Um Olhar para a Arbitragem Tributária: Comparativo das Propostas no Senado Federal, Provocações e Sugestões

A Look at Tax Arbitration: Comparison of Proposals in the Federal Senate, Provocations and Suggestions

Tathiane Piscitelli

Professora da FGV Direito SP. Coordenadora Acadêmica do Grupo de Pesquisa “Métodos Alternativos de Resolução de Disputa em Matéria Tributária”, do Núcleo de Direito Tributário da mesma instituição. Doutora em Direito pela Universidade de São Paulo. E-mail: tathiane.piscitelli@fgv.br.

Andrea Mascitto

Professora da Pós-graduação da FGV Direito SP. Coordenadora Executiva do Grupo de Pesquisa “Métodos Alternativos de Resolução de Disputa em Matéria Tributária”, do Núcleo de Direito Tributário da mesma instituição. Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP. Conselheira Consultiva do Instituto Brasileiro de Arbitragem e Transação Tributárias (IBATT). Membro do Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAR). Advogada em São Paulo. E-mail: amascitto@pn.com.br.

André Luiz Fonseca Fernandes

Mestrando em Direito Tributário pela FGV Direito SP. Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP). Pesquisador do Grupo de Pesquisa “Métodos Alternativos de Resolução de Disputa em Matéria Tributária”, do Núcleo de Direito Tributário da FGV Direito SP. Coordenador do Comitê Temático de Transação Tributária e Negócio Jurídico Processual do Instituto Brasileiro de Arbitragem e Transação Tributárias (IBATT). Advogado em São Paulo. E-mail: afernandes@ajc.adv.br.

Resumo

O artigo analisa e compara alguns dos principais aspectos dos projetos de lei em trâmite no Senado Federal que pretendem, com base em modelos distintos, instituir a arbitragem tributária no Brasil. A partir da avaliação (i) do instrumento normativo adequado para criação do instituto; (ii) do momento no qual a disputa poderia ser levada à seara arbitral tributária; (iii) das matérias tributárias passíveis de solução arbitral; (iv) do controle judicial da decisão arbitral tributária; (v) da formalização da opção pela via arbitral tributária; (vi) da legislação subsidiária aplicável ao mecanismo arbitral tributário; e (vii) de algumas questões conexas às anteriores são apresentadas sugestões de aperfeiçoamento de tais modelos legislativos, com o objetivo de melhorar o acesso à justiça tributária no país.

Palavras-chave: arbitragem tributária, métodos alternativos de solução de controvérsias tributárias, Projeto de Lei n. 4.257/2019, Projeto de Lei n. 4.468/2020, acesso à justiça tributária.

Abstract

This article analyses and compares some of the main features of the bills of law, currently pending in the Federal Senate, that contain different mechanisms of tax arbitration and aim at introducing this alternative means of tax dispute resolution in Brazil. Based on the appraisal of (i) the adequate legal instruments for its institution; (ii) the timing to refer the tax controversy to arbitration; (iii) the tax matters to be decided by the arbitrators; (iv) the judicial control of the arbitration award; (v) the arbitration agreement in tax-related disputes; (vi) the legislation to be applied to tax arbitration on a supplementary basis; and (vii) some related issues to the previous ones, the article presents suggestions to improve those tax arbitration mechanisms and increase the access to tax justice in the country.

Keywords: tax arbitration, alternative dispute resolution in tax law, Bill of Law n. 4.257/2019, Bill of Law n. 4.468/2020, access to tax justice.

1. Introdução

A arbitragem é método heterocompositivo de resolução de conflitos genericamente disciplinado na Lei n. 9.307/96 (Lei de Arbitragem). Os debates sobre a utilização do instituto em matéria tributária se intensificaram a partir de 2015, com a inclusão, no art. 1º, da possibilidade de arbitragem com a administração pública. A discussão, todavia, insere-se em uma perspectiva mais ampla, que envolve a utilização de métodos alternativos, ou adequados, de resolução de disputa em matéria tributária.

Especificamente em relação à arbitragem, há dois projetos de lei (PL) em tramitação no Senado Federal que preveem modelos diversos de aplicação do instituto em matéria tributária: os PLs n. 4.257/2019 e 4.468/2020. O objetivo deste artigo é comparar, de forma objetiva, alguns dos principais aspectos dessas iniciativas, de modo a apresentar provocações e sugestões que colaborem para o debate das propostas e para a efetiva implementação do instituto no Brasil. Para tanto, algumas considerações introdutórias são necessárias.

O PL n. 4.257/20191 foi apresentado pelo Senador Antônio Anastasia (PSDB-MG) e institui a arbitragem tributária via alteração da Lei de Execuções Fiscais (LEF – Lei n. 6.830/80), com recorte temporal pós-constituição da relação jurídica tributária e garantia da dívida, além da referência aos requisitos da Lei de Arbitragem. Já o PL n. 4.468/20202, apresentado pela Senadora Daniella Ribeiro (PP-PB), traz a figura da “arbitragem especial tributária”, possível de ser realizada antes mesmo da constituição da relação jurídica tributária – ou seja, em momento diametralmente oposto àquele previsto no PL n. 4.257/2019. O foco da arbitragem nesse modelo seria o de prevenir conflitos mediante solução de controvérsias sobre matérias de fato, podendo servir ainda para quantificação de crédito do sujeito passivo decorrente de decisão judicial transitada em julgado e não liquidado judicialmente.

A análise detalhada dos PLs depende da avaliação de aspectos formais e materiais neles contidos, que podem conferir maior ou menor força ao instituto da arbitragem. A avaliação desses pontos se dará nas seções a seguir, divididas pelos tópicos que julgamos essenciais para o enfrentamento do tema e evolução do instituto no Brasil. Tais tópicos passam pela definição do instrumento legislativo adequado, pelos limites materiais da arbitragem e momento de realização do procedimento, dentre outros aspectos. A última dessas seções trata de peculiaridades específicas de ambos os projetos, com a apresentação das respectivas sugestões, e conclui o texto. As ideias aqui delineadas partem do pressuposto de que o debate público ainda no curso do processo legislativo é salutar para a aprovação de normas mais coerentes e adequadas ao ordenamento jurídico nacional.

2. Instrumento adequado para criação da arbitragem tributária

O primeiro ponto de atenção na análise dos mencionados PLs se refere ao instrumento legislativo escolhido para a criação da arbitragem tributária no Brasil. Trata-se, naturalmente, de questão formal que pode ter impacto relevante na constitucionalidade do instituto. Em ambos os casos, estamos diante de projetos de leis ordinárias.

Como brevemente tratado nas linhas anteriores, o PL n. 4.257/2019 promove alterações na LEF e insere a arbitragem naquele contexto processual específico. Já o PL n. 4.468/2020 realiza poucas alterações na Lei n. 9.430/96 e pretende instituir regime autônomo, desvinculado tanto do regime geral da arbitragem particular e administrativa (Lei de Arbitragem) quanto do processo de execução fiscal. A escolha do instrumento legislativo para a criação do instituto não é trivial e há diversas correntes doutrinárias sobre o tema3.

Inicialmente, há quem condicione a criação da arbitragem tributária à previsão do instituto em lei complementar. Tal exigência estaria relacionada com a imprescindibilidade de alteração do Código Tributário Nacional (CTN) nos arts. 151 e 156, que disciplinam, respectivamente, hipóteses de suspensão da exigibilidade e extinção do crédito tributário. Trata-se de prever, com precisão, o impacto que a arbitragem tributária teria quanto à relação jurídica tributária, observando-se o papel e a função das normas gerais para tanto, nos termos do art. 146, inciso III, da Constituição, especialmente a alínea “b”. A partir da adequação do CTN, lei ordinária nacional ou mesmo lei ordinária específica de cada ente da Federação poderia regular o processo arbitral tributário.

A segunda corrente sustenta, a seu turno, que a arbitragem tributária poderia ser criada e disciplinada por lei ordinária nacional específica, com fundamento no art. 22, inciso I, da Constituição, que delega competência para a União disciplinar matérias de Direito Processual; ou mesmo por lei ordinária própria de cada ente da Federação, nos termos do art. 24, inciso XI e § 3º, da Constituição, que prevê a possibilidade de os Estados instituírem normas gerais sobre “procedimentos em matéria processual” na ausência da lei federal4. Em ambos os casos, defende-se que, ou cabe à lei ordinária regular inteiramente a matéria, ou cabe a esta espécie legislativa regulá-la parcialmente e adotar, em relação aos pontos não especificamente abordados, as disposições da Lei de Arbitragem. Parte-se da premissa de que é dispensável lei complementar nacional prévia para tratar das questões mencionadas, e isso se dá por, pelo menos, duas razões.

Em primeiro lugar, o entendimento segundo o qual a lei complementar é dispensável em casos como esses foi o que prevaleceu no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.405/RS5. Nos termos do voto vencedor do ministro relator Alexandre de Moraes, “[...] a Constituição Federal não reservou à lei complementar o tratamento das modalidades de extinção e suspensão dos créditos tributários, à exceção da prescrição e decadência, previstos no art. 146, III, ‘b’, da CF”.

De outro lado, alega-se que seria possível a inclusão, em lei ordinária, de norma que equipare o regime jurídico e as soluções por ela dadas ao processo arbitral tributário aos institutos (e respectivos efeitos) previstos no CTN. Aliás, teria sido esse o caminho adotado pelo legislador no art. 45 da Lei n. 13.140/2015 (Lei de Mediação), que equipara a submissão do litígio à composição extrajudicial à hipótese do art. 151, inciso III, do CTN, para fins de suspensão da exigibilidade do crédito tributário6.

Por fim, há uma última corrente que afirma ser desnecessária lei específica, podendo a arbitragem tributária ser criada por ato administrativo infralegal, com fundamento único na Lei de Arbitragem.

Como fica claro, dentre as várias orientações possíveis, os PLs em análise optaram pela segunda corrente; ou seja, para os autores das iniciativas legislativas, a arbitragem tributária não dependeria de lei complementar para ser validamente criada. Há uma diferença, no entanto, na natureza da lei ordinária que se pretende criar com cada qual: enquanto o PL n. 4.257/2019 segue o caminho da lei ordinária nacional específica, obrigando a todos em todo o território nacional por meio de alterações na LEF, o PL n. 4.468/2020 escolhe a via da lei ordinária federal específica, com modificações e referências à aplicação de outras normas federais, como as Leis n. 9.430/96 e 13.988/2020.

De nossa perspectiva, a escolha pela lei ordinária é acertada, ainda que seja possível e adequado defender a necessidade de alteração do CTN. Em verdade, a inserção do instituto da arbitragem em dispositivos do Código resultaria em maior segurança jurídica aos contribuintes e à Fazenda Pública, que não teriam de se valer de interpretações extensivas ou por analogia para ver contemplado o citado mecanismo de solução de disputa dentre as formas de suspensão da exigibilidade ou de extinção do crédito tributário.

Ainda assim, caso nos concentremos na escolha legislativa já feita e em tramitação no Congresso, parece-nos que a lei de caráter nacional constitui o melhor caminho para conferir maior uniformidade ao procedimento que, então, poderia passar a ser regulamentado no âmbito infralegal, por ato administrativo dos diferentes entes e em todos os níveis: federal, estadual, municipal e distrital.

3. Momento da arbitragem tributária e questões conexas

O segundo ponto de atenção em relação aos PLs analisados diz respeito ao momento em que seria possível a solução de disputas, por meio de arbitragem tributária, entre o Fisco e o sujeito passivo da relação jurídica tributária. Essa questão não está de todo dissociada da primeira, já que a criação do instituto por lei ordinária, e sem a modificação do CTN por lei complementar, justifica a eleição de um escopo mais restrito e delimitado a um momento em que a relação jurídica tributária já esteja constituída e garantida, ou então em que nem mesmo esteja constituída.

Como mencionado, o PL n. 4.257/2019 prevê a arbitragem em momento posterior à constituição da relação jurídica tributária e demanda, como requisito de acesso ao procedimento, a garantia dos valores em debate, realizada no contexto de ação judicial em curso – Execução Fiscal, Ação Consignatória de Pagamento ou Ação Anulatória do Ato Declarativo da Dívida. Dentre as hipóteses de garantia, o PL indica o depósito em dinheiro, o seguro garantia e a fiança bancária7.

De outro lado, o PL n. 4.468/2020 pretende instituir a arbitragem em momento anterior à constituição da relação jurídica tributária – a ausência de constituição pelo lançamento é, em verdade, pressuposto ao procedimento8. Além disso, pode abranger controvérsia relativa à quantificação de crédito reconhecido judicialmente e passível de compensação9.

Nos dois casos, fica claro que os PLs criam estratégias para evitar o debate sobre a efetiva necessidade de ampliar, no CTN, as hipóteses de suspensão da exigibilidade e extinção do crédito tributário. Porém, a despeito da maior dificuldade legislativa de aprovar uma lei complementar que altere o CTN e, ao menos, amplie as citadas hipóteses de suspensão da exigibilidade, esse seria o caminho mais adequado para a criação de um instituto sólido, que possa ser amplamente aplicado sem as amarras da constituição, ou não, da relação jurídica tributária.

Sobre esse ponto, note-se que inexiste qualquer óbice institucional para a instauração da arbitragem tributária em qualquer momento do processo de positivação da norma tributária: seria possível pensar na submissão da controvérsia tributária a esse meio heterocompositivo de resolução de conflitos antes do início da fiscalização, no curso ou após o término de processo administrativo que tenha redundado na constituição da relação jurídica tributária, diante do indeferimento de pedido de compensação ou do desprovimento de pedido de restituição, entre outras hipóteses.

Faz-se necessário, contudo, a adequada disciplina legislativa desses casos, nos termos das diretrizes constitucionais e legais, o que enseja a retomada da discussão anterior, atinente ao veículo introdutório adequado para tanto e às questões conexas a serem enfrentadas, como a suspensão da exigibilidade e extinção do crédito tributário.

De outro lado, um escopo mais restrito e delimitado para a arbitragem tributária, tal qual adotado por ambos os PLs, serviria, sem dúvida, para desmistificar o instituto e para reduzir a eventual oposição da administração tributária e dos órgãos de representação dos entes federativos em juízo. Seria um bom teste para a criação desse método heterocompositivo em matéria de tributação10.

Deve-se, no entanto, indagar se esse seria, de fato, o caminho mais recomendável. Uma arbitragem tributária de caráter nacional e de hipóteses amplas, pensada para todas as etapas do iter de constituição da relação jurídica tributária, poderia conferir, efetivamente, maior coerência e uniformidade ao procedimento. Nesse sentido, um sistema arbitral tributário abrangente seria uma solução mais adequada para funcionar como meio alternativo às vias judicial e administrativa e atuar como instrumento eficaz de acesso à justiça tributária. Seria um teste mais completo do instituto e, por isso, parece ser a opção mais recomendável.

No mais, tratando-se especificamente do PL n. 4.257/2019, nossa posição é a de que a exigência de acesso prévio ao Poder Judiciário como requisito para submissão do litígio tributário à via arbitral11 atenta contra a economia processual, a eficiência e a própria natureza desse método alternativo (enquanto opção aos métodos tradicionais) de solução de controvérsia.

O citado PL é maculado, ainda, por lacunas relevantes atinentes à suspensão processual, em especial da Execução Fiscal12, na vigência do processo arbitral. Sugere-se, aqui, a resolução desse problema mediante a inclusão de um parágrafo no art. 16-A, com os seguintes dizeres: “A opção pela adoção de juízo arbitral suspende a execução fiscal até o recebimento da notificação ou ciência pessoal da sentença arbitral ou da decisão do pedido de esclarecimentos”. Com isso, não haveria dúvidas, na seara do processo executivo fiscal, sobre os efeitos da opção pela via arbitral.

Não se desconhece que essa solução é diferente daquela adotada pelo Código de Processo Civil (CPC) em relação aos embargos à execução, inclusive aos embargos à execução fiscal, que não têm, em regra, efeito suspensivo automático13. O CPC objetiva, com isso, evitar que tal instrumento funcione como meio impeditivo de prestação da tutela executiva14. Mas a solução sugerida, diferente de prejudicar, reafirma a efetividade da pretensão executiva.

Como se lê no Relatório “Justiça em Números 2020”, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), os processos executivos fiscais constituíam, em 2019, 39% do total de litígios em curso e 70% das execuções pendentes de julgamento, com taxa de congestionamento de 87%. Isso significa que, de cada 100 processos de execução fiscal que tramitaram naquele ano, apenas 13 foram baixados. O resultado é a seguinte estimativa contida no mencionado Relatório: “O tempo de giro do acervo desses processos é de 6 anos e 7 meses; ou seja, mesmo que o Judiciário parasse de receber novas execuções fiscais, ainda seria necessário todo esse tempo para liquidar o acervo existente”15.

Percebe-se, nesse contexto, que a concessão de efeito suspensivo automático, no âmbito judicial, aos embargos à execução fiscal, retiraria a efetividade da tutela executiva, substituindo-a por uma potencial espera de quase sete anos (ou mais) pelo pagamento do crédito tributário e encerramento do processo executivo.

Não é o que se espera no campo arbitral, caracterizado por decisões céleres e técnicas16. Considerando-se a experiência portuguesa com a arbitragem tributária17, cujos resultados têm sido muito relevantes18, as decisões arbitrais vêm sendo proferidas no prazo médio de quatro meses e meio, sendo que o prazo definido pela legislação para sua prolação é de seis meses, podendo chegar, após prorrogações por períodos sucessivos de dois meses, até o máximo de um ano19.

Decisões arbitrais céleres na esfera tributária ratificariam a efetividade da tutela executiva no Brasil, aumentando a eficiência na arrecadação tributária em caso de êxito estatal no processo arbitral. É o suficiente para justificar a suspensão do procedimento de execução fiscal em caso de opção, pelo contribuinte, da via arbitral.

Para que isso seja assegurado pela legislação, sugere-se a inclusão de novo parágrafo em dispositivo (art. 16-A) que o art. 1º do PL n. 4.257/2019 almeja incluir na LEF, com a seguinte redação: “A sentença arbitral deverá ser proferida no prazo de seis meses a contar do início do processo arbitral, prorrogável, por igual período, até o máximo de um ano”.

Some-se a essas considerações sobre o referido PL uma outra, relativa ao requisito inafastável nele previsto de garantia do crédito tributário para adesão ao procedimento arbitral. Como a arbitragem tributária consiste em meio de ampliação do acesso à jurisdição, seria indispensável que o modelo adotado pelo PL fosse o mais abrangente e inclusivo possível, de modo a viabilizar que sujeitos passivos desprovidos de condições financeiras para oferecer as garantias mencionadas no caput do art. 16-A e do art. 41-T (dispositivos que o PL tenciona incluir na LEF) pudessem ter, ainda assim, acesso à via arbitral. Tal medida evitaria, inclusive, eventuais arguições de inconstitucionalidade dessas normas, fundadas no prejuízo ao direito de defesa dos contribuintes, na ofensa ao princípio da isonomia e no argumento de conflito com o sistema da LEF, que tem um rol mais extenso de garantias passíveis de serem ofertadas na instância judicial20.

No que se refere ao PL n. 4.468/2020 e às questões relacionadas ao momento da arbitragem tributária, há outros pontos importantes que merecem reflexão. Em primeiro lugar, a despeito do parágrafo único do art. 1º do PL determinar que a arbitragem não poderá ser instaurada nos casos de “crédito tributário que já tenha sido constituído mediante lançamento ou auto de infração e imposição de multa”, não está claro se há possibilidade de arbitragem para discussão de tributos sujeitos ao lançamento por homologação que tenham sido declarados e não pagos.

Nesse caso, a jurisprudência e a doutrina21 são firmes em reconhecer que a declaração correta, realizada pelo sujeito passivo, tem o condão de constituir a relação jurídica tributária. Não se trata, naturalmente, de lançamento tributário, já que este, nos termos do art. 142 do CTN, é ato privativo da administração tributária. Ainda assim, não seria demasiado esclarecer, no texto da norma, a possibilidade de arbitragem também para os casos em que o particular emita a norma individual e concreta que constitui a relação jurídica tributária.

Outro ponto relativo ao PL n. 4.468/2020 diz respeito à situação do sujeito passivo a partir da instauração da arbitragem tributária. Decorre do art. 7º do PL que, firmado o compromisso arbitral, poderá ser lavrado auto de infração para prevenir a decadência em relação ao crédito tributário envolvido na matéria arbitrável, não cabendo aplicação de multa de ofício (com menção expressa ao art. 63 da Lei n. 9.430/9622). O respectivo processo administrativo teria o julgamento sobrestado até a decisão final na via arbitral23. Nesse contexto, possuiria o sujeito passivo o direito de obter certidão de regularidade fiscal?

Como é sabido, a lavratura de auto de infração para prevenção de decadência pressupõe, nos termos do art. 63 da Lei n. 9.430/96, a materialização de prévia causa suspensiva de exigibilidade do crédito tributário. Tal causa suspensiva reside, de acordo com a referida norma da Lei n. 9.430/96, nas hipóteses dos incisos IV e V do art. 151 do CTN24.

A redação do citado art. 7º do PL leva a crer que a submissão de questão à solução arbitral foi equiparada, para fins de afastamento da multa de ofício, à hipótese de suspensão de exigibilidade do crédito tributário. Não há problema insuperável em relação a isso: como se viu na seção 2 deste artigo, há entendimento de que a Constituição não exige lei complementar para tanto, bastando lei ordinária para disciplinar tais modalidades de suspensão de exigibilidade25. Ademais, há exemplo nesse sentido na própria legislação federal: o art. 45 da Lei de Mediação equipara a submissão do litígio à composição extrajudicial à hipótese do art. 151, III, do CTN, para fins de suspensão da exigibilidade do crédito tributário.

De todo modo, faz-se fundamental que o PL deixe claro que, presente a citada equiparação, a submissão de questão à solução arbitral deve produzir todos os efeitos típicos de uma causa de suspensão de exigibilidade, exatamente como assinala a Lei de Mediação, afastando qualquer dúvida de que o sujeito passivo tem direito, no decorrer do processo arbitral, à obtenção de certidão de regularidade fiscal.

Por essa razão, seria adequada a inclusão, no inciso III do art. 7º do PL n. 4.468/2020, de complemento (em itálico) com o seguinte teor: “III – na hipótese de lavratura de auto de infração para exigência de tributos lançados com fundamento na questão submetida à arbitragem especial, considera-se suspensa a exigibilidade do crédito tributário”.

4. Delimitação da arbitragem: matérias passíveis de discussão

A matéria passível de submissão à arbitragem tributária, também denominada “arbitrabilidade objetiva”, constitui outro tema que suscita importantes debates. No PL n. 4.257/2019 inexiste qualquer limitação de matéria: apresentada garantia em juízo (depósito em dinheiro, seguro garantia ou fiança bancária) no contexto de Execução Fiscal, Ação Consignatória de Pagamento ou Ação Anulatória do Ato Declarativo da Dívida, a arbitragem pode ser eleita como via de solução do conflito, independentemente da natureza da questão tributária em discussão26.

Já o PL n. 4.468/2020 limita a arbitrabilidade objetiva às matérias de fato27, sendo vedada discussão sobre lei em tese e constitucionalidade de normas e proibida decisão contrária a entendimento consolidado no Judiciário nas hipóteses do art. 927 do CPC28 e naquelas em que tenha havido julgamento, no Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral29.

Acerca do tema, deve-se destacar inicialmente que uma disputa nunca envolverá apenas questões de fato, já que a subsunção do fato à norma tributária demanda, necessariamente, interpretação desta, de modo que aspectos qualificados como “de direito” necessariamente virão à tona.

Tome-se como exemplo o caso da classificação fiscal de mercadorias, normalmente referida como a típica disputa a ser objeto de arbitragem nos termos do citado PL. Dentre as questões rotineiramente apreciadas no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), a Câmara Superior de Recursos Fiscais já teve oportunidade de decidir sobre a correta classificação fiscal das barras de cereal (sem chocolate): entre produtos de confeitaria sem cacau (NCM 1704.90.90) ou preparações alimentícias obtidas a partir de flocos de cereais não torrados ou de misturas de flocos de cereais não torrados com flocos de cereais torrados ou expandidos (NCM 1904.20.00), aquele órgão julgador entendeu ser correta a primeira classificação, com incidência mais gravosa (5%) de IPI30.

A conclusão não decorreu, contudo, de mera análise de fatos, mas de sua qualificação jurídica à luz da Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), que tem por base o Sistema Harmonizado de Designação e de Codificação de Mercadorias (SH), oriundo do Decreto n. 97.409/88. Não parece correto dizer, portanto, que esse modelo de arbitragem tributária estaria limitado a discussões fáticas, já que estas são indissociáveis, como mostra o exemplo, de questões de direito.

De outro lado, a vedação à discussão de constitucionalidade de normas jurídicas, nos termos do art. 2º, inciso I, do PL n. 4.468/2020, comporta apreciação mais crítica.

Ao se falar desse desenho de arbitragem tributária, o que está em causa é um processo que será julgado por árbitros, juízes de fato e de direito da causa31, e que terá, ao seu término, laudo arbitral definitivo e terminativo, como se vê do art. 8º, inciso IV, do PL. Ademais, a decisão vincula a administração tributária e o sujeito passivo, sendo incabível homologação ou recurso ao Poder Judiciário, segundo os arts. 4º, § 3º, e 8º do PL. Caberá, apenas, o ajuizamento de ação de anulação do laudo arbitral32.

Com base nessas particularidades do instituto, não parece despropositado afirmar que se está na presença de um modelo de arbitragem que tem características semelhantes àquelas do sistema geral da Lei de Arbitragem. Disso decorre que a atividade a ser desenvolvida no processo arbitral do PL n. 4.468/2020 terá natureza jurisdicional33.

Não há dúvidas, contudo, de que a natureza jurisdicional da arbitragem não autoriza o juízo arbitral a exercer controle concentrado ou abstrato de constitucionalidade; somente o Poder Judiciário pode fazê-lo, como determina o art. 97 da Constituição34. Todavia, a mesma conclusão seria aplicada ao controle difuso ou concreto de constitucionalidade? Haveria vedação expressa nos arts. 948 e 949 do CPC35?

Para Gustavo Justino de Oliveira e Felipe Faiwichow Estefam, a resposta seria negativa, pois a atividade do árbitro seria de cunho jurisdicional, não podendo ele “ignorar a supremacia da Constituição e permitir que a sua decisão seja construída a partir de leis ou atos normativos eivados de inconstitucionalidade”. Segundo os autores, “a incorporação de preceitos tidos por inconstitucionais equivaleria a aceitar a alteração de preceito constitucional por norma infraconstitucional”36. Caberia, então, ao árbitro, nessa situação, afastar a aplicação de leis e atos normativos inconstitucionais37.

Portanto, depreende-se daí que, se um órgão julgador de primeira instância do Poder Judiciário, um juiz de fato e de direito da causa tal como o árbitro, pode afastar a aplicação de ato normativo por entendê-lo incompatível com a Constituição, a mesma competência poderia ser reconhecida ao árbitro no bojo da arbitragem do PL em causa. Isso conferiria coerência ao sistema arbitral nele previsto, evitaria o enfraquecimento da tutela jurisdicional arbitral e acentuaria sua eficácia na prevenção de litígios tributários38.

Seria interessante, para tanto, a modificação do inciso I do art. 2º do PL n. 4.468/2020, de modo que, na hipótese de vedação à “I – discussão sobre constitucionalidade de normas jurídicas”, fosse acrescentado o seguinte trecho: exceto no caso de controle difuso ou concreto.

Por fim, ainda seria possível ampliar a arbitrabilidade objetiva atinente ao PL n. 4.468/2020 para alcançar questões aduaneiras e hipóteses de reconhecimento de créditos em favor do sujeito passivo. Novamente, não há óbices institucionais para tanto, e um bom regramento normativo poderia ser capaz de prever essas hipóteses com segurança jurídica para todas as partes envolvidas.

5. Revisão ou anulação da decisão arbitral

Os debates sobre a criação de um regime de arbitragem tributária no Brasil sempre foram permeados pela possibilidade, ou não, de as decisões arbitrais ficarem sujeitas ao controle judicial, o que lhes conferiria, a depender da posição adotada, diferentes graus de eficácia e de efetividade na perspectiva da resolução da disputa39.

Caso o controle judicial seja a regra, a consequência seria atribuir à arbitragem o status de apenas mais uma instância de discussão, havendo sempre a possibilidade de a decisão arbitral ser submetida ao Poder Judiciário para reapreciação do litígio. A eficácia e a efetividade de tal decisão seriam, em termos de solução de disputa, mais baixa.

De outro lado, se o controle judicial da decisão arbitral configurar hipótese excepcional, isso implicaria conferir à arbitragem tributária o patamar de instância única de decisão: a via arbitral produziria decisões definitivas, a não ser em casos restritos que pudessem ser objeto de sindicância judicial. Haveria, portanto, maior grau de eficácia e de efetividade da decisão arbitral como meio de resolução do conflito.

A preocupação com o tema e a escolha de uma das posições anteriores é relevante especialmente à luz do fato de que nosso sistema tributário está inserido no texto constitucional, e alegações de inconstitucionalidade sempre resultam no debate judicial da questão em disputa. O assunto não passou despercebido aos PLs em análise, que fizeram uma escolha clara: ambos consideraram o controle judicial da decisão arbitral como hipótese excepcional.

Nesse sentido, o PL n. 4.257/2019 previu, no caput do art. 16-F, que pretende incluir na LEF (com a redação que lhe foi dada pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado) a possibilidade de qualquer parte pleitear, judicialmente, a declaração de nulidade da decisão arbitral, caso esta:

contrarie enunciado de súmula vinculante, decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade ou acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas, incidente de assunção de competência, recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida e recursos extraordinário ou especial repetidos (sic)40.

O dispositivo reproduz, quase que integralmente, as hipóteses do art. 927 do CPC41. Já na parte final desse dispositivo do PL lê-se que é “aplicável, no que couber, o previsto nos arts. 32 e 33 da Lei n. 9.037, de 23 de setembro de 1996”. Trata-se dos artigos da Lei de Arbitragem que contemplam as hipóteses de nulidade da decisão arbitral42 e que, consoante o PL n. 4.257/2019, serão aplicáveis, quando cabível, à arbitragem tributária nele prevista.

O PL n. 4.468/2020 afirma, de seu turno, ser vedada decisão arbitral “contrária a entendimento consolidado pelo Poder Judiciário nas hipóteses de que trata o art. 927 da Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), bem como julgamentos em sede de repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal” (art. 2º, inciso III, do PL).

Tal vedação o aproxima, como visto, do PL n. 4.257/2019. Além disso, o PL n. 4.468/2020 adota fórmula muito semelhante à contida na Lei de Arbitragem (e repetida pelo PL n. 4.257/2019), para relacionar as hipóteses de nulidade da decisão arbitral a casos de nulidade do compromisso arbitral, incompetência da autoridade que a proferiu, situações de prevaricação, concussão e corrupção passiva, dentre outras43.

O controle judicial da decisão arbitral constitui, portanto, exceção em ambos os PLs. Em nenhum deles é prevista a possibilidade do compromisso arbitral e da decisão arbitral serem objeto de pedido de anulação judicial pelo simples desacordo da parte perdedora. Observado o sistema de precedentes vinculantes do CPC (art. 927) e inexistente qualquer causa de nulidade da decisão arbitral (art. 32 da Lei de Arbitragem, reiterado ou adaptado nos PLs), tal decisão não é passível de controle judicial.

Esse aspecto é de fundamental importância para definir a autonomia do instituto e traçar, com precisão, os limites dentro dos quais (e apenas dentro deles) o Judiciário poderá interferir na decisão do tribunal arbitral, sob a legítima pretensão de manter a coerência do ordenamento jurídico pátrio e preservar a competência do Supremo de declarar a inconstitucionalidade de normas no controle concentrado ou abstrato, em especial na esfera tributária.

A partir dessas constatações, fica nítido que os PLs privilegiam o valor da segurança jurídica: a inserção do método arbitral no sistema de resolução de conflitos tributários, à maneira por eles preconizada, não descuida da necessidade de, em consonância com a via judicial de solução de disputas, manter uma jurisprudência estável, íntegra e coerente, inclusive conforme o art. 926 do CPC. O mesmo pode ser dito do cuidado dos PLs com os vícios do processo arbitral em si, legitimamente delimitados na norma que serve de referência a ambos, i.e., a Lei de Arbitragem44. Em qualquer caso, vê-se que a preocupação dos PLs com a segurança jurídica acaba por reforçar a validade e a autonomia do instituto45.

6. Formalização da opção pela via arbitral

Outro aspecto que merece atenção nos PLs se refere ao modo de opção pela via arbitral neles definido. Sobre o tema, reforce-se que a arbitragem, a despeito de ser mecanismo heterocompositivo de resolução de conflitos, tem em seu núcleo o exercício da autonomia da vontade das partes, justamente porque a via arbitral tem por consequência a renúncia de acesso ao Poder Judiciário. Ou seja, ressalvadas as hipóteses de nulidade da decisão arbitral tratadas anteriormente, não há possibilidade de a parte perdedora recorrer ao Judiciário para alterar a determinação material da decisão46. Tal impossibilidade é, reitere-se, elemento central para a efetividade do instituto, consubstanciada na resolução de demandas de modo célere e técnico.

Exatamente por essa razão, faz-se necessário que haja opção clara das partes pela arbitragem – e tal escolha se aplica, também, para a administração tributária. Nos termos da Lei de Arbitragem, há dois instrumentos básicos de manifestação de vontade relacionados ao uso do juízo arbitral para solução de determinada controvérsia: a cláusula compromissória e o compromisso arbitral.

A utilização do primeiro instrumento está desde logo descartada no Direito Tributário, já que envolve situações em que a arbitragem é prevista contratualmente. Trata-se, como se lê no caput do art. 4º da Lei de Arbitragem, de “convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato”. Ora, sendo o princípio da legalidade a base fundamental de cobrança de tributos, não há sentido em cogitar da possibilidade de relação contratual entre Fisco e contribuinte e, consequentemente, de cláusula compromissória.

De outro lado, não haveria óbice para a incorporação, ao Direito Tributário, do compromisso arbitral: ele é representativo de um ato, judicial ou extrajudicial, que revela a disposição das partes envolvidas para solucionar o conflito pela via arbitral (art. 9º da Lei de Arbitragem). Tal compromisso pode servir, nesse sentido, como marco instituidor da arbitragem tributária.

O tema é objeto de tratamento expresso apenas no PL n. 4.468/2020, que detalha todos os elementos do compromisso arbitral em seus arts. 5º47 e 6º48. Esse amplo detalhamento favorece a segurança jurídica, especialmente no que concerne à indicação da “matéria que será objeto da arbitragem” (art. 6º, inciso VI, do PL). O mesmo não pode ser dito, entretanto, da exigência de indicação, no compromisso arbitral, dos “fatos que são considerados como incontroversos para solução do conflito” (art. 6º, inciso XIII, do PL).

Como se viu na seção 4 deste artigo, não há como dissociar discussões fáticas das questões de direito a serem julgadas na seara arbitral. Assim, a referida indicação no compromisso arbitral da matéria a ser dirimida já seria suficiente para delimitar o litígio a ser objeto da arbitragem tributária. Exigir, ainda, a indicação no compromisso de “fatos incontroversos” tem o potencial de causar dúvidas e discussões a respeito do escopo da arbitragem – ainda mais se esses “fatos” forem considerados incontroversos pelo sujeito passivo e controversos pela administração tributária, trazendo demora, insegurança e possível judicialização para o instituto e prejudicando o seu desenvolvimento.

Já o PL n. 4.257/2019, a despeito de não abordar explicitamente o tema, prevê a aplicação subsidiária da Lei de Arbitragem ao regime de arbitragem tributária nele contido49. A previsão é suficiente para solucionar a aparente omissão e estender àquele regime a utilização do compromisso arbitral, tal como disposto na Lei de Arbitragem50. A solução, em si, não é inadequada, mas vai exigir que, por ocasião da edição dos regulamentos que irão tratar da arbitragem tributária em cada ente federativo51, haja o cuidado de evitar a menção a regras da Lei de Arbitragem que não teriam aplicação ao campo arbitral tributário52.

7. Normas subsidiárias aplicáveis

O último aspecto relevante a considerar nos PLs diz respeito à indicação das normas às quais se poderá recorrer para interpretação de eventuais lacunas jurídicas. Por tratarem de questão processual, no sentido de que trazem a previsão de mecanismo heterocompositivo para a solução de disputa entre Fisco e sujeito passivo, ambos acabam tendo conexão com o CPC.

Nesse sentido, o PL n. 4.257/2019 praticamente reproduz o CPC ao tratar das hipóteses excepcionais de controle judicial da decisão arbitral53 e da questão da fixação dos honorários advocatícios54, enquanto o PL n. 4.468/2020 invoca o mesmo diploma em vários momentos55.

Há, no entanto, estranha divergência entre as iniciativas na referência subsidiária, para além da legislação processual. Ambos os PLs contêm, como se viu até aqui, características que os aproximam do sistema da Lei de Arbitragem. Nada mais natural, então, que a aplicação subsidiária daquela lei a ambos.

É o que se vê no PL n. 4.257/2019: a previsão da mencionada aplicação subsidiária está no art. 16-A, que tal PL tenciona incluir na LEF. O PL n. 4.468/2020 seguiu, contudo, caminho distinto: ele prevê, no art. 13, a aplicação subsidiária da Lei n. 13.988/2020, que disciplinou a transação em matéria tributária e não tributária na esfera federal.

Esse ponto em específico é merecedor de crítica, pois, a despeito de ambos os institutos, arbitragem e transação, situarem-se no contexto mais geral dos métodos alternativos (ou adequados) de resolução de disputa, eles não se confundem, e o regramento jurídico da transação em nada parece colaborar com a evolução da arbitragem no Brasil, especialmente à luz da existência de uma lei geral de arbitragem que é, inclusive, aplicada às relações jurídicas entre particular e administração pública56. Para evitar dúvidas interpretativas e eventual judicialização do instituto, seria mais adequada a aplicação subsidiária da Lei de Arbitragem ao desenho arbitral do PL n. 4.468/2020. Por isso, sugere-se que o art. 13 do PL n. 4.468/2020 passe a determinar tal aplicação subsidiária à arbitragem tributária nele delineada.

8. Considerações finais

O objetivo desta última seção é destacar algumas outras peculiaridades adicionais de cada PL, com a indicação de sugestões concretas para melhoria das normas ali dispostas. Comecemos pelo PL n. 4.257/2019.

Como visto nas seções anteriores, tal PL tem por objetivo incluir dispositivos na LEF para prever a arbitragem como via de solução de litígios na área do Direito Tributário. Contudo, em diversas passagens, utiliza-se do termo “executado”57, o que poderia levar à conclusão de que apenas o executado (em execução fiscal) poderia fazer parte de uma arbitragem tributária.

A assunção seria fortalecida pelo próprio dispositivo que determina serem arbitráveis créditos tributários objeto de ações de outra natureza (Ação Consignatória de Pagamento ou Ação Anulatória do Ato Declarativo da Dívida). Confira-se:

Art. 41-T. O executado pode optar pelo procedimento arbitral previsto nos arts. 16-A a 16-F caso, ao ajuizar a ação prevista no art. 164 da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966, ou a ação anulatória do ato declarativo da dívida, prevista no art. 38 desta lei, garanta o juízo por depósito em dinheiro, fiança bancária ou seguro garantia.

Contudo, tal assunção seria problemática e, a nosso ver, inadequada, já que as ações judiciais em referência não são necessariamente precedidas de execução fiscal ajuizada em face do sujeito passivo. Ademais, como se sabe, o ajuizamento de execução fiscal nem sempre se dá rapidamente. Não são raras as situações nas quais, após o término de processo administrativo no qual não obteve êxito, o sujeito passivo se vê forçado a ingressar, muito antes do efetivo ajuizamento de execução fiscal, com Ação Anulatória do Ato Declarativo da Dívida ou Ação Consignatória, com o objetivo de obter, por exemplo, a renovação de sua certidão de regularidade fiscal. Nessa situação, o dispositivo de que se cuida não parece autorizar a opção do sujeito passivo pelo juízo arbitral.

Diante disso, o ideal seria a adoção de termo diverso, como “sujeito passivo” (contribuinte e/ou responsável), em vez de “executado”. A aprovação do PL com a manutenção da palavra “executado” na norma transcrita limitaria a opção pela via arbitral à hipótese de ajuizamento de execução fiscal, em franca contradição com o sistema de arbitragem tributária que se quer implementar.

Em resumo, a arbitragem tributária deve ser vista como alternativa eficaz à via judicial, e não como meio que dependa necessariamente do acesso prévio a essa via (em execução fiscal) para poder atuar em concreto (como alternativa à Ação Anulatória do Ato Declarativo da Dívida ou à Ação Consignatória).

Ao lado desse ponto, há uma omissão relevante no PL n. 4.257/2019: não há regras de transição ou disposições transitórias que possibilitem a migração das disputas atuais pelos métodos judiciais tradicionais para a arbitragem tributária, uma vez criado o instituto. Isso não seria necessário na lógica do PL n. 4.468/2020, pois ele se concentra em interregnos muito específicos58, mas seria razoável contemplar tal hipótese no PL n. 4.257/2019.

Um modelo interessante de transição seria a previsão de um prazo de, pelo menos, dois anos para migração à arbitragem tributária, a contar da data da publicação da lei instituidora59. Durante esse período, haveria tempo hábil para a edição de atos de manifestação de vontade da administração tributária, criação ou credenciamento de órgãos institucionais ou entidades especializadas para os processos arbitrais de que trata o PL, ao lado da instrumentalização do procedimento e sua respectiva consolidação.

No que se refere ao PL n. 4.468/2020, há ainda dois pontos a abordar. O primeiro se refere à figura do árbitro desempatador, que seria convocado se a decisão proferida pelo tribunal arbitral (composto por três árbitros) não for unânime e assim estiver previsto no compromisso arbitral60, competindo ao presidente da instituição arbitral efetuar a designação respectiva61. A previsão é controversa, porque permite que a opinião de um quarto julgador, que não participou do processo deliberativo como um todo e que adotaria uma das posições dos árbitros originais, prevaleça sobre o posicionamento da maioria de um colegiado ímpar.

Ademais, o voto do árbitro desempatador poderia resultar justamente em empate se considerados todos os votos, mas ele prevaleceria como uma espécie de instância revisional monocrática. Esse aspecto agregaria, a nosso ver, margem desnecessária para questionamento do procedimento.

Por fim, no que se refere aos efeitos da sentença arbitral, o PL n. 4.468/2020 não estatui, tal como se vê na Lei de Arbitragem62 e no próprio PL n. 4.257/201963, que a sentença arbitral produz os mesmos efeitos e, assim, equivale à sentença judicial. Por não fazer tampouco referência à Lei de Arbitragem como de aplicação subsidiária, diferentemente do PL n. 4.257/201964, a nossa compreensão é a de que a previsão expressa nesse sentido no PL n. 4.468/2020 conferiria maior segurança ao instituto e afastaria quaisquer dúvidas quanto à definitividade da decisão proferida no bojo da arbitragem tributária.

Para concluir, note-se que as sugestões e provocações feitas não têm a pretensão de exaurir os comentários aos PLs aqui analisados, havendo outros pontos importantes que merecem atenção; cite-se, apenas a título exemplificativo, a delimitação dos responsáveis pelos custos do processo arbitral e a respectiva proporção, a fixação de honorários, os requisitos do compromisso arbitral, procedimentos e afins que comportam um debate ainda mais detalhado.

O objetivo do artigo foi, apenas, provocar reflexões a partir de contrapontos objetivos aos projetos de lei, já que eles adotam modelos distintos de arbitragem tributária. Desse modo, acredita-se, será possível apresentar subsídios ao desenvolvimento do tema e evoluir na adoção mais abrangente de métodos adequados de resolução de disputa em matéria tributária, melhorando o acesso à justiça tributária no país.

Referências

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1 BRASIL. Senado Federal. Parecer (SF) n. 82, de 2019. Disponível em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=8028147&ts=1624912168155&disposition=inline (versão atual aprovada pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado). Acesso em: 20 jul. 2021.

2 BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei (PL) nº 4.468/2020. Disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/144536. Acesso em: 11 jun. 2021.

3 PISCITELLI, Tathiane. Arbitragem no Direito Tributário: uma demanda do Estado Democrático de Direito. In: PISCITELLI, Tathiane et al. (org.). Arbitragem tributária: desafios institucionais brasileiros e a experiência portuguesa. 2. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020, p. 193-194; e MASCITTO, Andréa. Requisitos institucionais para a arbitragem entre fisco e contribuintes no Brasil: necessidade de norma geral. In: PISCITELLI, Tathiane et al. (org.). Arbitragem tributária: desafios institucionais brasileiros e a experiência portuguesa. 2. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020, p. 139-147.

4 Como exemplar desse movimento, cite-se o Projeto de Lei n. 531/2020, que pretende instituir a arbitragem em matéria tributária no Estado do Mato Grosso (MATO GROSSO. Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso. Projeto de Lei n. 531, de 2020. Disponível em: https://www.al.mt.gov.br/proposicao/cpdoc/80652/visualizar. Acesso em: 28 jun. 2021). A iniciativa funda-se no entendimento de que lei ordinária específica de cada ente da Federação poderia criar e disciplinar a via arbitral tributária. Há, contudo, dúvidas relativas à constitucionalidade de tal expediente. Sobre o tema, Leonardo Varella Giannetti afirma que: “[...] os Estados e Municípios não possuem competência para criar e estabelecer um regime jurídico de arbitragem tributária totalmente novo. Esses entes da federação deverão partir da legislação federal existente para, então, estabelecer algumas regras procedimentais, tal qual autoriza o art. 24, XI, da Constituição Federal” (GIANNETTI, Leonardo Varella. Arbitragem no Direito Tributário brasileiro: possibilidade e procedimentos. Tese (Doutorado em Direito) – PUC/MG. Belo Horizonte, 2017, p. 205. Disponível em: http://www.biblioteca.pucminas.br/teses/Direito_GiannettiLVa_1.pdf. Acesso em: 28 jun. 2021).

5 ADI 2405/RS, Relator(a): Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, j. 20.09.2019, Processo eletrônico DJe-215, Divulg. 02.10.2019, Public. 03.10.2019.

6 Lei n. 13.140/2015, art. 45: “No caso de determinação e exigência de créditos tributários da União cujo sujeito passivo seja órgão ou entidade de direito público da administração pública federal, a submissão do litígio à composição extrajudicial pela Advocacia-Geral da União é considerada reclamação, para fins do disposto no inciso III do art. 151 da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional”.

7 Como se vê nos seguintes dispositivos que o art. 1º do PL n. 4.257/2019 pretende incluir na LEF: “Art. 16-A. Se o executado garantir a execução integralmente por depósito em dinheiro, fiança bancária ou seguro garantia, pode optar pela adoção de juízo arbitral para julgar os embargos ofertados, respeitados os requisitos da Lei n. 9.307, de 23 de setembro de 1996 e os a seguir definidos, na forma de regulamento de cada entidade da Federação” e “Art. 41-T. O executado pode optar pelo procedimento arbitral previsto nos arts. 16-A a 16-F caso, ao ajuizar a ação prevista no art. 164 da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966, ou a ação anulatória do ato declarativo da dívida, prevista no art. 38 desta lei, garanta o juízo por depósito em dinheiro, fiança bancária ou seguro garantia”.

8 É o que determina o art. 1º do PL n. 4.468/2020: “A arbitragem especial tributária poderá ser instaurada no curso da fiscalização, mediante solicitação do contribuinte ou provocação da Administração Tributária, para prevenir conflitos mediante solução de controvérsias sobre matérias de fato, observando o disposto nesta lei. Parágrafo único. Este procedimento não poderá ser instaurado nos casos de relação jurídica tributária que já tenha sido constituído mediante lançamento tributário ou auto de infração e imposição de multa”. Além disso, o art. 12 do referido PL pretende incluir, na Lei n. 9.430/1996, o artigo 48-A, que autoriza a solução de consultas por arbitragem tributária. Confira-se a sua redação: “As consultas que envolvam questões fáticas e sua qualificação jurídica poderão ser solucionadas por arbitragem especial tributária, atendidos os requisitos e condições estabelecidos nesta Lei”.

9 Nos termos do art. 12 do PL n. 4.468/2020, que pretende acrescentar o § 19 ao art. 74 da Lei n. 9.430/96: “O crédito decorrente de decisão judicial transitada em julgado não liquidado judicialmente poderá ser quantificado por meio de arbitragem especial tributária, atendidos os requisitos e condições estabelecidos nesta Lei”.

10 MASCITTO, Andréa. Requisitos institucionais para a arbitragem entre fisco e contribuintes no Brasil: necessidade de norma geral. In: PISCITELLI, Tathiane et al. (org.). Arbitragem tributária: desafios institucionais brasileiros e a experiência portuguesa. 2. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020, p. 145. A aprovação dos dois PLs em discussão (sem que suas disposições sejam conjugadas e adaptadas) não parece ser, entretanto, um bom caminho. Haveria, nessa situação, diferentes meios de solução de controvérsias para cada etapa do iter de constituição da relação jurídica tributária, o que implicaria um “quebra-cabeça legislativo” para a arbitragem tributária, ainda mais complicado pela aplicação subsidiária, ao PL n. 4.257/2019, das normas da Lei de Arbitragem, e ao PL n. 4.468/2020, das normas da lei federal de transação (Lei n. 13.988/2020). O tema será abordado na seção 7.

11 É o que assinala o anteriormente mencionado art. 16-A que o PL n. 4.257/2019 pretende incluir na LEF: “Se o executado garantir a execução integralmente por depósito em dinheiro, fiança bancária ou seguro garantia, pode optar pela adoção de juízo arbitral para julgar os embargos ofertados, respeitados os requisitos da Lei n. 9.307, de 23 de setembro de 1996 e os a seguir definidos, na forma de regulamento de cada entidade da Federação”.

12 Mas também da Ação Consignatória de Pagamento ou Ação Anulatória do Ato Declarativo da Dívida.

13 Art. 919 do CPC (de aplicação subsidiária à LEF e aos embargos à execução fiscal, consoante o artigo 1º desta): “Os embargos à execução não terão efeito suspensivo. § 1º O juiz poderá, a requerimento do embargante, atribuir efeito suspensivo aos embargos quando verificados os requisitos para a concessão da tutela provisória e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes. § 2º Cessando as circunstâncias que a motivaram, a decisão relativa aos efeitos dos embargos poderá, a requerimento da parte, ser modificada ou revogada a qualquer tempo, em decisão fundamentada. § 3º Quando o efeito suspensivo atribuído aos embargos disser respeito apenas a parte do objeto da execução, esta prosseguirá quanto à parte restante. § 4º A concessão de efeito suspensivo aos embargos oferecidos por um dos executados não suspenderá a execução contra os que não embargaram quando o respectivo fundamento disser respeito exclusivamente ao embargante. § 5º A concessão de efeito suspensivo não impedirá a efetivação dos atos de substituição, de reforço ou de redução da penhora e de avaliação dos bens.”

14 CONRADO, Paulo Cesar. Execução fiscal. 4. ed., rev. e atual. São Paulo: Noeses, 2020, p. 185.

15 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça em números. [s.d.]. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/pesquisas-judiciarias/justica-em-numeros/. Acesso em: 30 jun. 2021. Por ocasião da elaboração deste artigo, ainda não estava pronto o Relatório do CNJ que analisará o estado da prestação jurisdicional pelo Poder Judiciário no ano de 2020.

16 A pesquisa “Arbitragem em números e valores”, que vem sendo preparada regularmente por Selma Ferreira Lemes, revela que, num universo de oito câmaras privadas brasileiras de arbitragem e no período de dois anos (2018 e 2019), a média de duração do procedimento arbitral foi de 18,8 meses em 2018 e 18,4 meses em 2019. LEMES, Selma Ferreira. Arbitragem em números e valores: 2020. Disponível em: http://selmalemes.adv.br/artigos/Analise-Pesquisa-ArbitragensNseValores-2020.pdf. Acesso em: 30 jun. 2021.

17 Cf. DOMINGOS, Francisco Nicolau. Estrutura do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD): Funcionamento, escolha dos árbitros e limites institucionais. In: PISCITELLI, Tathiane et al. (org.). Arbitragem tributária: desafios institucionais brasileiros e a experiência portuguesa. 2. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020, p. 61-71.

18 Cf. VILLA-LOBOS, Nuno; PEREIRA, Tânia Carvalhais. O caso particular da arbitragem tributária no âmbito das políticas públicas em matéria de justiça tributária. In: VILLA-LOBOS, Nuno; PEREIRA, Tânia Carvalhais (org.). Arbitragem em Direito Público. São Paulo: FGV Projetos/CAAD, 2019, p. 7-24; e PALMA, Clotilde Celorico. Contributos da arbitragem tributária em matéria de IVA: análise de alguns acórdãos. In: DOMINGOS, Francisco Nicolau (org.). Justiça tributária: um novo roteiro. 2. ed., rev. e ampl. Lisboa: Rei dos Livros, 2019, p. 245-269.

19 VILLA-LOBOS, Nuno; PEREIRA, Tânia Carvalhais. O caso particular da arbitragem tributária no âmbito das políticas públicas em matéria de justiça tributária. In: VILLA-LOBOS, Nuno; PEREIRA, Tânia Carvalhais (org.). Arbitragem em Direito Público. São Paulo: FGV Projetos/CAAD, 2019, p. 22.

21 Nesse sentido, confira-se a Súmula 436 do Superior Tribunal de Justiça: “A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do fisco”. Na mesma linha, por todos, CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 31. ed., rev. e atual. São Paulo: Noeses, 2021, p. 466-470.

22 Art. 63 da Lei n. 9.430/96: “Na constituição de crédito tributário destinada a prevenir a decadência, relativo a tributo de competência da União, cuja exigibilidade houver sido suspensa na forma dos incisos IV e V do art. 151 da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966, não caberá lançamento de multa de ofício. § 1º O disposto neste artigo aplica-se, exclusivamente, aos casos em que a suspensão da exigibilidade do débito tenha ocorrido antes do início de qualquer procedimento de ofício a ele relativo.”

23 Art. 7º do PL n. 4.468/2020: “A assinatura do compromisso arbitral: I – impede instauração de processo administrativo ou qualquer medida de fiscalização relacionada às questões de fato e de direito objeto do procedimento arbitral; II – afasta a espontaneidade de que trata o art. 138 da Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional); III – na hipótese de lavratura de auto de infração para exigência de tributos lançados com fundamento na questão submetida à arbitragem especial: a) não caberá lançamento de multa de ofício, nos moldes do art. 63 da Lei n. 9.430, de 27 de dezembro de 1996; b) o julgamento do processo administrativo será sobrestado até final decisão do procedimento arbitral”.

24 Art. 151 da Lei n. 5.172/66: “Suspendem a exigibilidade do crédito tributário: (...) IV – a concessão de medida liminar em mandado de segurança; V – a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial”.

25 ADI 2405/RS, Relator(a): Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, j. 20.09.2019, Processo Eletrônico DJe-215, Divulg. 02.10.2019, Public. 03.10.2019.

26 Cf. nota de rodapé n. 7 deste artigo (arts. 16-A e 41-T que o PL n. 4.257/2019 deseja incluir na LEF).

27 Cf. notas de rodapé n. 8 e 9 deste artigo (arts. 1º e 12 do PL n. 4.468/2020).

28 Art. 927 do CPC: “Os juízes e os tribunais observarão: I – as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; II – os enunciados de súmula vinculante; III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV – os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; V – a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados”.

29 Art. 2º do PL n. 4.468/2020: “As controvérsias tributárias que podem ser objeto da arbitragem tributária de que trata esta Lei são aquelas relativas a matérias fáticas, sendo vedado: I – discussão sobre constitucionalidade de normas jurídicas; II – discussão sobre lei em tese; III – decisão contrária a entendimento consolidado pelo Poder Judiciário nas hipóteses de que trata o art. 927 da Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), bem como julgamentos em sede de repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal”.

30 Acórdão n. 9303-005.856, 3ª Turma, seção de 18.10.2017.

31 Art. 4º, § 3º, do mencionado PL n. 4.468/2020.

32 Art. 10 do PL n. 4.468/20: “Poderá ser proposta ação de anulação do laudo arbitral, após 60 dias da ciência pelas partes do laudo arbitral proferido, quando: I – for nulo o compromisso arbitral; II – emanou de quem não podia ser árbitro; III – não contiver os requisitos do art. 3º desta Lei; IV – for proferida fora dos limites do compromisso arbitral; V – comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva; VI – forem desrespeitados os princípios de que trata o art. 2° desta Lei; VII – for proferida fora do prazo estipulado no art. 6, IX desta Lei”.

33 FERNANDES, André Luiz Fonseca; MASCITTO, Andréa. Primeiras considerações sobre a arbitragem especial tributária do Projeto de Lei n. 4.468/20. Migalhas, 21 de outubro de 2020. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/335156/primeiras-consideracoes-sobre-a-arbitragem-especial-tributaria-do-projeto-de-lei-4-468-20. Acesso em: 2 jul. 2021. Como se lê naquele texto: “A edição 122 (Da Arbitragem) da Jurisprudência em Teses do STJ, composta por acórdãos daquele tribunal publicados até 22.03.2019, revela, no tema 9, que é pacífico no STJ o entendimento de que: ‘A atividade desenvolvida no âmbito da arbitragem possui natureza jurisdicional, o que torna possível a existência de conflito de competência entre os juízos estatal e arbitral, cabendo ao Superior Tribunal de Justiça – STJ o seu julgamento.’”. Tais autores acrescentam ainda que a norma do art. 3º do CPC/2015 assinala que “o amplo acesso à jurisdição para tutelar ameaça ou lesão a direitos diz respeito não apenas à jurisdição estatal, mas também à jurisdição arbitral”.

34 Art. 97 da CF/88: “Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”.

35 Art. 948 do CPC: “Arguida, em controle difuso, a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo do poder público, o relator, após ouvir o Ministério Público e as partes, submeterá a questão à turma ou à câmara à qual competir o conhecimento do processo”. Art. 949 do CPC: “Se a arguição for: I – rejeitada, prosseguirá o julgamento; II – acolhida, a questão será submetida ao plenário do tribunal ou ao seu órgão especial, onde houver. Parágrafo único. Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário ou ao órgão especial a arguição de inconstitucionalidade quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão”.

36 OLIVEIRA, Gustavo Justino de; ESTEFAM, Felipe Faiwichow. Curso prático de arbitragem e administração pública. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019, p. 138. Cf. ainda FERNANDES, André Luiz Fonseca; MASCITTO, Andréa. Primeiras considerações sobre a arbitragem especial tributária do Projeto de Lei n. 4.468/20. Migalhas, 21 de outubro de 2020. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/335156/primeiras-consideracoes-sobre-a-arbitragem-especial-tributaria-do-projeto-de-lei-4-468-20. Acesso em: 2 jul. 2021.

37 FERNANDES, André Luiz Fonseca; MASCITTO, Andréa. Primeiras considerações sobre a arbitragem especial tributária do Projeto de Lei n. 4.468/20. Migalhas, 21 de outubro de 2020. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/335156/primeiras-consideracoes-sobre-a-arbitragem-especial-tributaria-do-projeto-de-lei-4-468-20. Acesso em: 2 jul. 2021.

38 FERNANDES, André Luiz Fonseca; MASCITTO, Andréa. Primeiras considerações sobre a arbitragem especial tributária do Projeto de Lei n. 4.468/20. Migalhas, 21 de outubro de 2020. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/335156/primeiras-consideracoes-sobre-a-arbitragem-especial-tributaria-do-projeto-de-lei-4-468-20. Acesso em: 2 jul. 2021.

39 GIANNETTI, Leonardo Varella. Arbitragem no Direito Tributário brasileiro: possibilidade e procedimentos. Tese (Doutorado em Direito) – PUC/MG. Belo Horizonte, 2017, p. 342-350. Disponível em: http://www.biblioteca.pucminas.br/teses/Direito_GiannettiLVa_1.pdf. Acesso em: 28 jun. 2021; e MENDONÇA, Priscila Faricelli de. A arbitragem em matéria tributária e o sistema normativo brasileiro. In: BOSSA, Gisele Barra et al. (coord.). Medidas de redução do contencioso tributário e o CPC/15: contributos práticos para ressignificar o processo administrativo e judicial tributário. São Paulo: Almedina, 2017, p. 340-341.

40 Não se olvide a necessidade de se ajustar a redação deste artigo do PL n. 4.257/2019. O grupo de pesquisa Métodos Alternativos de Resolução de Disputa em Matéria Tributária, do Núcleo de Direito Tributário da FGV Direito SP, coordenado pelas autoras e que tem o autor como membro-pesquisador, apresentou ao Senado a seguinte sugestão de redação para o art. 16-F: “Qualquer das partes pode pleitear ao órgão do Poder Judiciário competente a declaração de nulidade caso a sentença arbitral contrarie enunciado de súmula vinculante, decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade ou acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas, incidente de assunção de competência, recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida e recursos extraordinário ou especial repetitivos, desde que anteriores ao recebimento da notificação ou ciência pessoal da sentença arbitral ou da decisão do pedido de esclarecimentos, sendo aplicável, no que couber, o previsto nos arts. 32 e 33 da Lei n. 9.307, de 23 de setembro de 1996. § 1º Fica caracterizada a nulidade da sentença arbitral ou da decisão do pedido de esclarecimentos quando estas não observarem precedente vinculante referido pelo caput ou forem proferidas nas hipóteses do art. 32 da Lei n. 9.307, de 23 de setembro de 1996. § 2º A demanda judicial para declaração de nulidade da sentença arbitral deverá ser proposta no prazo de até 90 (noventa) dias após o recebimento da notificação ou ciência pessoal daquela ou o recebimento da decisão do pedido de esclarecimentos. § 3º Sendo declarada a nulidade da sentença arbitral, outra será proferida em seu lugar, com possibilidade de aproveitamento da prova já produzida, a critério do árbitro e desde que tal prova não tenha sido afetada pela declaração de nulidade. § 4º Não se aplicam ao processo arbitral regulamentado por esta Lei as disposições dos arts. 982, I e § 3º, 1.035, § 5º e 1.036, § 1º da Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015”.

42 Art. 32 da Lei de Arbitragem: “É nula a sentença arbitral se: I – for nula a convenção de arbitragem; II – emanou de quem não podia ser árbitro; III – não contiver os requisitos do art. 26 desta Lei; IV – for proferida fora dos limites da convenção de arbitragem; V – revogado; VI – comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva; VII – proferida fora do prazo, respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta Lei; e VIII – forem desrespeitados os princípios de que trata o art. 21, § 2º, desta Lei”. Art. 33 da Lei de Arbitragem: “A parte interessada poderá pleitear ao órgão do Poder Judiciário competente a declaração de nulidade da sentença arbitral, nos casos previstos nesta Lei”.

43 Art. 10 do PL n. 4.468/2020: “Poderá ser proposta ação de anulação do laudo arbitral, após 60 dias da ciência pelas partes do laudo arbitral proferido, quando: I – for nulo o compromisso arbitral; II – emanou de quem não podia ser árbitro; III – não contiver os requisitos do art. 3º desta Lei; IV – for proferida fora dos limites do compromisso arbitral; V – comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva; VI – forem desrespeitados os princípios de que trata o art. 2° desta Lei; VII – for proferida fora do prazo estipulado no art. 6º, IX, desta Lei”.

44 E que, por esse e por outros motivos, deveria ser de aplicação subsidiária a ambos os PLs. O assunto será tratado na seção 7 deste artigo.

45 Por outro lado, atentam contra a segurança jurídica entendimentos temerários, tal qual recente decisão (Acórdão n. 3.160/2020 – Plenário, relator ministro Vital do Rêgo, seção de 25.11.2020) exarada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) que, ao tratar da arbitragem entre a União e particulares, afirmou que caberia ao TCU verificar a razoabilidade e a adequação do cumprimento da decisão arbitral “de modo compatível com as disponibilidades e limites orçamentários”. O tribunal arbitral é instância competente e independente para solucionar controvérsias, e qualquer interferência nesses termos configura verdadeira desnaturação do instrumento e coloca em risco sua estabilidade institucional. Nenhum modelo adequado de arbitragem, ou de arbitragem tributária, pode conviver com este grau de interferência indevida do TCU.

46 O tema foi objeto de controle incidental de constitucionalidade do STF na Sentença Estrangeira 5.206 (Agravo Regimental), Tribunal Pleno, relator ministro Sepúlveda Pertence, j. 12.12.2001, DJ 30.04.2004. Na ocasião, decidiu-se pela ausência de qualquer ofensa constitucional, justamente à luz da autonomia das partes na adesão ao mecanismo arbitral.

47 “Formalizada a opção pela utilização da arbitragem especial, será designada audiência para assinatura do compromisso arbitral, que será firmado por: I – autoridade administrativa a ser designada pelo Ministério da Fazenda ou Advocacia Geral da União; II – procurador devidamente constituído pelo contribuinte.”

48 “São cláusulas obrigatórias do compromisso arbitral estabelecido para o procedimento de arbitragem especial: I – o local onde se desenvolverá a arbitragem; II – a obrigatoriedade de que o árbitro ou os árbitros decidam a questão de fato segundo regras jurídicas brasileiras; III – o nome, profissão, estado civil e domicílio das partes e representantes privados, assim como dados e cargo dos representantes jurídicos da pessoa jurídica de direito público; IV – o nome, profissão e domicílio dos árbitros; V – a possibilidade de indicar um árbitro desempatador, no caso do laudo arbitral não ser unânime; VI – a matéria que será objeto da arbitragem; VII – o lugar em que será proferido o laudo arbitral; VIII – a obrigatoriedade de cumprimento das normas desta lei; IX – o prazo para a apresentação do laudo arbitral será de até 12 meses, podendo ser prorrogado por acordo entre as partes por até duas vezes, desde que não ultrapasse prazo total de 24 meses; X – a fixação dos honorários dos árbitros; XI – a definição da responsabilidade pelo pagamento: a) de honorários dos árbitros; b) de eventuais honorários periciais; e c) de outras despesas com o procedimento de arbitragem; XII – as provas que serão produzidas na arbitragem; XIII – os fatos que são considerados como incontroversos para solução do conflito.”

49 No caput do várias vezes transcrito art. 16-A (que o PL quer incluir na LEF).

51 Cf., mais uma vez, o art. 16-A que o PL pretende incluir na LEF.

52 É o caso do art. 11, inciso II, da Lei de Arbitragem, que diz que o compromisso arbitral poderá conter autorização para o árbitro julgar por equidade, se assim for convencionado pelas partes. O modelo arbitral do PL n. 4.257/2019 admite somente, como não poderia deixar de ser, a arbitragem de direito (art. 16-C que o PL almeja incluir na LEF), ou seja, aquela fundada nas normas de direito positivo. A arbitragem por equidade (ou “autorização para deixar de lado as normas de direito posto e julgar segundo o que parecer justo no caso concreto” – CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à Lei n. 9.307/96. 3. ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2009, p. 65) não é autorizada pelo citado PL.

53 Como visto na seção 5 deste artigo.

54 Cf. art. 16-D que o PL quer incluir na LEF: “A fixação dos honorários advocatícios devidos ao advogado do vencedor no processo arbitral obedece aos critérios do art. 85 da Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015 – Código de Processo Civil. Parágrafo único. O valor total dos honorários advocatícios corresponde a metade do valor fixado pelo critério do caput”.

55 Por exemplo, no que diz respeito às hipóteses excepcionais de controle judicial da decisão arbitral (cf. seção 5 deste artigo) e à questão de impedimento/suspeição dos árbitros (art. 4º, § 1º, do PL: “Aplicam-se aos árbitros os motivos de impedimento e suspeição de que tratam os arts. 144 e 145 da Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil))”.

56 Art. 1º, § 1º, da Lei de Arbitragem: “A administração pública direta e indireta poderá utilizar-se da arbitragem para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis”.

57 O termo “executado” é, por exemplo, utilizado nos seguintes dispositivos que o PL quer incluir na LEF: “Art. 16-E. As despesas do processo arbitral devem ser adiantadas pelo executado.”; e “Art. 16-G. A sentença produz para o executado optante e para Fazenda Pública os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário”.

58 Como visto na seção 3 deste artigo.

59 Uma redação possível da respectiva norma, pensada no âmbito do grupo de pesquisa Métodos Alternativos de Resolução de Disputa em Matéria Tributária, do Núcleo de Direito Tributário da FGV Direito SP, seria a seguinte: “Os autores das ações judiciais mencionadas nos arts. 16-A e 41-T da Lei n. 6.830, de 22 de setembro de 1.980, que estiverem em curso na data de publicação desta Lei, poderão optar pela adoção de juízo arbitral, desde que o façam no prazo de 2 (dois) anos a contar da referida publicação. Parágrafo único. É vedada a opção pela adoção de juízo arbitral caso tenha sido proferida sentença nas ações judiciais mencionadas no caput”.

60 Art. 9º do PL n. 4.468/2020: “Na hipótese de decisão não unânime entre os três árbitros, será designado árbitro desempatador no prazo de 30 dias, se assim estiver previsto pelas partes no compromisso arbitral. Parágrafo único. O árbitro desempatador analisará toda a documentação do processo e emitirá decisão adotando uma das posições anteriores, justificando-as, sendo vedada a reabertura da instrução processual para determinar a realização de novas provas e diligências”.

61 Art. 4º, § 7º, do PL n. 4.468/2020.

62 Art. 31 da Lei de Arbitragem: “A sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo”.

63 Art. 16-G, que o PL n. 4.257/2019 almeja incluir na LEF: “A sentença produz para o executado optante e para Fazenda Pública os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário”.

64 Cf. seção 7 deste artigo.