Reflexões sobre Ilícitos, Sanções e a Dedutibilidade de Multas no Imposto de Renda

Insights on Illicit Actions, Sanctions, and Deductibility of Penalties within the Income Tax

André Mendes Moreira

Professor Adjunto de Direito Tributário da UFMG. Doutor em Direito Tributário pela USP, onde fez residência Pós-doutoral. Mestre em Direito Tributário pela UFMG. Diretor da ABRADT e Associado ao IBDT. Advogado. E-mail: andre@sachacalmon.com.br.

Pedro Henrique Neves Antunes

Especialista em Direito Tributário pelo IBET e pela Faculdade Milton Campos. Professor da Especialização em Direito Tributário do IBET. Associado à ABRADT e ao IBDT. Advogado. E-mail: pedro.antunes@sachacalmon.com.br.

Resumo

No texto aborda-se a controvérsia acerca da dedutibilidade, da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, de despesas incorridas no pagamento de multas que tenham sido fixadas no contexto de atividades relacionadas ao regular exercício da atividade empresarial. Inicialmente, são analisados os requisitos legais para caracterização de determinada despesa como dedutível. Sustenta-se inexistir, no direito brasileiro, vedação geral à tributação de ganhos ilícitos, ou à dedutibilidade de despesas por atos ilícitos. A partir de então, explora-se a caracterização da necessidade, da normalidade e da habitualidade de tais dispêndios, à luz da atividade empresarial. Em sequência, conclui-se que a vedação à dedução de multas incorridas no exercício de atividades operacionais viola, por um lado, o conceito de renda tributável; e, por outro, o princípio da renda líquida. Para além disso, sustenta-se que a aceitação da dedutibilidade de determinadas multas em detrimento de outras acaba instituindo situação injustificadamente arbitrária e, enquanto tal, atentatória à igualdade. Ao cabo, demonstra-se que a vedação da dedução acaba por imprimir finalidades sancionatórias ao tributo, o que é vedado pelo direito brasileiro.

Palavras-chave: ilícito, sanção, IRPJ, CSLL, multas, contexto da atividade empresária, dedutibilidade.

Abstract

The text addresses, for purposes of income tax and social contribution on profits, the right to deduct expenses related to penalties applied within the context of business’ activities. Initially, the legal requirements for an expense to be deductible are analyzed. The article sustains the nonexistence, in Brazilian tax law, of a general principle that would forbid either the taxation of illicit gains or the deductibility of expenses related to illicit actions. From then on, the necessity, normality, and usualness of these expenses to the business’ activities are analyzed. It follows in conclusion that the non-deductibility of expenses related to penalties incurred within the context of the enterprise would violate, on the one hand, the concept of taxable income; and, on the other hand, the principle of net income. Besides that, it is sustained that the deductibility of some penalties in detriment of others is arbitrary and contrary to the principle of equality. At last, it’s shown that the non-deduction transforms the income tax into a penalty itself, which is forbidden by Brazilian law.

Keywords: illicit, sanction, Income Tax, Social Contribution on Profits, context of the entrepreneurial activity, deductibility.

1. Introdução

Não é recente o estudo acerca dos efeitos tributários do ilícito. Alfredo Augusto Becker dedicou todo o § 3º do Capítulo V da Quinta Parte de sua clássica Teoria geral do direito tributário (1963) ao estudo da tributação dos atos ilícitos1. Já naquele momento – previamente, pois, à EC n. 18/1965 e ao próprio CTN –, Becker sustentava que os argumentos contrários e a favor da tributação dos atos ilícitos não subsistiam quando analisados à luz da dogmática jurídica (ou, no plano jurídico, em seus dizeres), já que, em sua maioria, seriam fundamentos pré-jurídicos de natureza ética ou econômica2.

Recentemente, o tema retornou com renovada força ao centro das discussões doutrinárias3, sobretudo em vista dos desdobramentos – inclusive tributários – da Operação Lava-Jato, iniciada em 20144.

Entretanto, fato é que a temática se manteve relevante desde sempre, envolvendo profundas controvérsias travadas entre contribuintes e os Fiscos, em especial, o federal. Dentre as questões debatidas, uma se reveste de especial relevância: a dedutibilidade, da base de cálculo do imposto de renda da pessoa jurídica (IRPJ) e da contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL), do valor despendido por sociedades empresárias no pagamento de multas fixadas no contexto de atividades relacionadas ao regular exercício de sua atividade empresarial5.

Tais multas podem ser impostas por Agências Regulatórias a concessionárias, autorizatárias ou permissionárias de serviço público6. Por autoridades de trânsito a veículos de transportadoras7. Pelas autoridades fiscais das condições laborais, no caso das multas trabalhistas8. Ou mesmo pelos próprios particulares, quando há previsão de multas contratuais decorrentes de atraso na entrega de cargas9 ou rompimento de avenças em geral10.

Na esteira de tais discussões, o presente artigo tem objeto específico: demonstrar, à luz da doutrina especializada, que os valores despendidos no pagamento de multas fixadas no contexto de atividades relacionadas ao regular exercício da atividade empresarial são dedutíveis para apuração do IRPJ e da CSLL, por força da legislação de regência.

Isso porque consubstanciam efetivas despesas operacionais (ou necessárias, conforme denominação utilizada pelo art. 311 do RIR/2018), consoante critérios fixados pelo art. 47 da Lei n. 4.506/1964. Nem mesmo a ilicitude verificável na origem de referidas multas seria suficiente à descaracterização de despesa operacional, já que o direito brasileiro não veda a tributação ou a dedutibilidade por ilícitos.

À luz de tal cenário, serão explorados os requisitos à caracterização de determinada despesa como operacional (ou necessária). Nesse mesmo tópico se demonstrará que inexiste no direito brasileiro vedação geral à tributação de ganhos ilícitos, ou à dedutibilidade de despesas por atos ilícitos.

A partir de então, restará evidenciado que a caracterização da necessidade, da normalidade e da usualidade dos dispêndios incorridos pela empresa deve se dar à luz da própria atividade empresária desenvolvida, sendo irrelevante, para fins tributários, sua licitude ou ilicitude. Para além disso, se demonstrará que a dedutibilidade de determinadas multas em detrimento de outras acaba instituindo situação injustificadamente arbitrária e, enquanto tal, atentatória à igualdade constitucional.

Ao final, será exposta conclusão no sentido de que a vedação à dedução viola, por um lado, o conceito de renda tributável, ante a inexistência de acréscimo patrimonial; e, por outro, o princípio da renda líquida. Não bastasse isso, a não dedução imprime finalidades sancionatórias ao tributo, o que é vedado pelo direito brasileiro.

Confira-se.

2. Dos requisitos à caracterização de determinada despesa como operacional: o direito brasileiro permitiria a classificação, como despesa necessária, de gastos incorridos pela empresa no pagamento de sanções?

Para a apuração do lucro real tributável, parte-se do lucro contábil, promovendo-se as respectivas adições e exclusões legalmente previstas, tudo nos termos do art. 6º, caput, do Decreto-lei n. 1.598/1977 e art. 258, caput, do atual Regulamento do Imposto de Renda (Decreto n. 9.580/2018).

Dentre as exclusões permitidas estão as chamadas despesas operacionais (ou necessárias, na denominação do RIR/2018), cujo conceito é fornecido pelo art. 47 da Lei n. 4.506/1964 (Lei das S/A).

À luz dos dispositivos referidos, pode-se dizer que, para que determinada despesa seja considerada operacional, ela deve ser:

i) necessária às operações exigidas pela atividade da empresa (art. 47, § 1º, da Lei n. 4.506/1964);

ii) usual; e

iii) normal, quando consideradas especificamente as operações e as atividades por ela desempenhadas (art. 47, § 2º, da Lei n. 4.506/1964).

Para os fins do presente estudo, todavia, a seguinte pergunta é fundamental: o direito brasileiro permitiria a classificação, como despesa necessária, de gastos incorridos pela empresa no pagamento de sanções?

A resposta a tal questionamento é insuperavelmente positiva: sim, o direito brasileiro, em determinadas situações, admite expressamente que sanções sejam classificadas como despesa necessária da empresa11.

Tanto é assim que se admite a dedutibilidade de multas decorrentes de atraso na entrega do bem, em atividade de agenciamento de cargas; bem como a dedução de multas por quebras contratuais na prestação de serviços. Em paralelo, são de Luís Eduardo Schoueri e Guilherme Galdino12 os seguintes exemplos de sanções dedutíveis:

a) multas compensatórias e multas por infrações que não tenham sido impostas por falta de pagamento, ou pagamento a menor de tributo, nos termos do art. 352, § 5º, do RIR;

b) multas contratuais (infração a norma de origem privada), conforme Pareceres Normativos n. 5013 e n. 6614, ambos de 1976, da Coordenação do Sistema de Tributação da Receita Federal do Brasil;

c) indenizações trabalhistas, conforme precedentes do CARF15.

Tais exemplos permitem afirmar, juntamente com Humberto Ávila, que não existe regra na legislação do imposto de renda que estabeleça a proibição da dedutibilidade de despesas decorrentes de ato ilícito16.

De fato, a permissão à dedutibilidade de gastos com despesas ilícitas parece ser a outra face do que se habituou denominar princípio do non olet, compreendido no sentido de que uma atividade ilícita gera ganhos econômicos e, portanto, deve ser submetida à tributação17. Seria dizer: “se o legislador tributário não cogita a licitude/ilicitude, bastando-lhe, para a tributação, que certos efeitos se façam presentes, nada obsta a tributação”18.

Nesse ponto, não se pode deixar de registrar a lição de Ricardo Mariz de Oliveira, para quem o non olet sequer deveria ser entendido como um princípio jurídico, sendo que, “[a] verdadeira ratio de qualquer incidência repousa na capacidade contributiva de alguém, manifestada através da ocorrência de fatos que correspondam à hipótese de incidência deste ou daquele tributo, e isto pode ocorrer tanto em situações de licitude quanto de ilicitude”19.

Na visão de Mariz, tanto despesas decorrentes de alguma ineficiência da empresa como as resultantes de atos de imperícia, negligência ou até mesmo de dolo, são dedutíveis quando relacionadas com a atividade empresarial20.

De todo modo, a conclusão não se altera: se o ganho é tributável, pela mesma razão deve se admitir a dedução da despesa – inclusive sob pena de restar caracterizada, no caso, verdadeira sanção por ato ilícito, o que é vedado no direito brasileiro por força do art. 3º do CTN, como apontam Schoueri e Galdino21, bem como Fernando Facury Scaff22 e Ávila23.

Ainda sobre o non olet e a tributação do ilício, de relevo o posicionamento capitaneado por Misabel Derzi, que, firme na teoria da unidade do injusto24, entende que não se poderia conceder tratamento igual a fatos e pessoas diferentes, nem tampouco legitimar, ou “lavar”, por meio da tributação, a titularidade de valores fruto da criminalidade25. Em sua visão, a consequência dos ganhos decorrentes da atividade ilícita deveria ser o perdimento dos bens, de forma que, tendo sido o sujeito expropriado, inexistiria fato jurídico tributável26.

Sobre o tema, Schoueri revela que, por sua força, o argumento capitaneado por Derzi havia sido reproduzido nas duas primeiras edições do seu manual de Direito Tributário. Entretanto, reflexões posteriores teriam levado à revisão do seu posicionamento27.

Para tanto, explica Schoueri que o perdimento dos bens decorrentes da atividade ilícita só seria possível após o final do processo penal, de forma que o delinquente manteria a propriedade de seus bens, além de seguir deles usufruindo, ao longo de todo esse tempo. Assim, em sua visão, enquanto ainda não perfectibilizado o perdimento dos bens, há riqueza fruída, nada impedindo a exigência do imposto de renda28.

Nesse ponto, recomendável uma pequena digressão, para que se possa ter maior clareza a respeito da compreensão de Schoueri acerca da caracterização da renda para fins de incidência tributária, de forma a fundamentar seu entendimento pela tributação do ilícito. De fato, a partir da relevância que atribui à concepção econômica das hipóteses de incidência tributária29, já seria esperada a conclusão por ele sustentada – e acima exposta.

Em breves linhas, sustenta Schoueri que a discussão a respeito do non olet no Brasil foi permeada pela polêmica acerca da consideração econômica do fato gerador30. Para tanto, vale-se, por um lado, das lições de Rubens Gomes de Sousa, no sentido de que, ainda que um ato, contrato ou negócio seja juridicamente nulo, ou mesmo ilícito, desde que tenha produzido efeitos econômicos, incidirá o tributo, pouco importando as circunstâncias jurídicas. Por outro, invoca Amílcar de Araújo Falcão, para quem deveria ser levado em conta a consideração da consistência econômica do fato gerador31.

A partir daí, sustenta Schoueri32 que referida visão teórica teria sido incorporada ao CTN em seu art. 118, I, o qual deveria ser lido em conjunto ao art. 116, que, por sua vez, contemplaria duas hipóteses de fatos geradores, a saber: (i) as situações de fato; e (ii) as situações jurídicas.

Assim, enquanto as situações jurídicas pressuporiam a validade e a licitude do objeto, sob pena de não se configurar o fato jurídico tributário, as situações de fato não levariam em consideração o negócio jurídico (ou sua falta), limitando-se aos efeitos concretos que, presentes, devem ser tributados. Em decorrência, não tendo o legislador tributário cogitado da licitude/ilicitude, para a ocorrência da tributação, bastariam os efeitos econômicos33.

Roque Antonio Carrazza, a seu turno, expressamente convalidou o posicionamento de Derzi, reconhecendo, todavia, que, inexistindo a pena de perdimento34, haverá espaço à tributação35. Por outro lado, entende seria o Estado livre para considerar tributáveis mesmos fatos que ele próprio – Estado – consideraria administrativa ou penalmente ilícitos36.

Com isso, especificamente no que diz respeito à tributação do ilícito, e por fundamentos substancialmente distintos, alinha-se Carrazza, em maior grau, ao pensamento de Schoueri.

À luz de todo o exposto, é certo concluir que, independentemente da conclusão pela legitimidade ou ilegitimidade, da tributação dos atos ilícitos, é imperioso se mantenha coerência com as premissas. Noutras palavras, ou se admite a tributação do ilícito – e consequentemente sua dedutibilidade, essencial para que a renda (e não o patrimônio) seja gravada – ou então se reconhece a impossibilidade de que o ilícito possa impactar a esfera tributária – vedando, assim, sua tributação e, paralelamente, sua dedutibilidade.

Atualmente, o direito brasileiro tem reconhecido e convalidado os efeitos tributários dos atos ilícitos, admitindo tanto a tributação dos ganhos decorrentes da atividade ilícita37, quanto, em restritas hipóteses, a dedutibilidade de despesas que, apesar de relacionadas à atividade da empresa, decorrem de atos ilícitos (basta ver os exemplos acima). A tributação do ilícito, portanto, apresenta-se como realidade jurídico-positiva do direito tributário brasileiro, devendo ser estudada como tal – inclusive pelo presente texto.

Fixados tais pontos, avancemos.

3. Ainda sobre a caracterização de despesas operacionais: como devem ser interpretadas a necessidade, a usualidade e a normalidade acerca das multas relacionadas ao contexto da atividade empresária?

A partir do exposto no último tópico, pode-se afirmar que, pelo art. 47 da Lei n. 4.506/1964, serão dedutíveis da base de cálculo do IRPJ (e, consequentemente, da CSLL, por força do art. 2º da Lei n. 7.689/1988) despesas incorridas pela sociedade empresária que, não computadas nos custos38, sejam necessárias, normais e usuais – ao se levar em conta o próprio caráter da atividade econômica desempenhada.

Com isso, a legislação de regência, referindo-se a despesas necessárias, valeu-se do conceito contábil de despesas (juridicizando-o), pretendendo assim separar:

a) aquelas que tenham relação com a atividade empresarial – devendo, portanto, ser deduzidas para fins de apuração da renda; e

b) aquelas que não têm qualquer relação – insuscetíveis, pois, de dedução.

Com Ávila39, podemos dizer que o critério legal objetivo à qualificação de determinada despesa como necessária seria sua relação com a atividade operacional da empresa. Logo, seriam necessárias as despesas incorridas para a realização das transações ou operações exigidas pela atividade da empresa.

A normalidade e a usualidade, por sua vez, devem ser aferidas em vista do tipo de transações, operações ou atividades da empresa, por força de disposição expressa de lei (§ 2º do art. 47 da Lei n. 4.506/1964).

Quanto às despesas presentemente consideradas, ou seja, multas que tenham sido fixadas no contexto de atividades relacionadas ao exercício da atividade empresarial, indutiva, a essa altura, sua caracterização como efetivas despesas operacionais das empresas que se dedicam àquelas atividades.

Afinal, a continuidade da exploração da atividade econômica pela sociedade empresária depende do pagamento de tais multas, a evidenciar sua necessidade (§ 1º do art. 47 da Lei n. 4.506/1964). Para além disso, à luz do próprio contexto da atividade desempenhada, tais multas tornam-se perfeitamente justificáveis – até mesmo previsíveis –, apesar de envolver, em sua origem, o descumprimento de determinado dever jurídico (seja contratual ou legal) pela fonte produtora (realidade que está dentro do direito; e não fora dele, inclusive).

Justamente esse é o caso do pagamento de multas relacionadas à atividade da empresa, que se tornam usuais ou normais em decorrência de características tipicamente observáveis naquele determinado campo de exploração econômica. A título de exemplo, seria dizer:

a) é razoável que transportadoras terrestres incorram em multas de trânsito, já que situação usual/normal àquele ramo40. Apesar disso, sua dedutibilidade tem sido negada tanto pela RFB, quanto pela jurisprudência administrativa e judicial;

b) da mesma forma, não é situação excepcional (v.g., inusual ou anormal) que concessionárias de serviços públicos incorram em multas regulatórias fixadas por Agências Reguladoras do serviço sob concessão41. Apesar disso, sua dedutibilidade tem sido negada tanto pela RFB, quanto pela jurisprudência administrativa e judicial;

c) também não será extraordinário se determinada prestadora de serviço vier a arcar com determinada multa contratual, por eventual quebra de contrato. Excepcionalmente, e de modo contraditório, nesse último caso, em específico, a dedutibilidade tem sido reconhecida pela própria RFB, além de convalidada pelo CARF. Tal postura acaba por criar tratamento discriminatório e anti-isonômico, contrariando o princípio constitucional da igualdade, como será visto mais abaixo, em tópico específico.

Por ora, o que se nota é que as multas acima referidas compõem a realidade da atividade econômica respectivamente desempenhada, o que se dá pelas mais diversas – e legítimas – razões. Logo, consubstanciam efetiva despesa operacional (ou necessária), sendo irrepreensivelmente legítima sua dedução da base de cálculo do IRPJ e da CSLL42.

4. Dos demais mandamentos constitucionais e legais à dedutibilidade das multas: conceito constitucional de renda, igualdade tributária e vedação à utilização do tributo como sanção por atos ilícitos

4.1. A vedação à dedutibilidade das multas viola a hipótese constitucional e legal de incidência do imposto de renda

A partir do exposto no tópico acima, pode-se afirmar que a vedação à dedução de multas incorridas no exercício de operações intrínsecas à atividade econômica desempenhada pela empresa faz com que o imposto de renda (e a CSLL) incidam sobre grandeza de todo necessária à manutenção da própria fonte produtora.

Com isso, acaba por desconsiderar, por um lado, o conceito constitucional de renda (art. 153, III, da CR/1988)43 e sua exigência de universalidade (art. 153, § 2º, I, da CR/1988)44, por pretender tributar inclusive valores cuja destinação se apresentava como verdadeira condição de permanência da atividade. Logo, tributam-se inclusive grandezas que não representam – ou que sequer poderiam ensejar – qualquer acréscimo patrimonial do contribuinte45, por representarem despesas usualmente incorridas por quem se dispôs a exercer aquele tipo de atividade econômica.

Por outro lado, viola também a hipótese de incidência legal do imposto de renda (art. 43, caput, do CTN), ao permitir a tributação de renda indisponível. Assim, ao se tributar renda indisponível, estaria sendo também violado o princípio da renda líquida. Afinal, não há disponibilidade sobre numerário que necessariamente precisa ser alocado para pagar multas devidas a agências reguladoras ou autoridades públicas em geral. A não quitação de tais dívidas, em certas situações, pode implicar inclusive a proibição de exercício das atividades empresariais.

Conforme consigna Schoueri, o princípio da renda líquida é extraível dos parâmetros que regem o sistema constitucional tributário, a partir das características típicas46 do IRPJ47, que teriam sido imprimidas pelo constituinte na repartição de competências tributárias48. Por ele, tem o contribuinte direito à dedução de despesas necessárias à obtenção da riqueza sujeita ao tributo49, de forma a obter a renda disponível.

Assim, em sua visão, disponibilidade deveria ser entendida pela prerrogativa do beneficiário da renda de, conforme seu interesse, empregá-la para a destinação que melhor lhe aprouver – podendo utilizá-la inclusive para o pagamento do próprio tributo50.

Consequentemente, a vedação à dedutibilidade das multas acabaria por representar a tributação de gastos imprescindíveis à tributação da própria renda, fazendo com que se tribute valores indisponíveis – o que não seria permitido seja pelo art. 153, III, da CR/1988, seja pelo art. 43, caput, do CTN, que exige expressamente a disponibilidade como fato gerador do IRPJ.

Em verdade, apesar de adotarem pontos de partida diversos, tanto a concepção renda-acréscimo patrimonial, quanto a concepção renda-disponibilidade, levam à mesma – e insuperável – conclusão, ou seja: a vedação à dedutibilidade de multas incorridas em operações e transações desempenhadas pelos contribuintes no exercício de sua atividade empresarial descaracteriza o imposto de renda tal como previsto na Constituição e no CTN.

4.2. O atual tratamento conferido ao tema da dedutibilidade das multas viola o princípio constitucional da igualdade: tratamento discriminatório injustificado, a caracterizar arbitrariedade

Restou exposto ao longo do texto que, atualmente, a RFB permite a dedução de determinadas multas da base de cálculo do IRPJ (v.g., multas por quebras contratuais), vedando a dedução de outras (v.g., multas de trânsito e multas regulatórias).

Ocorre que, ao se confrontar objetivamente as características das (i) multas cuja dedutibilidade tem sido reconhecida, com (ii) as multas cuja dedutibilidade tem sido negada, não se chega a justificativa plausível para a diferença no tratamento de cada uma delas.

Nesse sentido, as razões apontadas pela RFB para admitir a dedutibilidade de multas por atraso na entrega na atividade de agenciamento de cargas seriam plenamente aplicáveis para se admitir a dedutibilidade das multas de trânsito das transportadoras; ou, ainda, às multas regulatórias impostas pelas Agências Reguladoras aos concessionários (ou autorizatários e permissionários, tanto faz) de serviços públicos.

A título de exemplo, a Solução de Consulta n. 281-COSIT, de 27 de setembro de 2019, ao concluir pela dedutibilidade das referidas multas por atraso, valeu-se dos seguintes argumentos:

a) inexistiria rol taxativo das despesas dedutíveis ou das despesas indedutíveis. Por outro lado, há a regra geral da dedutibilidade de despesas necessárias e usuais;

b) multas contratuais por atraso na entrega de cargas de logística seria algo absolutamente inerente a esta prática comercial. Assim, é natural supor que as cautelas seriam tomadas quanto aos cumprimentos dos prazos, porém, a mora no cumprimento, pelo agenciador, dos prazos previamente convencionados seria contingência intrínseca à atividade exercida;

c) tal contingência, por sua vez, adviria muitas vezes de variáveis exógenas, verificando-se com relativa frequência, sendo risco do negócio;

d) teria sido violada cláusula contratual que buscava resguardar o interesse de uma das partes contratantes, estando a despesa intimamente relacionada à exploração do objeto social, revelando prática comum aos tipos de serviços prestados.

Da leitura dos fundamentos da solução de consulta, nota-se que os critérios ali descritos, se aplicados às multas ora analisadas, levariam indiscutivelmente à caracterização de sua necessidade e habitualidade às atividades empresárias correspondentes. É o que se nota a partir de critérios como: (i) multas inerentes à prática comercial; (ii) contingências intrínsecas à atividade exercida; (iii) variáveis exógenas; (iv) relativa frequência; (v) risco do negócio; (vi) íntima relação com a exploração do objeto social; (vii) prática comum aos serviços prestados.

Em decorrência, acaba-se por constatar a existência de tratamento desigual, por parte da RFB, de contribuintes que se encontram em situações equivalentes, sem que exista qualquer razão legítima a tanto51. Em verdade, atribui-se tratamento desigual a depender da atividade econômica desempenhada, em nítida contrariedade, primeiramente, aos dispositivos constitucionais que asseguram: (i) o livre exercício de ofício e profissão (art. 5º, XIII, da CR/1988), bem como de atividade econômica (art. 170, parágrafo único, da CR/1988); e (ii) a vedação a tratamento desigual sem justificativa legítima a tanto (art. 5º, caput, da CR/1988).

Consequentemente, constata-se violação (iii) à própria norma constitucional da igualdade (art. 5º, caput, da CR/1988), tanto em sua acepção de regra, quanto em sua acepção de princípio52, bem como à própria (iv) igualdade tributária (art. 152 da CR/1988), ao conferir tratamento tributário desproporcional às multas por quebras contratuais (e seus sujeitos); e todas as demais multas que se relacionam à atividade empresária (e, naturalmente, seus sujeitos).

Em verdade, a única diferença mais significativa que se constatou entre o caráter das multas ora confrontadas está no fato de que as multas por quebras contratuais estariam previstas em contratos firmados entre particulares, enquanto todas as outras estariam previstas em diplomas diversos (as das concessionárias, por exemplo, nos respectivos contratos de concessão, além de normas regulatórias; e as multas de trânsito, na legislação de regência).

Ocorre que referida diferenciação é absolutamente insuficiente à justificação da diferença de tratamento entre as multas para fins de dedutibilidade do IRPJ, já que não é um dos critérios eleitos pelo legislador ao estabelecer quais despesas poderiam ser deduzidas. Não sendo critério legalmente fixado, está-se diante de indiferente jurídico, de todo imprestável à justificação de tratamentos desiguais e, justamente por isso, arbitrários.

Consequentemente, a análise da dedutibilidade de todas as multas fixadas no contexto de atividades relacionadas ao regular exercício da atividade empresarial, a partir dos mesmos critérios utilizados ao se concluir pela dedutibilidade das multas por quebras contratuais, é exigência direta de importantes normas constitucionais, dentre as quais se destaca, com especial vigor, a igualdade tributária.

4.3. Tributo não pode se revestir de sanção por ilícitos, por força de vedação legal

Finalmente, há que se destacar que os critérios legais positivados pelo legislador para determinar se determinada despesa é ou não dedutível do IRPJ/CSLL são exclusivamente: sua necessidade, sua usualidade e sua normalidade. A ilicitude definitivamente não é critério para tanto.

Consequentemente, o fato de determinada despesa cuja dedução se investiga ter origem no cometimento de atos ilícitos (ainda que relacionadas a condutas graves – e inteiramente repreensíveis – como infrações de trânsito, descumprimento de obrigações regulatórias, violação às regras concorrenciais, dentre outras), não pode interferir na análise – e consequentemente, na conclusão – acerca de sua dedutibilidade.

Caso assim não seja, se estará, por um lado, trazendo à análise da dedutibilidade critérios não previstos no art. 47 da Lei n. 4.506/1964 (ou em qualquer outro dispositivo legal); e, por outro lado, se permitirá a atribuição de caráter sancionatório a tributo, prática reconhecidamente vedada pelo direito brasileiro, a teor do art. 3º do CTN.

5. Conclusões

Dedicou-se o presente texto à análise da dedutibilidade, para fins de IRPJ e CSLL, do valor gasto no pagamento de multas fixadas no contexto de atividades relacionadas ao regular exercício da atividade empresarial (por exemplo: multas impostas por agências regulatórias às empresas fiscalizadas; multas de trânsito arcadas por transportadoras; multas por quebra de contrato etc.).

De início, demonstrou-se que o fato de a imposição da multa decorrer do cometimento de ato ilícito não impede per se sua dedutibilidade, já que inexiste no direito brasileiro regra geral vedando a tributação ou a dedução de valores decorrentes de ilícitos.

A partir de então, coube demonstrar que tais multas cumprem os requisitos da necessidade, da usualidade e da normalidade, já que, por um lado, a continuidade da exploração da atividade econômica pela sociedade empresária depende do pagamento de tais multas, a evidenciar sua necessidade. Por outro, à luz do próprio contexto da atividade desempenhada, tais multas tornam-se perfeitamente justificáveis – até mesmo previsíveis –, já que relacionadas a operações e transações demandadas pelo regular exercício da atividade da empresa.

Em seguida, foram demonstradas as razões pelas quais a dedutibilidade das multas aqui estudadas decorreria da conjugação de outros mandamentos constitucionais e legais. Quanto às normas constitucionais, demonstrou-se que a vedação à dedução de despesas necessárias viola o conceito de renda e o princípio da renda líquida (art. 153, III, da CR/1988), bem como sua exigência de universalidade (art. 153, § 2º, I, da CR/1988).

Também a respeito das normas constitucionais, demonstrou-se que o atual tratamento conferido pela RFB a diferentes tipos de multas, ora permitindo a dedução, ora negando-a, acaba por violar tanto a igualdade (geral e tributária) como o livre exercício de profissão e a não discriminação entre sujeitos, bens e serviços.

Já quanto às normas infraconstitucionais, a dedução também seria determinada pelo art. 43 do CTN, ao positivar, em âmbito legal, o princípio da renda líquida, exigindo a dedução de despesas necessárias à obtenção da riqueza sujeita ao tributo, de forma a se tributar apenas a chamada renda disponível. Assim, a vedação à dedutibilidade violaria tanto a hipótese constitucional quanto a legal do imposto de renda.

Por fim, foram expostas as razões pelas quais a conclusão pela indedutibilidade de despesas a partir do critério da ilicitude acabaria por conferir tratamento sancionatório ao tributo, postura vedada pelo art. 3º do CTN.

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1 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 6. ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 640 e ss.

2 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 6. ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 642.

3 Por todos, é ver: ADAMY, Pedro Augustin; FERREIRA NETO, Arthur M. (coord.). Tributação do ilícito: estudos em comemoração aos 25 anos do Instituto de Estudos Tributários – IET. São Paulo: Malheiros, 2018.

5 É o que se depreende do seguinte julgado, proferido em setembro de 1990: “As multas, de um modo geral, não são dedutíveis, pois técnica e ontologicamente, não representam ou não se caracterizam como despesas necessárias à atividade da empresa e a manutenção de sua fonte produtora.” (TRF-1, AC n. 0021126-30.1989.4.01.0000, Des. Federal Fernando Gonçalves, j. 15.08.1990, DJ 10.09.1990, p. 20421).

6 FARO, Maurício Pereira; MEIRA, Thais de Barros. Dedutibilidade de multas administrativas da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. In: RABELO FILHO, Antonio Reinaldo et. al. Tributação & telecomunicações. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2016, p. 351-368. Negando a dedutibilidade de multas impostas pela ANEEL a distribuidora de energia elétrica, é ver: TRF-2, Ap. n. 0013160-30.2017.4.02.5101, Rel. Luiz Antonio Soares, j. 18.09.2019, pub. 20.09.2019.

7 Negando a dedutibilidade por empresas transportadoras, é ver: TRF4, Ap. Cível n. 5011436-76.2016.4.04.7107, Rel. Des. Federal Alexandre Gonçalves Lippel, juntado aos autos em 11.06.2020 (processo atualmente no STJ, pendente de decisão: AREsp n. 1.878.205/RS). No mesmo sentido, a jurisprudência administrativa: CARF, Acórdão n. 1402-002.389, Processo n. 10183.721717/2013-74, Rel. Cons. Leonardo Luis Pagano Goncalves, j. 14.02.2017, pub. 03.04.2017).

8 Negando a dedutibilidade de multas por infração de lei não tributária, como trabalhistas e de trânsito, é ver: CARF, Acórdão n. 1402-001.190, Processo n. 11080.726294/2010-57, Rel. Leonardo de Andrade Couto, j. 11.09.2012, pub. 27.09.2012.

9 Reconhecendo a dedutibilidade de tal despesa na atividade de agenciamento de cargas, é ver: Solução de Consulta COSIT n. 281, de 27.09.2019.

10 Reconhecendo a dedutibilidade, é ver: CARF, Acórdão n. 1201-000.840, 10283.004194/2002-17, Rel. Marcelo Cuba Netto, j. 06.08.2013, pub. 28.08.2013); CARF, Acórdão n. 1201-000.839, Processo n. 10283.004163/2002-66, Rel. Marcelo Cuba Netto, j. 06.08.2013, pub. 28.08.2013).

11 Nesse ponto, parece existir diferença entre o direito brasileiro e o alemão – ao menos no que se diz respeito a sanções penais. Sobre o tema, consignou Klaus Tipke: “[c]omo na hierarquia jurídica alemã, a justiça penal prevalece sobre a justiça tributária, penas pecuniárias, multas ou mesmo valores de subornos não podem ser deduzidos da base de cálculo do imposto de renda a título de despesas operacionais ou despesas profissionais” (TIPKE, Klaus. Sobre a unidade da ordem jurídica tributária. Trad. Luís Eduardo Schoueri. In: SCHOUERI, Luís Eduardo; ZILVETI, Fernando Aurelio (coord.). Estudos em homenagem a Brandão Machado. São Paulo: Dialética, 1998, p. 61).

12 SCHOUERI, Luís Eduardo; GALDINO, Guilherme. Dedutibilidade de despesas com atividades ilícitas. In: ADAMY, Pedro Augustin; FERREIRA NETO, Arthur M. (coord.). Tributação do ilícito: estudos em comemoração aos 25 anos do Instituto de Estudos Tributários – IET. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 148-212.

13 PN n. 50/76/CST/SRF: “É dedutível, como despesa operacional da pessoa jurídica, o valor da multa contratual, paga ou incorrida, decorrente do inadimplemento de cláusula que obrigue o representante comercial, o mandatário ou o comissário mercantil a vender uma quantidade determinada de mercadorias.”

14 PN n. 66/76/CST/SRF: “São dedutíveis do lucro operacional as perdas em benefício do vendedor, quando originárias do inadimplemento de obrigações assumidas pelo comprador em contrato de compra e venda mercantil.”

15 Schoueri e Galdino, amparando-se em acórdão do CARF de 2018 (CARF, Acórdão n. 1301-002.830, 3ª Câmara, 1ª Turma Ordinária, Rel. Cons. Roberto Silva Júnior, j. 13.03.20218), consignam que: “Nesse sentido, existe interpretação ampla no caso das indenizações trabalhistas, uma vez que se entende por dedutíveis todas as despesas de verbas indenizatórias decorrentes de violação direta da lei, de ‘normas criadas por convenção ou acordo coletivo, elaboradas com a intervenção dos sindicatos, e por sentença normativa da Justiça do Trabalho’. Ademais, montantes pagos em virtude de infrações a obrigações trabalhistas que derivam do contrato de trabalho devido a ‘regras veiculadas nos regulamentos internos da empresa, que criam obrigações para o empregador, também são dedutíveis’.” (SCHOUERI, Luís Eduardo; GALDINO, Guilherme. Dedutibilidade de despesas com atividades ilícitas. In: ADAMY, Pedro Augustin; FERREIRA NETO, Arthur M. (coord.). Tributação do ilícito: estudos em comemoração aos 25 anos do Instituto de Estudos Tributários – IET. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 177-178)

16 ÁVILA, Humberto. Dedutibilidade de despesas com o pagamento de indenização decorrente de ilícitos praticados por ex-funcionários. In: ADAMY, Pedro Augustin; FERREIRA NETO, Arthur M. (coord.). Tributação do ilícito: estudos em comemoração aos 25 anos do Instituto de Estudos Tributários – IET. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 83-103.

17 CARRAZZA, Roque Antonio. Reflexões sobre a obrigação tributária. São Paulo: Noeses, 2010, p. 266.

18 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 10. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 162.

19 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Tributação em torno de atos ilícitos (noções gerais e Imposto de Renda). In: ADAMY, Pedro Augustin; FERREIRA NETO, Arthur M. (coord.). Tributação do ilícito: estudos em comemoração aos 25 anos do Instituto de Estudos Tributários – IET. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 105.

20 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 697.

21 SCHOUERI, Luís Eduardo; GALDINO, Guilherme. Dedutibilidade de despesas com atividades ilícitas. In: ADAMY, Pedro Augustin; FERREIRA NETO, Arthur M. (coord.). Tributação do ilícito: estudos em comemoração aos 25 anos do Instituto de Estudos Tributários – IET. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 212.

22 SCAFF, Fernando Facury. Incide Imposto de Renda nos acordos de leniência e nas colaborações premiadas? Portal Consultor Jurídico – CONJUR (online). Disponível em: https://www.conjur.com.br/2021-set-20/justica-tributaria-incide-ir-acordos-leniencia-colaboracoes-premiadas. Acesso em: 14 nov. 2021.

23 ÁVILA, Humberto. Dedutibilidade de despesas com o pagamento de indenização decorrente de ilícitos praticados por ex-funcionários. In: ADAMY, Pedro Augustin; FERREIRA NETO, Arthur M. (coord.). Tributação do ilícito: estudos em comemoração aos 25 anos do Instituto de Estudos Tributários – IET. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 83-103.

24 DERZI, Misabel Abreu Machado. Direito tributário, direito penal e tipo. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: RT, 2007, p. 153-154.

25 DERZI, Misabel Abreu Machado. A intributabilidade do ilícito penal. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva; GOMES, Luiz Flávio; DERZI, Misabel Abreu Machado; BALERA, Wagner (org.). Crimes contra a ordem tributária. São Paulo: IOB, 2002, p. 84.

26 DERZI, Misabel Abreu Machado. A intributabilidade do ilícito penal. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva; GOMES, Luiz Flávio; DERZI, Misabel Abreu Machado; BALERA, Wagner (org.). Crimes contra a ordem tributária. São Paulo: IOB, 2002, p. 84.

27 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 10. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 165 (nota de rodapé n. 61).

28 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 10. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 165.

29 SCHOUERI, Luís Eduardo. O mito do lucro real na passagem da disponibilidade jurídica para a disponibilidade econômica. In: LOPES, Alexsandro Broedel; MOSQUERA, Roberto Quiroga (org.). Controvérsias jurídico-contábeis (aproximações e distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2010. vol. 1, p. 241-264.

30 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 10. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 159-160.

31 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 10. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 160.

32 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 10. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 162.

33 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 10. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021, p. 162.

34 Sobre a irrelevância da perda de perdimento à definição da (in)tributabilidade dos atos ilícitos, é ver: FOLLONI, André. Importações puníveis com pena de perdimento da mercadoria e reflexos tributários. In: ADAMY, Pedro Augustin; FERREIRA NETO, Arthur M. (coord.). Tributação do ilícito: estudos em comemoração aos 25 anos do Instituto de Estudos Tributários – IET. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 147 e ss.

35 CARRAZZA, Roque Antonio. Reflexões sobre a obrigação tributária. São Paulo: Noeses, 2010, p. 268 e ss.

36 CARRAZZA, Roque Antonio. Reflexões sobre a obrigação tributária. São Paulo: Noeses, 2010, p. 268.

37 Nesse sentido, prevê o art. 61 da Lei n. 8.981/1995 a incidência do IRPJ-Fonte, à alíquota de 35%, sobre pagamento efetuado a beneficiário não identificado.

38 Custos têm conceituação própria, positivada no caput do art. 46 da mesma Lei n. 4.506/1964, pelo qual seriam custos as despesas e os encargos relativos à aquisição, produção e venda dos bens e serviços objeto das transações de conta própria.

39 ÁVILA, Humberto. Dedutibilidade de despesas com o pagamento de indenização decorrente de ilícitos praticados por ex-funcionários. In: ADAMY, Pedro Augustin; FERREIRA NETO, Arthur M. (coord.). Tributação do ilícito: estudos em comemoração aos 25 anos do Instituto de Estudos Tributários – IET. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 90.

40 A sistemática de pontuação imprimida às carteiras de habilitação dos motoristas apenas corrobora a usualidade e normalidade das infrações de trânsito. Inclusive atento à normalidade da situação, editou recentemente o legislador a Lei n. 14.071/2020 que, alterando o Código de Trânsito Brasileiro, aumentou de 20 (vinte) pontos para 40 (quarenta) pontos o limite anual permitido, caso inexista nenhuma infração gravíssima dentre as computadas (conforme atual art. 261, I, “c”, do CTB).

41 Nesse sentido: “As multas devidas pelas empresas de telecomunicações à Anatel em virtude do descumprimento de norma regulatória, ou, mais precisamente, de compromisso expressamente assumido em Contrato [são] usuais porque, inobstante os esforços envidados e os investimentos liberados no aperfeiçoamento dos serviços, a rigidez das normas do setor e as dificuldades supervenientes ao processo de privatização acabaram por obstar o atendimento de determinadas obrigações, culminando na imposição das multas.” (BICHARA, Luiz Gustavo A. S.; RABELO FILHO, Antônio Reinaldo; FALCÃO, Manuella Vasconcelos. A dedutibilidade das multas pagas em favor da Anatel da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. In: MOREIRA, André Mendes; RABELO FILHO, Antônio Reinaldo; CORREIA, Armênio Lopes (org.). Direito das telecomunicações e tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2006, fls. 292/310)

42 “Assim também ocorre com as multas contratuais por atraso na entrega de obras ou em virtude de outros inadimplementos contratuais. O ideal é a empresa ser eficiente e não incorrer nestes gastos. Necessários, literal e diretamente, talvez eles não sejam, pois, pelo contrário, prejudicam a empresa. Mas são dedutíveis porque decorrem de atividade da empresa, relacionando-se com ela.” (OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 697)

43 “A nosso sentir, independentemente de qualquer disposição legal neste sentido, também devem ser deduzidas da base de cálculo in concreto do IR as multas recolhidas pela empresa, bem como as despesas necessárias à sua atividade e à manutenção da respectiva fonte produtora. [...] Em todos esses casos não se está diante de meros favores, benesses ou isenções, mas de diretrizes implicitamente postas pela Constituição para que venha determinada a verdadeira renda tributável pela pessoa jurídica – vale dizer, o acréscimo patrimonial por ela experimentado, ao longo do período de apuração.” (CARRAZZA, Roque Antonio. Imposto sobre a Renda. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 95)

44 No sentido de totalidade (universalidade) dos fatores positivos e negativos que influenciem na determinação do acréscimo patrimonial do contribuinte (ÁVILA, Humberto. Dedutibilidade de despesas com o pagamento de indenização decorrente de ilícitos praticados por ex-funcionários. In: ADAMY, Pedro Augustin; FERREIRA NETO, Arthur M. (coord.). Tributação do ilícito: estudos em comemoração aos 25 anos do Instituto de Estudos Tributários – IET. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 85).

45 “De acordo com a jurisprudência do STF, em consonância com a doutrina indicada até aqui, não se concebe a existência de renda sem a ocorrência de um acréscimo patrimonial, ponto sobre o qual não parece mais pairar qualquer controvérsia. A esse respeito, portanto, não há o que interpretar, cabendo ao exegeta apenas descrever (e não adscrever) o conteúdo já atribuído aos vocábulos pelo órgão competente para fazê-lo.” (FONSECA, Fernando D. de Moura. Imposto sobre a Renda: uma proposta de diálogo com a contabilidade. 1. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2018, p. 112)

46 Schoueri é expoente da parcela da doutrina nacional que entende serem tipológicas (e não conceituais, ou classificatórias) as disposições constitucionais acerca da repartição de competências tributárias. A conceituação materialidade tributável ficaria a cargo da lei complementar, por força do art. 146, III, “a”, da CR/1988. Sobre o tema, é ver: SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 10. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021.

47 Também Fernando Aurelio Zilveti e Daniel Azevedo Nocetti, sobretudo quanto ao Imposto de Renda, fazem coro ao posicionamento de Schoueri, ao sustentarem que: “A renda no sistema tributário brasileiro é a principal expressão do tipo como forma de pensar. Nesse sentido, desde a Constituição Federal, o Código Tributário Nacional e as leis pertinentes revelam o tipo em sua expressão mais pura.” (ZILVETI, Fernando Aurelio; NOCETTI, Daniel Azevedo. Presunção de renda no direito tributário na era digital. In: ZILVETI, Fernando Aurelio et. al. (coord.). Direito tributário: princípio da realização no Imposto sobre a Renda. Estudos em homenagem a Ricardo Mariz de Oliveira. São Paulo: IBDT, 2019, p. 119)

48 SCHOUERI, Luís Eduardo. Considerações acerca da disponibilidade da renda: renda disponível é renda líquida. In: ZILVETI, Fernando Aurelio et. al. (coord.). Direito tributário: princípio da realização no Imposto sobre a Renda. Estudos em homenagem a Ricardo Mariz de Oliveira. São Paulo: IBDT, 2019, p. 25 e ss.

49 SCHOUERI, Luís Eduardo. Considerações acerca da disponibilidade da renda: renda disponível é renda líquida. In: ZILVETI, Fernando Aurelio et. al. (coord.). Direito tributário: princípio da realização no Imposto sobre a Renda. Estudos em homenagem a Ricardo Mariz de Oliveira. São Paulo: IBDT, 2019, p. 25 e ss.

50 SCHOUERI, Luís Eduardo. Considerações acerca da disponibilidade da renda: renda disponível é renda líquida. In: ZILVETI, Fernando Aurelio et. al. (coord.). Direito tributário: princípio da realização no Imposto sobre a Renda. Estudos em homenagem a Ricardo Mariz de Oliveira. São Paulo: IBDT, 2019, p. 23.

51 ÁVILA, Humberto. O “postulado do legislador coerente” e a não-cumulatividade das contribuições. In: ROCHA, Valdir (coord.). Grandes questões atuais do direito tributário. São Paulo: Dialética, 2007. vol. 11, p. 175-183.

52 ÁVILA, Humberto. Teoria da igualdade tributária. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2021.