Fundos de Investimento Imobiliário: Aspectos Fiscais e Questões Controversas
Roberto Quiroga Mosquera
Professor de Direito Tributário da Universidade de São Paulo e da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Mestre e Doutor em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Advogado em São Paulo.
Rodrigo de Madureira Pará Diniz
LLM em Direito Tributário pelo Insper. Advogado em São Paulo.
Resumo
O presente artigo tem por escopo a análise do tratamento tributário aplicável, no Brasil, aos Fundos de Investimento Imobiliários e aos seus quotistas, especificamente no que tange ao Imposto de Renda. Ademais, a presente análise busca esclarecer as principais questões controversas sobre o tema discutidas atualmente.
Palavras-chave: fundos de investimento imobiliário, tributação, imposto de renda.
Abstract
This article states about the Brazilian tax treatment applicable in connection with investment in Real Estate Investment Funds, specifically concerning the Brazilian Income Tax. Furthermore, this article reports the main tax issues related to such investments currently discussed in Brazil.
Keywords: real estate investment fund, taxation, income tax.
1. Introdução
Os mercados financeiro e de capitais experimentaram grande desenvolvimento durante o Século XX e continuam a se incrementar de modo significativo nestas primeiras décadas do Século XXI.
Sua importância na economia moderna é inegável, pois não só constituem a principal fonte de financiamento de empresas atuantes nos mais variados setores da economia e das pessoas físicas em suas atividades particulares, como também compõem o destino fundamental dos recursos poupados pelos detentores de capital, que buscam nos mercados financeiros e de capitais atraentes e rentáveis investimentos nos inúmeros instrumentos financeiros atualmente a eles ofertados.
Neste sentido, caracteriza-se o mercado financeiro pela interposição financeira da entidade financeira entre aqueles que têm recursos disponíveis e aqueles que necessitam de crédito. Já no mercado de capitais, o trânsito dos recursos financeiros do detentor de poupança para o necessitado de financiamento dá-se diretamente.
Não obstante, independentemente da presença de uma instituição financeira intermediadora, tais mercados acabam por constituir um dos principais vetores da economia moderna, ao viabilizarem o aludido intercâmbio financeiro entre investidores e aqueles que necessitam de crédito.
Como é de se esperar, os detentores de capital não estão dispostos a emprestar seus recursos em troca de baixas taxas de rentabilidade.
Assim, verifica-se atualmente uma crescente diversidade no Brasil e no exterior de instrumentos financeiros postos à disposição dos referidos investidores, sejam estes pessoas físicas ou jurídicas residentes no País ou investidores domiciliados fora do País.
Dentre os inúmeros instrumentos financeiros ofertados, posição de destaque é ocupada pelos fundos de investimento, representantes de uma fundamental característica dos mercados financeiros modernos, qual seja, a junção e consolidação de patrimônios pertencentes a investidores distintos em um único canal de investimento.
Tal característica, ao oferecer significativas vantagens para os mais diversos investidores, torna os fundos de investimento um instrumento financeiro único e extremamente atraente, o que justifica sua propagação e crescente oferta no Brasil durante as duas últimas décadas.
No âmbito de tal indústria, relevância ímpar apresentam os Fundos de Investimento Imobiliário como fontes de financiamento para empreendimentos de longo prazo (sem os onerosos encargos usualmente aplicáveis nos financiamentos bancários) e como investimentos financeiros extremamente atrativos, especialmente no âmbito da recente expansão do setor imobiliário brasileiro e da noticiada valorização dos imóveis nos principais centros do País.
Naturalmente, tal desenvolvimento dos fundos de investimento (e, em especial, dos referidos Fundos de Investimento Imobiliário) não passou despercebido pelo legislador tributário e pelas autoridades fiscais, que caracterizaram inúmeros fatos-jurídicos tributários nos variados atos relacionados aos fundos de investimento em questão.
Todavia, a despeito de sua relativa jovialidade e especificidade, a legislação tributária resultante da aludida intenção de se tributar os diversos fatos-jurídicos relacionados aos fundos de investimento apresenta lacunas em diversos aspectos, além de ser pouco esclarecedora e de difícil interpretação pelos investidores, contribuintes e operadores do Direito em inúmeros de seus dispositivos.
Deste modo, diversas são as críticas apresentadas pela doutrina ao analisar a matéria e inúmeros são os questionamentos e dúvidas suscitadas pelos investidores e contribuintes diante dos desafios impostos por sua aplicação aos casos concretos.
Nesse sentido, passamos à análise das principais controvérsias em matéria tributária (fundamentalmente, no âmbito da tributação da renda) relacionadas aos investimentos em Fundos de Investimento Imobiliário, as quais, por apresentarem reflexos no tratamento fiscal da carteira de tais fundos e de seus investidores, certamente contribuem por afastar investidores nacionais e estrangeiros e, assim, prejudicar o financiamento e o desenvolvimento do mercado imobiliário nacional.
2. Tributação das Carteiras dos Fundos de Investimento
Conforme mencionado, a origem dos fundos de investimento e sua crescente importância como instrumento financeiro na economia contemporânea decorre, dentre outras características, das vantagens e oportunidades que os investimentos realizados coletivamente possibilitam, ou seja, os investidores, enquanto quotistas de uma carteira com patrimônio bastante superior àquele que individualmente detêm, podem se beneficiar de investimentos com melhores taxas de rentabilidade e nos quais possivelmente não estariam aptos a investir isoladamente.
Neste cenário, destaca-se que, ainda que os fundos de investimento sejam legalmente considerados entidades sem personalidade jurídica própria (posto serem estruturados como condomínios), a consecução de investimentos por meio dos aludidos fundos pressupõe a existência de duas relações fundamentais, quais sejam, (i) a relação entre os quotistas e o fundo em que estes aportam seus respectivos capitais em contrapartida das quotas recebidas (objetivando as vantagens econômicas acima mencionadas quanto a possíveis ganhos financeiros e melhores taxas de rentabilidade), e (ii) a relação entres os fundos e os investimentos próprios de suas carteiras (como, por exemplo, as ações de companhias investidas pelos fundos de investimento em participações).
Daí porque, antes que se passe à análise específica das principais controvérsias em matéria fiscal relacionadas aos investimentos em Fundos de Investimento Imobiliário, cumpre-nos o exame do tratamento tributário geralmente conferido pela legislação em vigor às operações próprias das carteiras dos fundos de investimento (e, especificamente, às carteiras dos Fundos de Investimento Imobiliário) e a seus quotistas.
2.1. Tributação das carteiras dos fundos de investimento - aspectos gerais
A despeito de a escassa produção doutrinária dedicada exclusivamente aos fundos de investimento no Direito brasileiro voltar-se, fundamentalmente, à análise dos impactos fiscais da relação estabelecida entre os quotistas e os fundos de investimento por eles investidos (ou seja, a incidência do Imposto de Renda sobre os rendimentos e ganhos auferidos pelos investidores), fundamental se faz a análise dos aspectos tributários referentes ao Imposto de Renda da relação entre os fundos de investimentos e os ativos que compõe a sua carteira, já que, ainda que indiretamente, eventual tributação incidente sobre as operações do portfólio do fundo impactará nos rendimentos de seus investidores ao influenciar na valorização das respectivas quotas.
Neste contexto, no que tange especificamente às implicações tributárias referentes ao Imposto de Renda decorrentes da remuneração do portfólio do fundo de investimento, isto é, da renda referente às operações e aplicações realizadas pelo patrimônio (carteira) dos fundos de investimento, menciona-se que, há tempos, vigora no ordenamento jurídico brasileiro a regra geral de não tributação de tais ganhos e rendimentos.
De fato, a Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, já estipulava em seu artigo 57 que as remunerações pagas às sociedades de investimento, em crescente desenvolvimento à época, pelas sociedades e companhias investidas, não estariam sujeitas a qualquer tributação.
Referida isenção foi de grande importância no desenvolvimento das sociedades de investimento, pois evitou que tal estrutura de investimento se sujeitasse à onerosa carga tributária então vigente, que acabaria por desestimular sua adoção, posto que, caso contrário, as remunerações pagas pelas sociedades investidas estariam sujeitas à tributação tanto na sociedade de investimento quanto nos acionistas destas, tornando, pois, inviável tal estrutura de investimento.
Daí a relevância das previsões legais acerca da não tributação das remunerações então pagas às sociedades de investimento, ora replicadas na legislação em vigor para as remunerações pagas às carteiras de fundos de investimentos, nos termos expressamente dispostos no artigo 14 da Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil (RFB) nº 1.022, de 5 de janeiro de 2010.
Por oportuno, destaca-se que a regra de não tributação das carteiras dos fundos de investimento fundamenta-se (i) na mencionada opção do legislador tributário de evitar o referido efeito adverso da imposição do Imposto de Renda sobre as carteiras dos fundos de investimento e sobre os respectivos quotistas e (ii) no fato de os fundos de investimento não possuírem personalidade jurídica e, como tal, não serem efetivamente contribuintes do Imposto de Renda.
Todavia, da leitura do dispositivo transcrito infere-se que a referida regra de não tributação dos rendimentos, ganhos e demais remunerações auferidas pelas carteiras dos fundos de investimento apresenta determinadas exceções legalmente previstas.
Com efeito, dentre outras hipóteses específicas, estão sujeitas à tributação pelo Imposto de Renda as carteiras dos fundos de investimento que, a despeito das previsões legais acerca da obrigatoriedade de subscrição total das quotas, ainda possuam quotas não subscritas por seus investidores.
Sugere-se, neste caso, o uso da tributação pelo Imposto de Renda como mecanismo de punição e penalidade aos fundos que operem sem que as correspondentes quotas tenham sido integralmente subscritas.
Outras importantes exceções à regra de não tributação das carteiras dos fundos de investimento são as restrições impostas aos Fundos de Investimento Imobiliário com relação à aplicação de recursos em empreendimentos vinculados a seus quotistas e em ativos financeiros, conforme abaixo detalhado.
2.2. Tributação das carteiras dos Fundos de Investimento Imobiliário - aspectos específicos
Diferentemente dos fundos de investimento em geral, cujas carteiras estão, em regra, isentas de tributação pelo Imposto de Renda, os Fundos de Investimento Imobiliário estão sujeitos a normas bastante específicas, fundamentalmente em razão do setor econômico em que estão inseridos.
Nesse contexto, em linhas gerais, define a doutrina tais fundos como veículos de investimentos coletivos (como todos os fundos de investimento), responsáveis pela captação de recursos (através da emissão de quotas) para investimentos em empreendimentos imobiliários, de construção futura ou já concluídos.
Deste modo, os Fundos de Investimento Imobiliários - obrigatoriamente constituídos na forma de condomínios fechados - foram introduzidos em nosso ordenamento jurídico com o claro objetivo de fomentar a atividade imobiliária, que passou a ter em tais condomínios uma importante forma de financiamento, substancialmente menos onerosa do que a captação direta de recursos, até porque os investidores dos referidos fundos são, usualmente, investidores pessoas físicas.
Neste cenário, os recursos captados pelos Fundos de Investimentos Imobiliários são, majoritariamente, aplicados na incorporação de empreendimentos imobiliários, construção de imóveis, aquisições de imóveis, bem como investidos em projetos que facilitem o acesso à moradia e serviços, inclusive em áreas rurais, com a finalidade de alienação futura, locação ou, ainda, arrendamento.
Como uma particularidade do regime a que tais fundos estão sujeitos, menciona-se que os resultados decorrentes da consecução das aludidas atividades, como a alienação das unidades imobiliárias e os aluguéis dos imóveis investidos, são, obrigatoriamente, reconhecidos pelos Fundos de Investimento Imobiliário pelo regime de caixa, isto é, apenas quando efetivamente auferidos e incorridos, os recebimentos e os desembolsos experimentados pelos fundos serão, respectivamente, reconhecidos como receitas e despesas (em oposição ao regime de competência geralmente adotado pelas pessoas jurídicas dedicadas a tais atividades imobiliárias para o reconhecimento de receitas e despesas).
Ademais, no que tange especificamente aos imóveis adquiridos pelos Fundos de Investimento Imobiliário, destaca-se, ainda, que estes deverão ser registrados no ativo imobilizado do fundo e, tal qual ocorre quando imóveis são detidos por pessoas jurídicas, as unidades integrantes da carteira do fundo estarão sujeitas à depreciação fiscal, nos termos da legislação em vigor.
Neste contexto, importa ressalvar que, a despeito das referidas normas aplicáveis aos Fundos de Investimento Imobiliário, como a do reconhecimento de receitas e despesas pelo regime de caixa, o que, em tese, propicia o recebimento de lucros e ganhos pela carteira do Fundo de Investimento Imobiliário, este não deverá, em regra, sofrer qualquer impacto fiscal em virtude de tais resultados.
Isso porque, conforme anteriormente mencionado, a legislação tributária em vigor consagra, desde a época das sociedades de investimento coletivo, a não tributação das carteiras de investimentos dos veículos de investimento coletivo, ou seja, eventual tributação deve ocorrer no nível dos investidores e não do meio (veículo) por eles utilizados para conduzir seus investimentos coletivamente.
Assim, em regra, os fundos de investimento, inclusive os imobiliários, não devem recolher tributos de qualquer natureza, ainda que venham a auferir rendas ou ganhos decorrentes dos ativos integrantes de suas carteiras de investimento.
Todavia, no caso específico dos Fundos de Investimento Imobiliário, a legislação vigente impõe certos requisitos para que tal condição isentiva seja, de fato, aplicada às carteiras de investimento com relação aos rendimentos e ganhos eventualmente auferidos.
Com efeito, nos termos do artigo 2º da Lei nº 9.779, de 19 de janeiro de 1999, as rendas e ganhos experimentados pelos Fundos de Investimentos Imobiliários não estarão sujeitos à tributação usualmente aplicável às pessoas jurídicas sediadas no Brasil, dedicadas a atividades imobiliárias, desde que não apliquem recursos em empreendimentos imobiliários que tenham como incorporador, construtor ou sócio, quotista que possua, isoladamente ou em conjunto com pessoa a ele ligada, mais de 25% das quotas do fundo.
Outrossim, para que a totalidade dos ganhos e rendimentos auferidos por suas carteiras não esteja sujeita a qualquer tributação, os Fundos de Investimento Imobiliário deverão distribuir aos seus investidores ao menos 95% do lucro registrado apurado, com base no regime de caixa, e baseado nos balanços semestral ou anual (datados de 30 de junho e 31 de dezembro de cada ano-calendário, respectivamente).
Assim, atendidas as referidas condições, os ganhos e rendas auferidos pelas carteiras de investimentos dos Fundos de Investimento Imobiliários estarão, regra geral, isentas de tributação pelo Imposto de Renda no Brasil.
Ressalva-se, contudo, que a referida isenção não é plena, isto é, não abarca a totalidade dos rendimentos e ganhos auferidos pelos Fundos de Investimento Imobiliários, como, por exemplo, os resultados das aplicações financeiras por eles eventualmente desenvolvidas.
De fato, na hipótese de os Fundos de Investimento Imobiliário investirem parte de seu patrimônio em aplicações financeiras - de renda fixa ou variável - a aludida isenção não se aplicará e, portanto, os Fundos de Investimento Imobiliários estarão, com relação a tais investimentos, sujeitos à tributação comumente aplicável às pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil.
Considerando tal possibilidade de tributação das carteiras dos Fundos de Investimento Imobiliário, duas importantes observações devem ser realizadas.
Primeiramente, há de se destacar que, desde o advento da Lei nº 12.024, de 27 de agosto de 2009, não são consideradas aplicações financeiras, para fins de incidência do Imposto de Renda sobre os rendimentos auferidos pelas carteiras dos aludidos fundos, os investimentos em certificados de recebíveis imobiliários, letras hipotecárias, letras de créditos imobiliários e quotas de outros Fundos de Investimento Imobiliário que sejam negociadas na bolsa de valores ou no mercado de balcão organizado.
A edição de tal normativo buscou, fundamentalmente, fazer com que os Fundos de Investimentos Imobiliários continuassem a ser investimentos financeiramente atrativos para pessoas físicas, já que, até então, caso tais investidores optassem por realizar investimentos diretos em tais produtos financeiros, gozariam de isenção referente ao Imposto de Renda, enquanto por meio dos referidos fundos, seriam onerados pelo tributo.
Ou seja, antes do advento da Lei nº 12.024/2009, aqueles que optassem por investir indiretamente nos referidos ativos através dos Fundos de Investimento Imobiliário suportariam maior ônus tributário do que as pessoas físicas que o fizessem de modo direto.
Naturalmente, tal procedimento acabou por desestimular a estruturação de Fundos de Investimento Imobiliário para o varejo, o que veio a ocorrer de forma relevante após a edição do normativo em questão.
Contudo, se a edição de tal normativo restabeleceu parcialmente a coerência do sistema tributário, nos termos apontados, a restrita lista de produtos financeiros para os quais a isenção foi preservada é merecedora de críticas.
De fato, o legislador poderia, idealmente, ter ampliado a relação de aplicações financeiras em questão, incluindo produtos comumente empregados em estruturas de desenvolvimento de empreendimentos imobiliários, como quotas de fundos de investimento imobiliários e de fundos de investimento em direitos creditórios.
Além desta previsão de produtos financeiros equiparados a atividades imobiliárias para fins de não tributação da carteira dos Fundos de Investimento Imobiliários, destaca-se, ainda, a previsão legal de que o Imposto de Renda retido, quando do pagamento de rendimentos pelas referidas aplicações financeiras, é passível de compensação com o Imposto de Renda por ocasião do pagamento de rendimentos aos quotistas do fundo.
Tal possibilidade eliminaria, a princípio, a chamada “dupla tributação” que a isenção em regra concedida às carteiras de fundos de investimento pretende evitar.
Não obstante, tal máxima não é plenamente verdadeira, já que na hipótese de o Fundo de Investimento Imobiliário incorrer em prejuízos em seus investimentos, os quotistas seriam (ainda que temporariamente) duplamente onerados, já que sofreriam não só com a natural desvalorização das suas quotas, como também já teriam sido onerados com o recolhimento do Imposto de Renda sobre os rendimentos das aplicações financeiras investidas pelo fundo.
Destarte, a possibilidade de compensação do Imposto de Renda retido quando do pagamento de rendimentos pelas aplicações financeiras aos Fundos de Investimento Imobiliário somente possui efeito equivalente aos das isenções geralmente concedidas aos fundos de investimento se, no cômputo global de suas rendas e ganhos (resultantes das atividades imobiliárias e das aplicações financeiras), os Fundos de Investimento Imobiliário obtiverem resultados positivos. Caso contrário, fatalmente incorreríamos novamente em hipótese de desrespeito ao conceito constitucional de renda.
Não é de se estranhar as inúmeras críticas apresentadas às restrições impostas aos Fundos de Investimento Imobiliário, que acabam por restringir o escopo de suas atividades e investimentos, além de distanciá-los do tratamento geralmente conferido aos fundos de investimento no Brasil.
De fato, conforme abaixo detalhado, a análise da legislação em vigor demonstra que também os quotistas dos Fundos de Investimento Imobiliário estão sujeitos a um tratamento tributário específico com relação a tais investimentos e diverso daquele, em regra, verificado em relação às aplicações em fundos de investimento.
3. Tributação dos Quotistas dos Fundos de Investimento Imobiliário
Conforme mencionado, do mesmo modo que as carteiras dos Fundos de Investimento Imobiliário, também os quotistas de tais condomínios estão sujeitos a um tratamento tributário próprio com relação ao Imposto de Renda, diverso das regras aplicáveis aos investidores de fundos de investimento em geral (como os fundos de investimentos de renda fixa e os fundos de investimento multimercado) e de fundos que detenham participações societárias em suas carteiras (como os fundos de ações e os fundos de investimento em participações).
Nesta linha, há de se mencionar que, nos termos da legislação em vigor, o Imposto de Renda aplicável aos quotistas de Fundos de Investimento Imobiliário toma por base (i) a residência dos quotistas no Brasil ou no exterior, e (ii) alguns eventos financeiros que caracterizam o auferimento de rendimento e a sua consequente tributação (a cessão ou alienação de quotas, o resgate de quotas, a amortização de quotas, e a distribuição de lucros pelo fundo de investimento).
No que tange à tributação aplicável aos quotistas dos Fundos de Investimento Imobiliário que sejam domiciliados no Brasil, prevê a legislação em vigor a incidência do Imposto de Renda, a título de antecipação, à alíquota de 20% quando da distribuição de resultados pelos fundos aos referidos quotistas, bem como quando os quotistas aufiram rendimentos no resgate das quotas e, ainda, em eventuais alienações destas em que haja efetivo ganho de capital. Adicionalmente, sobre os ganhos decorrentes de negociações em ambiente de bolsa, mercado de balcão organizado ou mercado de balcão não organizado com intermediação, haverá retenção do Imposto de Renda à alíquota de 0,005%.
Não obstante, uma importante particularidade deve ser destacada com relação à tributação imposta aos quotistas dos Fundos de Investimento Imobiliário que sejam pessoas físicas residentes no País.
Com efeito, conforme previsão do artigo 3º, III, da Lei nº 11.033, de 21 de dezembro de 2004, estarão isentos do Imposto de Renda na modalidade fonte e por ocasião da entrega anual da Declaração do Imposto de Renda da Pessoa Física (DIRPF) os rendimentos distribuídos para quotistas pessoas físicas, desde que observadas três condições cumulativas, quais sejam:
(i) o Fundo de Investimento Imobiliário tenha, pelo menos, 50 quotistas;
(ii) sejam suas quotas negociadas exclusivamente na bolsa de valores ou no mercado de balcão organizado; e
(iii) os quotistas beneficiados por tal isenção detenham menos de 10% da totalidade das quotas do fundo e estas não lhe conferem direito ao recebimento de mais de 10% dos rendimentos do fundo.
Nota-se, assim, que a legislação tributária em vigor estimula significativamente os investimentos por pessoas físicas em Fundos de Investimento Imobiliário cujas quotas sejam pulverizadas, atribuindo a tais investidores, inclusive, um tratamento mais benéfico do que o aplicável a investidores não residentes no País que apliquem recursos nos aludidos fundos.
De fato, aos quotistas residentes e domiciliados no exterior, por ingressarem recursos no Brasil por intermédio dos mecanismos previstos na Resolução do CMN nº 2.689/2000 (quotistas qualificados), é aplicável tratamento tributário específico determinado em função de residirem ou não em país ou jurisdição que não tribute a renda ou capital, ou que tribute a renda à alíquota máxima inferior a 20% (Jurisdição de Baixa ou Nula Tributação).
Assim, no caso de quotistas qualificados que não sejam residentes em Jurisdição de Baixa ou Nula Tributação, os ganhos auferidos na cessão ou alienação, amortização e resgate das quotas dos Fundos de Investimento Imobiliário, bem como os rendimentos distribuídos por tais fundos, serão tributados pelo Imposto de Renda à alíquota de 15%, exceto no caso de ganhos auferidos na alienação das correspondentes quotas por meio de operação realizada em bolsa de valores ou no mercado de balcão organizado, os quais, de acordo com razoável interpretação das leis e regras atinentes à matéria, devem ser isentos do Imposto de Renda.
Por outro lado, no caso de quotistas qualificados que sejam residentes em Jurisdição de Baixa ou Nula Tributação, os ganhos auferidos na cessão ou alienação, amortização e resgate das quotas e os rendimentos distribuídos pelo fundo serão, em regra, tributados de acordo com as normas aplicáveis aos quotistas residentes no Brasil.
4. Questões Controversas em Matéria Fiscal Relacionadas aos Fundos de Investimento Imobiliário
Diante do acima exposto, nota-se que o as regras aplicáveis aos investimentos em Fundos de Investimento Imobiliário em muito diferem das regulamentações vigentes, em matéria tributária, para os fundos de investimento em geral, o que impossibilita que seja aplicável tanto aos rendimentos auferidos pelas carteiras dos Fundos de Investimento Imobiliário, quanto aos ganhos e rendimentos experimentados por seus quotistas, tratamento tributário equivalente ou similar.
Justifica-se, naturalmente, tal tratamento específico. Até porque, caso o legislador optasse por submeter os investimentos em Fundos de Investimento Imobiliário ao tratamento geralmente aplicável aos fundos de investimento de renda fixa ou aos fundos de investimento em ativos de renda variável a depender da composição de suas carteiras, os contribuintes e entidades responsáveis pela administração e gestão das correspondentes carteiras enfrentariam evidentes dificuldades operacionais para analisar se os ativos integrantes da carteira do fundo possibilitam rendimentos de natureza fixa ou variável.
Neste particular, ressalva-se que um único imóvel pode produzir ganhos de renda variável ao Fundo de Investimento Imobiliário, quando de sua alienação, e rendimentos de renda fixa por ocasião, por exemplo, do recebimento de aluguéis predeterminados para locações de longos períodos.
Daí porque parece-nos acertada a decisão do legislador de atribuir um tratamento tributário específico e próprio aos investimentos em Fundos de Investimento Imobiliário.
Todavia, a forma com que tratamento tributário foi estabelecido, sobretudo com relação às normas relacionadas à isenção das operações realizadas pelas carteiras dos Fundos de Investimento Imobiliário é merecedora de críticas, especialmente pela imprecisão de certos dispositivos legais.
Por conseguinte, diversas são as dúvidas enfrentadas pela doutrina, pelos operadores do Direito e, principalmente, pelos investidores (contribuintes) quanto à sua correta interpretação e adequada aplicação.
Em especial, no âmbito das estruturas envolvendo Fundos de Investimento Imobiliário, destacam-se as controvérsias relacionadas ao regime de distribuição de lucros pelos Fundos de Investimento Imobiliário e à equiparação, para fins tributários, das carteiras dos referidos fundos às pessoas jurídicas em geral.
4.1. Do regime de distribuição de lucros pelos Fundos de Investimentos Imobiliários
Conforme anteriormente detalhado, de maneira geral, os fundos de investimentos constituídos no Brasil não sofrem tributação em sua carteira de investimentos. Todavia, dentre outros requisitos, para que certo Fundo de Investimento Imobiliário faça jus ao mencionado tratamento tributário, qual seja, de não tributação de sua carteira de investimento, a legislação em vigor estabelece que os Fundos de Investimento Imobiliário devem distribuir ao menos 95% dos lucros auferidos e apurados com base no regime de caixa aos seus quotistas, com base em balanço ou balancete semestral encerrado em 30 de junho e 31 de dezembro de cada ano.
Não obstante, como supraexplanado, a legislação tributária vigente prevê, em regra, a incidência do Imposto de Renda sobre os rendimentos e ganhos percebidos por qualquer beneficiário de Fundos de Investimento Imobiliário.
Neste cenário, há de se observar que, em razão de disposições contidas na legislação fiscal, para fins de distribuição de seus resultados, os Fundos de Investimento Imobiliário são obrigados a apurar seus lucros de acordo com o regime de caixa, ou seja, apenas recebimentos e desembolsos efetivamente realizados serão reconhecidos para a determinação do lucro.
Consequentemente, dado o crescente volume de estruturas de investimento envolvendo a constituição de Fundos de Investimento Imobiliário, questiona-se com frequência quando os rendimentos em questão devem ser considerados como distribuídos pelo fundo a seus quotistas para fins de incidência do Imposto de Renda. Justifica-se, assim, a análise das regras referentes à apuração de resultados segundo o regime de caixa.
Em linhas gerais, o regime de caixa pode ser definido como o regime contábil segundo o qual, na determinação do resultado do exercício, são consideradas todas as receitas e despesas efetivamente verificadas durante o período, a despeito do momento de ocorrência de seus fatos geradores.
Assim, ao contrário do que preceitua o regime de competência, pelo regime de caixa devem ser consideradas as despesas e receitas que passaram pelo caixa durante certo intervalo, de forma a se atingir, ao final deste, o efetivo resultado de dado período.
Por esta razão, a corrente predominante sobre o tema define a disponibilidade econômica como sinônimo do regime de caixa, enquanto que a disponibilidade jurídica é tratada como sinônimo do regime de competência.
Assim, pode-se compreender que o regime de caixa implica o reconhecimento, para fins de tributação, apenas dos valores que transitarem pela conta caixa (disponibilidade econômica).
Em uma análise pragmática, nota-se, portanto, que o jurista assevera que tal regime é de caixa, pois considera o que se passa pela conta caixa.
Ora, parece claro que, de acordo com a melhor doutrina contábil e mesmo pelos ensinamentos de Alcides Jorge Costa, somente se considera, para fins de tributação pelo regime de caixa, aquilo que transita pela conta caixa, ou seja dinheiro/numerário, não podendo ser dado o mesmo tratamento a outros bens.
Neste contexto, conforme prevê a legislação fiscal que trata dos Fundos de Investimento Imobiliário, o marco temporal para que se determine o lucro passível de distribuição aos seus quotistas (ou seja, o momento em que as receitas e as despesas que transitaram pelo caixa do fundo devem ser confrontadas, a fim de se determinar o efetivo lucro de certo período) ocorre ao fim de cada semestre, ou seja, em 30 de junho e 31 de dezembro de todos os anos.
Isso quer dizer que, segundo o regime de caixa, o que se busca para fins de determinação do lucro tributável e de distribuição obrigatória é o efetivo lucro realizado em caixa (os valores em caixa, após a realização efetiva de receitas e despesas durante os aludidos intervalos) em 30 de junho ou 31 de dezembro, sendo certo que as entradas de caixa do período são impactadas e reduzidas por saídas de caixa na forma de custos e despesas.
Diante disso, para fins de determinação do lucro tributável a ser distribuído aos quotistas dos Fundos de Investimento Imobiliário, pouco importa se o caixa era positivo em determinado momento do ano-calendário, ou se no encerramento do semestre apurou-se mais saídas de caixa (na forma de despesas e custos) do que os respectivos ingressos de receitas em decorrência da comercialização dos imóveis integrantes da carteira de dado fundo.
De fato, o lucro a ser distribuído aos seus quotistas somente será apurado pelo regime de caixa com base em balanço ou balancete semestral encerrado em um dos marcos temporais previstos pela legislação pertinente (30 de junho e 31 de dezembro de cada ano).
Ademais, há de se observar que, em razão do oneroso tratamento tributário a que estão geralmente sujeitas as aplicações financeiras das carteiras dos Fundos de Investimento Imobiliário, é natural que tais fundos nem sempre disponham de valores suficientes em caixa para a concretização do pagamento dos lucros apurados em 30 de junho e 31 de dezembro aos quotistas, sem que isto represente, por si só, um procedimento em desacordo com a aludida obrigatoriedade de distribuição.
A título exemplificativo de tal hipótese, tomemos o caso de um Fundo de Investimento Imobiliário que, ao longo de determinado exercício e em momento anterior aos referidos marcos temporais, realiza a comercialização de certos imóveis integrantes de sua carteira, cujas correspondentes receitas sejam imediatamente utilizadas para suportar despesas ordinárias da carteira do fundo ou, ainda, reaplicadas durante o semestre em novos empreendimentos, caso assim autorizado pelo correspondente regulamento.
Com efeito, como resultado da alocação gradativa das receitas operacionais auferidas pelo referido fundo de investimento, através da comercialização de outros imóveis integrantes de sua carteira, verificar-se-á, nos aludidos marcos temporais, que não haverá lucro apurado pelo regime de caixa a ser distribuído a seus quotistas, motivo pelo qual não há de se falar em qualquer obrigatoriedade de distribuição, nem na correspondente incidência do Imposto de Renda.
Diferente seria se o marco temporal estabelecido pela legislação vigente para a distribuição mandatória de lucros auferidos pelos Fundos de Investimento Imobiliário no regime de caixa aos seus quotistas fosse outro, ou seja, se não fosse verificada semestralmente a existência de lucro/caixa a ser distribuído aos quotistas, mas, por exemplo, mensalmente.
Nessa hipótese, caso a alocação do lucro mencionado acima no caixa do próprio fundo de investimento não houvesse ocorrido com relação à totalidade do produto da comercialização dos imóveis originais, poderiam as autoridades fiscais, eventualmente, sustentar a aplicação da regra supracitada, de forma que o Fundo de Investimento Imobiliário distribuísse aos seus quotistas pelo menos 95% dos lucros auferidos.
Contudo, mesmo em tal cenário, sugere-se, ainda, a possibilidade de que os contribuintes sustentem a viabilidade de que os Fundos de Investimento Imobiliário suspendam extraordinariamente o pagamento da parcela dos lucros estabelecida na legislação pertinente, em decorrência do comprometimento desses valores para garantir a solvência dos fundos e o cumprimento de suas finalidades de investimento.
Isso porque, da leitura do artigo 17 da Lei nº 8.668, de 25 de junho de 1993, pode-se depreender que o aspecto temporal da hipótese de incidência do Imposto de Renda é a distribuição de lucros pelos Fundos de Investimento Imobiliário a seus investidores. Apenas e tão somente a partir da ocorrência de tal evento, o administrador do fundo assume o papel de responsável pela retenção e posterior recolhimento do tributo.
Nessa linha, para determinar o momento exato em que surge a obrigação do administrador em recolher o tributo em questão, faz-se necessária a compreensão do significado do vocábulo “distribuição”.
Para tanto, uma vez que não há uma definição própria de distribuição na legislação tributária, deve-se avaliar os possíveis conceitos atribuídos a este termo pelo ordenamento jurídico pátrio.
Nesse sentido, há de se mencionar, preliminarmente, que o vocábulo distribuir, mesmo desprovido de qualquer acepção jurídica, significa dar ou entregar coisa a diversas pessoas.
Ademais, tomaremos como base também o significado atribuído ao vocábulo pela Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1964, - Lei das Sociedades por Ações, inclusive porque os lucros distribuídos pelas sociedades por ações a seus acionistas recebe o nome de dividendos.
De fato, dividendo é a parcela do lucro ou rendimento a que o titular de uma ação faz jus. Note-se que, na legislação dos Fundos de Investimento Imobiliário, a distribuição prevista é de “dividendos”.
Feita tal consideração, entendemos que a legislação societária equipara a distribuição à ocorrência de efetivo pagamento da parcela do lucro apurado pela sociedade, o dividendo, concretizado mediante a ocorrência cumulativa de dois eventos distintos: (i) a apuração de lucro, e (ii) a deliberação de assembleia geral determinando o pagamento de tais quantias. Sem a observância sucessiva dessas duas condições, pode-se afirmar que não ocorre a efetiva distribuição dos lucros. Isso quer dizer que o vocábulo distribuir significa, para a legislação societária, tão somente pagar, observando os procedimentos supra.
Tal entendimento pode ser extraído do artigo 201 da Lei das Sociedades Anônimas, o qual utiliza os dois vocábulos, quais sejam, distribuir e pagar, alternadamente e com o mesmo conteúdo semântico.
Como se nota, a acepção conferida pela lei ao vocábulo distribuir é equivalente ao de realização de pagamento dos dividendos.
Dessa forma, se o procedimento utilizado pelos Fundos de Investimento Imobiliário não envolve qualquer pagamento ou entrega de valores ao quotista, não há de se falar na ocorrência de distribuição strictu sensu, isto é, evento apto a ensejar a retenção e o recolhimento do Imposto de Renda, desde que o lucro não tenha sido apurado e/ou o seu respectivo pagamento não tenha sido deliberado (por meio de ato expresso do administrador ou qualquer outro meio societário para registrar a distribuição dos lucros).
Adicionalmente, é de se observar que os traços constitucionalmente estabelecidos para o Imposto de Renda impedem sua incidência em momento distinto da sua efetiva distribuição aos quotistas, ou seja, o Imposto de Renda só pode incidir quando o rendimento se tornar disponível, sob qualquer forma, ao beneficiário, tornando-se uma obrigação exigível. Caso contrário, restará caracterizada hipótese de evidente inconstitucionalidade, passível de questionamentos pelos contribuintes junto ao Judiciário.
Tal afirmação sustenta-se no artigo 43 do Código Tributário Nacional que estabelece que o Imposto de Renda tem como fato gerador a aquisição de disponibilidade econômica (que informa o regime de caixa, como mencionado anteriormente) ou jurídica do acréscimo patrimonial.
Com base nesse dispositivo legal, tem-se que só ocorrerá a incidência do Imposto de Renda quando restar concretizada - em sua plenitude - a aquisição de disponibilidade jurídica ou econômica dos rendimentos pelo quotista.
Neste sentido, em um cenário de reaplicação de ganhos pelas carteiras dos Fundos de Investimento Imobiliário e consequente inexistência de recursos em caixa para distribuição de lucros aos quotistas ou, ainda, de não deliberação de distribuição dos referidos lucros, não há de se falar na aquisição de disponibilidade jurídica ou econômica ao quotista, eis que ele não teria a aptidão de exigir o pagamento ou a posse de tais valores.
Por outro lado, cumpre frisar que o crédito contábil poderia ensejar a disponibilidade jurídica da renda, desencadeando, consequentemente, a sua sujeição ao Imposto de Renda, desde que por meio do mesmo houvesse a transferência jurídica da renda para o patrimônio do beneficiário.
Não obstante, a nosso ver, o mero lançamento contábil nos livros da fonte pagadora, por si só, não é suficiente para ocasionar a incidência do Imposto de Renda, pois referido evento pode não ter o condão de criar obrigação do Fundo de Investimento Imobiliário em favor do quotista.
De tal maneira, resta evidente que ainda que houvesse lançamento contábil de lucros a distribuir aos quotistas, isto não representaria disponibilidade econômica ou jurídica em favor do quotista exigida pelo artigo 43 do Código Tributário Nacional, exceto se a obrigação já fosse exigível e não tivesse sido quitada.
Diante do acima exposto, no exemplificativo cenário de reaplicação de ganhos pelas carteiras dos Fundos de Investimento Imobiliário e, consequentemente, inexistência de recursos em caixa para distribuição de lucros aos quotistas ou, ainda, de não deliberação de distribuição dos referidos lucros, não deve se falar na incidência do Imposto de Renda, tampouco na obrigatoriedade de distribuição do resultado auferido com a comercialização de imóveis nos intervalos dos marcos temporais (30 de junho e 31 de dezembro) estabelecidos pela legislação tributária, dada a inexistência de lucro apurado com base no regime de caixa a ser distribuído no encerramento do semestre.
Com efeito, ainda que o caixa de tais alienações não seja integralmente consumido com a alocação em custos e despesas relacionados às atividades da carteira do fundo, não há de se falar na disponibilidade econômica ou jurídica de rendimentos aos quotistas, não tendo ocorrido o evento que autorizaria a incidência do Imposto de Renda. É com este enfoque que, a nosso ver, deve ser interpretado o regime de distribuição de lucros pelos Fundos de Investimentos Imobiliários.
4.2. Da equiparação dos Fundos de Investimento Imobiliário às pessoas jurídicas
A segunda questão controversa referente à tributação dos Fundos de Investimento Imobiliário também relaciona-se aos requisitos estabelecidos pela legislação vigente para que seja conferida às carteiras dos referidos fundos a isenção geralmente aplicada aos portfolios dos fundos de investimento.
Como mencionado, a análise dos requisitos em questão leva à conclusão de que o objetivo do legislador, ao estabelecer tais condições específicas, não foi o de assegurar a todo empreendimento imobiliário conduzido por um Fundo de Investimento Imobiliário um tratamento fiscal mais benéfico, mas tão somente aos que apresentem certa pulverização de quotistas.
Com efeito, a despeito da inexistência de exposição de motivos quando da instituição da regra em comento, a nosso ver, estruturas envolvendo a constituição e/ou interposição de Fundos de Investimento Imobiliário, com concentração de quotistas e desenhadas com o único propósito de postergação da tributação incidente sobre o desenvolvimento de atividades imobiliárias, foram inibidas pelo legislador através da referida equiparação de suas carteiras, para fins tributários, às pessoas jurídicas em geral, nos termos do artigo 2º da Lei nº 9.779/1999.
Neste contexto, diversas são as leituras do dispositivo em questão debatidas atualmente, sobretudo quanto à equiparação às pessoas jurídicas, para fins tributários, dos Fundos de Investimento Imobiliário que possuam quotistas exclusivos e/ou apresentem em suas carteiras imóveis construídos/incorporados no passado por seus quotistas ou pessoas a estes relacionadas.
Nesta linha, há de se observar que, nos termos do dispositivo acima transcrito, a regra de equiparação de um Fundo de Investimento Imobiliário a uma pessoa jurídica é deflagrada quando qualquer quotista do fundo que detenha, isoladamente ou em conjunto com pessoa ligada, 25% ou mais de suas quotas, seja também incorporador, construtor ou sócio de empreendimento imobiliário em que o fundo aplique seus recursos.
A regra de desenquadramento pressupõe, portanto, que o quotista do Fundo de Investimento Imobiliário esteja enquadrado cumulativamente em duas qualificações distintas:
- Qualificação Quantitativa: deter mais de 25% das quotas do fundo e;
- Qualificação Subjetiva: ser incorporador, construtor ou sócio do empreendimento em que o fundo aplique seus recursos.
Nesse sentido, é evidente que a análise dos elementos prescritos pela norma legal para fins de aplicação de tal equiparação (ou seja, a ocorrência simultânea das Qualificações Quantitativa e Subjetiva) não deve alcançar fatos anteriores, isto é, as “qualidades” em questão devem ser verificadas em um mesmo e presente momento.
Destarte, muito embora, em momento anterior à aquisição pela carteira do determinado Fundo de Investimento Imobiliário, certo imóvel possa ter sido de propriedade direta de um quotista ou, ainda, por este construído ou incorporado, tal situação deixa de ocorrer quando, já concluído, o imóvel passa a ser detido exclusivamente pela carteira de um Fundo de Investimento Imobiliário (ou seja, quando a única relação entre o imóvel e o quotista passa ocorrer através do investimento no Fundo de Investimento Imobiliário).
De fato, não se pode pretender a caracterização de um quotista de certo Fundo de Investimento Imobiliário como “sócio do empreendimento imobiliário”, para os fins aqui discutidos, pelo simples fato de ser quotista. Fosse esta a intenção da lei, bastaria dizer que a tributação como pessoa jurídica se daria apenas pela qualificação quantitativa (deter 25% ou mais das quotas do fundo), o que claramente não foi o desejo do legislador.
Da mesma forma, importa observar que, na hipótese de a construção/incorporação do imóvel ser realizada por pessoa relacionada ao quotista em questão (ainda que quotista exclusivo), igualmente não há de se falar na equiparação para fins tributários da carteira do fundo a uma pessoa jurídica.
Isso porque, a nosso ver, a leitura adequada do artigo 2º da Lei nº 9.779/1999, leva à conclusão de que o conceito de pessoa ligada deve ser observado unicamente para fins de análise da Qualificação Quantitativa. Consequentemente, ainda que o construtor/incorporador venha a ser pessoa ligada ao quotista exclusivo do Fundo de Investimento Imobiliário, não se verifica, em nossa opinião, a Qualificação Subjetiva necessária à equiparação do fundo a uma pessoa jurídica.
Não obstante, em um precedente1 recente e isolado, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) manteve, por maioria de votos, a imposição a certo Fundo de Investimento Imobiliário da tributação aplicável às pessoas jurídicas com fulcro justamente (i) na anterior qualidade do quotista do fundo em questão como sócio dos imóveis posteriormente adquiridos pela carteira do fundo e (ii) em sua subsequente qualidade de quotista exclusivo do referido fundo.
Contudo, o exame detido do acórdão proferido no citado precedente, revela a imprecisão e falta de clareza do entendimento adotado pelo Carf naquela ocasião, o qual, em nossa opinião, não merece prevalecer por ausência de base legal.
Com efeito, nos termos mencionados acima, deve haver coexistência entre a titularidade pelo investidor do Fundo de Investimento Imobiliário de 25% ou mais de suas quotas e sua caracterização como construtor, incorporador ou sócio do empreendimento detido pelo fundo investidor (ou seja, verificação em um mesmo momento das Qualificações Quantitativa e Subjetiva).
Ademais, cumpre-nos destacar que, ainda que a legislação de regência da matéria seja imprecisa e não faça qualquer diferenciação entre imóveis em construção e empreendimentos concluídos, a equiparação, para fins tributários, de um Fundo de Investimento Imobiliário a uma pessoa jurídica somente deve ocorrer no período em que a investidora titular de 25% ou mais das quotas esteja realizando a incorporação ou a construção do imóvel detido pela carteira do fundo, posto que, uma vez concluída a obra e passando a relação entre o investidor do Fundo de Investimento Imobiliário e o imóvel unicamente através do investimento no fundo, não há de se falar em ocorrência dos eventos previstos na legislação como hipóteses de equiparação da carteira do fundo a uma pessoa jurídica.
Neste cenário, destaca-se que a legislação em vigor não prevê um procedimento específico para que um Fundo de Investimento Imobiliário que, por preencher simultaneamente as condições estabelecidas pelo artigo 2º da Lei nº 9.779, seja equiparado, para fins tributários a uma pessoa jurídica, deixe de incorrer em tal hipótese. Da mesma forma, inexiste na regulamentação em vigor um prazo para que tal eventual “reenquadramento” seja efetivado. Justifica-se, portanto, os pleitos realizados por certos players do mercado imobiliário junto às autoridades fiscais para que seja editada regulamentação específica sobre tal questão.
Não obstante, prevalece o entendimento de que a equiparação de um Fundo de Investimento Imobiliário a uma pessoa jurídica somente deve ocorrer enquanto presentes as condições exigidas pelo artigo 2º da Lei nº 9.779 (isto é, a ocorrência simultânea das ditas Qualificações Quantitativa e Subjetiva).
Assim, a partir do momento em que nenhum investidor detenha simultaneamente 25% ou mais das quotas do fundo e seja sócio, incorporador ou construtor de um imóvel detido pelo fundo em questão, não há de se equiparar sua carteira, para fins tributários, a uma pessoa jurídica.
5. Conclusões
Diante do exposto, é possível concluir que os fundos de investimento apresentam um papel central nos mercados financeiro e de capitais brasileiros, representando uma fundamental fonte de financiamentos dos diferentes setores econômicos e, ao mesmo tempo, um atrativo investimento financeiro para os detentores de capital, inclusive pessoas físicas.
Neste contexto, os Fundos de Investimento Imobiliário destacam-se como uma importante alternativa de financiamento de empreendimentos imobiliários de médio e longo prazos, sobretudo no atual cenário de expansão imobiliária e de valorização de imóveis nas principais cidades brasileiras.
Nesse sentido, o legislador tributário estabeleceu um tratamento fiscal bastante singular aos Fundos de Investimento Imobiliário, afastando-os das regras geralmente aplicáveis aos fundos de investimento no Brasil.
Especificamente, buscando uma maior pulverização das quotas dos Fundos de Investimento Imobiliário e inibindo estruturas que objetivassem somente a postergação da tributação incidente sobre o desenvolvimento de atividades imobiliárias, a legislação em vigor estabelece uma série de condições específicas para que as carteiras dos Fundos de Investimento Imobiliário sejam isentas do Imposto de Renda, assim como seus quotistas pessoas físicas não tenham os rendimentos apurados com relação a tais investimentos onerados pelo tributo em questão.
Naturalmente, a falta de clareza e especificidade das regras tributárias em questão leva a inúmeras incertezas quanto ao funcionamento dos Fundos de Investimento Imobiliário e seus reflexos fiscais. É o caso, por exemplo, do controverso regime de distribuição mandatória de lucros pelos Fundos de Investimentos Imobiliários.
Assim, considerando a mencionada importância dos Fundos de Investimento Imobiliário como fonte de financiamento da expansão do setor imobiliário brasileiro, sugere-se que a correspondente legislação seja aprimorada, fundamentalmente nas questões que ensejam maiores debates, como as hipóteses de equiparação, para fins tributários, das carteiras dos Fundos de Investimento Imobiliário às pessoas jurídicas, que já opõem contribuintes e autoridades fiscais no âmbito do Carf e do Judiciário.
1 BRASIL. Ministério da Fazenda. Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Acórdão nº 1301-00.994, sessão, 7 de agosto de 2012, data de publicação 9 de abril de 2013. 1ª Seção, 3ª Câmara. Relator: Wilson Fernandes Guimarães.