Sub-accounts
Rogério Abdala Bittencourt Júnior
Especialista em Direito Tributário pelo IBET – Instituto Brasileiro de Estudos Tributários. Advogado em Belo Horizonte/MG. E-mail: rogerio@alkmim.adv.br.
Resumo
O presente trabalho visa demonstrar a aplicabilidade do princípio da verdade material quando da tributação imediata das avaliações a valor justo – AVJs, baseada na ausente ou errônea evidenciação de tais ajustes na escrituração contábil do contribuinte.
Em um primeiro momento, é analisado o contexto da instituição da norma em referência, sobretudo no que diz respeito à gradual adoção pela legislação tributária nacional dos padrões contábeis internacionalmente aceitos (IFRS). Em seguida, é dada uma noção geral do que se entende por avaliações de patrimônio a valor justo e valor presente, diferenciando-se uma espécie da outra.
Evidencia-se, ainda, a neutralidade fiscal natural dos ajustes de mensuração patrimonial para fins fiscais, sobretudo em razão de o Direito e a Contabilidade serem sistemas de referência diversos e em razão dos pressupostos previstos na legislação para a tributação dos ganhos verificados na contabilidade.
Por fim, atribui-se a correta aplicação do princípio processual da verdade material em relação aos contribuintes eventualmente afetados pela tributação direta das oscilações econômicas provocadas pelos AVJs, e as possíveis saídas argumentativas do contribuinte, que passam pela possibilidade de ampla produção de provas.
Palavras-chave: AVJs, subcontas, princípio da verdade material, IFRS, direito, contabilidade, Lei 12.973/2014.
Abstract
This research intends to demonstrate the applicability of the principle of material truth when there is an immediate taxation of fair value assessments (“AVJs”), based in the absent or erroneous disclosure of such assessments on the taxpayers’ accounting books.
At first, it will be analyzed the context of the enactment of such regulation, particularly with regard to the gradual adoption by the Brazilian tax legislation of the international accounting standards (IFRS). After, a general idea of what is meant by fair value adjustment and present value adjustment is given, distinguishing one kind from another.
It is also shown the natural fiscal neutrality of the accounting adjustments for tax purposes, mainly because of the Law and Accounting being diverse reference systems and because of the assumptions provided in the legislation for the taxation of gains recorded in accounting.
Ultimately, it is attributed the correct legal application of the principle of material truth regarding to the taxpayers eventually affected by the direct taxation of economic fluctuations caused by the fair value adjustments (AVJs), and the possible argumentative outputs of the taxpayer, which include the possibility of wide production of evidence.
Keywords: AVJs – fair value adjustments, subaccounts, principle of material truth, IFRS, Law, Accounting, Statute number 12.973/2014.
1. Introdução
A Lei 11.638, de 2007, deu um grande passo em direção à convergência das empresas brasileiras ao padrão contábil internacional, ao alterar dispositivos da Lei das S.A.s (Lei 6.404/1976) no que tange à forma de elaboração e divulgação de demonstrações financeiras.
Esse diploma legal obrigou todas as sociedades anônimas a realizar avaliações de ativos e passivos, a “valor de mercado” e “valor presente”, e trouxe expressa regra de neutralidade dos ajustes contábeis quanto a eventuais efeitos fiscais (art. 177 da Lei 6.404/1976)1. Naquele contexto, as sociedades anônimas abertas com ações negociadas em bolsa ainda se sujeitavam às normativas da CVM – Comissão de Valores Mobiliários, por força do disposto no art. 177, § 3º, que previa regras especiais de realização dos ajustes, bem como ampliava o rol de ativos e passivos a serem avaliados.
Com a edição da Lei 11.941/2011, passou-se a adotar a terminologia “avaliações a valor justo” (AVJ) e “avaliações a valor presente” (AVP) em relação aos ajustes obrigatórios de ativos e passivos das empresas ali descritos. A Lei 11.941/2011 previu, ainda, a neutralidade fiscal dos ajustes a valor justo e a valor presente, e a obrigatoriedade de “duas contabilidades”, conhecida como “two books”, uma nos moldes do novo padrão contábil, outra voltada para o Fisco, esta sem considerar para fins tributários os ajustes ali previstos (padrões constantes do RTT – Regime Tributário de Transição).
Com a promulgação da Lei 12.973, de 2014, resultado da conversão em lei da Medida Provisória 627/2013, e sua regulamentação pela Instrução Normativa SRF 1.515/2014, passou a ser obrigatória às pessoas jurídicas em geral a realização de mensurações periódicas de seu patrimônio (AVJ e AVP), no sentido do que aponta a prática contábil internacional – “IFRS” (International Financial Reporting Standards), e a lei também impôs o registro (controle) de tais ajustes em subcontas do ativo e passivo.
Anteriormente à alteração promovida Lei 12.973/2014, os ajustes de avaliação patrimonial eram registrados em conta própria, e “transferidos para o resultado do exercício à medida que os ativos e passivos forem sendo realizados”2 para fins contábeis. Não havia, portanto, até a edição da Medida Provisória 627/2013, convertida na Lei 12.973/2014 a segregação dos controles contábeis em subcontas do ativo e passivo, relativamente aos eventos econômicos de mensuração.
Deveras, as regras trazidas pela legislação recente concretizaram uma preocupação crescente com a atração de investimentos para o País, no sentido de tornar mais fidedignas as demonstrações contábeis das pessoas jurídicas, adotando-se o padrão contábil mais aceito internacionalmente.
Os ajustes de avaliação patrimonial consistem na realização de estimativas periódicas dos ativos e passivos da empresa, a fim de apurar um valor do patrimônio social mais próximo da realidade do mercado, visando à proteção de credores e investidores. Tais ajustes nada mais são, portanto, que o reconhecimento de perspectivas de ganhos futuros, conforme a visão contábil prospectiva.
Existem dois tipos de ajustes: as AVJs – avaliações a valor justo; e AVPs – avaliações a valor presente. O ajuste a valor presente3 consiste em estimativa de valor corrente de fluxo de caixa futuro no curso normal das operações de uma pessoa jurídica, e é obrigatório quanto a ativos e passivos não circulantes, ativos e passivos relevantes de curto prazo, todos os ativos e passivos realizáveis e exigíveis sem encargos ou rendimentos financeiros, ou negociados com taxas não condizentes com o mercado.
Quanto aos ajustes a valor presente, a lei tributária (Lei 12.973/2014) previu neutralidade fiscal plena, e a IN 1.515/2014 a confirmou em seus arts. 34 e 374.
Já o ajuste a valor justo se refere à avaliação do preço pelo qual uma transação “não forçada” pra alienar o ativo ou transferir o passivo ocorreria entre participantes do mercado na data de mensuração, sob “condições correntes” de mercado, abstraindo-se das características das entidades que transacionam5.
A título de dever instrumental (ou obrigação acessória, como prevê o CTN) das pessoas jurídicas, estas devem realizar, além da referida avaliação, o registro (controle) da variação do valor dos seus ativos em subcontas do ativo e do passivo.
Trocando em miúdos, o histórico de movimentações de componentes do ativo e passivo permanece escriturado nas contas de passivo e ativo do Livro Razão, com a peculiaridade de haver nova forma de controle, em subcontas do ativo e passivo, do histórico de avaliações de ativos a valor justo e a valor presente.
Não há qualquer polêmica no que tange à ausência de atribuição de efeitos tributários imediatos pelo IRPJ das AVJs devidamente registradas (controladas) em subcontas do ativo ou passivo na forma da Lei 12.973/2014, o que possibilita afirmar que este caso se trata de neutralidade fiscal expressa contida na lei.
A respeito da neutralidade fiscal contida na Lei 12.973, resultante da conversão da MP 627/2013, no que tange aos ajustes a valor justo regularmente evidenciados em subcontas, explica Natanael Martins que: “Na mesma linha da compatibilização da norma contábil com princípios e regras de natureza tributária, o ganho ou a perda decorrente da avaliação de ativo ou passivo a valor justo, de que trata o Pronunciamento Técnico CPC 46, aprovado pela Deliberação CVM 699/2012, não será computado na determinação do lucro real, senão quando o valor relativo ao ganho ou a perda for realizado, inclusive mediante depreciação, amortização, exaustão, alienação ou baixa, ou quando o passivo for liquidado ou baixado.”6
Situação equivalente, no entanto, não ocorre quando se está diante de uma tributação imediata, prevista na Lei 12.973/2014, de oscilações econômicas, em decorrência do incorreto ou ausente controle das AVJs em subcontas do ativo e passivo.
Isso porque o não registro em subcontas de AVJs acarreta duas consequências: (i) a tributação imediata, pelo IRPJ e tributos decorrentes, da oscilação patrimonial positiva decorrente do AVJ; (ii) a impossibilidade de dedução de perda patrimonial, em oscilação patrimonial negativa decorrente de AVJ.
Diante disso, ao contrário da previsão expressa na Lei 12.973/2014 de neutralidade fiscal dos ajustes a valor justo regularmente realizados em subcontas, o indevido ou inexistente controle de tais ajustes acarreta a imediata tributação, o que, como trataremos adiante, não pode ser entendido como hipótese de incidência tributária, na medida em que seu antecedente normativo é um ilícito (descumprimento de dever instrumental) e contraria os pressupostos de tributação da Constituição Federal e do CTN.
Entendemos também que a falha no registro de AVJs em subcontas não pode prejudicar o direito de o contribuinte se utilizar de todos os meios característicos da ampla defesa, dentre eles a busca pela verdade material, no sentido de que seja concedido ao sujeito passivo ampla possibilidade de produção de provas, que vise demonstrar sua regularidade fiscal no que diz respeito aos efeitos dos ajustes contábeis de mensuração de patrimônio.
Importa ressalvar que os possíveis efeitos fiscais do AVJ em momento anterior à realização de ativo ou passivo em decorrência do não registro em subcontas só se aplicam às pessoas jurídicas optantes pelo regime de lucro real. Quanto à tributação pelo lucro presumido e arbitrado, os arts. 25 (§ 3o) e 27 (§ 5o) da Lei 9.430, de 1996, excepcionam da base de cálculo os mencionados ajustes.
2. A Neutralidade Fiscal “Natural” das AVJs
A previsão da tributação “posterior” do AVJ devido ao correto uso de subcontas contábeis poderia criar uma ideia de que a Lei 12.973 teria eliminado, na apuração da renda tributável das pessoas jurídicas, o requisito da disponibilidade jurídica ou econômica – por vezes referida como sinônimo de “realização” – para fins de considerar havido um acréscimo patrimonial tributável, com o que não concordamos.
Com efeito, a Lei 12.973, de 2014, em seu texto, condicionou a neutralidade fiscal – isto é, a não tributação imediata pelo imposto de renda das AVJs ao cumprimento do dever instrumental do controle dessa avaliação em subcontas do ativo e passivo, senão verifique-se o disposto nos arts. 13 e 14 de tal diploma legal7.
Deveras, em decorrência do condicionamento legal da não tributação imediata das AVJs ao cumprimento do dever instrumental do registro das oscilações de ativos e passivos na escrituração contábil da pessoa jurídica, cria-se uma situação de insegurança em relação aos contribuintes que, por mero erro formal, ou não preenchimento correto de suas demonstrações e declarações contábeis, estejam sujeitos à imediata tributação do imposto de renda, como verdadeira sanção ao descumprimento da obrigação acessória.
Muito embora haja previsão expressa de que a não tributação das AVJs está efetivamente condicionada ao cumprimento das obrigações acessórias de caráter meramente informativo, entendemos que a tributação de um ganho não pode estar divorciada da efetiva ocorrência do fato gerador do imposto de renda8.
Com efeito, o Direito se baseia na previsão normativa de acontecimentos identificados no mundo fenomênico. Os eventos ocorridos são relevantes para o direito se nele previstos, se e quando coincidem com a previsão hipotética do Direito, e na medida em que são vertidos em linguagem competente (descrição em linguagem jurídica). Quando isso ocorre, é desencadeada uma relação jurídica reconhecida segundo a linguagem do direito, o que se costuma denominar fato jurídico.
E a ideia de como ocorre o fato jurídico tributário tem a mesma lógica, como preceitua Paulo de Barros Carvalho9, segundo o qual, “Concretizando-se o fato previsto no descritor da regra de incidência, inaugura-se, como vimos, uma relação jurídica de conteúdo patrimonial, que conhecemos por ‘obrigação tributária’. Tudo, evidentemente, nos termos dos instrumentos comunicacionais que o direito estipula.”
Porém, não necessariamente o que ocorre no mundo fenomênico é relevante para o Direito. A ciência da Contabilidade descreve eventos de natureza econômica, que, previstas em suas regras, são fatos contábeis. Tais eventos econômicos podem igualmente ser fatos jurídicos, se previstos na ordem jurídica e vertidos na linguagem do Direito.
Além disso, fatos contábeis nem sempre possuem as mesmas características dos fatos jurídicos, razão pela qual não há sobreposição de um sobre o outro. Sobretudo na “nova contabilidade”, há prevalência da “visão prospectiva”, no sentido de se focalizar na perspectiva de ganhos ou perdas futuros dos ativos. Por outro lado, o Direito é sempre voltado a uma análise de fatos já ocorridos, retrospectiva.
O intérprete deve ter um especial cuidado ao igualar, de modo irrefletido, os efeitos da “nova contabilidade” e os do Direito Tributário, em razão de se tratarem de sistemas de referência diversos, uma vez que, como adverte Alexandre Alkmim10, “A partir da convergência da contabilidade brasileira às normas contábeis internacionalmente aceitas, ocorreu o desprendimento dos sistemas de referência, em parte outrora coincidentes, do direito e da contabilidade. A ciência contábil viu-se livres das amarras das normas jurídico-tributárias e passou a dar vazão aos próprios princípios e normas que buscam a valoração patrimonial da empresa e sua capacidade de produção de riquezas no futuro.”
No que tange à apuração da tributação sobre a renda (IRPJ e CSLL), ainda que tenham sido alteradas as regras de escrituração contábil, por meio da Lei 12.973/2014, o Direito segue, sob sua linguagem, aferindo os efeitos da escrituração contábil e seus ajustes, para fins de identificação dos fatos jurídicos dali extraídos.
Direito e Contabilidade são, portanto, dois corpos de linguagem diversos, cada qual com suas descrições hipotéticas e pressupostos próprios. No âmbito da Lei 12.973/2014, com a obrigatoriedade da escrituração contábil digital (SPED ‒ Sistema Público de Escrituração Digital), o instrumento dos ajustes do lucro real do imposto de renda passou a ser obrigatoriamente o e-LALUR (Livro de Apuração do Lucro Real Digital)11. Com efeito, na esteira da sistemática da Lei 11.638/2007, mantiveram-se apartadas a contabilidade e as regras de tributação.
Isso não impediu, porém, que ficasse condicionada, pela mesma Lei, a não tributação dos ajustes a valor justo ao devido e regular registro de oscilações econômicas de ativos e passivos em subcontas do ativo e do passivo – isto é, ganhos meramente escriturais.
Tem-se, portanto, de distinguir o aumento de patrimônio real, no sentido da existência de denotação de capacidade econômica (contributiva), do mero ganho escritural, por efeito de um registro ou demonstração contábil.
O princípio da capacidade contributiva é de índole constitucional, pois encontra previsão no § 1º do art. 145 do texto da Constituição: “§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.”
Deveras, não existe renda sem haver fato jurídico tributário já ocorrido, que apresente um acréscimo de valor realizado (disponível, nos termos do art. 43 do CTN), e que denote capacidade contributiva.
Victor Borges Polizelli define, com propriedade, que o princípio da realização da renda “é uma diretriz geral de alocação temporal dos ingressos (receitas) e egressos (despesas), que procura atribuir tais elementos ao período-base em que são verificados os fatos substanciais que o geraram (condição de materialidade) sempre e quando exista um certo grau de objetividade na sua mensuração (condição de objetividade) e segurança na sua concreção”12.
Com efeito, a identificação de real aquisição de acréscimo patrimonial ou riqueza nova, no que tange aos ajustes a valor justo, não prescinde da análise da efetiva aquisição de “direito novo”. No caso do imposto de renda, a identificação da renda tributável é informada pelo princípio da capacidade contributiva, já que, como adverte Alexandre Alkmim13: “além de a capacidade contributiva poder exprimir-se na graduação das alíquotas de tributação, o princípio também deve estar presente na formação da base de incidência, ou seja, na identificação da própria renda.”
Nesse sentido, saliente-se que a hipótese de incidência do imposto de renda é composta materialmente pelo aspecto da aquisição de acréscimo patrimonial, o qual é pressuposto indissociável da tributação. Ricardo Mariz de Oliveira defende que só existe acréscimo patrimonial tributável “quando haja ingressos de novos bens ao patrimônio, os quais tenham valor que supere o montante dos gastos incorridos para a sua produção.”14
Rubens Gomes de Sousa15, um dos coautores do Código Tributário Nacional, destacou, em relação aos pressupostos da tributação da renda, a “aquisição da disponibilidade”, segundo o qual, “(...) a comissão de 1964 julgou mais adequado, à função prática de definir o fato gerador do imposto, dar ênfase ao requisito da aquisição da disponibilidade. Mas nem por isso (...) o requisito de tratar-se de riqueza nova foi repudiado”, “não só ele está implícito no conceito de disponibilidade, (...) mas está também expresso no art. 43 n. I, onde se diz que a renda é um ‘produto’ do capital (...), e no art. 43 n. II, onde se diz que os proventos de qualquer natureza são os ‘acréscimos patrimoniais’ (...). Essa redação do inciso II implica que também a renda, de que trata o inciso I, é um acréscimo patrimonial (...).”
Com efeito, não se trata de simples acréscimo, mas acréscimo disponível e riqueza nova que adere ao patrimônio do sujeito passivo, razão pela qual a inexistência de fatos que denotem capacidade econômica impede a tributação.
Não existem, da mesma forma, na ordem jurídico-tributária nacional, a hipótese de incidência da renda que esteja desvinculada da ocorrência de um acréscimo patrimonial realizado, isto é, já ocorrido no mundo fenomênico, e não meramente potencial, ou prospectivo. Nesse sentido, descreve Ricardo Mariz de Oliveira que não são passíveis de serem tributados “ganhos meramente escriturais, quando ainda não adquiridos em definitivo, e, portanto, por não representarem aquisições de disponibilidade econômica ou jurídica de renda”16.
Nesse sentido, inclusive, já se pronunciou o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE 606.107/RS, com repercussão geral reconhecida, e cujo acórdão foi relatado pela Ministra Rosa Weber: “(...) A contabilidade constitui ferramenta utilizada também para fins tributários, mas moldada nesta seara pelos princípios e regras próprios do Direito Tributário. Sob o específico prisma constitucional, receita bruta pode ser definida como o ingresso financeiro que se integra no patrimônio na condição de elemento novo e positivo, sem reservas ou condições (...) V – O conceito de receita, acolhido pelo art. 195, I, ‘b’, da Constituição Federal, não se confunde com o conceito contábil.”
Assim, não se pode cogitar a tributação com base em simples oscilação escritural de patrimônio contábil. Portanto, o Direito Tributário deve realizar uma leitura jurídica dos novos tratamentos contábeis, e não admitir que a renda contábil sobreponha os conceitos e institutos jurídicos.
Entender-se, portanto, que fatos contábeis emanem efeitos jurídicos per se é ferir a segurança jurídica e os pressupostos de tributação da renda, na medida em que o Direito detém suas próprias regras para considerar tributáveis, ou não, determinados eventos econômicos ou fatos contábeis que possa representar, por exemplo, renda, receita, custo ou despesa.
Nesse sentido, inclusive, alertou Ricardo Mariz de Oliveira, ao comentar a reavaliação de ativos prevista na Lei 11.638/200717 e os pressupostos de tributação da receita e da renda, que “toda vez que a Contabilidade reconhecer uma receita por antecipação desse momento de efetiva aquisição da mesma, fazendo-o tão somente porque sua finalidade é informar o que pode vir a ocorrer futuramente (desde que haja boa dose de segurança quanto a esta possibilidade), ela, ainda que também diga que a ‘receita está realizada’, terá adotado um critério dissonante do jurídico, inclusive do jurídico-tributário (...)”.
Com efeito, a má ou ausente escrituração contábil dos ajustes a valor justo não representam acréscimo patrimonial disponível (renda), mas meras oscilações econômicas, ajustadas a fatos contábeis, que não são capazes de emanar efeitos tributários imediatos ou diretos, sem que ocorram os fatos geradores das exações eventualmente aplicáveis.
Ora, eventual tributação em face de pessoas jurídicas, em decorrência de erro ou da ausência de controle do AVJ em subcontas, deve ser informado pelo princípio da verdade material, a fim de que se permita, no curso do processo administrativo fiscal, a ampla produção probatória pelo contribuinte, de forma que seja demonstrada não só a inexistência de acréscimo patrimonial disponível, mas que se tenha tratado de meros erros formais que não possam resultar na tributação da renda, divorciada de seus pressupostos legais e constitucionais.
Com base nisto, é indevida, a nosso ver, a tributação imediata de oscilações de valor de ativos ou passivos não evidenciadas em subcontas, sobretudo quando não se dê ao contribuinte nova oportunidade de cumprir a finalidade da norma: provar, por outros meios, a ausência de aquisição jurídica do ganho, e informar os credores e investidores, por exemplo, por notas explicativas e retificação de demonstrações contábeis, da oscilação de valor contábil de seu patrimônio.
Por fim, cabe outra reflexão, no que diz respeito à possibilidade, ou não, de se ter previsto como consequência normativa do descumprimento de dever instrumental o pagamento dos tributos incidentes sobre a renda.
Ora, como aponta o art. 3o do CTN, o conceito de tributo está desvinculado de ato ilícito, na medida em que o tributo é prestação pecuniária “que não constitua sanção de ato ilícito” (art. 3o do CTN)18, o que significa que o nascimento de obrigação tributária não pode ter como antecedente normativo um descumprimento de dever legal, como é o caso do registro de AVJs em subcontas.
Nada obsta, ainda, que se tenha em conta o que ensina Luciano Amaro, segundo o qual “não se paga tributo porque se praticou uma ilicitude, embora se possa ter de pagá-lo com abstração do fato de ela ter sido praticada”19.
Diante disso, há de se considerar que o descumprimento de obrigação acessória (art. 115 do CTN20 – também referido como dever instrumental) é passível de dar azo à aplicação de multas, mas nunca ao nascimento do dever de pagar um tributo. Afinal, o dever de pagar tributo só nasce em virtude da ocorrência de atos ou fatos lícitos, e da verificação, no mundo fático, de evento que corresponda à hipótese de incidência descrita no antecedente normativo do tributo.
Com efeito, “os acontecimentos ilícitos vêm sempre atrelados a uma providência sancionatória e, fixando-se o caráter lícito do evento, separa-se, com clareza, a relação jurídica do tributo da relação jurídica atinente às penalidades exigidas pelo descumprimento de deveres tributários”21.
Por oportuno, não se deve afirmar, ainda, que, no caso da ausência de evidenciação de AVJs em subcontas em determinado período fiscal, haveria o impedimento do conhecimento do fato gerador por parte do Fisco, porquanto este, ao tempo da efetiva realização do passivo ou do ativo, teria plena possibilidade de investigar e reconstruir o fato jurídico tributário, e, em caso de inadimplência, efetuar o lançamento de ofício.
Dessa feita, apesar de a previsão normativa da Lei 12.973/2014 ser no sentido de que a abstenção do controle de AVJs em subcontas determine o nascimento de obrigação tributária, na verdade se está diante de uma sanção, que certamente é por natureza confiscatória, na medida em que seu valor equivale ao do próprio tributo que seria devido ao tempo da verdadeira aquisição da renda, o que, a nosso ver, torna a previsão legal contrária à ordem jurídico-tributária vigente.
3. O Princípio Processual da Verdade Material e o Controle de AVJs em Subcontas
A Lei 12.973/2014, resultado da conversão da MP 627/2013, e regulamentada pela Instrução Normativa SRF 1.515/2014, previu a necessidade de controle de AVJs em subcontas, prática contábil complexa, como adverte Tatiana Lopes22: “(...) Se em um primeiro momento parece ser tranquila a abertura de subcontas, como será demonstrado nos itens subsequentes, essa atividade pode ser bastante complexa, na medida em que a empresa precisará segregar ativos e mensurar valores específicos, isso sem mencionar todo o gasto sistêmico necessário para garantir que a subconta respeite a lógica legal, bem como se vincule com todos os outros sistemas com interface a este. (...)”
Em um futuro próximo, a sistemática da utilização obrigatória do SPED e dos ajustes de AVJs ainda objeto de absorção pela prática contábil das empresas certamente gerará conflitos no âmbito administrativo, no que diz respeito, sobretudo, ao falho ou ausente controle das AVJs em subcontas do ativo ou passivo. Vale dizer que o próprio lançamento, feito na forma eletrônica, será facilitado e célere, o que merece especial atenção dos contribuintes.
O princípio da verdade material, na visão de Hugo de Brito Machado Segundo, é decorrente do princípio da legalidade, “porquanto para bem aplicar a lei – sem importar a quem essa aplicação eventualmente favoreça – a Administração deve conhecer os fatos que reclamam sua aplicação”23.
Leonardo Henrique M. de Oliveira24, por sua vez, conceitua o princípio da verdade material como aquele princípio que “faz com que o julgador pesquise exaustivamente se, de fato, ocorreu a hipótese abstratamente prevista na norma”.
Pode-se afirmar, ainda, que o princípio da verdade material é também decorrente de outro princípio, o da ampla defesa, porquanto seja dever do julgador promover a produção ampla de instrumentos probatórios em âmbito administrativo, como manda a Constituição25.
Traduz-se, portanto, na busca da realidade fática que permeia o momento antecedente à atuação estatal. No caso de um lançamento tributário, decorrente de administrativa plenamente vinculada (art. 3º do CTN), e “tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente” (art. 142 do CTN), deve-se aferir, sob o prisma da verdade material, os fatos jurídicos tributários que justificaram a atuação estatal que resultou na cobrança de crédito tributário.
No sentido da aplicabilidade do princípio da verdade material ao Direito Tributário se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento do REsp 901.311/RJ26. Assim, para a devida aplicação da lei tributária, que nada mais é que a previsão legal genérica de um evento (hipótese), que, uma vez ocorrido no mundo fenomênico, ocasiona o nascimento de um fato jurídico tributário, necessário se faz dar ao contribuinte ampla oportunidade de demonstrar, por todos os meios de prova admitidos, a forma como se deu a ocorrência do fato, ou ainda afastar a existência de pressupostos da ocorrência do fato jurídico tributário.
Como já evidenciamos, a Lei 12.973/2014, tanto em relação ao ganho quanto no que tange à perda decorrente de ajuste a valor justo, condicionou a não geração de efeitos tributários das variações positivas e negativas do patrimônio ao controle de tais eventos econômicos e fatos contábeis em subcontas do ativo ou passivo.
Com efeito, criou-se uma hipótese de tributação sem efetiva demonstração, por parte do Fisco, da ocorrência do fato jurídico tributário, na medida em que, desvinculando-se da real verificação de ganho ou perda patrimonial para fins de apuração da renda ou receita havida, previu-se a tributação imediata da oscilação de valor contábil não evidenciada em subcontas. Criou, na verdade, hipótese de nascimento de obrigação tributária com base em antecedente ilícito (descumprimento de dever instrumental).
Entendemos que, para fins de plena aplicação do princípio da verdade material em âmbito administrativo, além da demonstração, por parte do contribuinte, da inexistência de fato jurídico tributário em âmbito administrativo, é recomendável a retificação da ECF – Escrituração Contábil Fiscal, e a ECD – Escrituração Contábil Digital, ambos já emitidos por via do SPED, em que não fora lançado o ajuste a valor justo, ou que o fora incorretamente, com vistas a permitir a demonstração, no âmbito administrativo, da verdade material de tais ajustes retificados.
Nessa ordem de ideias, temos que, ao contribuinte que for surpreendido com lançamento baseado em controle incorreto ou ausente de AVJs em subcontas do ativo ou passivo, caberá buscar a demonstração, em âmbito administrativo, fundado no princípio da verdade material:
i) que, tendo cometido erro no preenchimento das demonstrações contábeis, estas foram posteriormente retificadas, e que, em qualquer hipótese, o erro de preenchimento não pode irradiar efeitos tributários se posteriormente sanado, tampouco gerar a tributação imediata de ganho não realizado (não disponível);
ii) que, ausente o controle do ajuste a valor justo em subcontas, retificou sua demonstração contábil, e, provada a regularidade das novas informações ali lançadas, não houve prejuízo ao Fisco, já que a renda só poderia ser tributada se houvesse a realização do acréscimo patrimonial – o que se dá com a disponibilidade jurídica ou econômica da renda;
iii) e, em qualquer hipótese, demonstrar a impossibilidade de tributação imediata do ganho respectivo, em razão da não realização do ativo ou passivo, sobretudo pelo fato de ainda compor o ativo ou passivo da sociedade, e desde que verificado que não houve a disponibilização jurídica ou econômica daquele ganho, que é meramente escritural.
Portanto, fundado no princípio da verdade material, é direito do contribuinte defender-se de lançamentos de IRPJ e de CSLL baseados em meras oscilações econômicas de patrimônio, sem que tenha havido a efetiva realização do passivo ou ativo, devido ao fato de a realização ser um pressuposto para a tributação da renda na ordem jurídico-tributária vigente.
Uma vez atribuída plena eficácia ao princípio constitucional da ampla defesa, da qual decorre o princípio da verdade material em âmbito administrativo no Direito Tributário, deverá ocorrer a tributação da renda quando da efetiva disponibilização jurídica ou econômica do acréscimo patrimonial, e não pelo mero descumprimento de dever instrumental do contribuinte – controle de mensurações patrimoniais em subcontas.
E tal possibilidade ganha ainda mais relevo quando se analisam os dispositivos do novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), notadamente seu art. 15, o qual prevê expressamente a aplicação subsidiária das normas do Código aos processos administrativos27.
Diante do disposto no Novo CPC, é de se reconhecer que todo o arcabouço probatório previsto nesse novo diploma processual pode ser lançado mão pelos contribuintes no âmbito do processo administrativo fiscal, tais como a prova emprestada (art. 372 do NCPC), a ata notarial (art. 384 do NCPC), os documentos eletrônicos (art. 439 do NCPC), e as inovações do rito da prova pericial (arts. 464 a 480 do NCPC).
4. Conclusões
A Lei 12.973/2014 previu hipótese de tributação da renda e da receita não realizada, em face do descumprimento de dever instrumental do registro de AVJs em subcontas.
Diante disso, é uma indubitável faculdade do contribuinte, fundamentando-se no princípio da verdade material, em âmbito administrativo, comprovar: (i) a inexistência de acréscimo patrimonial disponível, i.e., tributável; (ii) a efetiva existência de perda patrimonial a ser considerada para efeitos de abatimento da base de cálculo do lucro real.
Vale dizer, ainda, que a condição imposta pela Lei 12.973/2014 no que diz respeito à necessidade de regular controle de AVJs em subcontas para que haja tributação quando da realização de ativo ou passivo não é definitiva ou rígida, tampouco impede que o contribuinte retifique suas demonstrações contábeis ou se defenda administrativamente, com fundamento no princípio da verdade material.
Não é de se olvidar, por fim, a possibilidade de discussão judicial da questão aqui trabalhada, por meio de ação de cognição ampla, em que se permita a abordagem de todos os aspectos aqui tratados.
5. Referências Bibliográficas
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1 Art. 177, § 7º: “Os lançamentos de ajuste efetuados exclusivamente para harmonização de normas contábeis, nos termos do § 2º deste artigo, e as demonstrações e apurações com eles elaboradas não poderão ser base de incidência de impostos e contribuições nem ter quaisquer outros efeitos tributários.”
2 IUDÍCIBUS, Sérgio de; MARTINS, Eliseu; GELBKE, Ernesto Rubens; SANTOS, Ariovaldo dos. Manual de contabilidade societária. São Paulo: Atlas, 2010, p. 350.
3 Vide CPC 12 – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. “(…) Anexo, (…) Perguntas e Respostas sobre Ajuste a Valor Presente. (…) 1. Valor presente (present value) – é a estimativa do valor corrente de um fluxo de caixa futuro, no curso normal das operações da entidade”.
4 “Art. 34. Os valores decorrentes do ajuste a valor presente, de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei nº 6.404, de 1976, relativos a cada operação, somente serão considerados na determinação do lucro real no mesmo período de apuração em que a receita ou resultado da operação deva ser oferecido à tributação.
Art. 37. Os valores decorrentes do ajuste a valor presente, de que trata o inciso III do caput do art. 184 da Lei nº 6.404, de 1976, relativos a cada operação, somente serão considerados na determinação do lucro real no período de apuração em que: I – o bem for revendido, no caso de aquisição a prazo de bem para revenda; II – o bem for utilizado como insumo na produção de bens ou serviços, no caso de aquisição a prazo de bem a ser utilizado como insumo na produção de bens ou serviços; III – o ativo for realizado, inclusive mediante depreciação, amortização, exaustão, alienação ou baixa, no caso de aquisição a prazo de ativo não classificável nos incisos I e II do caput; IV – a despesa for incorrida, no caso de aquisição a prazo de bem ou serviço contabilizado diretamente como despesa; e V – o custo for incorrido, no caso de aquisição a prazo de bem ou serviço contabilizado diretamente como custo de produção de bens ou serviços.”
5 Vide item 9 do CPC 46. O art. 7º, § 1º, inciso II, alínea “d” da Resolução CFC 750/1993 estipula que “d) Valor justo. É o valor pelo qual um ativo pode ser trocado, ou um passivo liquidado, entre partes conhecedoras, dispostas a isso, em uma transação sem favorecimentos”.
6 Prossegue o Autor no sentido de que: “(...) É dizer, também aqui, o legislador, de modo correto, prescreveu o cômputo do ganho ou perda na determinação do IRPJ e da CSLL, apurado em face da avaliação de ativos ou passivos a valor justo, apenas no momento em que o ativo ou o passivo esteja efetivamente sendo realizado.” (MARTINS, Natanael. A nova contabilidade pós Medida Provisória 627/2013. Normas contábeis e normas de tributação – dois corpos distintos de linguagem e aplicação. In: MOSQUERA, Roberto Quiroga; LOPES, Alexsandro Broedel (coords.). Controvérsias jurídico-contábeis (aproximações e distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2014. v. 5, p. 310)
7 “Art. 13. O ganho decorrente de avaliação de ativo ou passivo com base no valor justo não será computado na determinação do lucro real desde que o respectivo aumento no valor do ativo ou a redução no valor do passivo seja evidenciado contabilmente em subconta vinculada ao ativo ou passivo. (...)
§ 3º Na hipótese de não ser evidenciado por meio de subconta na forma prevista no caput, o ganho será tributado.
Art. 14. A perda decorrente de avaliação de ativo ou passivo com base no valor justo somente poderá ser computada na determinação do lucro real à medida que o ativo for realizado, inclusive mediante depreciação, amortização, exaustão, alienação ou baixa, ou quando o passivo for liquidado ou baixado, e desde que a respectiva redução no valor do ativo ou aumento no valor do passivo seja evidenciada contabilmente em subconta vinculada ao ativo ou passivo.
§ 2º Na hipótese de não ser evidenciada por meio de subconta na forma prevista no caput, a perda será considerada indedutível na apuração do lucro real.”
8 Nesse sentido, Ricardo Mariz de Oliveira discorre, em seu artigo intitulado Lei n. 12.973/74: efeitos tributários das modificações contábeis (escrituração x realismo jurídico), que “especialmente no que diz respeito aos impostos sobre a renda (IRPJ e CSL) e às contribuições sobre receitas (PIS e COFINS), valem apenas os atos efetivamente ocorridos e não os que possam vir a ocorrer, pouco importando que sua ocorrência possa ser seguramente prevista e mesmo possa estar iminente. É que fatos geradores são fatos já efetivamente ocorridos, e não possivelmente a ocorrer no futuro (CTN, art. 113, 114, 116, 118, 142, etc.).” Texto para o XI Congresso Nacional de Estudos Tributários do IBET, publicado no livro O direito tributário entre a forma e o conteúdo. São Paulo: coedição IBET-Noeses, 2014, p. 1.045.
9 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 373-375. O Autor ainda pondera que “Predomina a concepção segundo a qual a situação verificada no mundo físico-social, ocorrida em estrita conformidade com a previsão da lei, faria surgir, inapelavelmente, a relação jurídica, por força da imputação normativa. No campo dos tributos, teríamos o ‘fato gerador’ provocando o nascimento da obrigação tributária, independentemente de qualquer ato específico de reconhecimento de seus destinatários. Daí a tradicional distinção entre o fenômeno da incidência, fulminante e infalível, e o posterior ato de aplicação, confiado a competência dos vários agentes do poder público ou privado e mediante o qual os comandos prescritivos adquiririam eficácia social cumprindo os objetivos últimos do direito positivo.”
10 Antes do trecho destacado, o Autor descreve, de maneira acertada, que: “A partir da convergência da contabilidade brasileira às normas de contabilidade internacionalmente aceitas, ditadas pelo International Accounting Standards Board – IASB no padrão IFRS, afastou-se do segundo sistema de referência (interesse do Fisco) para aproximar-se do terceiro (interesse dos acionistas). Isso porque a contabilidade no Brasil sofria forte influência fiscal, no sentido de ser instrumento primordial de oferecimento de informações para fins de tributação, sujeitando-se como consequência, às determinações dos órgãos fazendários. Apesar de os princípios da contabilidade estarem previstos em normativa desde 1981, com a edição da Resolução CFC nº 530, ainda assim são inúmeros os exemplos em que as regras fiscais influenciavam, e por que não dizer, distorciam a escrituração contábil.” (TEIXEIRA, Alexandre Alkmim. O direito, a contabilidade e seus sistemas de referência: tópicos sobre a primazia da substância sobre a forma e a realização da renda para fins de tributação. In: QUEIROZ, Mary Elbe (coord.). Tributação em foco: a opinião de quem pensa, faz e aplica o direito tributário. São Paulo: Focofiscal, 2015. v. 2, p. 173.
11 Art. 2º da Lei 12.973/2014, que altera o art. 7º, acrescenta o § 6º e altera o art. 8º, I, “b” e §§ 1º a 4º do Decreto-lei 1.598/1977, e art. 48.
12 POLIZELLI, Victor Borges. O princípio da realização da renda. Reconhecimento de receitas e despesas para fins do IRPJ. Série Doutrina Tributária v. VII. São Paulo: Quartier Latin, 2012, p. 157.
13 Completa o Autor considerando que “Na verdade, o conceito de renda está intimamente atrelado à capacidade contributiva do contribuinte, permitindo medir sua disponibilidade para cumprir com a obrigação tributária incidente sobre referida grandeza.” (TEIXEIRA, Alexandre Alkmim. Capacidade contributiva na tributação da renda: entre o lucro real e o arbitramento nas omissões de receita e glosas de despesas. In: MANEIRA, Eduardo; TÔRRES, Heleno Taveira (orgs.). Direito tributário e a Constituição. Homenagem ao Professor Sacha Calmon Navarro Coêlho. 1. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2012. v. 1, p. 67-84.
14 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 38.
15 SOUSA, Rubens Gomes de. Pareceres – 1: Imposto de Renda. Ed. Póstuma. São Paulo: Resenha Tributária, 1975, p. 66.
16 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Incorporação de ações no direito tributário: conferencia de bens, permuta, dação em pagamento e outros negócios jurídicos. São Paulo: Quartier Latin, 2014, p. 18.
17 “Destarte, não se tributa a expectativa de renda, nem se reconhece uma receita para fins tributários porque ela esteja em vias de existir, mas apenas a renda e a receita como fatos atuais, efetivamente ocorridos em sua plenitude. (...) Daí a realização da renda ser participante permanente da obrigação tributária cujo objeto seja o imposto de renda, pois é através da renda realizada que se materializa a respectiva capacidade contributiva. Como já dito, a renda realizada não corresponde necessariamente à renda recebida em dinheiro (...). Em suma, a receita somente pode integrar a renda e o aumento patrimonial, para fins de incidência tributária, quando estiver realizada, segundo o art. 43 do CTN, quando estiver na disponibilidade econômica ou jurídica do titular do patrimônio ao qual ela se agregará.” (OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Reconhecimento de receitas – questões tributárias importantes (uma nova noção de disponibilidade econômica?). In: MOSQUERA, Roberto Quiroga; LOPES, Alexsandro Broedel (coords.). Controvérsias jurídico-contábeis (aproximação e distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2012. v. 3, p. 307-310)
18 “Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.”
19 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 25.
20 “Art. 115. Fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal.”
21 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 5. ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 405.
22 Rastreabilidade contábil versus custo de conformidade: o caso das subcontas da Lei 12.973/2014 e seus potenciais impactos tributários. In: MOSQUERA, Roberto Quiroga; LOPES, Alexsandro Broedel (coords.). Controvérsias jurídico-contábeis (aproximações e distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2015. v. 6.
23 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Processo tributário. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 44.
24 OLIVEIRA, Leonardo Henrique M. de. Processo administrativo e judicial tributário. In: TÔRRES, Heleno Taveira et al. (coords.). Direito tributário e processo administrativo aplicados. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 69.
25 “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”
26 “Processual civil. Recurso especial. Tributário. Escrituração irregular. Saldo credor em caixa. Presunção de omissão de receita. Faculdade do contribuinte produzir prova contrária. Princípio da verdade material. Sucumbência. Princípio da causalidade.
1. A presunção juris tantum de omissão de receita pode ser infirmada em Juízo por força de norma específica, mercê do princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF/1988) coadjuvado pela máxima utile per inutile nom vitiatur.
2. O princípio da verdade real se sobrepõe à presuntio legis, nos termos do § 2º, do art. 12 do DL 1.598/77 (art. 281 RIR/99 – Decreto 3.000/99), ao estabelecer ao contribuinte a faculdade de demonstrar, inclusive em processo judicial, a improcedência da presunção de omissão de receita, considerada no auto de infração lavrado em face da irregularidade dos registros contábeis, indicando a existência de saldo credor em caixa. Aplicação do princípio da verdade material.” (REsp 901.311/RJ, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Rel. p/ Acórdão Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, j. 18.12.2007, DJe 06.03.2008)
27 Novo CPC: “Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente.”