Direito Constitucional Tributário Comparado: a Tributação nas Constituições do Brasil e de Outros Países

Rodrigo Caramori Petry

Professor de Direito Tributário. Advogado e Consultor em Curitiba - Estado do Paraná - Brasil - América do Sul. Mestre em Direito Econômico e Social pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Membro Associado do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Membro do Conselho Acadêmico de Tributação da Associação Comercial do Paraná.

Resumo:

O presente texto analisa a existência e a formulação do Direito Constitucional Tributário em dez países diferentes, incluindo o Brasil, apontando e comparando os textos das diversas Constituições, para apresentar um panorama geral da regulação constitucional da matéria tributária nesses países e a posição singular da Constituição brasileira.

Palavras-chave: Direito Tributário, Direito Constitucional, direito comparado.

Abstract: this paper analyzes the existence and formulation of constitutional tax law in ten different countries, including Brazil, pointing and comparing the texts of the various constitutions, to present an overview of the constitutional regulation of tax matters in these countries and the unique position of the Brazilian Constitution.

Keywords: tax law, constitutional law, comparative law.

1. Introdução

No presente artigo vamos realizar um estudo comparativo entre o texto constitucional brasileiro em matéria tributária e os textos de outros nove países, abrangendo assim a experiência constitucional de nações localizadas em cinco continentes,1 com organizações sociais, políticas e econômicas diversas. A escolha dos países que serão objeto de nosso estudo comparativo foi baseada em razões variadas, mas criteriosas: uns, são países dentre os mais desenvolvidos econômica e socialmente no mundo; outros países foram escolhidos porque mantêm relações econômicas ou sociais próximas e interessantes para o Brasil; ou, no caso de alguns países, o interesse comparativo está justamente em analisar se e como a radical diversidade de orientação política e econômica que tais países guardam com relação ao Brasil influencia na regulação constitucional expressa da atividade tributária.

Para ser factível uma pesquisa dessa natureza em artigo científico é preciso primeiramente restringi-la em termos quantitativos, talhando-a em um corte horizontal. Isso porque na atualidade existem aproximadamente 193 países reconhecidos no mundo. Logicamente, uma abordagem de todos os países esbarraria em nossas limitações de espaço editorial. Além do mais, o presente estudo não pretende exaurir a matéria, mas apontar experiências constitucionais notavelmente interessantes para efeitos comparativos com o Brasil.

Daí também é necessário fazer outro recorte no objeto da pesquisa, agora de caráter vertical, e que por isso diz respeito a um limite de aprofundamento do objeto, para restringir o nível de investigação das Constituições de cada um dos países escolhidos para a pesquisa. Em virtude desse recorte, afirmamos que, rigorosamente, não será objeto de estudo a integralidade do “Direito Constitucional Tributário”2 de cada um dos países analisados, e sim apenas os textos/dispositivos de cada Constituição que tratam expressa e especificamente da tributação. Portanto, não se fará aqui uma comparação ampla entre os “limites ao poder de tributar” existentes na Constituição de cada país, porque uma análise de tal magnitude exigiria uma exposição muito mais complexa e demorada, abrangendo também: (i) as normas constitucionais tributárias não expressas; e (ii) as normas constitucionais gerais aplicáveis à atividade tributária, de alguma forma, em cada país.

Seria de se exigir, caso nos propuséssemos a uma investigação mais profunda dos regimes constitucionais tributários, a indicação e análise de todos os dispositivos constitucionais que pudessem ser aplicados para limitar o poder de tributar (ainda que não especialmente voltados à tributação). E isso abrangeria desde os direitos fundamentais como a propriedade, a liberdade, a igualdade, a inviolabilidade do domicílio, a privacidade, a irretroatividade da lei etc., que estão presentes em praticamente todas as Constituições atuais de países mais representativos (embora com diferentes pesos jurídicos), até as regras relativas à intervenção do Estado na economia, assim como as regras relativas às prestações e serviços sociais (previdência, saúde pública etc.),3 já que os tributos comumente servem para financiar e interferir nessas diversas áreas.

Essa abrangência iria além, pois uma análise profunda do Direito Constitucional Tributário estrangeiro e comparado também teria de se basear na interpretação dos tribunais constitucionais de cada país, já que seria fundamental considerar como cada país interpreta seus próprios dispositivos constitucionais em relação à atividade tributária, dando assim uma maior precisão ao estudo dos limites tributários existentes na Constituição de cada país, inclusive porque diversos desses limites são implícitos.4

Portanto, no presente estudo, a pesquisa é dedicada estritamente à análise dos textos constitucionais. O estudo é focado nos dispositivos constitucionais que expressamente se dirigem à atividade tributária em cada país. Pelos motivos já explicitados, não será feita aqui a identificação de todas as normas tributárias que possam ser extraídas dos textos constitucionais (importante lembrar aqui a distinção entre “veículo normativo”, “texto normativo” e “norma jurídica”).5

Tendo em vista que o regime constitucional tributário adotado em um país é fortemente influenciado pela forma de organização e exercício do poder do Estado, procuraremos identificar qual é a forma de governo e de Estado adotada em cada um dos países cujas Constituições serão analisadas.6

2. A Doutrina sobre Direito Constitucional Tributário no Brasil e os Estudos de Direito Constitucional Tributário Estrangeiro e Comparado

É interessante notar que nos livros escritos no Brasil sobre Direito Constitucional Tributário, assim como nas obras gerais sobre Direito Tributário brasileiro (ou seja, as que tenham por proposta estudar a generalidade de áreas componentes do Direito Tributário), são incomuns as abordagens sobre textos constitucionais tributários de outros países. Também raras são as abordagens de direito constitucional tributário comparado, ou seja, que impliquem o cotejamento sistemático entre diversos sistemas constitucionais tributários, ou mesmo a simples comparação entre textos alienígenas constitucionais expressos em matéria tributária e o texto constitucional brasileiro.7

Um pouco mais presentes em nossa doutrina são as abordagens científicas de aspectos tópicos do Direito Constitucional Tributário de outros países, comparando-os com aspectos tópicos do texto constitucional tributário brasileiro.8 Também existem algumas poucas obras doutrinárias de juristas brasileiros que tratam de aspectos do Direito Constitucional Tributário estrangeiro mas o fazem apenas por intermédio de citações de doutrinadores estrangeiros, sem transcrever e explorar o texto constitucional expresso desses países em matéria tributária.9

São encontradas com muito mais frequência as publicações de obras doutrinárias tratando do Direito Constitucional comparado de modo geral, mas é muito comum que tais obras sequer toquem o tema do Direito Constitucional Tributário.10

Tendo em vista esse panorama doutrinário, constata-se a oportunidade do presente estudo, que pretende ajudar a preencher uma lacuna nas pesquisas de Direito Constitucional publicadas no Brasil.

3. Aspectos Gerais do Direito Constitucional Tributário

3.1. Tributo: um fenômeno universal das finanças públicas no mundo

A constituição e a organização das finanças públicas é um assunto de preocupação universal, de todos os Estados pelo mundo afora. E o tributo, entendido aqui como uma prestação pecuniária compulsória exigida pelo Estado (ou, em alguns casos, exigida por entidade que colabore com o Estado),11 é reconhecido como principal meio de financiamento dos gastos estatais por praticamente todos os países.

E nem mesmo o país Estado da Cidade do Vaticano12 deixa de instituir tributos, embora tal cobrança seja cercada de peculiaridades que impedem comparativos alinhados com as demais nações soberanas.13 Dada a peculiaridade da organização da Santa Sé, a Constituição do Vaticano (chamada “Código de Direito Canônico”)14 não será objeto de análise neste estudo, ainda que esteja voltado para o Direito Constitucional Tributário comparado.

Embora os tributos sejam objeto comum de preocupação de todos os Estados na atualidade, o nível de regulação expressa da atividade tributária no texto das Constituições dos países é variado: a maioria dos países aponta apenas alguns princípios e regras tributários em suas Constituições, sem ocupar-se muito nessa tarefa; uns poucos países detalham mais o tratamento expresso da tributação, e alguns países quase não tratam da matéria tributária em seu texto constitucional.

São as peculiaridades históricas da vida política, da economia e da sociedade de cada país que explicam as opções de cada nação em relação à forma de regramento da atividade tributária no texto de suas Constituições.

3.2. Aspectos comuns do Direito Constitucional Tributário em diversos países

Em relação ao Direito Constitucional Tributário, é de se notar a tendência de que todas as Constituições do mundo tenham ao menos um dispositivo explícito tratando de matéria tributária. Apesar de ter aspectos em comum em diversos países, a extensão e a forma de regulação do Direito Constitucional Tributário varia muito entre as Constituições, especialmente em relação às normas explícitas. Inclusive, muitos países, ao contrário do Brasil, não fixam numerosas normas limitadoras explícitas em face do poder de tributar, pois o sistema de limitações vigora a partir da interpretação ampla dos princípios gerais da Constituição desses países, como ocorre, por exemplo, na Alemanha, onde as limitações tributárias são, na sua maioria, implícitas.15

O que importa fixar é que a inexistência de regra expressa não significa que não existam limites para a atividade tributária em um país, pois diversas nações adotam os princípios constitucionais gerais ou implícitos como limitações ao poder de tributar, construindo tais limitações por meio de uma atividade interpretativa dos textos constitucionais.

De outro lado, em alguns países o texto constitucional demonstra uma preocupação apenas em legitimar a tributação, bastando-se no primado da lei (infraconstitucional), e inclusive alertando para o caráter obrigatório do tributo.16 Em verdade, atualmente, não importando o regime político do Estado, todo país possui uma Constituição. Mas isso não quer dizer que todo e qualquer país seja organizado politicamente em regime que prestigie as liberdades democráticas. Apesar de inicialmente as Constituições serem conhecidas como “cartas de liberdades”, pois utilizadas para libertar as massas contra o poder absolutista reinante em muitos países do Ocidente até meados do século XIX, especialmente na Europa, a ideia de um país ter Constituição (e assim ser um “Estado Constitucional”) não implica necessariamente em identificá-lo como um “Estado Democrático de Direito” como conhecemos. A história de alguns países ditos “socialistas” pode nos servir de exemplo aqui.

De qualquer forma, o desenvolvimento das civilizações ao redor do globo terrestre, influenciado pela crescente troca de informações e mútuas influências jurídicas, especialmente aquelas prestigiando as liberdades individuais, gerou uma contaminação geral pelo constitucionalismo, na maioria das vezes entendido como símbolo ou presunção de nação organizada, pacífica e respeitosa dos direitos individuais. O direito constitucional tributário também evoluiu em diversos países como fruto de influências de outras nações nas quais algumas ideias foram bem sucedidas. Daí ser possível identificar, em muitos países, alguns “princípios comuns de direito constitucional tributário”, aos quais Victor Uckmar dedica especial atenção em seu livro que usa essa expressão como título e que se tornou um clássico da matéria.17 Na obra referida, o autor identifica a quase onipresença da legalidade e da igualdade nas Constituições dos mais diversos países do mundo, e, em menor grau, a presença marcante de alguma forma de distribuição explícita de competências tributárias entre as esferas de poder fiscal descentralizadas (seja em países unitários, que atualmente aderem à descentralização fiscal para melhorar sua administração, seja em países já compostos por unidades federativas, autônomas em geral, como é o caso do Brasil).

3.3. Relações entre o Direito internacional, o Direito comunitário supranacional e o Direito Constitucional Tributário

Antes de avançar no estudo do Direito Constitucional Tributário de cada país, cumpre aqui fazer alguns esclarecimentos elementares sobre o Direito internacional tributário e sobre o Direito comunitário supranacional, especialmente acerca do regime jurídico dos blocos de integração internacional e sua relação com o Direito Constitucional Tributário dos países envolvidos em tais blocos.

Como as Constituições dos Estados-membros dos blocos de integração, de modo geral, não detalham o regime tributário nacional e ao mesmo tempo partilham da obediência a certos princípios comuns de Direito Constitucional Tributário, os tratados internacionais que formam os blocos econômicos assim como as normas supranacionais editadas pelos órgãos comunitários (como ocorre na União Europeia) não trazem derrogações substanciais para o Direito Constitucional Tributário de cada Estado-membro, que continua válido e aplicável em cada país.

É regra que os países com tratados de livre comércio ou outra espécie de integração recebam e internalizem disposições tributárias que se integram ao arcabouço normativo infraconstitucional, especialmente quanto aos tributos aduaneiros de interesse ao comércio multilateral dos membros do bloco, pois a razão do acordo, em sua parte comercial, é a desoneração de tributos no comércio intrabloco. Ao lado dessas normas aduaneiras tributárias, também são internalizadas nos países acordantes outras normas infraconstitucionais, para que possa haver harmonização legislativa dos tributos que incidam sobre matérias ou sujeitos passivos que possam interessar a mais de um país, como, por exemplo: a tributação sobre a renda transnacional (empresas multinacionais); a tributação sobre bens cuja localização e seu titular estejam em diferentes países; a tributação sobre transmissão de bens de um país a outro; a tributação previdenciária sobre trabalhadores cuja residência e o trabalho se localizem em países distintos etc.18

Mas como a maioria dos países (inclusive os membros da União Europeia) possui pouco detalhamento das regras tributárias em suas Constituições, o Direito Constitucional Tributário expresso deles convive com os tratados internacionais que fixam regras tributárias intergovernamentais, assim como com regras supranacionais, sem necessidade de substanciais alterações/adaptações. Por tal razão, podemos prosseguir o presente estudo de Direito Constitucional Tributário sem explorar as regras do Direito internacional e comunitário, pois vamos abordar aqui apenas um primeiro extrato de conhecimento acerca do Direito Constitucional Tributário: as normas constitucionais expressas sobre a tributação em cada país analisado.

4. Análise do Direito Constitucional Tributário de Diversos Países pelo Mundo

4.1. Constituição do Brasil

O Brasil (República Federativa do Brasil) é um país organizado sob o regime político republicano presidencialista, com o poder estatal dividido na forma de um Estado federativo, no qual a competência para instituir e cobrar tributos é repartida, não somente entre o poder central (União Federal) e os 26 entes federados (Estados), mas também é dividida com 5.570 poderes locais, denominados de “Municípios”, que são subdivisões político-territoriais dos Estados. Além disso, outra entidade político-territorial, o chamado “Distrito Federal” (DF), onde se localiza a sede da República Federativa do Brasil, também recebe competência tributária, podendo instituir e cobrar os tributos típicos dos Estados e também aqueles atribuídos aos Municípios. Tal organização é estabelecida pela Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 1988 e ainda em vigor (até hoje - 16 de outubro de 2013 - já modificada por 81 emendas, sendo 75 ordinárias e 6 de revisão constitucional).

Antiga colônia de Portugal, o Brasil nasceu, ou melhor, teve sua independência proclamada, em 1822, sob um regime político monárquico hereditário constitucional. Após a independência e até hoje o Brasil já esteve sob 8 Constituições: (i) Constituição do Império (1824); (ii) Constituição da “República dos Estados Unidos do Brasil” (1891), que consolidou a mudança para o regime republicano, ocorrida em 1889; (iii) Constituição de 1934; (iv) Constituição de 1937 (formalizou o regime ditatorial do “Estado Novo”); (v) Constituição de 1946 (de abertura liberal, vigorou até novo golpe militar em 1964, a partir de quando foi progressivamente derrogada por atos institucionais editados por uma junta governamental militar); (vi) Constituição de 1967 (formalizando a revolução militar); (vii) “Emenda” nº 1/1969 (considerada como uma nova Constituição, pois reformulou basicamente todo o regime constitucional da Carta de 1967)19; e (viii) Constituição de 1988, editada para consolidar a volta ao regime democrático no Brasil, após lento e progressivo período de reabertura política, iniciado com maior visibilidade a partir de 197920.

A Constituição Federal brasileira de 1988 é especialmente detalhada em matéria tributária, constituindo um sistema amplo de normas protetivas dos cidadãos-contribuintes. Além do texto constitucional do Brasil possuir um capítulo especialmente dedicado à tributação, contendo a divisão das competências tributárias entre os entes políticos federados21 e a fixação de diversos limites ao poder de tributar, numerosas outras normas tributárias estão espalhadas pelo texto constitucional brasileiro. Existem normas expressamente voltadas à tributação em quase todos os Títulos da Constituição e nas suas disposições transitórias e emendas, somando um total de 61 artigos onde constam normas diretamente dirigidas à atividade tributária no Brasil, permanecendo a grande maioria dessas normas em vigor ainda atualmente.

É importante frisar que a extensão e a densidade extraordinárias do sistema constitucional tributário brasileiro não representam propriamente uma novidade do Texto Constitucional de 1988. As Constituições anteriores também continham numerosos dispositivos tributários, especialmente as de 1969, 1967 e 1946 (após a redação dada pela Emenda nº 18/1965)22, e, com menor dimensão, também as Cartas de 1946 (em sua redação original), 1937, 1934 e 1891 eram relativamente pródigas em dispositivos tributários se comparadas com as Constituições de outros países.

Vejamos abaixo todos os Títulos e os dispositivos expressos da Constituição brasileira atual que tratam de matéria tributária, conforme constam do seu texto:

- Título I (Dos Princípios Fundamentais): não há dispositivos tributários;

- Título II (Dos Direitos e Garantias Fundamentais)23: art. 5º, XXXIV (imunidade contra taxas, vedando a cobrança de taxas em razão do fornecimento de certidões pelo Poder Público); e art. 8º, IV, in fine (contribuição sindical);

- Título III (Da Organização do Estado): art. 24, I (competência legislativa concorrente em matéria tributária, entre União, Estados e DF); art. 30, III (competência legislativa tributária dos Municípios); art. 37, XXII (administrações tributárias); art. 40, caput e parágrafos 18 e 21 (contribuição previdenciária dos servidores públicos); art. 43, parágrafo 2º, III (incentivos tributários regionais);

- Título IV (Da Organização dos Poderes): art. 48, I (competência legislativa do Congresso Nacional em matéria tributária); art. 61, parágrafo 1º, II, “b” (iniciativa de propositura de projetos de leis tributárias); art. 62, parágrafo 2º (limites à medida provisória em matéria de impostos); art. 114, VIII (contribuições sociais previdenciárias devidas em virtude de ações trabalhistas);

- Título V (Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas): não há dispositivos tributários;

- Título VI (Da Tributação e do Orçamento): seu Capítulo I trata exclusivamente do “Sistema Tributário Nacional” em seus arts. 145, 146, 147, 148, 149 e 149-A (fixando as regras gerais sobre as espécies de tributo e as competências básicas em matéria tributária); arts. 150, 151 e 152 (fixando diversas limitações ao poder de tributar); e arts. 153, 154, 155 e 156 (distribuindo a competência tributária para instituição de impostos entre União, Estados, DF e Municípios, além de fixar diversos limites e normas gerais aos impostos respectivos);

- Título VII (Da Ordem Econômica e Financeira): art. 173, parágrafo 1º, II (tratamento tributário da empresa pública e da sociedade de economia mista); art. 177, parágrafo 4º (contribuição tributária de competência da União Federal, para intervenção sobre o domínio econômico no setor de petróleo e combustíveis); art. 179 (tratamento tributário para micro e pequenas empresas); art. 182, parágrafo 4º, II (imposto sobre a propriedade imóvel urbana com alíquotas progressivas como instrumento da política de urbanismo); art. 184, parágrafo 5º (imunidade tributária nas desapropriações de imóveis rurais para reforma agrária);

- Título VIII (Da Ordem Social): art. 194, parágrafo único, V e VI (diversidade e equidade na fixação de bases de incidência e de sujeitos contribuintes da seguridade social); art. 195, I, II, III e IV, e os parágrafos 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 11, 12 e 13 (diversas regras sobre as contribuições sociais tributárias que financiam os serviços e prestações de seguridade social); art. 201, caput e parágrafos 1º, 10, 11, 12 e 13 (regras sobre contribuições previdenciárias), art. 212, §5º (contribuição social tributária para financiar a educação básica pública);

- Título IX (Das Disposições Constitucionais Gerais): art. 239, caput e parágrafo 4º (contribuição ao PIS, cuja cobrança financia o seguro-desemprego e o abono/auxílio financeiro anual para trabalhadores de menor renda); art. 240 (contribuições sociais tributárias sobre a folha de salários, para financiar entidades de educação técnica e apoio social (Senai, Sesi, Senac etc.) 24);

- Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (parte final do texto constitucional): nesta parte constam dispositivos de transição, diversos deles incluídos por emendas constitucionais, contendo diversas normas inclusive em matéria tributária, especialmente quando possuem natureza dinâmica ou provisória, quais sejam: art. 34 (trata da vigência do sistema tributário nacional); arts. 40 e 92 (manutenção, por prazo determinado, de incentivos fiscais para produção econômica na Zona Franca de Manaus/Amazônia); art. 41 (incentivos fiscais setoriais); art. 56 (arrecadação de contribuição de seguridade social/Finsocial); art. 57 (tratamento de débitos tributários previdenciários de Estados e Municípios); art. 72 (tributos para o Fundo Social de Emergência); arts. 74, 75, 80, I, 84 e 85 (trataram da extinta contribuição provisória sobre movimentação financeira (CPMF) enquanto ela estava em vigor); art. 78, parágrafo 2º (pagamento de tributos com uso de precatórios/condenações judiciais contra o Estado); arts. 80 e 82 (alíquotas adicionais de impostos para o Fundo de Combate à Pobreza); art. 88 (alíquota mínima para o imposto sobre serviços (ISS)); e o art. 94 (vigência de regime tributário diferenciado para micro e pequenas empresas).

Além dessa enorme quantidade de dispositivos expressamente dedicados à tributação, a Constituição brasileira ainda possui vários dispositivos tributários presentes no texto de algumas emendas constitucionais que não foram integrados ao texto-base da Constituição. Tais dispositivos vigoraram (e parte deles vigora ainda hoje) nessa condição validamente.25 Vejamos tais dispositivos, incluindo aqui alguns que já deixaram de vigorar (indicamos tal circunstância entre parênteses, para que não sejam tais dispositivos somados ao que estão em vigor ainda atualmente).

- arts. 2º, 3º e 4º da Emenda nº 3/1993 (trataram do hoje já extinto imposto provisório sobre movimentação financeira, e determinaram a extinção do imposto estadual de renda e do imposto municipal sobre vendas);

- art. 12 da Emenda nº 20/1998 (manutenção de contribuições à seguridade);

- art. 4º da Emenda nº 41/2003 (contribuição previdenciária do servidor público em transição);

- arts. 4º e 5º da Emenda nº 42/2003 (adicionais de impostos estaduais e projeto de benefícios fiscais);

- arts. 5º e 6º da Emenda nº 62/2009 (tratando de precatórios/condenações judiciais contra o Estado e seu uso como moeda alternativa para o pagamento de tributos).

Como se vê, muitos desses dispositivos tributários fixam regras delimitadoras da incidência dos tributos chamados “contribuições sociais”, que formam uma espécie de tributo para além dos impostos, das taxas e das contribuições de melhoria, e que apesar de tomar de empréstimo uma estrutura jurídico-normativa típica de impostos,26 possuem peculiaridades devido à especial destinação constitucional. As contribuições sociais ocupam um grande espaço na carga tributária brasileira, e financiam as atividades estatais ligadas à saúde pública, à previdência (aposentadorias, pensões, seguros de acidentes do trabalho e outros benefícios) e à assistência social aos necessitados (pobres, crianças, adolescentes e idosos desamparados etc.).

Além dessas contribuições sociais, também são regradas no texto constitucional brasileiro uma série de outras contribuições de natureza tributária, que financiam outras atividades do Estado brasileiro e seus intermediários, seja no interesse da intervenção da União Federal sobre o domínio econômico, especialmente em determinados setores da economia onde se mostrou necessária e útil a intervenção pública para fomentar o desenvolvimento ou o equilíbrio da economia; seja também no interesse das organizações sindicais patronais e dos trabalhadores, ou no interesse das entidades públicas/autarquias que fiscalizam o exercício de profissões regulamentadas por lei.

Em virtude de todo esse cuidado da Constituição do Brasil com o regramento da atividade tributária, dizemos que o cidadão brasileiro possui um regime de especial proteção constitucional em matéria tributária. É um caso singular no mundo, pois não encontramos na Constituição de outros países representativos o mesmo tratamento extenso e rígido relativo à atividade tributária do Estado.27 E é de se notar que a Constituição brasileira, em sua íntegra, não é a mais extensa do Globo, apesar de seus 250 artigos ordinários, 97 artigos de disposições transitórias, e pouco mais de uma dezena de artigos textualmente independentes do corpo principal da Constituição (constantes de determinadas emendas constitucionais). Mas, ao menos em matéria tributária, a Constituição brasileira é a mais extensa dentre os países com maior destaque no contexto político, econômico e social do mundo atual.28

É importante explicar o que chamamos, no parágrafo acima, de “dispositivos textualmente independentes”, porque os estudos constitucionais e tributários costumam ignorar sua existência, apesar de seu reconhecimento ser fundamental para a adequada compreensão da dimensão do texto Constitucional. Tais dispositivos são adições normativas independentes do texto constitucional original, ou seja, são dispositivos que constam apenas do texto da própria emenda constitucional, não sendo inseridos no texto da Constituição vigente. Note-se que em toda emenda constitucional há um dispositivo que, por sua própria natureza, consta apenas do texto da emenda, e nunca é integrado ao texto principal da Constituição: é o dispositivo que trata do início da vigência da emenda. Mas os dispositivos que estamos a tratar aqui vão além, pois regulam o próprio direito material, não a vigência da emenda. Daí alertarmos sempre que a leitura da Constituição não se basta no texto principal, pois existem alguns dispositivos que só podem ser encontrados no texto das Emendas Constitucionais. Para o bem da segurança jurídica, tais dispositivos somam número proporcionalmente reduzido se comparado ao número de dispositivos integrados diretamente no texto principal da Constituição.

Esses dispositivos textualmente autônomos podem ser encontrados nas seguintes emendas à Constituição brasileira de 1988, observando-se que diversos deles não estão mais em vigor atualmente: Emenda nº 2/1992 (art. 1º), Emenda nº 3/1993 (arts. 2º ao 5º), Emenda de Revisão nº 1/1994 (art. 2º), Emenda nº 8/1995 (art. 2º), Emenda nº 9/1995 (art. 3º), Emenda nº 17/1997 (arts. 3º ao 5º), Emenda nº19/1998 (arts. 25 ao 31 e art. 33), Emenda nº 20/1998 (arts. 9º ao 15), Emenda nº 24/1999 (art. 2º), Emenda nº 32/2001 (art. 2º), Emenda nº 33/2001 (art. 4º), Emenda nº 41/2003 (arts. 2º ao 9º), Emenda nº 42/2003 (arts. 4º e 5º), Emenda nº 45/2004 (arts. 3º ao 8º), Emenda nº 47/2005 (arts. 2º ao 4º), Emenda nº 51/2006 (art. 2º), Emenda nº 59/2009 (art. 6º), Emenda nº 60/2009 (caput do art. 1º), Emenda nº 62/2009 (arts. 3º ao 6º), Emenda nº 67/2010 (art. 1º), Emenda nº 69/2012 (arts. 2º e 3º), Emenda nº 70/2012 (arts. 2º e 3º), e Emenda nº 73 (art. 2º).

Além de todos esses dispositivos expressos e aplicados especialmente à tributação, o texto constitucional brasileiro ainda traz diversos dispositivos que, apesar de possuírem conteúdo normativo de aplicabilidade genérica, de amplo espectro (como o são os direitos fundamentais), são também aplicáveis à matéria tributária. E existem também aqueles dispositivos constitucionais que, apesar de serem primeiramente destinados a regular questões de um outro ramo do direito (v.g. direito administrativo, direito do trabalho, etc.), ganham uma especial importância em matéria tributária servindo para definir o possível âmbito de incidência de tributos. Um exemplo desse tipo de dispositivo é o art. 21 da Constituição, que, ao definir competências administrativas da União Federal, acaba por delimitar possíveis fatos geradores de taxas de serviços públicos ou de taxas devidas pelo exercício do poder de polícia da União nessas áreas de sua competência executiva. Outro exemplo é art. 7º da Constituição, que, ao definir diversos direitos pecuniários dos trabalhadores empregados, também define possíveis pagamentos que formam a folha de salários, que, por sua vez, é base de cálculo da contribuição previdenciária (que é um tributo).

Enfim, como é de se esperar, a interpretação do texto constitucional nos leva a um trabalho inesgotável de descoberta e construção de sentidos normativos, a se renovar incessantemente no esforço criativo do intérprete. Isso é resultado da própria abertura da linguagem, que em vão tenta abarcar o universo infinito de complexidades que o mundo real apresenta. É o que desafia a pretensão humana de trazer condições para decidibilidade dos conflitos, efetividade para os direitos, segurança e paz social.

No presente texto, porém, nos preocupamos apenas em apontar os dispositivos expressos da Constituição brasileira em matéria tributária, que, devido ao grande número não foram transcritos aqui e sim apenas indicados, para que assim tenhamos espaço para olhar com mais atenção as Constituições de outros países.

4.2. Constituição dos EUA

Os Estados Unidos da América (EUA) são um país politicamente organizado sob o regime de governo republicano presidencialista, em regime de Estado federativo, representando a maior economia do mundo ainda atualmente.

A única Constituição dos EUA foi promulgada em 17 de setembro de 1787, tendo sofrido 27 emendas até hoje,29 e é conhecida como primeira Constituição do Mundo Contemporâneo (isso sem considerarmos que a Declaração de Direitos da Virgínia de 1776 funcionou como uma verdadeira espécie de Constituição, e ainda que geralmente o início da Idade Contemporânea seja associado a um momento dois anos posterior: a Revolução Francesa de 1789).30 O texto constitucional norte-americano é composto de apenas sete artigos, quase todos com algumas poucas subdivisões. Trata-se de uma Constituição das mais sintéticas do mundo, mas isso não significa que seu abreviado texto limite a aplicabilidade de suas normas.

Assim como ocorreu com diversos outros países, uma das principais causas da Declaração de Independência dos EUA foi a luta contra o excesso e o arbítrio na cobrança de tributos, no caso, pela Inglaterra, país colonizador do território norte-americano original. Na época, a Inglaterra havia aumentado extraordinariamente os impostos sobre os colonos norte-americanos por causa dos gastos extras com a chamada “Guerra dos Sete Anos” e com manutenção do processo colonizador inglês, difuso por várias partes do Globo. Consequentemente, entre os anos de 1750 e 1770, as 13 colônias inglesas revoltaram-se contra os abusos e os colonos passaram a divulgar em forma de protesto a expressão “no taxation without representation” significando um basta à tributação arbitrária, sem a representação do povo por meio do parlamento.31 A expressão acabou por se tornar um símbolo clássico da reinvindicação de limites ao poder de tributar desde as origens do nascimento dos Estados Unidos, e inspirou parte do texto da Declaração de Independência em 1776.32

Embora nenhum dos sete artigos da Constituição dos EUA seja exclusivamente dedicado à matéria tributária (apenas o artigo I e as Emendas XVI e XXIV tratam da matéria em alguns de seus dispositivos), a interpretação das cláusulas constitucionais gerais da Carta norte-americana pela Suprema Corte tem mostrado aplicações do texto constitucional dos EUA para limitar o poder de tributar em determinados tipos de casos (geralmente ligados à necessária obediência à isonomia entre contribuintes e Estados, devido processo legal etc.). Ressalta assim a importância que possui a jurisprudência como fonte do Direito Constitucional nos EUA, inclusive e especialmente em matéria constitucional tributária, pois é pela interpretação feita pela Supreme Court que se descobrem os limites tributários não expressos no texto constitucional.

A propósito, já em uma das primeiras e mais comentadas decisões em matéria de Direito Constitucional Tributário, proferida pela Suprema Corte dos EUA em 1819 (caso do cidadão McCulloch versus Estado de Maryland), o Juiz Presidente da Corte, John Marshall, firmou a célebre advertência de que “o poder de tributar envolve também o poder de destruir” (the power to tax involves the power to destroy), e que, portanto, é preciso parcimônia na tributação.33

Conclui-se então que o texto da Magna Carta norte-americana é muito distinto do texto da Constituição brasileira em matéria tributária, apesar de implicitamente derivarem princípios e diretrizes comuns, como é a tendência em relação a todas as Constituições do mundo.34 Um dos aspectos mais marcantes é que, apesar de também adotar a forma federativa de Estado, a Constituição dos EUA não se ocupou de distribuir a competência legislativa tributária entre os entes federados (governo federal, Estados e Municípios), ou seja, não discriminou os tributos de cada ente, muito diferente do Brasil.

Do texto da Constituição dos EUA e de suas emendas, apenas os seguintes dispositivos trataram expressamente de normas tributárias: (i) artigo I (nas suas seções 7, 8, 9 e 10), onde se fixou a competência do Congresso para lançar e arrecadar taxas, impostos e outros tributos, exigindo sejam uniformes em todos os Estados, além de limites sobre impostos diretos, e limitações aos tributos aduaneiros (importação e exportação) e outras regras em prol do princípio do equilíbrio federativo entre os Estados; e (ii) as emendas XVI (1913) e XXIV (1964), tratando de impostos sobre a renda, e vedação a restringir direito de voto dos cidadãos em face de débitos de impostos.35

4.3. Constituição da Alemanha

A Alemanha é um país politicamente organizado sob regime de governo republicano (com Presidente e Chanceler) e regime de Estado federativo (Estados, distritos e municípios com autonomia, relacionados a um governo central), e sua economia capitalista é considerada atualmente a mais forte e expressiva da Europa.

País unificado em 1871 sob regime imperial (chamado “Segundo Reich”, durou de 1871 até 1918)36, a Alemanha já esteve sob três Constituições desde então: a Constituição Imperial ou “Bismarckiana”,37 de 1871, a Constituição Republicana de Weimar, de 191938, e, finalmente, a Constituição de 194939, ainda em vigor.

A atual Lei Fundamental da República Federativa da Alemanha, promulgada em 23 de maio de 1949 e tendo sofrido algumas alterações desde então40, é, como se viu, a sucessora direta da Constituição de 1919, conhecida como “Constituição de Weimar”41 e considerada a segunda Constituição “social” do mundo (aponta-se a Constituição do México de 1917 como a primeira Constituição com caráter social). O texto constitucional alemão atual é dividido em 11 capítulos, mas nenhum deles trata exclusivamente da tributação na Alemanha. O Capítulo que trata do “Sistema Financeiro” aborda os tributos e a distribuição das competências tributárias entre os entes federados conjuntamente com normas sobre distribuição de receitas, elaboração de orçamentos públicos, limites de endividamento público etc.

O texto constitucional alemão possui um total de 146 artigos, e apenas dois deles possuem dispositivos diretamente relativos à tributação, mas isso já é suficiente para que a Constituição alemã se destaque em relação às demais Constituições de países europeus pelo cuidado na discriminação das competências tributárias, em prestígio da forma de Estado Federal assumida pela Alemanha, como no Brasil também ocorre.

A matéria tributária é tratada apenas pelos artigos 105 e 106 da Constituição da Alemanha42, nos quais primeiramente são distribuídas as competências tributárias dos entes federados, inclusive com a nominação das bases de incidência de impostos (impostos aduaneiros, impostos sobre consumo, imposto sobre renda imobiliária etc.); e em seguida também são fixadas as regras de repartição das receitas arrecadadas, que incluem repasses financeiros entre os entes federados. Ou seja, a tônica do tratamento expresso da matéria tributária na Constituição alemã está na repartição de competências tributárias e o destino da arrecadação, quase que exclusivamente.

Os dispositivos tributários são reunidos às disposições financeiras, não havendo, ao contrário do caso brasileiro, uma separação das matérias. Além dos arts. 105 e 106, os demais artigos do capítulo da Constituição alemã que trata do “Sistema Financeiro” trazem apenas regras sobre a distribuição de receitas tributárias, administração tributária, orçamento e limites ao endividamento público.

A Constituição alemã centralizou as disposições tributárias no Capítulo do Sistema Financeiro, e não previu expressamente a instituição de tributos especiais para instrumentalizar as funções sociais do Estado, ou para instrumentalizar a intervenção do Estado sobre o domínio econômico ou no interesse de categorias profissionais ou econômicas (sindicatos e autarquias de fiscalização profissional), diferentemente da Constituição brasileira, que previu as contribuições especiais no art. 149 e em diversos outros dispositivos espalhados pelo texto constitucional.

4.4. Constituição da França

País no qual eclodiu a mundialmente famosa Revolução de 1789, pela qual o Rei Luis XVI foi limitado em seu poder, e a partir da qual gerou-se a queda do regime político monárquico absolutista, espalhando ideias liberais em diversas outras nações da Europa e das Américas, a França também teve sua história constitucional inspirada na luta contra o abuso na cobrança de tributos.43 Nesse sentido, note-se que a Revolução Francesa teve como uma de suas origens a revolta contra a cobrança de impostos extraordinários, razão pela qual a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) e a primeira Constituição da França (1791) ressaltaram o direito dos cidadãos a participar no controle da instituição e da cobrança de tributos.44

A França, conhecida no final do século XVIII e no século XIX como “barril de pólvora da Europa”45, em sua história política alternou-se várias vezes entre a monarquia e a república. Desde o abandono do Absolutismo Monárquico em 1789 com a Revolução Liberal, a França já esteve sob a égide de nada menos do que 15 Constituições (além de documentos legislativos de transição política com força constitucional): (i) Constituição de 1791 (fruto imediato da Revolução, restringiu o poder do Rei, criando uma monarquia constitucional); (ii) Constituição de 1792 (aboliu a monarquia, criando a 1ª República); (iii) Constituição do Ano I da República (promulgada em 1793); (iv) Constituição do Ano III da República (promulgada em 1795); (v) Constituição do Ano VIII da República (promulgada em 1799); (vi) Constituição do Ano X da República (promulgada em 1802); (vii) Constituição do Ano XII, ou Imperial, de 1804 (início do Império Napoleônico); (viii) Constituição de 1814 (marcando o fim do 1º Império Francês); (ix) Constituição de 1830; (x) Constituição de 1848 (fruto de nova Revolução, proclama a 2ª República); (xi) Constituição de 1852; (xii) Constituição de 1870; (xiii) Constituição de 187546; (xiv) Constituição de 1946, que assinala a 4ª República, logo após o final da Segunda Guerra Mundial); e (xv) Constituição de 1958 (marcando o início da 5ª República francesa, exercida em regime semipresidencialista, daí sua diferença para a 4ª República, que era parlamentarista).47

A França atual é um país politicamente organizado sob a forma de governo republicano exercido em regime semipresidencialista (conhecido como um misto de presidencialismo e parlamentarismo, com o Poder Executivo chefiado por um presidente conjuntamente com um primeiro-ministro)48 e regime de estado unitário (o país é dividido em 26 regiões administrativas subdivididas em municípios/comunas com pequena autonomia, o governo é centralizado), e sua economia é capitalista.

O texto da atual Constituição da República da França promulgada e em vigor desde 4 de outubro de 195849, é dividido em 16 títulos, que por sua vez se dividem em um total de 89 artigos, mas nenhum dos títulos é dedicado exclusivamente à tributação.

Em relação aos tributos, a Constituição francesa é muito singela, prevendo apenas em seu art. 34 (dentro do Título V, que trata das relações entre o Parlamento e o Governo) que a lei fixará as regras concernentes à base de cálculo, alíquotas, e as modalidades de recolhimento de impostos de todas as naturezas (legalidade tributária): “Article 34. La loi fixe les régles concernant: (...) - l’assiette, le taux et les modalités de recouvrement des impositions de toutes natures; le régime d’émission de la monnaie.” Como se vê, a Constituição francesa não tratou de outros limites tributários nem fixou a competência para instituição de tributos, sejam impostos ou sejam outros tributos, diferentemente do que ocorre na Constituição brasileira, que inclusive positivou a existência constitucional de contribuições como tributos voltados a determinados fins sociais, de intervenção sobre o domínio econômico ou no interesse de categorias profissionais ou econômicas.

Ao estudar a Constituição francesa no que diz respeito à tributação, o saudoso Geraldo Ataliba observou, corretamente, ser importante complementar o texto expresso do art. 34 com as disposições tributárias da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, incorporada à Constituição da França de 1958 por seu preâmbulo. E, ao fazer isso, é necessário compreender como incluídas e expressas dentro do texto da Constituição francesa “em sentido amplo”, as exigências da capacidade contributiva e da legalidade tributária indicadas na citada Declaração.50

Em relação aos territórios franceses de ultramar (antigas colônias exploratórias francesas), o artigo 72-2 traz apenas previsão quanto à legalidade na determinação das receitas tributárias (“advindas das imposições de toda natureza”) de forma lacônica, sem definir espécies tributárias nem regras específicas aos tributos.

E no que diz respeito a finalidades sociais ou de interesse de categorias profissionais ou econômicas, a Constituição francesa apenas previu no art. 34 que cabe à lei fixar os princípios fundamentais do direito sindical, ao lado do direito do trabalho e da seguridade social (“La loi détermine les principes fondamentaux: (...) - du droit du travail, du droit syndical et de la sécurité sociale”), sem fixar regras tributárias relativas ao financiamento de tais setores, bem diferente da Constituição do Brasil.

4.5. Constituição da Inglaterra

A Inglaterra é um país organizado em regime de monarquia constitucional parlamentarista, que dirige politicamente o Estado chamado “Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte”, e compartilha a sua Chefe de Estado (Rainha Elizabeth II) com outras três nações (Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte) componentes do Reino, tendo como chefe de governo um primeiro-ministro (premiê). Apesar da ligação política entre os países da Ilha da Grã-Bretanha (Inglaterra, Escócia e Gales) e a Irlanda do Norte, é a Inglaterra que centraliza a representatividade internacional e os assuntos internos de maior abrangência, permitindo às nações ligadas terem chefes de governo locais (primeiros-ministros) e Legislativo próprio para cuidar de assuntos de interesse local. A Inglaterra se organiza sob o regime de Estado unitário sob o manto do Reino Unido, não havendo divisões políticas autônomas dentro do país.

A Inglaterra é um país no qual não se adotou uma Constituição escrita em documento único, sistematizado. Formam a Constituição inglesa uma série de documentos escritos esparsos, orientações jurisprudenciais e costumeiras de caráter constitucional adotados pelas autoridades constituídas. A chamada “Constituição do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte”, inicia-se com a Magna Carta de 1215 e suas modificações posteriores,51 seguidas da Petição de Direitos (Petition of Rights) de 1628 e da Declaração de Direitos (Bill of Rights) de 1689, e outros documentos conhecidos como os alicerces históricos da monarquia constitucional, caracterizada pela limitação do poder monárquico pelo Parlamento.52

Interessa notar que o mais conhecido documento constitucional inglês, a Magna Carta de 1215, possui sua origem ligada à revolta contra a cobrança abusiva de tributos por parte do Rei João sem Terra, que levou os nobres contribuintes a exigir que o Rei outorgasse a Carta para que a nobreza tivesse uma garantia de maior controle e moderação na cobrança de impostos.

Isso explica porque, apesar de na Constituição inglesa encontrarmos de forma expressa muito pouca matéria relativa à tributação, mesmo os textos muito antigos e que ainda estão parcialmente em vigor integrando a Constituição, já expressavam disposições fundamentais garantidoras de um controle parlamentar sobre o poder de instituir tributos. É constante na história constitucional da Inglaterra a exigência de que os tributos sejam moderados e limitados pela lei. Assim identificamos a precoce origem inglesa da limitação do poder de tributar pelo parlamento (expressão da legalidade tributária)53 e a exigência de moderação na cobrança nos arts. 14 e 20 da Carta Magna da Inglaterra;54 vemos novamente uma limitação ao poder de tributar na Petition of Right de 1628, quando reitera a exigência da autorização do Parlamento para cobrança de tributos,55 assim como no Bill of Rights de 1689, quando ele afirma a necessidade de autorização parlamentar na cobrança de tributos, assim como exige moderação na cobrança de multas.56

4.6. Constituição da Itália

A Itália é um país politicamente organizado sob o regime republicano parlamentarista (com presidente e primeiro-ministro), e é um Estado unitário (embora existam divisões administrativas com parcial autonomia, denominadas “regiões”, “províncias”, “comunas” e “cidades metropolitanas”). Sua economia é capitalista.

O Estado italiano nasceu sob regime monárquico em 1861, na regência do Rei Vittorio Emanuele I57, como resultado da unificação de diversas regiões da península itálica antes governadas também sob regime monárquico. Como o primeiro rei da Itália era antes Rei da Sardenha, o Estado italiano nasceu tendo por Constituição o chamado “Estatuto Albertino”,58 que era a lei fundamental do Reino da Sardenha desde 1848, e no qual se estatuía um regime político de monarquia constitucional. Houve, portanto, uma absorção da Constituição Sarda, que permaneceu em vigor na Itália desde a unificação até logo depois da Segunda Guerra Mundial, quando em 1947 foi elaborada e promulgada uma nova Constituição, já em regime republicano de governo. Portanto, a Itália viveu até hoje sob a égide de apenas duas Constituições.

A Constituição atual da República Italiana, promulgada em 1947, como já indicado, possui 139 artigos ordinários aos quais se somam 18 artigos transitórios e finais, num total de 157 artigos.59 O texto constitucional italiano é dividido em quatro partes básicas, das quais duas são subdivididas em títulos e seções, mas nenhuma dessas partes é dedicada exclusivamente à tributação.

Os pouco dispositivos da Constituição da Itália que tratam de normas diretamente aplicáveis a relações tributárias estão dispersos e encontram-se em sete artigos, quais sejam: o art. 14 (na Parte I da Constituição: Direitos e deveres dos cidadãos/relações civis), que trata do direito à inviolabilidade do domicílio dos cidadãos, inclusive em matéria fiscal tributária e delega à lei os termos da relativização para fiscalização; o art. 20 (também na Parte I), que protege a liberdade de culto religioso, e inclui uma vedação à instituição de gravames tributários especiais sobre a constituição de associações religiosas; o art. 23 (também na Parte I), que prevê a regra da legalidade geral, também aplicada à matéria tributária em virtude de sua generalidade (dirigida a “prestações patrimoniais”);60 art. 53 (no Título IV: Relações políticas), que trata do dever de pagar tributos e do princípio da capacidade contributiva, a ser fixada mediante uso da progressividade fiscal;61 art. 81 (no Título relativo ao Parlamento), que trata da regra da anualidade tributária orçamentária, vedando a criação de novos tributos após a aprovação do orçamento anual, o art. 119 (no Título que trata das competências das regiões, províncias e municípios), que autoriza às regiões terem impostos próprios (fixados por lei Nacional ou Regional) além de receberem parte da receita de tributos recolhidos pelo governo central, e, finalmente, o art. 120 que veda tributação discriminatória ou que restrinja a livre circulação de pessoas ou bens entre as regiões ou outras unidades administrativas italianas.

Destes artigos da Constituição italiana que tratam da matéria tributária, destacamos os arts. 119 e 120, por serem os mais extensos e tratarem da competência tributária (seja legislativa, seja apenas de aplicação da lei tributária) das Regiões, Províncias, Cidades metropolitanas e Comunas (equivalentes aos Municípios no Brasil), observando que o texto de tais dispositivos não discrimina os tributos que cabem a cada entidade administrativa italiana, limitando-se a delegar à lei a instituição de tais tributos.

É interessante ainda notar que a Constituição da Itália, apesar de adotar a forma de Estado unitária, prevê uma competência legislativa tributária compartilhada entre o poder central (Estado nacional) e as Regiões italianas, que, apesar de não serem autônomas a ponto de constituírem-se em Estados (como ocorre no Brasil, ou de forma mais acentuada nos EUA), possuem receitas tributárias próprias, passíveis de fixação por lei própria (as Regiões possuem Legislativo) ainda que de forma coordenada em normas gerais pela Lei do Estado (lei nacional).

As demais unidades administrativas italianas (Províncias, Comunas etc.) não possuem competência legislativa tributária, e sim apenas capacidade tributária ativa, no sentido de poderem, por meio de atos administrativos próprios, desempenharem a função de sujeito ativo na cobrança de tributos instituídos por Lei do Estado (central) ou por lei editada pelas Regiões.62 De qualquer forma, a relativa autonomia atribuída às regiões e a descentralização administrativa italiana permitem que alguns entendam que a Itália se organiza em uma espécie de regime “federativo”.63 Por isso encontramos na Itália referências, inclusive em comentários à Constituição italiana, a um “federalismo fiscal”, embora a Itália não seja formalmente uma República federativa, como é a brasileira ou a norte-americana.64

Como visto, o texto da Constituição italiana não discrimina os tributos de competência do Governo central ou das Regiões, sendo omissa sobre as formas de financiamento das principais atividades estatais, seja na área social em geral, de seguridade social, de intervenção econômica, sindical ou profissional, muito diferentemente da Constituição brasileira, que é detalhada sobre tais matérias.

4.7. Constituição da Espanha

A Espanha, ou Reino da Espanha, é um país que politicamente adota a forma de governo monárquico constitucional parlamentarista, com forma de Estado unitário, porém descentralizado, com um governo central denominado “Estado”, que convive com 17 divisões ou regiões político-administrativas chamadas de “comunidades autônomas” (que gozam de autonomia legislativa e executiva),65 além de duas cidades autônomas.66 As comunidades autônomas se dividem em 52 províncias, essas divididas em um total de mais de 8.100 Municípios67 (também chamados de “entidades locais”). O Chefe de Estado é representado pelo Rei (Juan Carlos I), e a Chefia de governo é exercida por um primeiro-ministro (chamado de “presidente do governo”).

O Estado Nacional espanhol se consolidou no século XV, especialmente com a unificação dos Reinos cristãos de Aragão e Castela e com a reconquista da Península Ibérica (antes invadida por povos muçulmanos, desde o século VIII). Sucederam-se monarquias absolutistas, até o constitucionalismo passar a limitar a monarquia, no século XIX. Desde então, o país já teve 10 Constituições: (i) Constituição de 1808 (imposta por Napoleão Bonaparte); (ii) Constituição Monárquica Liberal de 181268 (vigorou até 1814, novamente entre 1820-1823, e depois foi adotada provisoriamente entre 1836-1837); (iii) Constituição de 1837; (iv) Constituição de 1845 (conservadora); (v) Constituição de 1856 (não entrou em vigor); (vi) Constituição de 1869 (monárquica liberal, foi suspensa por curtíssimo período republicano); (vii) Constituição de 1876 (monárquica liberal, foi em parte suspensa em 1923 mediante um golpe militar); (viii) Constituição de 1931 (marca o início da 2ª República espanhola, vigorou em parte até 1947, quando iniciou-se uma ditadura pelo Regente Militar Francisco Franco, que permaneceu como Chefe de Estado e de Governo da Espanha até sua morte em 1975); (ix) Lei Orgânica do Estado Espanhol de 1966 (editada durante o regime ditatorial de Franco)69; e (x) Constituição de 1978 (institucionaliza o retorno à democracia na forma de monarquia constitucional, parlamentarista).

A Constituição atual da Espanha70 é estruturada em um preâmbulo e 10 Títulos numerados dentro dos quais há um total de 169 artigos, após os quais seguem mais quatro partes: as “Disposições Adicionais” (quatro disposições), as “Disposições Transitórias” (nove disposições), a “Disposição Derrogatória” e a “Disposição Final”. Nenhum dos títulos da Constituição espanhola é dedicado exclusivamente à matéria tributária, mas existem sim alguns artigos expressamente voltados à tributação. Vejamos quais são os poucos dispositivos constitucionais tributários espanhóis.

O texto da Constituição espanhola inaugura o tratamento expresso da matéria tributária com um artigo específico, o art. 31, localizado no Título I (“Dos direitos e deveres fundamentais”), mais especialmente no Capítulo II (“Direitos e liberdades”), Seção 2ª (“Dos direitos e deveres dos cidadãos”). O art. 31 prevê a exigência de justiça tributária ligada ao princípio da capacidade contributiva, sustentada nos pilares da igualdade e da progressividade fiscal, vedado o confisco patrimonial dos contribuintes, e obedecida a legalidade na instituição de prestações pessoais ou patrimoniais (incluindo-se aqui os tributos).

Ainda em relação à matéria tributária, a Constituição da Espanha prevê mais um artigo expresso e específico, que renova a exigência da legalidade no exercício da competência tributária. É o art. 133, no Título VII (Economia e Fazenda). O art. 134 também prevê, em seu item 7, ao tratar dos orçamentos públicos, o seguinte no que diz respeito à matéria propriamente tributária, ipsis litteris (tradução do autor): “7. A lei de Orçamentos não pode criar tributos. Poderá modificá-los quando uma lei tributária substantiva assim o preveja.”71

A Constituição espanhola ainda possui dispositivos próprios para regular a competência tributária e a capacidade de arrecadação e gestão. Primeiramente, note-se que o art. 142, ao tratar da autonomia do governo local (Município), prevê receitas tributárias próprias (tradução do autor): “Artigo 142. As Fazendas locais deverão dispor dos meios suficientes para o desempenho das funções que a lei atribui às Corporações respectivas e se nutrirão fundamentalmente de tributos próprios e de participação nos do Estado e das Comunidades Autônomas.” Os Municípios espanhóis não dispõem de competência legislativa tributária, porque não possuem Poder Legislativo para elaborar as leis. Os tributos municipais/locais são instituídos por leis elaboradas pelo Estado (governo central), que deixam aos Municípios a competência de arrecadação e gestão tributária, ou seja, os entes locais podem aplicar tais leis e assim arrecadar os tributos que lhes garantem a autonomia financeira prevista no art. 142 da Constituição da Espanha.72

Assim, na Espanha, somente o Estado (governo central) e suas divisões regionais (Comunidades Autônomas) possuem Poder Legislativo e competência legislativa tributária. Mas cabe ao Estado (governo central) a competência para editar leis gerais em matéria de finanças públicas (inclusive matéria tributária), o que o faz principalmente com base no art. 149.1, item 14º, da Constituição da Espanha, esse, portanto, outro dispositivo constitucional sobre a matéria tributária.73 Mas a competência do Poder central para edição de normas gerais em matéria tributária é também fundamentada no art. 133.1 e no art. 157.3 da Constituição. Tais normas gerais em matéria tributária já existem, e atualmente estão na Lei Geral Tributária da Espanha (Ley 58/2003)74, que, portanto, encontra fundamento em tais dispositivos.75

Também tratando da distribuição de competência tributária na Espanha, os arts. 156 e 157 da Constituição espanhola definem o campo de autonomia fiscal das Comunidades Autônomas, mas sem apontar as matérias tributáveis (hipóteses de incidência possíveis), apenas apontando-se competência para impostos, taxas e contribuições especiais, sendo vedadas normas tributárias que criem obstáculos à livre circulação de bens e serviços.

Notamos aqui a importância da distribuição de competências tributárias também em países unitários, porém descentralizados, como é o caso da Espanha, onde o respeito à igualdade entre os cidadãos é vista como dependente de uma harmonização entre as legislações tributárias descentralizadas, a ser conduzida pela legislação nacional (do Estado espanhol). No caso da Espanha, essa delicada relação é construída entre Estado espanhol e as Regiões Autônomas (já que os Municípios não possuem competência legislativa); e no Brasil, entre a União Federal, os Estados e também os Municípios, já que estes entes locais possuem competência para fazer leis tributárias, diferentemente dos entes locais espanhóis, como já vimos.

Assim como ocorre no Brasil, na Espanha o governo central deve distribuir parte da arrecadação dos tributos centrais aos entes regionais (Comunidades Autônomas), embora tais regras de direito financeiro não sejam definidas na Constituição espanhola (vide art. 157, acima reproduzido). Mas a atribuição de competências tributárias na Espanha possui uma notável diferença em relação ao Brasil: a competência legislativa do Estado pode ser em parte delegada para as Comunidades Autônomas, por meio de lei própria editada pelo Estado, devido à abertura dada pelos arts. 156 e 157 da Constituição espanhola.76

Enfim, são apenas essas as disposições constitucionais expressas aplicáveis à tributação na Espanha.77

Verificou-se a inexistência, na Constituição da Espanha, de uma previsão para instituição de tributos/contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas, ou seja, que financiem sindicatos e conselhos de fiscalização profissional, ao contrário do que dispõe a Constituição do Brasil (art. 149). Sequer existe previsão da forma de financiamento dos sindicatos, pois a Constituição se limita nos arts. 7º e 24, item 1, a prever os aspectos do princípio da liberdade sindical. E em relação às entidades de fiscalização das profissões regulamentadas, chamadas na Espanha de “colégios profissionais”, a Constituição espanhola se limita a prever, no art. 36, que a lei regulará o regime dessas entidades (com caráter público) e o exercício das profissões. Também no art. 149.1, não há previsão de qualquer contribuição para o financiamento das entidades de fiscalização profissional.

Também em relação aos serviços e prestações pecuniárias típicas de seguridade social, comumente oferecidos pelo Poder Público, a Constituição da Espanha é silente sobre as formas de financiamento. Diversamente da Constituição brasileira, na Constituição espanhola não há previsão de tributos (contribuições) que financiem a seguridade social, apenas atribui-se ao Estado a tarefa de editar leis para zelar pelas condições de trabalho, segurança e previdência social dos trabalhadores. Não há também previsão de contribuição para financiar a seguridade social dos servidores públicos, limitando-se o art. 103 da Constituição espanhola a prever que cabe à lei definir o estatuto dos servidores, e também no art. 149.1, item 18º, a competência do Estado para definição das regras do funcionalismo público, porém, sem mencionar a forma de financiamento da previdência social dos servidores.

4.8. Constituição de Portugal

Portugal, ou República Portuguesa, é um país organizado sob regime de governo republicano parlamentarista, tendo por Chefe de Estado um Presidente e por Chefe de Governo um Primeiro-Ministro. Portugal adota a forma de Estado unitário, porém descentralizado, com um governo central denominado “Estado central”, dividido basicamente em 18 Distritos, que se dividem em 308 Municípios ou “Concelhos”, que por sua vez se dividem em aproximadamente 4.260 freguesias (com funções semelhantes às dos Municípios, mas em menor escala).78 A previsão, constante da Constituição portuguesa de 1976, de que serão criadas Regiões como divisões administrativas de 1º grau no território de Portugal (ao invés de Distritos), ainda não foi concretizada. Ao lado dessa divisão, existem duas Regiões Autônomas componentes do Estado português: Madeira e Açores (ambos são arquipélagos localizados no Oceano Atlântico). A economia portuguesa é capitalista.

O Estado Nacional português se consolidou no século XII, mediante a formação do Reino de Portugal após a reconquista cristã da Península Ibérica, antes invadida por povos muçulmanos desde o século VIII. Já no século XIII o Reino de Portugal conquistou estabilidade em suas fronteiras territoriais.79 Sucederam-se monarquias absolutistas, até o constitucionalismo passar a limitar a monarquia no século XIX. Ao longo de períodos de instabilidade política, Portugal já teve 6 Constituições: (i) Constituição de 1822 (inaugurou o constitucionalismo monárquico em Portugal); (ii) Constituição monárquica de 1826 (menos liberal, foi outorgada pelo Rei Dom Pedro IV80, vigorou nos períodos de 1826-1828, 1834-1836 e 1842-1910, tendo sido abandonada, primeiro por causa de restaurações absolutistas monárquicas, e, finalmente, pela instauração da República em 1910); (iii) Constituição monárquica de 1838 (vigorou entre 1838-1842); (iv) Constituição de 1911 (inaugurou a República, mas deixou parcialmente seu vigor a partir de 1926, devido a movimentos ditatoriais); (v) Constituição de 1933, instaurou o chamado “Estado Novo” em Portugal, um regime político fascista centralizador); (vi) Constituição de 1976 (restaurou a democracia na República portuguesa, e, com alterações, ainda está em vigor).81

A Constituição atual de Portugal82 possui um total de 296 artigos, e é iniciada com um breve Preâmbulo, após o qual segue uma primeira Parte sem número (intitulada “Princípios Fundamentais”), seguida por quatro Partes principais numeradas, e, após, disposições finais e transitórias. Na Parte II, que trata da “Organização econômica” do País, o Título IV trata especificamente das instituições financeiras, assim como das finanças públicas em geral e da tributação (Título IV - Sistema financeiro e fiscal). Porém, apenas dois artigos desse Título são dedicados à tributação, quais sejam: o art. 103º e o art. 104º. Tais dispositivos fixam as seguintes diretrizes do sistema fiscal português, basicamente: (i) repartição justa dos rendimentos e riqueza; (ii) princípio da legalidade tributária, aplicável na determinação da incidência, da alíquota, dos benefícios fiscais, do lançamento e cobrança, e de outras garantias aos contribuintes; (iii) vedação à retroatividade tributária; (iv) imposto sobre rendimento pessoal com objetivo de redução de desigualdades, com progressividade fiscal de alíquotas e levando em conta os rendimentos da família83; (v) tributação das empresas sobre o rendimento real; (vi) igualdade na tributação do patrimônio; e (vii) tributação do consumo direcionada à redução de desigualdades e maior oneração sobre consumos de luxo.84

Além desses artigos especificamente voltados à tributação, existem ainda, na Constituição de Portugal, algumas diretrizes tributárias inseridas em artigos tratando de temas diversos, para os quais a política fiscal deva ser considerada como um importante instrumento, principalmente tendo em vista os efeitos indutores extrafiscais da tributação, e também seus efeitos econômicos. Nesse sentido, encontramos disposições tributárias voltadas: (i) ao meio ambiente; (ii) à sustentação financeira das famílias; (iii) à distribuição de riqueza; (iv) às cooperativas; (v) à eliminação de minifúndios (terras em dimensões insuficientes para a produção rural). Mais adiante, ao tratar de competência legislativa, distribuindo-a entre as entidades político-territoriais, a Constituição também trata brevemente da tributação. Vejamos melhor.

Primeiramente, observamos o art. 66º, item 2.h, que trata da política tributária portuguesa em relação ao meio ambiente, nos seguintes termos, ipsis litteris: “(...) incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e com o envolvimento e a participação dos cidadãos: (...) h) Assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com proteção do ambiente e qualidade de vida.”

Também observamos o texto da Constituição portuguesa em seu art. 67º, quando afirma a importância da família no contexto da política fiscal: “Artigo 67º (Família) (...) 2. Incumbe, designadamente, ao Estado para proteção da família: (...); f) Regular os impostos e os benefícios sociais, de harmonia com os encargos familiares.”85

No art. 81º, vamos encontrar diretriz para a política fiscal portuguesa se preocupar em garantir correção de desigualdades por meio da distribuição de renda: “Incumbe prioritariamente ao Estado: (...); b) Promover a justiça social, assegurar a igualdade de oportunidades e operar as necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento, nomeadamente através da política fiscal.”

Já no artigo 85º a Constituição de Portugal prevê que a lei deve instituir benefícios fiscais em prol das cooperativas, como estímulo a essas entidades produtivas: “Artigo 85º (Cooperativas e experiências de autogestão) (...) 2. A lei definirá os benefícios fiscais e financeiros das cooperativas, bem como condições mais favoráveis à obtenção de crédito e auxílio técnico.”

E ao tratar da correção de tamanho de minifúndios, o art. 95º da Constituição de Portugal prevê os incentivos fiscais como um dos instrumentos para a política de redimensionamento das terras rurais para produção.

Por último, quando afirma competências legislativas (art. 165º, nº 1, alínea “i”; art. 227º, nº 1, “i” e “j”; art. 238º, nos 3 (parte final) e 4; e art. 254º) a Constituição portuguesa também toca na matéria tributária ao fixar as competências das entidades administrativas territoriais portuguesas (Estado português, Regiões Autônomas e Autarquias/Freguesias/Municípios) para legislar em matéria tributária (em matéria de impostos, taxas e demais “contribuições financeiras”), embora não aponte as matérias tributáveis por impostos nem discrimine os demais tributos ou suas bases.

Além desses não existem outros dispositivos expressos tratando de matéria tributária na Constituição portuguesa. Portanto, conclui-se que, diferentemente do Brasil, Portugal opta por não discriminar as características das espécies de tributo, muito menos explicitar em seu texto constitucional as formas de financiamento das prestações estatais voltadas para o campo social, nem previu formas tributárias específicas para financiar instrumentos de intervenção na economia ou tributos para o financiamento do interesse de categorias profissionais ou econômicas.

Para melhor notar isso, observamos que o texto da Constituição portuguesa, em seus arts. 59º e 63º, por exemplo, prevê diversos direitos sociais dos trabalhadores e demais segurados do sistema de segurança social de Portugal, que é dirigido pelo Estado Português, que assim fica responsável por financiar atividades em prol da segurança do trabalho e prestações em virtude de desemprego involuntário e acidentes/riscos do trabalho, além de prestações previdenciárias (protegendo os cidadãos em situações de risco social, como no caso de doença, velhice, invalidez para o trabalho etc.), mas ali não se trata da forma de financiamento dessas atividades estatais. O direito à saúde também é prestigiado e garantido pela Constituição de Portugal com um artigo específico (art. 64º), no qual o Estado português se compromete em manter um sistema nacional universal. Porém, apesar de enunciar todos esses compromissos estatais, que demandam grandes recursos financeiros, a Constituição portuguesa não fixa as formas de financiamento das prestações estatais sociais.

Tal redação é muito diversa daquela adotada na Constituição do Brasil, que prevê, ao lado dos benefícios sociais, previdenciários, de saúde pública e assistência, também as respectivas fontes de financiamento desses benefícios de seguridade social, como vimos, havendo inclusive tributos específicos para tais gastos: as contribuições para a seguridade social.

A Constituição portuguesa (art. 81º e outros) também prevê diversas funções interventivas para o Estado português em relação à economia, prezando por seu desenvolvimento equilibrado e adequado a finalidades sociais, mas não prevê nenhum tributo específico para financiar ou instrumentalizar os fins interventivos do Estado, ao contrário do que ocorre na Constituição do Brasil.

Também diversamente da Constituição brasileira, a Constituição de Portugal não prevê contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas. Ou seja, há silêncio sobre contribuições corporativas e sindicais. Em relação ao financiamento sindical, a Constituição portuguesa é expressa em vedar a existência de contribuição tributária para o financiamento de sindicatos (art. 55º, item 2, subitem “b”), garantindo-se ampla liberdade na inscrição sindical e contribuição dos trabalhadores que se interessarem. Da mesma, forma, o Texto Constitucional português não prevê contribuição sindical tributária para as empresas ou empregadores. Muito diferente do que ocorre no Brasil, onde a Constituição Federal prevê ambas as contribuições sindicais: aquela cobrada do trabalhador e também a cobrada do empregador (art. 8º, IV e art. 149, caput).

4.9. Constituição da China

A China é um país politicamente organizado sob regime de governo socialista-comunista moderado, caracterizado pelo poderes concentrados em uma ditadura “democrático-popular” do Partido Comunista, chefiado por um Presidente e auxiliado por um conselho de Estado. Parcela significativa dos meios de produção está sob a propriedade e administração do Estado, mas com certa abertura e proteção ao mercado/propriedade privada nas diretrizes da política econômica. Há um Congresso Nacional Popular e congressos locais legislativos, ao lado do Poder Judiciário.

A China se organiza sob um regime de Estado unitário sui generis, que admite a divisão do país em províncias e municípios (os municípios ainda são divididos em distritos, cantões e vilas) que possuem poder tributário, mas, ainda são muito dependentes do poder central. A divisão político-administrativa chinesa também é composta por regiões relativamente autônomas (v.g. o Tibete) e regiões administrativas especiais com bastante autonomia, como é o caso de Hong Kong e Macau, que antes eram colônias da Inglaterra e de Portugal, respectivamente.

A China, durante milênios, foi governada por uma sucessão de dinastias (governos monárquicos hereditários) absolutistas, tendo apenas no início do século XX ensaiado uma Constituição monárquica (1908). Enfraquecido o poder monárquico, a China passou ao regime republicano mediante revolução vitoriosa em 1912, tendo sido promulgada a primeira Constituição republicana pouco depois. Após uma restauração monárquica de curta duração (1915-1916), a China permaneceu como república presidencialista, ainda que fragilizada por sérias divisões internas, por mais alguns poucos anos após a Segunda Guerra Mundial. Isso porque, em 1945, estourou uma guerra civil entre nacionalistas e comunistas, que durou até 1949, vencendo o grupo comunista, que deu início a um regime político ditatorial. Desde então, a China comunista já esteve sob as diretrizes de outras quatro Constituições:86 (i) Constituição de 1954; (ii) Constituição de 1975; (iii) Constituição de 1978; e (iv) Constituição de 1982.

A Constituição da República Popular da China promulgada em 4 de dezembro de 198287, é dividida em quatro capítulos, e possui 138 artigos no total. Mas nenhum artigo se dedica a falar sobre tributos especificamente. A única menção à atividade tributária é aquela constante do artigo 56º da Constituição chinesa, ipsis litteris: “Artigo 56.º Constitui dever dos cidadãos da República Popular da China pagar impostos nos termos prescritos pela lei.” O dispositivo primeiramente reforça o vínculo mandatório do pagamento dos impostos, para apenas em seguida prever a legalidade.

Não são explicitados outros direitos dos contribuintes, nem são apontados limites gerais aos tributos do sistema chinês. Nada se fala sobre as espécies de tributo passíveis de cobrança na China. Portanto, cabe à legislação infraconstitucional chinesa uma ampla margem de atuação em matéria tributária, muito diferentemente do que ocorre no Brasil face à Constituição brasileira.

4.10. Constituição de Cuba

Cuba é o único país do Mundo ocidental organizado em regime de república socialista-comunista, na forma de um Estado unitário (o país é dividido em províncias e municípios com funções político-administrativas, e embora contem com Executivo e Legislativo locais, são bastante dependentes das diretrizes do poder nacional). O País é dirigido por um poder centralizado nas diretrizes do Partido Comunista cubano (único partido), na direção de um regime econômico comunista,88 de economia planificada pelo Estado, mas atualmente dispõe de alguma abertura à propriedade privada dos meios de produção e comporta iniciativas capitalistas, que tentam melhorar a economia, prejudicada pelo embargo econômico internacional ainda atualmente imposto pelos EUA.89 O Poder Executivo é exercido pelo Presidente do Conselho de Estado e seus auxiliares, o Poder Legislativo nacional é representado pela Assembleia Nacional do Poder Popular (Asamblea Nacional del Poder Popular), e o Poder Judiciário está submetido hierarquicamente ao Executivo e ao Legislativo.90

Originalmente um território indígena colonizado pela Espanha, a Ilha de Cuba ganhou sua independência desse país por luta armada, apoiada por interesse dos EUA, em 1898, porém ficou ocupada por militares dos EUA até 1902. Cuba já teve 4 documentos político-institucionais que caracterizamos como Constituições: (i) Constituição de 1901; (ii) Constituição de 1940 (deixou em parte de vigorar a partir de 1952, por golpe político ditatorial do líder Fulgêncio Batista); (iii) “Lei Fundamental de 1959” (institucionalizou uma revolução militar para imposição de uma nova ditadura, porém mais alinhada ao socialismo, e liderada por Fidel Castro); e (iv) Constituição de 1976 (declaradamente comunista-marxista, consolidando a revolução de 1959).91

A Constituição atual de Cuba, promulgada em 24 de fevereiro de 1976,92 sofreu significativa reforma em 1992, após a perda do apoio econômico antes dado pelo regime comunista da União Soviética (extinta em 1991), além de algumas outras reformas em anos posteriores. A Constituição cubana é dividida em 15 capítulos, mas nenhum deles trata especificamente da tributação em Cuba. O texto constitucional cubano possui um total de 137 artigos, mas apenas um artigo possui um dispositivo diretamente relativo à tributação.

Em matéria tributária, a Constituição de Cuba limita-se a afirmar, em seu art. 34, que os estrangeiros tem o dever de contribuir com os gastos do Estado assim como os cidadãos cubanos, na forma da lei: “artículo 34º Los extranjeros residentes en el territorio de la República se equiparan a los cubanos: (...) en la obligación de contribuir a los gastos públicos en la forma y la cuantía que la ley establece”. Resta então assim formulada a exigência constitucional de legalidade tributária em Cuba.

Afora isso, não existe discriminação de competências, espécies de tributos ou indicação e regras ou princípios expressos acerca dos tributos que financiem serviços fundamentais do Estado, como a educação, direitos dos trabalhadores, saúde, previdência, assistência social, intervenção do Estado sobre a economia ou organização sindical. Ou seja, além das disposições constitucionais de Cuba serem menos extensas sobre temas sociais e econômicos se comparadas à Constituição brasileira, os tributos não encontram espaço na Constituição de Cuba, nem são fixados direitos materiais dos contribuintes, diferentemente da Constituição brasileira.

A própria formulação de um sistema tributário é algo tardio em Cuba, tendo em vista sua caracterização como Estado socialista, que só recentemente está dando abertura e incentivo à propriedade privada e à iniciativa empresarial dos particulares, necessários passos para que o país passe a ter uma economia suficientemente desenvolvida para gerar riqueza particular a ser tributada eficazmente.93

5. Conclusões

Em brevíssimas linhas, após o presente estudo panorâmico, destacamos algumas conclusões:

a) que a Constituição brasileira é muito particular em matéria tributária, de caráter notavelmente rígido e detalhista, ímpar no mundo;

b) a previsão expressa de amplo sistema constitucional tributário brasileiro limitador do poder de tributar não é, necessariamente, uma garantia de melhor cumprimento dos direitos dos contribuintes, já que outros países também prestigiam diversas limitações ao poder de tributar mas de forma implícita no texto de suas Constituições, o que reforça a importância dos tribunais constitucionais na concretização dos direitos dos contribuintes;

c) as definições de espécies tributárias e o desenho constitucional de um modelo geral dos elementos básicos possíveis a cada tributo dá aos contribuintes brasileiros um sistema especial de proteção nesse âmbito, rígido, diferente dos outros países;

d) existem variações na forma e na abrangência de limitações constitucionais ao poder de tributar instituídas no Brasil e em outros países, embora exista na maior parte dos países um núcleo comum;

e) o fato de a história constitucional brasileira contar com oito Constituições e diversas emendas, revelando certa instabilidade política e institucional inclusive em matéria tributária não é uma exclusividade brasileira, já que diversas outras nações, inclusive das mais desenvolvidas, já tiveram tantas ou mais alterações constitucionais, que só não revolveu tanto a matéria tributária justamente porque tais textos constitucionais não são tão extensos nessa matéria quanto o brasileiro;

f) a Constituição brasileira de 1988 surge em momento de abertura política pós-ditadura militar, e contou com ampla participação de setores sociais, o que explica em parte sua complexidade no campo das limitações ao poder de tributar, diferentemente de países como Portugal e Espanha, por exemplo, cujos textos constitucionais permaneceram mais fechados nesse âmbito embora tenham também passado por momento ditatorial pré-constitucional;

g) o tamanho/extensão generoso da Constituição brasileira não significa necessariamente que seja um texto ruim ou prolixo, a gerar mais dúvidas do que soluções, pois países que adotam textos constitucionais enxutos também passam por dificuldades interpretativas, inclusive face à inexistência de limites, regras ou princípios expressos; e, de outro lado, existem países mais desenvolvidos que o Brasil e que possuem Constituições mais extensas que a brasileira, embora em matéria tributária nenhum texto constitucional sequer se aproxima do brasileiro em extensão e complexidade.

1 Quais sejam: América do Sul, América Central, América do Norte, Europa e Ásia.

2 “Direito Constitucional Tributário” é expressão que abrange não só os textos constitucionais (expressos) dos países, mas também as normas constitucionais implícitas e aquelas editadas por fontes judiciais superiores que interpretem a Constituição de cada nação (jurisprudência dos tribunais constitucionais).

3 Diversas normas constitucionais reguladoras da atividade econômica em sentido amplo são passíveis de envolvimento na atividade tributária, já que a tributação não é somente o principal meio de financiamento estatal e paraestatal, mas também é um eficiente meio de intervenção governamental sobre a economia, considerando-se os efeitos indutores extrafiscais dos diversos tributos. Da mesma forma, é preciso reconhecer que as prestações sociais positivas dos Estados são financiadas, em regra, por tributos, e tais tributos podem receber os influxos das regras constitucionais de cada país no campo social.

4 Para uma análise dessa natureza, vejam-se, por exemplo, os estudos de Humberto Ávila, comparando os limites ao poder de tributar na Constituição da Alemanha e do Brasil, Sistema constitucional tributário. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012; e de Enio Moraes da Silva, comparando os sistemas constitucionais tributários dos EUA e do Brasil, Limites constitucionais tributários no Direito norte-americano. Juruá: Curitiba, 2001.

5 Como já tivemos a oportunidade de esclarecer, em estudo publicado anteriormente: “(...) i) ‘veículos normativos’ ou ‘instrumentos introdutórios de normas’ ou ‘fontes formais do direito’: são os modos de expressão do Direito, meios pelos quais as normas jurídicas são introduzidas no ordenamento para gerar os efeitos que lhes são próprios, e os mais relevantes estão discriminados na Constituição Federal; ii) ‘texto normativo’: é o direito positivo materializado/visualizável, por meio de símbolos de linguagem grafados em um papel ou outro substrato ou base comunicativa; iii) ‘norma jurídica’: é a significação obtida pela leitura e interpretação do texto escrito, que por sua vez foi trazido ao mundo jurídico por meio de um veículo.” Cf. PETRY, Rodrigo Caramori. “Reflexões sobre a estrutura do Direito Tributário no Brasil”. Revista Direito Tributário Atual nº 24. São Paulo: Dialética/IBDT, 2010, p. 497.

6 Formas de governo que existem fundamentalmente: a república e a monarquia, que, por sua vez, podem funcionar em regime presidencialista ou parlamentarista. E as formas de Estado básicas são: Estado federativo e Estado unitário, cf. DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 30ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, pp. 214-250.

7 No Brasil, destacam-se alguns trechos dos seguintes trabalhos doutrinários com abordagens mais densas do Direito Constitucional Tributário de outros países, cf. TORRES, Ricardo Lobo. Sistemas constitucionais tributários: tratado de Direito Tributário brasileiro. T. 2. V. 2. Rio de Janeiro: Forense, 1986; TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário: constituição financeira, sistema tributário e estado fiscal. V. 1. Rio de Janeiro: Renovar, 2009 ; MARTINS, Ives Gandra; e BASTOS, Celso Ribeiro. Comentários à Constituição do Brasil. T. 1, V. 6. São Paulo: Saraiva, 1991; ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: RT, 1968; SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

8 Cf. NOGUEIRA, Ruy Barbosa; e NOGUEIRA, Paulo Roberto Cabral. Direito Tributário aplicado e comparado. V. 1. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1977; id., ibid. V. 2. Rio de Janeiro: Forense, 1977; cf. BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 8ª ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

9 Cf. MORAES, Bernardo Ribeiro de. Curso de direito tributário: sistema tributário da Constituição de 1969. V. 1. São Paulo: Resenha Tributária, 1973.

10 Vejam-se, apenas para exemplificar, algumas das principais obras atuais de Direito Constitucional comparado, publicadas no Brasil, nenhuma delas abordando o Direito Constitucional Tributário: cf. DANTAS, Ivo. Novo direito constitucional comparado: introdução, teoria e metodologia. 3ª ed. Curitiba: Juruá, 2010; cf. FIUZA, Ricardo Arnaldo Malheiros. Direito constitucional comparado. 5ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2013; cf. GARCIA, Maria; AMORIM, José Roberto Neves (coords.). Estudos de direito constitucional comparado. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007; e cf. NASCIMENTO, Luiz Sales do. Direito constitucional comparado: pressupostos teóricos e princípios gerais. São Paulo: Verbatim, 2011.

11 Não ignoramos que existem Estados nos quais as prestações pecuniárias exigidas por entidades paraestatais com finalidades públicas não possuem natureza de tributo. Em nosso texto trabalhamos com um conceito genérico de tributo, sem particularizarmos detalhes, já que o conceito de tributo ganha peculiaridades a depender do ordenamento de cada país, por ser um conceito jurídico-positivo.

12 Fundamentando o reconhecimento do Vaticano como país soberano, veja-se: ACCIOLY, Hildebrando; e SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento. Manual de direito internacional público. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 1996, pp. 149-154.

13 É verdade que o Estado Pontifício também se utiliza em alguns casos da arrecadação de tributos para sustentar aspectos de sua existência e seus serviços, mas com especial singularidade, já que é um Estado destinado a servir de sede da representação da fé cristã católica no mundo. A Cidade-Estado do Vaticano sobrevive e desenvolve suas atividades tendo como principais fontes de financiamento a receita gerada por doações, as rendas obtidas com suas propriedades, com a prestação de serviços especiais e algumas atividades econômicas (sem fins lucrativos), e os ganhos obtidos com investimentos financeiros. Mas o Vaticano também possui previsão, inclusive extraterritorial, de tributos a serem exigidos por dioceses (repartições territoriais da Igreja espalhadas pelo mundo) em relação a pessoas jurídicas ligadas à própria Igreja. O Vaticano é um país que ostenta muitas singularidades, dentre as quais ser o menor país do mundo, o de menor população e o único a sustentar-se sem ter na cobrança de tributos a principal fonte de receita. Para exemplificar a existência de “tributos vaticanos”, cercados de peculiaridades, vejam-se o cânone 264, parágrafos 1º e 2º e o cânone 1.263 do Código de Direito Canônico.

14 Promulgado em 25 de janeiro de 1983, em substituição ao texto em vigor desde 1917, representa a maior Constituição do mundo moderno, com 1.752 artigos, denominados de “cânones” (regras), onde constam regras sobre temas muito diversos, alguns tratados costumeiramente em textos infraconstitucionais em outros países, como é o caso das normas detalhadas de processo civil e detalhes sobre infrações e sanções, além das normas de processo penal.

15 “Isso não significa que não se possa arguir matéria constitucional para questionar a exigência de tributo; o que ocorre é que naquele país as limitações constitucionais ao poder de tributar não são expressas; decorrem, outrossim, de garantias gerais asseguradas pela Constituição, cuja ameaça, por qualquer meio, inclusive o tributário, será coibida pela Corte Constitucional. Assim é que se desenha um quadro de proteção ao contribuinte a partir do Princípio do Estado de Direito e dos Direitos Fundamentais (...).” cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 70.

16 É o caso da Constituição da República Popular da China, por exemplo, que contém apenas um artigo expresso sobre tributação, qual seja, ipsis litteris: “Art. 56º Constitui dever dos cidadãos da República Popular da China pagar impostos nos termos prescritos pela lei.”

17 Cf. UCKMAR, Victor. Princípios comuns de Direito Constitucional Tributário. Tradução e notas ao Direito brasileiro por Marco Aurélio Greco. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999.

18 Para uma pesquisa sobre o Direito Tributário da integração, Direito Constitucional supranacional (sobretudo o europeu) e tributação, e outros temas comunitários, vale consultar, dentre outros: cf. BORGES, José Souto Maior. Curso de Direito comunitário. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009; CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição. 7ª ed. Coimbra: Almedina, 2003, pp. 233-236, 365-371, 817-830, 1.367-1.369, 1.423-1.430; GOMES, Luiz Flávio; MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direito supraconstitucional. São Paulo: RT, 2010 (Coleção Direito e Ciências Afins vol. 5).

19 “Teórica e tecnicamente, não se tratou de emenda, mas de nova constituição. A emenda só serviu de outorga, uma vez que verdadeiramente se promulgou texto integralmente reformulado (...).”cf. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 87.

20 Sobre o período de reabertura política no Brasil, cf. WILLIAMSON, Edwin. História da América Latina. Tradução de Patrícia Xavier. Lisboa: Edições 70, 2012, p. 445.

21 A detalhada discriminação de rendas na Constituição brasileira traz inconvenientes em virtude de certo “engessamento” do sistema, porém, para Rubens Gomes de Souza, “são suficientemente compensados pela segurança jurídica que dá o sistema da discriminação nominal dos tributos, ao contrário de outros países federais, como os Estados Unidos, a Argentina, o México, o Canadá, onde há constantes questões judiciais sobre competência tributária devido à elasticidade das respectivas Constituições, o que ainda se traduz pelo inconveniente econômico, muito grave, das superposições de tributos idênticos”. Cf. SOUZA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. Edição póstuma, coordenada pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários. São Paulo: Resenha Tributária, 1975, p. 189.

22 É somente a partir da EC nº 18/1965 que se estruturou no texto da Constituição de 1946 um sistema constitucional tributário, já que anteriormente a matéria tributária era tratada como uma parcela assistemática de regras e princípios imersos no Título I da Constituição de 1946, que nominalmente tratava da “Organização Federal”. Nas Constituições brasileiras republicanas anteriores (1937, 1934 e 1891) também não havia um espaço para o tratamento sistemático e organizado da matéria tributária.

23 Não estamos preocupados aqui em apontar os direitos fundamentais aplicáveis à esfera de proteção do cidadão-contribuinte, e sim apenas elencando os dispositivos constitucionais expressamente tributários. Assim, apesar de não haver nenhum direito fundamental do art. 5º expressamente tributário, não ignoramos que os direitos fundamentais gerais (art. 5º) formam, com outros direitos, o que Roque Carrazza denomina “estatuto do contribuinte” na Constituição brasileira. Cf. CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 24ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 420.

24 Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), Serviço Social da Indústria (Sesi), e Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac).

25 São relativamente raros os trabalhos tratando especificamente de uma teoria geral e do conjunto das diversas emendas constitucionais em matéria tributária. Para uma abordagem especialmente dedicada sobre essa matéria, por meio de enumeração das emendas e análise crítica acerca dos dispositivos constitucionais tributários introduzidos na Constituição Federal brasileira, vejam-se: ABRAHAM, Marcus. As emendas constitucionais tributárias e os 20 anos da Constituição Federal de 1988. São Paulo: Quartier Latin, 2009; PETRY, Rodrigo Caramori. “Reflexões sobre a função normativa das emendas constitucionais em matéria tributária: questionamentos envolvendo as contribuições ao PIS, CSLL, CPMF e RPPS”. Revista de Estudos Tributários nº 73. Porto Alegre, maio/junho de 2010, pp. 59-80.

26 Seus fatos geradores consistem, na maior parte dos casos, em manifestações de riqueza, como sucede com os impostos.

27 Ainda que o sistema constitucional tributário brasileiro seja rígido na discriminação das competências tributárias e nos limites expressos ao poder de tributar, o que deve oferecer mais segurança aos contribuintes, isso não significa que não existam conflitos de competência entre os entes políticos tributantes e inclusive abusos frequentes, a serem resolvidos no Judiciário, como alerta ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: RT, 1968, p. 89.

28 A mais extensa Constituição do mundo de que se tem notícia é a Constituição do Estado do Vaticano, denominada “Código de Direito Canônico”, e possui 1.752 artigos (“cânones”). A segunda mais extensa Constituição do mundo é a da República da Índia, aprovada em 1949, e que, após um breve preâmbulo, possuía originalmente 395 artigos, acompanhados por 12 tabelas contendo dezenas de dispositivos adicionais (com detalhamentos de alguns artigos do texto principal), além de quatro apêndices com dispositivos especiais. Atualmente (1º de outubro de 2013), após passar por 87 adições de artigos, além de diversas modificações e 21 revogações de artigos, produzidas por 97 emendas constitucionais (até 1º de outubro de 2013), o texto da Constituição da Índia contém a extraordinária soma de 461 artigos vide sítio do Ministério do Direito e Justiça da Índia na internet, no qual está disponível o texto da Constituição da Índia e suas emendas, em língua inglesa: INDIA. Constitution (1949). Ministry of Law and Justice. Government of India. Disponível em http://indiacode.nic.in/coiweb/welcome.html. Acesso em 1º de outubro de 2013.

29 Para acesso à Constituição dos EUA (com as 27 emendas) em língua portuguesa: USA. Constituição (1787). Universidade Estadual de Londrina (pasta do Professor José Miguel Arias Neto). Disponível em http://www.uel.br/pessoal/jneto/gradua/historia/recdida/ConstituicaoEUARecDidaPESSOALJNETO.pdf. Acesso em 10 de abril de 2013. As emendas 1 a 10, promulgadas em 1791, são comumente denominadas de United States Bill of Rights (Carta de Direitos dos Estados Unidos), em alusão à Bill of Rights inglesa, datada de 1689, e que dispôs uma série de limites ao poder constituído (monarquia inglesa).

30 A periodização da História com base em eventos é sabidamente problemática e muito discutível, pois a realidade não se altera do dia para a noite, e ao mesmo tempo em todos os lugares do Mundo Ocidental.

31 Como a tributação era decidida pelo parlamento inglês, e não havia participação dos colonos (isolados no território das 13 colônias, do outro lado do Oceano Atlântico), entenderam eles que não estavam representados como ingleses, e que, portanto, a tributação sobre as colônias era inconstitucional frente à Carta de Direitos (Bill of Rights) de 1689 da Inglaterra, na qual se previa que a tributação só poderia existir quando os contribuintes estivessem representados no parlamento.

32 Veja-se o texto da Declaração de Independência dos EUA: EUA. Declaração de independência dos Estados Unidos da América (1776). O Portal da História. Disponível em http://www.arqnet.pt/portal/teoria/declaracao_vport.html. Acesso em 12 de abril de 2013.

33 O caso envolvia questão de imunidade recíproca entre os entes federativos norte-americanos, pois o Estado de Maryland pretendia cobrar tributos (e em montante abusivo) sobre um banco federal, representado pelo Sr. James McCulloch. Para uma análise detalhada de aspectos desse julgamento envolvendo a interpretação da Constituição dos EUA, veja-se, no Brasil, cf. CAMPOS, Francisco. Direito Constitucional. V. 1. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1956. pp. 23-134.

34 No mesmo sentido é também a observação de Victor Uckmar, em clássico estudo sobre o tema, UCKMAR, Victor. Princípios comuns de Direito Constitucional Tributário. Tradução e notas ao Direito brasileiro por Marco Aurélio Greco. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 18.

35 Observamos que os EUA se organizam em um regime federativo cujo funcionamento não é obstado pelo fato da Constituição Federal do país não discriminar as competências tributárias entre os poderes componentes (União, Estados, DF e Municípios). Naquele país, convivem as competências tributárias federais, estaduais e locais (incluído aqui o Distrito Federal norte-americano, conhecido como “Washington, D.C.” ou “Distrito de Colúmbia”), limitadas apenas por certas restrições constitucionais genéricas. Bem diferente da rígida discriminação de competências feita pela Constituição do Brasil.

36 Lembramos que o Primeiro Império ou Reich alemão corresponde ao período de existência do Sacro Império Romano-Germânico do Ocidente (800-1806), que em verdade era uma frágil reunião de reinos.

37 Alusão ao papel fundamental do Premiê prussiano Otto Von Bismarck na unificação do país, sob as vistas do Rei da Prússia, Guilherme I, que com a unificação se tornaria o Imperador ou Kaiser alemão.

38 Tal Constituição marcou a queda do Império e a adoção da República como forma de governo pela Alemanha (sob regime parlamentarista, tendo o presidente o auxílio de um primeiro-ministro), logo após o término da Primeira Guerra Mundial.

39 Tal Constituição, surgida logo após o término da ocupação da Alemanha em 1949 pelas potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial (EUA, Inglaterra, França e URSS), representou o reflexo final da queda do regime totalitário alemão (inaugurado com a ascensão de Adolf Hitler como Primeiro-Ministro titular de plenos poderes em 1933). A Constituição de 1949 surgiu da reorganização política alemã, sob um novo modelo: a Alemanha dividida, em Ocidental (sob influência dos EUA, Inglaterra e França) e Oriental (sob influência da URSS), observando-se que o território da antiga cidade de Berlim, apesar de encravado dentro da Alemanha Oriental, também foi dividido internamente entre Berlim Ocidental e Berlim Oriental. Assim, quando tratamos da Constituição alemã de 1949 estamos mencionando a Constituição da Alemanha Ocidental (capitalista), também conhecida como República Federal da Alemanha. A Alemanha Oriental (comunista), conhecida como República Democrática da Alemanha, foi um Estado diverso, e que perdurou entre 1949 até 1990, e possuía uma Constituição diferente, que não sobreviveu à reunificação alemã em 1990.

40 Para visualizar o texto constitucional alemão em língua portuguesa, veja-se: ALEMANHA. Lei Fundamental (1949). Representações diplomáticas da Alemanha no Brasil. Disponível em http://www.brasil.diplo.de/contentblob/3254212/Daten/1330556/ConstituicaoPortugues_PDF.pdf. Acesso em 22 de março de 2013.

41 O nome “Weimar” é uma alusão à cidade onde foi promulgada a dita Constituição alemã.

42 Para uma análise do conteúdo dos arts. 105 ao 108 da Constituição da Alemã e o contexto político da formação do federalismo fiscal alemão, vejam-se, dentre outros: PRADO, Sérgio. Equalização e federalismo fiscal: uma análise comparada: Alemanha, Índia, Canadá e Austrália. Rio de Janeiro: Konrad-Adenauer-Stiftung, 2006, pp. 59-143; TIPKE, Klaus; e LANG, Joachim. Direito Tributário (Steuerrecht). Tradução da 18ª ed. alemã, totalmente refeita, de Luiz Dória Furquim. V. 1. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2008, pp. 125-162.

43 Como já vimos, outro exemplo clássico diz respeito à Constituição dos EUA, de 1787, gerada após a conquista da independência dos EUA em relação à Inglaterra, e que inspirou os franceses.

44 Eis o texto dos dispositivos limitadores do poder de tributar na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (parte do preâmbulo em conjunto com os arts. 13 e 14): “(...) Em razão disto, a Assembléia Nacional reconhece e declara, na presença e sob a égide do Ser Supremo, os seguintes direitos do homem e do cidadão: (...) Art. 13º. Para a manutenção da força pública e para as despesas de administração é indispensável uma contribuição comum que deve ser dividida entre os cidadãos de acordo com suas possibilidades. Art. 14º Todos os cidadãos têm direito de verificar, por si ou pelos seus representantes, da necessidade da contribuição pública, de consenti-la livremente, de observar o seu emprego e de lhe fixar a repartição, a coleta, a cobrança e a duração.” Texto disponível em: FRANÇA. Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789). USP (Biblioteca Virtual de Direitos Humanos). Disponível em http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/declaracao-de-direitos-do-homem-e-do-cidadao-1789.html. Acesso em 12 de abril de 2013. O texto da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão foi depois usado como preâmbulo da primeira Constituição da França, promulgada em 1791. O texto dessa Constituição, inspirada na Declaração de 1789, previu, em relação aos tributos, que “todas as contribuições seriam repartidas entre todos os cidadãos igualmente, conforme as riquezas” (Titre Premier (...) 2º Que toutes les contributions seront réparties entre tous les citoyens également en proportion de leurs facultes”. O texto da Constituição de 1791 está disponível em FRANCE. Constitution (1791). Conseil Constitutionnel Français. Disponível em http://www.conseil-constitutionnel.fr/conseil-constitutionnel/francais/la-constitution/les-constitutions-de-la-france/constitution-de-1791.5082.html. Acesso em 12 de abril de 2013.

45 Cf. AQUINO, Rubim Santos Leão de; et al. História das sociedades: das sociedades modernas às sociedades atuais. 26ª ed. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1993, p. 158.

46 A Constituição de 1875 ficou suspensa no período entre 1940 e 1944, quando o Estado francês se rendeu aos alemães na Segunda Guerra Mundial.

47 Para uma consulta, em língua francesa, do conjunto das Constituições da França e de alguns outros documentos jurídicos e leis importantes sobre sua história política, consulte-se: MAURY, Jean-Pierre. Collection des constitutions françaises. Digithèque de matériaux juridiques et politiques. Disponível em http://mjp.univ-perp.fr/france/france.htm. Acesso em 29 de maio 2013.

48 O semipresidencialismo francês é visto como o mais representativo desse sistema, na visão de DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 30ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 235.

49 O texto da Constituição da República da França promulgada e em vigor desde 4 de outubro de 1958 está disponível no sítio da Presidência da República francesa na internet: FRANCE. Constitution (1958). Présidence de la République. Disponível em http://www.elysee.fr/la-presidence/la-constitution-de-la-cinquieme-republique/. Acesso em 29 de março de 2013.

50 ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: RT, 1968, pp. 82-83.

51 Outorgada pelo Rei João I, conhecido como “Rei João sem Terra” (por não ter herdado de seu pai domínios territoriais) por pressão dos nobres ingleses que se revoltaram contra os abusos e fraquezas de seu reinado. O Rei João acabou depois por contestar a Magna Carta e seguiu-se guerra civil, apaziguada tempos depois. A Carta deu início a uma série de reinvindicações de controle do poder monárquico pelos nobres e depois pela burguesia, sendo reconhecido como início da formação do modelo de constitucionalismo moderno inglês.

52 Para maiores referências sobre os documentos que formam a Constituição da Inglaterra (Reino Unido), vejam-se: cf. BITAR, Orlando. “Fontes e essência da Constituição britânica”. Separata da Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Pará. Belém, 1959; DANTAS, Ivo. Novo Direito Constitucional comparado: introdução, teoria e metodologia. 3ª ed. Curitiba: Juruá, 2010, pp. 253-327.

53 Com isso não queremos afirmar que a origem histórica do princípio da legalidade tributária está na Magna Carta de 1215, pois, de fato, é anterior, sendo reconhecida a exigência de consentimento dos súditos para cobrança de tributos em período muito anterior, como nos dá conta Victor Uckmar, em dedicado estudo sobre o tema, cf. UCKMAR, Victor. Princípios comuns de Direito Constitucional Tributário. Tradução e notas ao Direito brasileiro por Marco Aurélio Greco. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999. De qualquer forma, se reconhece que identificar a origem de um instituto com evolução paulatina e de presença universal, como é a legalidade, é tarefa sujeita a dúvidas e controvérsias.

54 Vide texto integral da Magna Carta traduzido: INGLATERRA. Magna Carta (1215). Universidade Federal do Rio Grande do Norte (página do Professor Tassos Lycurgo). Disponível em http://www.ufrnet.br/~tl/otherauthorsworks/the_magna_carta_port.pdf. Acesso em 8 de abril de 2013.

55 Logo no início da Petição de Direitos inglesa consta a exigência de autorização do Parlamento antes da cobrança de tributos. INGLATERRA. Petição de Direitos (1628). USP Biblioteca Virtual de Direitos Humanos. Disponível em http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/peticao-de-direito-1628.html. Acesso em 9 de abril de 2013.

56 ENGLAND. English Bill of Rights (1689). Yale Law School (The Avalon Project). Disponível em http://avalon.law.yale.edu/17th_century/england.asp. Acesso em 9 de abril de 2013.

57 Conhecido antes como Vittorio Emanuele II, enquanto era Rei da Sardenha antes da unificação italiana.

58 Ganhou esse nome devido ao nome do Rei da Sardenha que outorgou em 1848 essa carta constitucional: Carlo Alberto di Savoia. Em 1848 vivia-se uma época de revoluções liberais na Europa.

59 ITALIA. Costituzione della Reppublica Italiana (1947). Presidenza del Consigli dei Ministri. Disponível em http://www.governo.it/Governo/Costituzione/CostituzioneRepubblicaItaliana.pdf. Acesso em 13 de abril de 2013.

60 “Nenhuma prestação pessoal ou patrimonial pode ser imposta se não com base na lei.” No original: “Art. 23. Nessuna prestazione personale o patrimoniale può essere imposta se non in base alla legge.”

61 “Art. 53. Todos tem a obrigação de contribuir para as despesas públicas na medida de sua capacidade contributiva. O sistema tributário é inspirado nos critérios de progressividade.” (tradução do autor). No original: “Art. 53. Tutti sono tenuti a concorrere alle spese pubbliche in ragione della loro capacità contributiva. Il sistema tributario è informato a criteri di progressività.”

62 Como esclarece o Professor Italiano, MITA, Enrico de. Principi di diritto tributario. 5ª ed. Milão: Giuffrè, 2007, pp. 25-26.

63 Veja-se: Fundazione Ugo Spirito. Osservatorio sul federalismo nazionale. Disponível em http://osservatoriofederalismo.fondazionespirito.it/idea.asp. Acesso em 19 de abril de 2013.

64 A expressão “federalismo fiscal” é adotada nos comentários feitos à redação atual do art. 119 da Constituição da Itália pelo Serviço de Estudos do Senado italiano, em texto elaborado por Francesco Marcelli, que analisou a Lei Constitucional nº 3/2001, cf. MARCELLI, Francesco. La legge costituzionale 18 ottobre 2001, nº 3. Senato della Reppublica (Servizio Studi/ Ufficio ricerche sulle questioni regionali e delle autonomie locali). Disponível em http://piattaformacostituzione.camera.it/application/xmanager/projects/piattaformacostituzione/file/EventiCostituzione2007/files/Dossier_n.270.pdf. Acesso em 19 de abril de 2013. Também sobre o “federalismo fiscal” italiano, veja-se: cf. GIARDA, Piero. Il sistema italiano di federalismo fiscale. (Treccani.it Enciclopedia Italiana). Disponível em http://www.treccani.it/enciclopedia/il-sistema-italiano-di-federalismo-fiscale_(XXI_Secolo)/#. Acesso em 19 de abril de 2013.

65 As comunidades autônomas regem-se por suas próprias leis fundamentais, chamadas “Estatutos”.

66 Quais sejam: Melilla e Ceuta, ambas no litoral norte da África, ao lado do Marrocos.

67 Maiores informações disponíveis no sítio do Instituto Nacional de Estadística espanhol (equivalente ao IBGE brasileiro em matéria de estatísticas): ESPAÑA. Instituto Nacional de Estadística. Disponível em www.ine.es. Acesso em 9 de junho de 2013.

68 Foi um dos mais extensos textos constitucionais do mundo: era composto por 384 artigos. Influenciou, com suas ideias liberais, a Constituição Imperial brasileira de 1824 e de outras nações latino-americanas.

69 A indicação dessa Carta como uma “Constituição” é controversa, pois editada sob regime ditatorial.

70 Vide texto da Constituição da Espanha em língua espanhola disponível a partir do sítio oficial do Governo da Espanha: ESPAÑA. Constitución Española (1978). Gobierno de España. Disponível em http://www.lamoncloa.gob.es/NR/rdonlyres/EBB3AFF7-C7EF-4009-A15E-E7D75FB3C8F5/232644/Constitucion_es1.pdf. Acesso em 9 de junho de 2013. A Constituição da Espanha recebeu desde sua promulgação em 1978 duas reformas constitucionais apenas: uma em 1992 e outra em 2011 (na Espanha não se dá o nome de “emenda” à Constituição, e sim “reforma”). O texto das reformas está disponível em: ESPAÑA. Constitución Española (1978): reformas. Tribunal Constitucional de España. Disponível em http://www.tribunalconstitucional.es/es/constitucion/Paginas/ConstitucionCastellano.aspx. Acesso em 10 de junho de 2013.

71 Tradução do autor. No original: “La Ley de Presupuestos no puede crear tributos. Podrá modificarlos cuando una ley tributaria sustantiva así lo prevea.”

72 Nesse mesmo sentido, veja-se: AYALA, José Luis Pérez de; e BECERRIL, Miguel Pérez de Ayala. Fundamentos de Derecho Tributario. Madri: Dykinson, 2009, p. 47.

73 “Artículo 149. 1. El Estado tiene competencia exclusiva sobre las siguientes materias: (...) 14ª Hacienda general y Deuda del Estado. 15ª (...).”

74 Antes da Ley 58/2003, estava em vigor a Ley General Tributaria 230/1963, que justamente por ser anterior à Constituição espanhola em vigor (promulgada em 1978), carecia de atualização, o que se realizou com a nova Lei Geral promulgada em 2003.

75 Como esclarece a própria Exposição de Motivos publicada junto à Ley General Tributaria da Espanha. ESPAÑA. Ley General Tributaria de España (Ley 58/2003). Boletín Oficial del Estado. Disponível em http://www.boe.es/boe/dias/2003/12/18/pdfs/A44987-45065.pdf. Acesso em 17 de junho de 2003.

76 Efetivando tal delegação legislativa tributária, vejam-se a Ley Orgánica de Financiación de Las Comunidades Autónomas (Ley Orgánica 8/1980, e suas alterações posteriores, dentre elas a mais recente, Ley 3/2009) e a Ley 21/2001, ambas editadas pelo Estado espanhol (governo central), para regular o sistema de financiamento das Comunidades Autônomas. ESPAÑA. Ley Orgánica de Financiación de Las Comunidades Autónomas (Ley 8/1980). Boletín Oficial del Estado. Disponível em http://www.boe.es/buscar/act.php?id=BOE-A-1980-21166. Acesso em 1º de setembro de 2013. Reconhecendo a possibilidade de delegação legislativa tributária na Espanha, veja-se também: AYALA, José Luis Pérez de; e BECERRIL, Miguel Pérez de Ayala. Fundamentos de Derecho Tributario. Madri: Dykinson, 2009, pp. 389-390.

77 Interessante observar também que a segunda parte do art. 47 da Constituição espanhola prevê a participação dos particulares na valorização de imóveis causada por obras públicas de urbanização, porém sem especificar se tratar de participação material ou no financiamento, inclusive por meio de tributo próprio (diferentemente do que ocorre no Brasil, país cuja Constituição prevê a chamada “contribuição de melhoria” declaradamente como espécie de tributo): “Artículo 47. (...). La comunidad participará en las plusvalías que genere la acción urbanística de los entes públicos.”

78 Ainda existem outras divisões administrativas, como as áreas metropolitanas e as comunidades intermunicipais.

79 Ainda que o Reino português, durante 1580 até 1640, tenha sido regido por reis originalmente espanhóis (período conhecido como “União Ibérica” ou “Dinastia Filipina”, durante o qual o Rei de Portugal era ao mesmo tempo Rei da Espanha, sucedendo-se três reis, todos de nome “Felipe”).

80 O mesmo Rei Dom Pedro IV de Portugal também foi o Rei Dom Pedro I do Brasil. A propósito, essa Constituição de 1826 foi redigida por Dom Pedro I quando estava no Brasil.

81 Sobre a evolução constitucional em Portugal, veja-se, dentre outros: cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição. 7ª ed. Coimbra: Almedina, 2003.

82 Vide texto da Constituição da República Portuguesa: PORTUGAL. Constituição da República Portuguesa (1974). Assembleia da República. Disponível em http://www.parlamento.pt/Legislacao/Documents/constpt2005.pdf. Acesso em 9 de junho de 2013. O texto constitucional português, desde 1976 já foi objeto de sete revisões/alterações por “leis constitucionais” (como são denominadas as “emendas” à Constituição em Portugal). Os textos das leis constitucionais revisoras, assim como o projeto de 8ª revisão constitucional, atualmente em curso, estão disponíveis no sítio da Assembleia da República. Sobre as reformas constitucionais portuguesas, veja-se: ALEXANDRINO, José de Melo. Reforma constitucional: lições do constitucionalismo português. Disponível em http://www.fd.ul.pt/Portals/0/Docs/Institutos/ICJ/LusCommune/AlexandrinoJosedeMelo2.pdf. Acesso em 3 de julho de 2013.

83 Aqui a Constituição portuguesa revela exigir um conteúdo mínimo do princípio da capacidade contributiva para cobrança de impostos em Portugal, ou seja, a interpretação que se faz é mais ampla que o texto expresso, pois capacidade contributiva não é exigida apenas em relação ao imposto sobre rendimento. Nesse sentido:, cf. GUIMARÃES, Vasco Branco. “Sobre a tributação das mais-valias”. Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal nº 3. Coimbra: Almedina, ano 3, outono, 2010, p. 255.

84 Interessante notar que essa diretriz da Constituição de Portugal se choca com as normas gerais editadas no âmbito da União Europeia para o imposto sobre o valor adicionado (IVA), razão pela qual esse dispositivo constitucional (art. 104, nº 4) não se aplica ao IVA, como esclarece José Casalta Nabais. Para tal autor, o dispositivo constitucional ainda permanece aplicável para outros eventuais impostos sobre consumo, e de fato o é aplicável no caso do vigente imposto português sobre veículos: NABAIS, José Casalta. Direito Fiscal. 5ª ed. Coimbra: Almedina, 2009, p. 491. Na citada obra, Nabais também entende que o art. 104º da Constituição portuguesa é praticamente inócuo ou até mesmo prejudicial de certa forma, por representar potencialmente um obstáculo à tarefa do legislador infraconstitucional português moldar o sistema fiscal do País conforme e em coerência com o desenvolvimento e transformação do sistema econômico, especialmente em Portugal, país com economia bastante aberta às trocas com o exterior (Id., ibid., p. 497).

85 “A consideração fiscal da família, requerida pela Constituição (arts. 67º, nº 2, al.f) e 104º, nº 1), implica a proibição de discriminações desfavoráveis dos contribuintes casados ou com filhos face aos contribuintes solteiros ou sem filhos, e não a imposição ao legislador da utilização do instrumento fiscal (benefícios fiscais) para o favorecimento da constituição e desenvolvimento da família.” Cf. NABAIS, José Casalta. Direito Fiscal. 5ª ed. Coimbra: Almedina, 2009, p. 156.

86 Vide informações nas seguintes fontes: CRI Online. China ABC. Disponível em http://portuguese.cri.cn/chinaabc/chapter2/chapter20101.htm. Acesso em 17 de agosto de 2013; CHINA. Embaixada da República Popular da China no Brasil. Disponível em http://br.china-embassy.org/por/zggk/. Acesso em 17 de agosto de 2013.

87 Vide texto da Constituição chinesa: CHINA. Constituição da República Popular da China (1982). Imprensa Oficial do Governo da Região Administrativa de Macao. Disponível em http://bo.io.gov.mo/bo/i/1999/constituicao/index.asp. Acesso em 2 de agosto de 2013.

88 Nesse sentido, observe-se o artigo 5º da Constituição cubana: “artículo 5º El Partido Comunista de Cuba, martiano y marxista-leninista, vanguardia organizada de la nación cubana, es la fuerza dirigente superior de la sociedad y del Estado, que organiza y orienta los esfuerzos comunes hacia los altos fines de la construcción del socialismo y el avance hacia la sociedad comunista.”

89 Maiores informações: CUBA. Informe de Cuba sobre la Resolution 66/6 de la Asamblea General de las Naciones Unidas. Gobierno de Cuba. Ministério de las Relaciones Exteriores de Cuba. Disponível em http://www.cubavsbloqueo.cu/informebloqueo2012/index.html. Acesso em 3 de abril de 2013.

90 “Artículo 121º Los tribunales constituyen un sistema de órganos estatales, estructurado con independencia funcional de cualquier otro y subordinado jerárquicamente a la Asamblea Nacional del Poder Popular y al Consejo de Estado.”

91 Sobre a evolução política de Cuba, veja-se, dentre outros: DEL POZO, José. História da América Latina e do Caribe: dos processos de independência aos dias atuais. Tradução de Ricardo Rosenbusch. Petrópolis: Vozes, 2009, pp. 111, 152, 285-288 e 330.

92 Texto da Constituição de Cuba: CUBA. Constitución de la República de Cuba (1976). Gobierno de Cuba. Disponível em http://www.cuba.cu/gobierno/cuba.htm. Acesso em 3 de abril de 2013.

93 “A fiscalidade, no Estado Socialista, perde toda a importância que tem no Estado de Direito. Aliás, a rigor, a idéia de socialismo é refratária à de tributação. Se ao Estado pertencem os meios de produção, a entrada financeira necessária aos gastos estatais se faz a título de preço público ou de contraprestação pelos bens (...). Um que outro tributo direto pode haver na estrutura socialista, sem que, entretanto, daí se origine um vero sistema tributário.” Cf. TORRES, Ricardo Lobo. Sistemas constitucionais tributários. Tratado de Direito Tributário brasileiro. T. 2, V. 2. Idealização de Aliomar Baleeiro, Coordenação de Flávio Bauer Novelli. Rio de Janeiro: Forense, 1986, p. 71. Como se disse, esta realidade tributária de Cuba está mudando, e sem alteração da Constituição cubana: “O código tributário que acaba de ser publicado estabelece a primeira tributação abrangente em Cuba desde a revolução de 1959, que levou à instauração do regime comunista e à eliminação de praticamente todos os impostos. Na década de 1990, após o colapso da União Soviética - que patrocinava o regime cubano -, Havana adotou alguns impostos esparsos, mas em geral preferiu manter salários baixos no setor público, para financiar serviços sociais gratuitos. Nos últimos dois anos, porém, o governo realizou reformas liberalizantes, estimulando as microempresas, a agricultura privada e a iniciativa individual, além de planos para aumentar o salário dos funcionários públicos. Com o novo código tributário, o Estado demonstra a intenção de ficar com parte dos dividendos.” Cf. FRANK, Marc. “O cobrador de impostos está chegando a Cuba”. Estadão. São Paulo, 28 de novembro de 2012. Disponível em http://www.estadao.com.br/noticias/internacional,o-cobrador-de-impostos-esta-chegando-a-cuba,966389,0.htm. Acesso em 19 de maio 2013.