Imposto de Renda e Indenização: Análise da Evolução Jurisprudencial nos Tribunais Superiores

Income Tax and Indemnification: Analysis of Jurisprudential Evolution in the Superior Courts

Relatório de Pesquisa Realizada pelos Membros do Grupo 1 de Pesquisa do “IBDT Jovem”

Coordenador: João Francisco Bianco

Mestre e Doutor em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo – USP. Professor do Mestrado Profissional em Direito Tributário Internacional oferecido pelo IBDT. Advogado.

Relatora: Marina Souza de Moraes Lopes

Pós-graduada em Direito Tributário Brasileiro pelo IBDT.

Aline Frota Parente Arrais de Moura

MPhil em Direito pela Universidade de Birmingham – Reino Unido. E-mail: aline@arraisdemoura.com.br.

Bruno Cesar Fettermann Nogueira dos Santos

Mestrando em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Pesquisador no Instituto Brasileiro de Direito Tributário. E-mail: brunocfns@usp.br.

Bruno Fulco Campilongo

Pós-graduando em Direito Tributário Brasileiro pelo IBDT. E-mail: brunocampilongo@hotmail.com.

Diogo Olm Arantes Ferreira

Mestrando em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Especialista em Direito Tributário Internacional pelo IBDT. Advogado. E-mail: diogo.olm@hotmail.com.

Felipe de Carvalho Pavão

Profissional da Contabilidade, Pós-graduado em Planejamento Tributário. Advogado em São Paulo, Especialista em Direito Tributário (USJT). Mestrando em Direito Tributário Internacional e Comparado (IBDT). E-mail: felipe_pavao@yahoo.com.br.

Maria Carolina Lopes Torres Fernandes

Graduada e Especialista em Direito Tributário pela UFRN. Advogada em São Paulo. E-mail: mariacarolinatorres@outlook.com.br.

Natanael Oliveira da Cruz

Pós-graduando em Direito Tributário Brasileiro pelo IBDT. E-mail: cruznatanael94@gmail.com.

Tatiana Caroline de Mesquita

Advogada em São Paulo. Especialista em Direito Tributário Internacional pelo IBDT e em Direito Tributário pela FGV. E-mail: tatiana.c.mesquita@hotmail.com.

Resumo

O objetivo deste artigo é examinar a evolução jurisprudencial dos precedentes do Supremo Tribunal Federal – STF e do Superior Tribunal de Justiça – STJ sobre o tema da incidência de Imposto de Renda sobre parcelas indenizatórias, com foco na identificação de pontos comuns e na análise crítica da coerência e consistência das decisões.

Palavras-chave: Imposto de Renda, indenização, acréscimo patrimonial.

Abstract

The purpose of this article is to demonstrate the jurisprudential evolution of the Federal Supreme Court – STF and the Superior Court of Justice – STJ precedents on the subject of the incidence of Income Tax on claimed indemnifications, focusing on the identification of common points and the critical analysis of consistency of the decisions.

Keywords: Income Tax, indemnifications, equity Increase.

I – Introdução

A judicialização de temas tributários no Brasil é histórica1 e uma constante nesses debates judiciais ao longo do tempo envolveu a não incidência de Imposto de Renda sobre determinada verba ou pagamento em razão de sua natureza indenizatória. As primeiras discussões localizadas sobre o tema datam da década de 50 no Supremo Tribunal Federal (STF) e elas se perpetuam até hoje, verificando-se ao longo dos anos variações sobre o tipo de parcela paga sob exame, mas não no debate em si que envolve invariavelmente a análise da incidência de Imposto de Renda sobre indenizações.

A existência de debates jurídicos antigos em matéria tributária nem sempre conduzem a uma evolução consistente e coerente da jurisprudência. Ciente disso e diante de uma provocação apresentada pelo Professor Luís Eduardo Schoueri em uma das tradicionais Mesas de Debates de quinta-feira do IBDT, o grupo IBDT Jovem se viu desafiado a identificar o entendimento dos Tribunais Superiores no que tange à incidência do Imposto de Renda sobre verbas indenizatórias.

Após longa pesquisa nos Tribunais Superiores, em especial junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), o presente artigo pretende apresentar o histórico de interpretações do STF e do STJ sobre a incidência de Imposto de Renda sobre as indenizações, destacando-se os principais marcos verificados e os votos que os representam, chegando até o momento atual de 2021.

Antes de passar para análise do histórico de julgamentos e seus marcos, necessário explicitar a metodologia utilizada para o desenvolvimento da pesquisa e, em seguida, iniciar a análise acerca da posição do STF sobre a competência jurisdicional para julgamento da matéria do Imposto de Renda sobre as indenizações.

II – Metodologia e desafios da pesquisa sobre indenizações

A pesquisa desenvolvida partiu inicialmente da busca de decisões no STF e no STJ a partir de temas dentro do universo Imposto de Renda e indenizações, analisando-se os julgamentos mais antigos localizados até os mais recentes. Nessa primeira fase da pesquisa analisaram-se julgamentos envolvendo indenizações pagas a pessoas físicas e jurídicas por desapropriação2, rescisão de contratos3, relações de trabalho (férias, programa de demissão voluntária, gratificações, horas extras, auxílios, demissão sem justa causa)4, dano moral5 e juros6.

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Após a identificação dos julgados, e tendo em vista o elevado volume de decisões localizadas, partiu-se então para organizá-los por data de julgamento, e não por data de publicação, bem como filtrando-se aqueles que se mostravam mais relevantes em cada tema específico, quais sejam, precedentes que culminaram em uniformização do entendimento de Seção, Súmulas Vinculantes, julgamentos em sistemática de repercussão geral ou recursos repetitivos.

Organizado o panorama geral da pesquisa, por data de julgamento e por tema, passou-se a analisar os julgamentos de forma a aferir os critérios gerais adotados pelos julgadores para concluir pela incidência ou não incidência de Imposto de Renda sobre determinada verba dita indenizatória, bem como identificando-se os julgamentos mais relevantes e que marcaram a evolução e os caminhos seguidos pela jurisprudência.

III – Da competência para analisar a incidência de Imposto de Renda sobre indenizações

Repassando historicamente as decisões do STF e do STJ que analisaram o tema, verifica-se que as mais antigas datam das décadas de 50/60 e envolveram casos de desapropriação.

Alguns Recursos Extraordinários7, ao analisarem os valores recebidos em decorrência de processos de desapropriação, concluíram pela sua caracterização como de natureza indenizatória. E como à época tais valores sujeitavam-se à incidência de Imposto de Renda, os julgados determinaram que quem causou o dano deveria arcar com tal imposto, de modo a não prejudicar a própria indenização.

Tal linha interpretativa culminou na edição da Súmula n. 493 aprovada em Sessão Plenária de 3 de dezembro de 1969, que concluiu que:

“O valor da indenização, se consistente em prestações periódicas e sucessivas, compreenderá, para que se mantenha inalterável na sua fixação, parcelas compensatórias do imposto de renda, incidente sobre os juros do capital gravado ou caucionado, nos termos dos arts. 911 e 912 do Código de Processo Civil.”

Outro ponto relevante desse histórico de decisões sobre o tema no STF foi a decisão proferida em 1987 que analisou a Representação n. 1260. Na ocasião, aquela Corte considerou inconstitucional o art. 1º, § 2º, II, do Decreto-lei n. 1.641/19788 que equiparava a desapropriação de imóveis à sua alienação para fins de incidência do imposto de renda. Esse dispositivo contrariou o entendimento anterior do STF no sentido de que o valor recebido a título de indenização por desapropriação não poderia ser impactado pelo Imposto de Renda.

Por outro lado, verificou-se que, a partir de 1998, o STF passou a considerar a análise do tema envolvendo a incidência de Imposto de Renda sobre parcelas indenizatórias como de competência exclusiva do STJ, o que se consolida em 2009 através do Agravo de Instrumento (AI) n. 705.941em Sessão Plenária realizada em 19 de novembro de 2009:

“Ementa: Recurso. Extraordinário. Incognoscibilidade. Rescisão de contrato de trabalho. Verbas rescisórias. Natureza jurídica. Definição para fins de incidência de Imposto de Renda. Matéria infraconstitucional. Ausência de repercussão geral. Agravo de instrumento não conhecido. Não apresenta repercussão geral o recurso extraordinário que, tendo por objeto a definição da natureza jurídica de verbas rescisórias (salarial ou indenizatória), para fins de incidência de Imposto de Renda, versa sobre matéria infraconstitucional.” (AI n. 705.941 RG, Rel. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, j. 19.11.2009, DJe-071, divulg. 22.04.2010, public. 23.04.2010, Ement. vol. 2398-05, pp. 1083, RDECTRAB vol. 17, n. 190, 2010, p. 218-223)

Diante da pacificação da competência jurisdicional do STJ ocorrida em 2009, aquele tribunal, que já apresentava julgamentos sobre o tema desde 1992, tem reforçada a sua competência para julgar inúmeros processos envolvendo a tributação das mais diversas verbas ditas indenizatórias. Vejamos então o histórico dessas decisões do STJ.

Importa anotar, outrossim, que neste ano de 2021 o STF, alterando seu entendimento anterior, readmitiu a sua competência para o julgamento da matéria no Recurso Extraordinário (RE) n. 855.091, que tratou da incidência de Imposto de Renda sobre os juros de mora devidos pelo atraso no pagamento de remuneração pelo exercício de emprego, cargo ou função, como se verá em detalhes no item IV.4.

IV – O histórico de julgamentos do STJ analisando a incidência de IR sobre indenizações

Como advertido anteriormente, ao iniciar a pesquisa sobre as decisões do STJ envolvendo Imposto de Renda e indenizações, verificou-se um elevado número de julgados. Diante disso, a pesquisa prosseguiu com a catalogação das decisões por data dos julgamentos e temas, de modo que se tornasse possível visualizar, em uma linha do tempo, a evolução da orientação jurisprudencial sobre a tributação das parcelas ditas indenizatórias, bem como as conclusões dos julgamentos realizados.

Alguns temas foram consolidados na jurisprudência, culminando na edição de Súmulas Vinculantes. Destacam-se as três primeiras Súmulas identificadas e que coincidem, naturalmente, com os processos mais antigos tratando do tema:

• 1994 – Súmula n. 1259 – Férias não gozadas: “O pagamento de férias não gozadas por necessidade do serviço não está sujeito a incidência do Imposto de Renda.”

• 1995 – Súmula n. 13610 – Licença-prêmio: “O pagamento de licença-prêmio não gozada por necessidade do serviço não está sujeito ao Imposto de Renda.”

• 1998 – Súmula n. 21511 – Programa de demissão voluntária: “A indenização recebida pela adesão a programa de incentivo à demissão voluntária não está sujeita à incidência do imposto de renda.”

De fato, a primeira decisão no STJ localizada sobre indenização e incidência de Imposto de Renda envolveu férias não gozadas, tendo sido proferida em 6 de outubro de 1993 no Recurso Especial (REsp) n. 34.988 que, inclusive, é um dos precedentes da citada Súmula n. 125.

A partir daí, os julgamentos passaram por outros temas como licença-prêmio e programas de demissão voluntária, mas também por juros referentes aos valores recebidos a título de desapropriação, dano moral, gratificações espontâneas em demissões sem justa causa, horas extras, adicional noturno, 1/3 de férias, férias proporcionais, férias gozadas, terço constitucional, auxílio-condução, auxílio-creche, juros de mora vinculados a verbas trabalhistas.

Muitos desses temas, como se percebe, relacionam-se à incidência do imposto de renda de pessoas físicas sobre verbas decorrentes de relação de trabalho e que, de fato, representam a maioria dos julgamentos que alcançaram os Tribunais Superiores.

A partir da análise de todos os julgamentos, buscou-se identificar o entendimento do STJ sobre o tema, verificando-se se há argumentos jurídicos comuns que permeiam todos os julgados, os momentos de linearidade dos julgamentos e momentos chave nos quais houve a demarcação de mudanças ou continuidade de entendimentos.

É o que se passa a demonstrar a partir de intervalos de tempo nos quais foi possível a identificação de pontos comuns, denominados a seguir, apenas para fins didáticos, como “primeiro momento”, “segundo momento”, “terceiro momento” e “quarto momento”.

IV.1 – Primeiro momento – os julgamentos até 2005

Conforme explicitado anteriormente, foram localizadas muitas decisões no STJ com foco no debate sobre a não incidência de Imposto de Renda sobre verbas indenizatórias, examinando as mais variadas naturezas de pagamento.

Traçando-se uma linha do tempo dos julgamentos catalogados, verificou-se certa linearidade de conclusões e embasamentos jurídicos até 2005, ano no qual o Ministro Teori Zavascki analisa o tema com maior profundidade no REsp n. 637.623/PR.

Para ilustrar os primeiros julgamentos envolvendo indenização e Imposto de Renda, cita-se como exemplo o julgamento ocorrido em 6 de outubro de 1993, da Primeira Seção, quando se analisou os Embargos de Divergência ao Recurso Especial (EREsp) n. 32.829/SP sobre a incidência de Imposto de Renda sobre licença-prêmio não gozada. Na ocasião, concluiu-se que no caso de indenização por licença-prêmio não gozada, indeferida por submissão ao interesse público, “o correspondente pagamento indenizatório não significa acréscimos patrimoniais ou riqueza nova disponível, mas simples transformação, compensando dano sofrido” e, por essa razão, não sujeita à incidência do imposto.

De forma semelhante, logo na sequência, em 6 de dezembro de 1994, a Primeira Turma do STJ, ao analisar, no REsp n. 34.988, se os valores recebidos a título de férias não gozadas seriam, ou não, fato gerador do Imposto de Renda, parte da premissa de que “as indenizações, pela própria natureza jurídica, não causam aumento de patrimônio algum, pois correspondem a uma recomposição; a um prejuízo anteriormente sofrido pela pessoa que as recebe” e, por essa razão, conclui que indenização “não pode ser considerada renda, pois não redunda em aumento de patrimônio”. O precedente, posteriormente, deu origem à Súmula n. 125, destacada anteriormente.

Já em 5 de agosto de 1996, considerando-se pacífico o entendimento de que sobre o valor da indenização por desapropriação não haveria incidência de Imposto de Renda, o STJ analisou por meio do REsp n. 93.518/SP se a mesma lógica interpretativa seria aplicada aos juros recebidos com a indenização. E a conclusão, na ocasião, foi no sentido de que:

“[…] os juros compensatórios integram a indenização pela perda da propriedade do bem expropriado. Desse modo, não se trata de juro remunerador de capital (moratório), sendo os compensatórios consequentes dos danos causados pela privação do uso e gozo da propriedade, enquanto o devedor (expropriante) não concretiza o ressarcimento pela diminuição patrimonial do expropriado.

[…] Nesse contexto, inexistente ‘riqueza nova’ proveniente da ‘renda’, a expressão pecuniária dos juros compensatórios, recebidos a título de indenização, não alterando a capacidade contributiva do expropriado, não podem ser tributáveis por meio do Imposto de Renda, constituindo ilegalidade a retenção das correspondentes parcelas integrativas do ‘justo preço’ (arts. 5º, XXIV, e 182, § 3º, C.F.).”12

Posteriormente, em 24 de novembro de 1998, adveio a já mencionada Súmula n. 215, que consolidou o afastamento da incidência do imposto de renda sobre a indenização recebida no contexto de adesão ao programa de incentivo à demissão voluntária.

Em 2002, a Primeira Turma do STJ, por meio do REsp n. 410.347/SC analisou se a indenização por dano moral sujeitar-se-ia ou não ao Imposto de Renda e concluiu que “as verbas indenizatórias que apenas recompõem o patrimônio do indenizado, físico ou moral, tornam infensas à incidência do imposto de renda”.

Em 9 de março de 2004, a Segunda Turma do STJ, por meio do REsp n. 402.035/RN também analisou a incidência de Imposto de Renda sobre o dano moral, concluindo, igualmente, reconhecendo a não incidência do tributo sobre “as verbas da reparação de danos morais, por sua natureza indenizatória, não há falar em rendimento tributável, o que afasta a aplicação do art. 718 do RIR/99 na espécie em comento”.

Dessa forma, o que se constatou na análise dos julgamentos sobre o tema no STJ até início dos anos 2000, mais especificamente até 2005 – aqui denominado como “primeiro momento” da jurisprudência do referido tribunal sobre indenizações e Imposto de Renda – foi a utilização comum dos seguintes argumentos jurídicos: (i) não há incidência de Imposto de Renda sobre indenizações, pois não há acréscimo patrimonial; (ii) a indenização tem caráter reparatório e compensatório de um prejuízo sofrido e (iii) os julgados não avaliam se o pagamento enquadra-se no conceito de indenização em si, bem como não fazem diferenciação entre patrimônio material e imaterial.

IV.2 – Segundo momento – 2005 – o julgamento do Recurso Especial
n. 637.623/PR com voto do Ministro Relator Teori Zavascki

Se até 2005 verificou-se que os julgamentos partiam, em grande parte, da premissa de que indenização não gerava acréscimo patrimonial e, por consequência, não implicava incidência de Imposto de Renda, quando o Ministro Teori Albino Zavascki analisou o tema, o fez com a profundidade que ainda não tinha se verificado nos julgamentos anteriores.

Como relator, o Ministro Teori analisou se a gratificação espontânea em demissão sem justa causa teria natureza indenizatória, bem como a sua tributação pelo Imposto de Renda, realizando distinções necessárias e relevantes que tornaram seu voto um verdadeiro marco sobre o tema13.

Em seu voto, ele sustenta a premissa de que, nos termos do art. 43 do Código Tributário Nacional (CTN), “não apenas as rendas genericamente consideradas, mas também os acréscimos patrimoniais de qualquer natureza configuram fato gerador do Imposto de Renda”14.

Assim, logo no início do seu voto o Ministro questiona o até então aceito “dogma” de que não incide Imposto de Renda sobre pagamentos referentes a prestações de natureza indenizatória, demonstrando o equívoco da adoção dessa premissa, já que o pagamento de indenização pode, ou não, acarretar acréscimo patrimonial. E ao descontruir esse dogma que dominava grande parte dos julgados até aquela ocasião, o Ministro Teori passa à análise do conceito de indenização e o seu pressuposto de reparação por lesão causada a um bem jurídico material ou imaterial.

É que, ao analisar o caso, o Ministro apresentou balizas importantes para a análise da incidência de Imposto de Renda sobre indenizações, enfrentando pontos que até então não tinham sido analisados pelas decisões anteriores, entre elas a própria configuração de determinado pagamento como tendo natureza indenizatória. Com muita propriedade, assim o Ministro descreve a indenização:

“Ora, aquilo que geralmente se entende por indenização é a prestação em dinheiro, substitutiva da prestação específica, destinada a reparar ou recompensar o dano causado a um bem jurídico, quando não é possível ou não é adequada a restauração in natura do bem jurídico atingido. Não tem natureza indenizatória, sob esse aspecto, o pagamento, ainda quando feito por força de sentença judicial, correspondente a uma prestação que originalmente (= antes e independentemente de ocorrência de lesão) era devida em dinheiro (v.g., pagamento por horas extras trabalhadas, ou 13º salário). Em tal caso, o que há, simplesmente, é o adimplemento in natura da obrigação, ainda que fora do prazo ou mediante execução forçada. Não tem natureza indenizatória, igualmente, o pagamento que não corresponda à retribuição ou à reparação de um dano, ou seja, que não tenha como pressuposto e como causa um ato ilícito causador de lesão ao patrimônio material ou imaterial. Pagamento espontâneo, a título de gratificação, jamais pode assumir natureza indenizatória.”

Interessante destacar que, ao analisar que tipo de pagamento teria ou não natureza indenizatória, o Ministro exclui desse grupo os pagamentos que eram devidos originariamente em dinheiro e que não correspondem à retribuição ou reparação de um dano.

Além disso, o Ministro Teori realizou a diferenciação entre dano de natureza patrimonial, integrante do patrimônio material, e dano de natureza não patrimonial, que envolveria o patrimônio imaterial ou moral15.

Ademais, o Ministro apresenta as diferenças entre dano material, lucro cessante e dano ao patrimônio imaterial, o que impactou na análise sobre acréscimo patrimonial e, por consequência, sobre a conclusão pela incidência ou não do Imposto de Renda:

“Em suma: a indenização que não acarreta acréscimo patrimonial é apenas aquela que se destina a recompor o dano material efetivamente causado pela lesão (= dano emergente ao patrimônio material). Relativamente a ela, não se configura fato gerador do imposto de renda. Todavia, acarreta acréscimo patrimonial (e, portanto, constitui fato gerador do imposto de renda) a indenização (a) por danos ao patrimônio imaterial (= moral), ou (b) referente a lucros cessantes ou (c) em valor que exceda ao da redução patrimonial causada pela lesão.”16

O voto destaca, ainda, a possibilidade de determinado pagamento, mesmo sendo chamado de “indenização”, acarretar acréscimo patrimonial e, por consequência configurar em tese fato gerador do Imposto de Renda, mas não se sujeitar a tal incidência em razão da previsão de isenção específica pela legislação infraconstitucional. Veja-se:

“A indenização que acarreta acréscimo patrimonial configura fato gerador do imposto de renda e, como tal, ficará sujeita a tributação, a não ser que o crédito tributário esteja excluído por isenção legal, como é o caso das hipóteses dos incisos XVI, XVII, XIX, XX e XXIII do art. 39 do Regulamento do Imposto de Renda e Proventos de Qualquer Natureza, aprovado pelo Decreto 3.000, de 31.03.99.”

E conclui:

“No caso, o pagamento feito pelo empregador a seu empregado, a título de gratificação, em reconhecimento por relevantes serviços prestados à empresa, não tem natureza indenizatória.”

Nessa linha, o voto do Ministro Teori conclui que o pagamento de indenização pode ou não acarretar acréscimo patrimonial, dependendo do bem jurídico a que se refere. Havendo dano ao patrimônio material, dano emergente em relação ao valor que apenas o recompõe, não há acréscimo patrimonial tributável. Por outro lado, caso o valor pago para reparação de um dano seja superior ao valor do bem material que sofreu o dano, haverá acréscimo em relação ao excedente e, portanto, sobre tal parcela haverá incidência de Imposto de Renda.

O Ministro Teori também conclui que o lucro cessante, ou seja, o valor recebido para compensar aquilo que deixou de ser auferido pela parte, assim como o valor pago para indenizar o dano a bem do patrimônio imaterial, revelam acréscimos patrimoniais e, por consequência, devem ser submetidos à incidência de Imposto de Renda.

Os termos da posição do Ministro Teori no voto do REsp n. 637.623/PR são reprisados por ele em julgamentos subsequentes, tratando de outros objetos, tais como o REsp n. 674.392/SC, que tratou dos valores recebidos a título de adicional noturno, horas extras e também gratificações espontâneas, bem como no REsp n. 644.840/SC, que tratou de gratificação espontânea, férias proporcionais e 1/3 de férias.

Além disso, sua posição influenciou os julgamentos subsequentes, levando à conclusão na Primeira Turma e na Segunda Turma do STJ pela incidência de Imposto de Renda sobre horas extras no julgamento dos EREsp n. 695.499/RJ17.

Os termos do voto do Ministro Teori Zavascki sobre a matéria chegaram a influenciar, em 2007, a análise sobre a incidência de Imposto de Renda sobre os valores recebidos a título de dano moral no REsp n. 748.86818, eis que o Ministro Luiz Fux, que era o relator, e votou pela não incidência de Imposto de Renda sobre tais valores, restou vencido. Prevaleceu o entendimento do Voto do Ministro Teori no sentido de que, tratando-se de dano ao patrimônio imaterial, a indenização recebida tinha natureza de acréscimo patrimonial e, por consequência, sujeitava-se à incidência de Imposto de Renda.

A partir desse julgamento, criou-se nítida dissonância entre o entendimento da Primeira Turma do STJ que, na ocasião, concluiu pela incidência de Imposto de renda sobre o dano moral, e a posição da Segunda Turma do STJ cujos julgamentos concluíam de forma, até então pacífica, pela não incidência de Imposto de Renda sobre o dano moral.

Por essa razão, o tema foi levado a julgamento da 1ª Seção que uniformizou o entendimento e trouxe, sob o ponto de vista da presente análise, novo marco no histórico da jurisprudência do STJ sobre o tema. Passa-se, a seguir, à análise dos detalhes desse julgamento que marca o que chamamos neste artigo como o início do “terceiro momento” da jurisprudência do STJ sobre indenizações e Imposto de Renda.

IV.3 – Terceiro momento – o julgamento sobre o dano moral – 2008

A análise sobre a incidência de Imposto de Renda sobre valores recebidos a título de dano moral pela 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça ocorreu no julgamento do REsp n. 963.387/RS, com relatoria do Ministro Herman Benjamim.

O caso concreto envolvia um indivíduo que teve seus documentos furtados e seus dados utilizados por um criminoso que se fez passar por ele. A vítima era advogado militante e, após o furto, tomou as providências cabíveis o que, contudo, não evitou que, quando fosse renovar sua carteira de habilitação, recebesse voz de prisão em nítida confusão com o criminoso que utilizou seus documentos e havia fugido da prisão. Diante dessas circunstâncias, portanto, impetrou habeas corpus preventivo e requereu indenização ao Estado do Rio Grande do Sul cujo resultado foi procedente à vítima, tendo o Estado sido condenado ao pagamento de R$ 60.000,00 à vítima.

O Relator, em seu voto, explicitou o histórico de decisões do STJ sobre o tema, afirmando que a jurisprudência era pacífica no sentido da não incidência de Imposto de Renda sobre indenização recebida a título de dano moral, até o julgamento, pela Primeira Turma, do REsp n. 748.868, quando prevaleceu o voto do Ministro Teori no sentido da incidência de Imposto de Renda.

No entanto, ele resgata os termos do voto do Ministro Luiz Fux no referido REsp n. 748.868 da 1ª Turma, que restou vencido, e conclui que sobre o valor da indenização recebida a título de dano moral não deve incidir Imposto de Renda eis que, nesse caso, o valor recebido “limita-se a recompor o patrimônio imaterial da vítima, atingido pelo ato ilícito praticado”, ou seja, não há riqueza nova oriunda dos frutos do capital, do trabalho ou da combinação de ambos, tratando-se de hipótese de não incidência e não de isenção19.

Argumenta ainda que, no Brasil, vigora o “princípio da reparação integral” que, segundo ele, é “uma exigência fundamental de justiça, que dispensa justificação”20, além de afirmar que tributar o valor recebido a título de dano moral transformaria o “Erário simultaneamente em sócio do infrator e beneficiário da dor do contribuinte”21. Por fim, conclui afirmando que deve existir isonomia de tratamento entre patrimônio material e patrimônio moral e argumentando que o desequilíbrio entre o tratamento desses patrimônios poderia levar a situações absurdas em que o dano material seria mais valorizado que o dano a alguma parte do corpo. Nas suas palavras:

“E, mais grave, concedendo-se tratamento mais benéfico aos bens materiais em desfavor dos bens da personalidade. Na situação atual, quem perde as pernas ou os dois olhos em uma sessão de tortura policial é mais gravosamente tratado, para fins de Imposto de Renda, do que aquele que bate o seu carro importado.”

O Ministro Teori Zavascki, por sua vez, em seu voto, reafirma os argumentos e conclusões apresentados no REsp n. 748.868 e tenta rebater as alegações do Ministro Herman Benjamim. Segundo seu entendimento, sustentar que a “indenização por dano moral não acarreta um acréscimo patrimonial é ir contra a natureza das coisas”. E se o princípio da reparação integral impede a tributação, então necessariamente o mesmo raciocínio deveria ser aplicado ao salário, que também é irredutível. Por fim, contra o argumento de que o Estado não pode ser sócio da dor do indenizado, relembra o princípio do “non olet” que autoriza a tributação do ilícito. De todo modo, os argumentos do Ministro Teori Zavascki não foram suficientes para convencer os demais Ministros. Estes acabaram votando com o Relator e unificaram o entendimento do STJ no sentido de reconhecer a não incidência de Imposto de Renda sobre os valores recebidos a título de dano moral.

Apesar da conclusão alcançada nesse relevante julgamento da 1ª Seção envolvendo a incidência de Imposto de Renda sobre o dano moral e ter restado vencido o Ministro Teori Zavascki nesse aspecto, o que se verificou é a permanente influência, ainda que parcial, do voto do Ministro Teori proferido no REsp n. 637.623/PR nos julgamentos posteriores. Como se demonstrará, a seguir, o voto do Ministro Teori Zavascki foi utilizado como referência inclusive para a conclusão do julgamento ocorrido em 15 de março de 2021 no STF do RE n. 855.091, com relatoria do Ministro Dias Toffoli.

IV.4 – Momento atual – dos julgamentos posteriores a 2008 e a retomada do tema pelo STF

Apesar dos julgamentos do STF ocorridos em 2009 terem concluído que a competência para análise sobre a incidência de Imposto de Renda seria do STJ, neste ano de 2021 o assunto voltou ao STF através do RE n. 855.091, que tratou no Tema de Repercussão Geral n. 808 sobre a incidência de Imposto de Renda sobre os juros de mora devidos pelo atraso no pagamento de remuneração pelo exercício de emprego, cargo ou função.

A primeira dúvida que surgiu foi o motivo de tal retorno do tema ao STF e se poderia haver mudança de entendimento sobre tal competência jurisdicional do Tribunal.

Em realidade, no julgamento, o Ministro Relator Dias Toffoli sugere que a matéria seria infraconstitucional, baseando seu voto, inclusive, em grande parte, em decisões do STJ sobre o tema. Segundo palavras do referido Ministro Relator, a subida do tema para o STF ocorreu em razão de Arguição de Inconstitucionalidade n. 5020732-11.2013.404.0000 realizada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, nos termos do art. 97 e 948 e 950 do CPC. Veja-se a posição do Ministro Toffoli no seguinte trecho do seu voto quando da análise da Repercussão Geral, oportunidade na qual explica que, como a interposição do RE foi baseada no art. 102, inciso III, “b”, da Constituição22, caberia ao STF apreciar a matéria:

“Como se vê, naquele precedente o acórdão impugnado decidiu a causa com base na legislação infraconstitucional, sendo que eventual afronta ao texto constitucional seria, caso ocorresse, apenas indireta ou reflexa. No caso dos autos, todavia, o Tribunal Regional aplicou decisão de seu órgão especial, proferida em sede de arguição de inconstitucionalidade, na qual o órgão reconheceu como não recepcionado o parágrafo único do art. 16 da Lei nº 4.506/64 e declarou, sem redução de texto, a inconstitucionalidade do § 1º do art. 3º da Lei nº 7.713/1988 e do art. 43, inciso II, § 1º, do Código Tributário Nacional, a fim de afastar a incidência de imposto de renda sobre os juros de mora recebidos em razão do atraso no pagamento percebido por pessoa física. Note-se que tal interpretação se deu em desacordo com a interpretação da legislação federal conferida pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.227.133. Como o recurso foi interposto também pela letra b do permissivo constitucional fato, por si só, suficiente a revelar a repercussão geral da matéria constitucional, cabe ao Supremo Tribunal Federal analisar a matéria de fundo e dar a última palavra sobre a constitucionalidade das normas federais. É de se aplicar, assim, o mesmo entendimento sobre a repercussão geral manifesto no RE nº 614.232/RS-AgR-QO, Relatora a Ministra Ellen Gracie (DJe de 4/3/11), […].”

Como se verifica por meio da análise do trecho acima transcrito, não é possível afirmar que o tema retornará à competência do STF no futuro. Nessa perspectiva, vale destacar trecho do Voto do Ministro Gilmar Mendes que não conheceu o RE, entendendo pela necessária remessa dos autos para análise pelo STJ, destacando que o TRF arguiu a inconstitucionalidade mesmo após decisão do STF no sentido de que a matéria seria infraconstitucional e que, caso se siga nessa linha, o STF ficaria refém de pauta estipulada pelos Tribunais Regionais23.

Para analisar a incidência de Imposto de Renda sobre os juros de mora recebidos no contexto do atraso no pagamento de verbas trabalhistas, o Ministro Relator resgata a jurisprudência do STJ, fazendo referência específica ao voto do Ministro Teori Zavascki no REsp n. 638.389/SP para explicitar a posição de que os valores recebidos a título de dano emergente não incrementam o patrimônio e aqueles recebidos a título de lucro cessante, estes sim, estão sujeitos ao Imposto de Renda. Confira o trecho do Voto do Ministro Dias Toffoli que demonstra a importância e a atual influência dos votos do Ministro Teori Zavascki sobre o tema:

“Na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, já há muito se afastou a tese segundo a qual as verbas indenizatórias, só por terem essa natureza, estão ipso facto fora da hipótese de incidência do imposto de renda. Isso porque a palavra indenização é ampla o suficiente para abranger, dentre outros, os valores recebidos a título de danos emergentes – que não incrementam o patrimônio – e os valores recebidos a título de lucros cessantes, esses sim tributáveis pelo IR, pois substituiriam o acréscimo patrimonial que deixou de ser auferido em razão de um ilícito. Sobre o tema, destaco o REsp nº 638.389/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Teori Zavascki, DJ de 1º/8/15.”24

Como se vê, o Ministro Relator entendeu que os valores recebidos pelo empregado a título de juros referem-se a danos emergentes e, assim sendo, visaram apenas a recompor o patrimônio do trabalhador pelo atraso no pagamento de verbas de natureza alimentar que o empregador não pagou a tempo e modo. O Ministro Toffoli justifica o enquadramento como dano emergente no seguinte sentido:

“A meu sentir, os juros de mora legais, no contexto em tela, estão fora do campo de incidência do imposto de renda, pois visam, precipuamente, recompor efetivas perdas, decréscimos, não implicando aumento de patrimônio do credor. A hipótese, portanto, é de não incidência tributária e não de isenção ou exclusão de base de cálculo. Cuidando-se a remuneração devida ao trabalhador decorrente do exercício de emprego, cargo ou função de obrigação de pagar em dinheiro, a meu modo de ver, o atraso em seu adimplemento gera danos emergentes para o credor, visto que, se houvesse o pagamento tempestivo, disso normalmente decorreriam acréscimos em seu patrimônio. Afinal, é com o dinheiro, como o auferido em razão do exercício de emprego, cargo ou função (verbas de natureza alimentar), que a pessoa organiza suas finanças, suprindo suas próprias necessidades e as de sua família, especialmente com moradia, alimentação, educação, saúde, higiene, transporte etc. E o atraso no adimplemento daquele tipo de obrigação (de pagar dinheiro) faz com que o credor busque outros meios para atender tais necessidades, como: uso do rotativo e/ou da linha de crédito do cartão de crédito, uso do cheque especial, obtenção de empréstimos, prolongamento do tempo de utilização de linha de crédito já contratada etc.”

E propôs o enunciado do tema 808 no seguinte sentido: “Não incide imposto de renda sobre os juros de mora devidos pelo atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função” que acabou sendo aprovado por maioria dos Ministros, restando vencido apenas o Ministro Gilmar Mendes.

Importante destacar algumas premissas alcançadas pelo Ministro Dias Toffoli nesse julgamento e que poderão influenciar julgamentos futuros sobre o tema envolvendo juros, quais sejam (i) o imposto de renda incide sobre acréscimo patrimonial25, (ii) “a expressão juros moratórios, que é própria do Direito Civil, designa a indenização pelo atraso no pagamento da dívida em dinheiro”26, esclarecendo que o direito aos juros de mora legais decorre de um ato ilícito imputado ao devedor, qual seja, o não pagamento dos valores em dinheiro aos quais tem direito o credor de receber nos respectivos vencimentos, e (iii) “os juros de mora legais têm natureza jurídica autônoma em relação à natureza jurídica da verba em atraso”, explicitando que não seriam frutos civis e, por isso, não se aplicaria a lógica de que a parcela acessória segue a sorte do principal.

Posto isso, importa destacar que a conclusão alcançada pelo STF no julgamento em questão foi compatível com o entendimento do STJ que culminou inclusive no julgamento do REsp n. 1.227.133/RS, em repetitivo, firmando a tese “Não incide Imposto de Renda sobre os juros moratórios legais vinculados a verbas trabalhistas reconhecidas em decisão judicial”. Não obstante, em 21 de junho de 2021, o STF afastou a modulação de efeitos de sua decisão.

Além do referido julgamento, outra decisão do STF envolvendo incidência de Imposto de Renda e parcela dita indenizatória ocorreu mais recentemente. Trata-se do RE n. 1.063.187 relativo ao tema de Repercussão Geral n. 96227 envolvendo a incidência de IRPJ e de CSLL sobre a SELIC aplicada à repetição de indébito, que foi julgado em Plenário Virtual no período de 17 a 24 de setembro de 2021.

Importante registrar que o reconhecimento da repercussão geral ocorreu em 19 de setembro de 2017, tendo o Ministro Relator Dias Toffoli votado nos mesmos termos do Tema 808, ou seja, reconhecendo os precedentes do STF que concluíram que a análise da incidência de Imposto de Renda sobre parcelas indenizatórias envolveria matéria infraconstitucional, mas concluindo pelo cabimento da análise do tema pelo STF, tendo em vista a Arguição de Inconstitucionalidade n. 5025380-97.2014.4.04.0000 do TRF da 4ª Região, que declarou inconstitucional diversos dispositivos de normas federais de tributação de pessoas jurídicas, e que o RE foi interposto com base no art. 102, inciso III, “b”, da Constituição, o que foi acolhido pela maioria dos Ministros, vencidos os Ministros Gilmar Mendes e Nunes Marques.

O julgamento em si seguiu também a mesma linha do RE n. 855.091, tendo os Ministros concluído, quanto ao mérito, por unanimidade, pela natureza indenizatória da SELIC devida sobre a repetição indébito. Vejamos o teor da decisão que foi disponibilizada durante o Plenário Virtual no site da egrégia casa:

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, apreciando o tema 962 da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário, dando interpretação conforme à Constituição Federal ao § 1º do art. 3º da Lei nº 7.713/88, ao art. 17 do Decreto-lei nº 1.598/77 e ao art. 43, inciso II e § 1º, do CTN (Lei nº 5.172/66), de modo a excluir do âmbito de aplicação desses dispositivos a incidência do imposto de renda e da CSLL sobre a taxa SELIC recebida pelo contribuinte na repetição de indébito tributário, nos termos do voto do Relator. Os Ministros Gilmar Mendes e Nunes Marques, inicialmente, não conheciam do recurso e, vencidos, acompanharam o Relator, para negar provimento ao recurso extraordinário da União, pelas razões e ressalvas indicadas. Foi fixada a seguinte tese: É inconstitucional a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores atinentes à taxa Selic recebidos em razão de repetição de indébito tributário. Sessão Virtual de 17.9.2021 a 24.9.2021.” (Destaques de nossa autoria)28

Um ponto que merece registro é que, diferentemente do julgamento do RE n. 855.091, o qual concluiu de forma compatível com posicionamento do STJ sobre o mesmo tema em sede de repetitivo, no caso do RE n. 1.063.187, o STF concluiu de forma oposta ao REsp n. 1.138.695 julgado pela sistemática de repetitivo e que havia concluído que “juros incidentes na repetição do indébito tributário, inobstante a constatação de se tratarem de juros moratórios, se encontram dentro da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, dada a sua natureza de lucros cessantes, compondo o lucro operacional da empresa”.

V – Conclusões

A análise do histórico de decisões do STJ sobre o tema da incidência de Imposto de Renda sobre as parcelas indenizatórias indica a utilização de argumentos comuns no decorrer das decisões, em especial que a incidência de Imposto de Renda somente pode ocorrer se houver efetivo acréscimo patrimonial.

No entanto, a existência de diversas decisões sobre o mesmo assunto ao longo do tempo e a utilização de argumentos jurídicos comuns não significa que os temas foram analisados em profundidade, especialmente no que tange à análise da própria hipótese de incidência do Imposto de Renda.

A definição do conceito de renda, por exemplo, seria algo de extrema relevância para fundamentar a conclusão sobre qual o tipo de parcela ou pagamento estaria ou não sujeito à incidência do imposto. O que se verificou, no entanto, foi, pelo menos inicialmente, a utilização do argumento genérico e superficial de que, sendo indenização, não haveria acréscimo patrimonial e, portanto, não haveria incidência de Imposto de Renda.

Somente a partir do voto do Ministro Teori Zavascki, no REsp n. 637.623/PR, distinções conceituais importantes foram feitas, tais como a própria conceituação de indenização, a diferenciação entre patrimônio material e imaterial e entre dano emergente ou lucro cessante. A partir desse voto, as decisões subsequentes seguiram o entendimento por ele introduzido de que o dano emergente não gera acréscimo patrimonial e, portanto, sujeita-se à incidência de Imposto de Renda, ao passo que o lucro cessante geraria acréscimo patrimonial e estaria sujeito à tributação.

Da mesma forma, nos EREsp n. 963.387/RS, também não se analisou a incidência do Imposto de Renda sobre os valores recebidos a título do dano moral na perspectiva do conceito de renda e se o valor recebido seria compatível, ou não, com os termos do art. 43 do CTN, afirmando-se apenas que se trata de mera recomposição patrimonial ou que tributar o dano moral seria colocar o Estado como “sócio” de quem sofreu o dano.

Não houve também a reflexão sobre o fato de os valores recebidos a título de indenização, seja no caso do lucro cessante, seja no caso do dano moral, tratarem-se de parcelas recebidas não por ação voluntária do recebimento do pagamento, mas sim pelo ato ou omissão ilícita de terceiro que causou o dano. E como se sabe, o fato gerador do Imposto de Renda só pode ocorrer quando derivado de ato ou negócio livremente praticado pelo contribuinte29.

E sob esse argumento, poder-se-ia chegar à conclusão até mesmo de que o antigo dogma de que “sobre parcelas indenizatórias não há incidência de Imposto de Renda” não se apresentava equivocado, já que a falta de atitude livre do contribuinte neste caso seria obstáculo para “toda e qualquer espécie de indenização e seria capaz, por si só, de excluir a incidência em todo e qualquer caso30.

Conforme afirmado inicialmente, debates jurídico-tributários antigos nem sempre conduzem a uma evolução consistente e coerente da jurisprudência, menos ainda à consolidação de uma ratio decidendi comum. Por mais que haja períodos em que as decisões do STJ apresentaram aparente alinhamento entre si, não se pode afirmar que há coerência nos argumentos jurídicos de cada decisão diante de casos concretos, assim como não se pode afirmar que o tema está pacificado, já que, conforme explicitado, há diversos argumentos jurídicos inexplorados.

De todo modo, a análise do histórico dos julgamentos realizados até o momento indica que há argumentos jurídicos comuns que sinalizam coerência entre os julgamentos do STJ e do STF, especialmente após a pacificação relativa ao dano moral, quais sejam: (i) não há incidência de Imposto de Renda sobre indenizações, quando estas não representarem acréscimo patrimonial; (ii) dano emergente tem caráter reparatório e compensatório de um prejuízo sofrido, portanto não sujeito ao Imposto de Renda; (iii) lucro cessante representa acréscimo patrimonial e, por essa razão, sujeita-se à incidência de Imposto de Renda, e (iv) o dano moral não representa acréscimo patrimonial e, por isso, sobre a parcela recebida a esse título, não incide Imposto de Renda.

VI – Referências bibliográficas

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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 39.726/SP; EREsp n. 32.829/SP; Súmula STJ n. 125; REsp n. 57.319-0/RS; Súmula STJ n. 136; REsp n. 14.693-3/SP; Súmula STJ n. 215; AgRg no Ag 421.881/RJ; n. 637.623/PR.

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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 851.677/RS.

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EREsp n. 695.499/RJ.

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EREsp n. 979.765/SE; AgRg no REsp n. 1.057.542/PE.

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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 963.387/RS; AgRg no Ag n. 1.021.368/RS.

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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.152.764/CE; Súmula STJ n. 498.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 47.449/SP.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.227.133/RS.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.089.720/RS; RE n. 28.195, n. 29.432, julgados em 1955; RE n. 30.625, julgado em 1958.

COSTA, Regina Helena. Judicialização e direito tributário. In: MANEIRA, Eduardo; TÔRRES, Heleno Taveira (coord.). Direito tributário e a Constituição: homenagem ao Professor Sacha Calmon Navarro Coêlho. São Paulo: Quartier Latin, 2012.

OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. As indenizações perante o Imposto de Renda. In: MURICI, Gustavo Lanna; CARDOSO, Oscar Valente; RODRIGUES, Raphael Silva (coord.). Estudos de direito processual e tributário em homenagem ao Ministro Teori Zavascki. Belo Horizonte: D’Plácido, 2018.

1 COSTA, Regina Helena. Judicialização e direito tributário. In: MANEIRA, Eduardo; TÔRRES, Heleno Taveira (coord.). Direito tributário e a Constituição: homenagem ao Professor Sacha Calmon Navarro Coêlho. São Paulo: Quartier Latin, 2012, p. 774.

2 Súmula TFR n. 39; Representação STF n. 1.260; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 47.449/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 93.518/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 94.224/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 130.194/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 118.534/RS; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 156.772/RJ; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 208.477/RS; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 673.273/AL; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 674.959/PR; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 799.434/CE; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 934.006/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 111.646-0/SP.

3 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.118.782/DF.

4 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 697.880/RS; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 644.840/SC; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 706.817/RJ; EREsp n. 770.078/SP; EREsp n. 860.955/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.118.782/DF; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.102.575/MG; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.112.745/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.102.575/MG; AgRg no REsp n. 1.440.702/RS; AgRg no REsp n. 1.452.479/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 36.084/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 34.988; n. 36.050-1/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 40.136/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 39.872/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 47.102/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 40.921/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 52.208/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 39.726/SP; EREsp n. 32.829/SP; Súmula n. 125; Recurso Especial n. 57.319-0/RS; Súmula n. 136; Recurso Especial n. 14.693-3/SP; Súmula n. 215; AgRg no Ag 421.881/RJ; n. 637.623/PR; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 674.392/SC; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 731.883/RS; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 851.677/RS; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 840.634/RS; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 852.572/RS; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 896.720/SP; EREsp n. 695.499/RJ; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 639.635/RS; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 825.907/RS; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.010.509/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 825.845/RS; EREsp n. 979.765/SE; AgRg no REsp n. 1.057.542/PE; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.111.223/SP.

5 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 410.347/SC; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 402.035/RN; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 963.387/RS; AgRg no Ag n. 1.021.368/RS; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 686.920/MS; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.152.764/CE. Súmula STJ n. 498.

6 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 47.449/SP; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.227.133/RS; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.089.720/RS.

7 Exemplos: RE n. 28.195 e n. 29.432, julgados em 1955; RE n. 30.625, julgado em 1958.

8 BRASIL. Decreto-lei n. 1.641/1978: “Art. 1º Constitui rendimento tributável o lucro apurado por pessoa física em decorrência de alienação de imóveis efetuada no ano-base. (Redação dada pelo Decreto-lei nº 1.950, de 1982). § 1º No caso de pessoa física equiparada à empresa individual, nos termos dos Decretos-leis nº 1.381, de 23 de dezembro de 1974, alterado pelo de nº 1.510, de 27 de dezembro de 1976, o disposto neste artigo somente será aplicável aos imóveis não alcançados pela equiparação e àqueles não computados na apuração do lucro da empresa. § 2º Para os efeitos do disposto neste artigo consideram-se: I – Imóveis – os bens definidos no artigo 43 do Código Civil; II – Alienação – as operações que importem na transmissão ou promessa de transmissão, a qualquer título, de imóveis ou na cessão ou promessa de cessão de direitos à sua aquisição, tais como as realizadas por: compra e venda, permuta, adjudicação, dação em pagamento, doação, desapropriação, procuração em causa própria, promessa de compra e venda, cessão de direitos ou promessa de cessão de direitos à aquisição de imóveis e contratos afins em que haja transmissão de imóveis ou cessão de direitos à sua aquisição.”

9 Súmula n. 125, Primeira Seção, julgado em 06.12.1994, DJ 15.12.1994, p. 34.815.

10 Súmula n. 136, Primeira Seção, julgado em 09.05.1995, DJ 16.05.1995, p. 13.549.

11 Súmula n. 215, Primeira Seção, julgado em 24.11.1998, DJ 04.12.1998, p. 82.

12 Cf. Voto do Ministro Milton Luiz Pereira no REsp n. 55.996/SP, p. 2.

13 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. As indenizações perante o Imposto de Renda. In: MURICI, Gustavo Lanna; CARDOSO, Oscar Valente; RODRIGUES, Raphael Silva (coord.). Estudos de direito processual e tributário em homenagem ao Ministro Teori Zavascki. Belo Horizonte: D’Plácido, 2018, p. 1090.

14 Cf. Voto do Ministro Teori Zavascki no RE n. 637.623/PR, p. 5.

15 “Os bens jurídicos, em seu aspecto essencial, comportam uma grande classificação: eles podem ser (a) de natureza patrimonial (= integrantes do patrimônio material) ou (b) de natureza não patrimonial (= integrantes do patrimônio moral das pessoas). Todavia, qualquer que seja a sua natureza, todos os bens jurídicos estão sob a tutela do direito. Assim, quem, por ato ou omissão ilícita, violar o direito, causando prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. É o que estabelece o Código Civil, nos artigos 186 e 927, reproduzindo a norma do art. 159 do Código de 1916.” (Voto do Ministro Teori Zavascki no RE n. 637.623/PR, p. 6)

16 Cf. Voto do Ministro Teori Zavascki no RE n. 637.623/PR, p. 8.

17 “Tributário. Imposto de Renda. Advogados da Caixa Econômica Federal.

Acordo coletivo. ‘Indenização’ por horas extraordinárias. Natureza remuneratória. Acréscimo patrimonial.

1. A verba decorrente de horas extraordinárias, inclusive quando viabilizada por acordo coletivo, tem caráter remuneratório e configura acréscimo patrimonial, incidindo, pois, Imposto de Renda.

2. É irrelevante o nomen iuris que empregado e empregador atribuem a pagamento que este faz àquele, importando, isto sim, a real natureza jurídica da verba em questão.

3. O fato de o montante ter sido fruto de transação em nada altera a conotação jurídica dos valores envolvidos.

4. Ademais, mesmo que caracterizada a natureza indenizatória do quantum recebido, ainda assim incide Imposto de Renda, se der ensejo a acréscimo patrimonial, como ocorre na hipótese de lucros cessantes.

5. Embargos de Divergência não providos.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. EREsp n. 695.499/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 09.05.2007, DJ 24.09.2007, p. 236)

18 “Tributário. Imposto de Renda. Reparação por danos morais. Natureza.

Regime tributário das indenizações. Distinção entre indenização por danos ao patrimônio material e ao patrimônio imaterial. Precedentes.

1. O imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador, nos termos do art. 43 do CTN, os ‘acréscimos patrimoniais’, assim entendidos os acréscimos ao patrimônio material do contribuinte.

2. Indenização é a prestação destinada a reparar ou recompensar o dano causado a um bem jurídico. Os bens jurídicos lesados podem ser (a) de natureza patrimonial (= integrantes do patrimônio material) ou (b) de natureza não patrimonial (= integrantes do patrimônio imaterial ou moral), e, em qualquer das hipóteses, quando não recompostos in natura, obrigam o causador do dano a uma prestação substitutiva em dinheiro.

3. O pagamento de indenização pode ou não acarretar acréscimo patrimonial, dependendo da natureza do bem jurídico a que se refere.

Quando se indeniza dano efetivamente verificado no patrimônio material (= dano emergente), o pagamento em dinheiro simplesmente reconstitui a perda patrimonial ocorrida em virtude da lesão, e, portanto, não acarreta qualquer aumento no patrimônio. Todavia, ocorre acréscimo patrimonial quando a indenização (a) ultrapassar o valor do dano material verificado (= dano emergente), ou (b) se destinar a compensar o ganho que deixou de ser auferido (= lucro cessante), ou (c) se referir a dano causado a bem do patrimônio imaterial (= dano que não importou redução do patrimônio material).

4. A indenização que acarreta acréscimo patrimonial configura fato gerador do imposto de renda e, como tal, ficará sujeita a tributação, a não ser que o crédito tributário esteja excluído por isenção legal, como é o caso das hipóteses dos incisos XVI, XVII, XIX, XX e XXIII do art. 39 do Regulamento do Imposto de Renda e Proventos de Qualquer Natureza, aprovado pelo Decreto 3.000, de 31.03.99. Precedentes.

5. ‘Se o objeto da indenização é o elemento moral, porque a ação danosa atingiu precisamente o patrimônio moral, não há dúvida de que o recebimento de indenização implica evidente crescimento do patrimônio econômico e, assim, enseja a incidência dos tributos que tenham como fato gerador esse acréscimo patrimonial’ (Hugo de Brito Machado, Regime Tributário das Indenizações, obra coletiva, Coord. Hugo de Brito Machado, p. 109). Em idêntico sentido, na obra citada: Gisele Lemke, p. 83; Hugo de Brito Machado Segundo e Paulo de Tarso Vieira Ramos, p. 124; Fábio Junqueira de Carvalho e Maria Inês Murgel, p. 74. E ainda: Leandro Paulsen, Direito Tributário, Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência, 5ª ed., Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2003, p. 655.

6. Configurando fato gerador do imposto de renda e não estando abrangido por norma isentiva (salvo quando decorrente de acidente do trabalho, o que não é o caso), o pagamento a título de dano moral fica sujeito à incidência do tributo.

7. Recurso especial provido.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp n. 748.868/RS, Rel. Min. Luiz Fux, Rel. p/ Acórdão Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 28.08.2007, DJ 18.02.2008, p. 24)

19 “Com a devida vênia dos que pensam de maneira diversa, creio que a indenização por dano estritamente moral não é fato gerador do Imposto de Renda, pois limita-se a recompor o patrimônio imaterial da vítima, atingido pelo ato ilícito praticado. Ao negar a incidência do Imposto de Renda, não se reconhece a isenção, mas a ausência de riqueza nova – oriunda dos frutos do capital, do trabalho ou da combinação de ambos – capaz de caracterizar acréscimo patrimonial. A indenização por dano moral não aumenta o patrimônio do lesado, apenas o repõe, pela via da substituição monetária, in statu quo ante.” (Cf. Voto do Min. Rel. Herman Benjamim no REsp n. 963.387/RS, p. 9)

20 “Finalmente, lembre-se que no Brasil e em muitos outros países vigora o princípio da reparação integral, ‘uma exigência fundamental de justiça’, que dispensa justificação. Violá-lo, de modo direto ou indireto, caracterizaria uma ‘verdadeira aberração’ (Geneviève Viney, Les Obligations. La Responsabilité: Effets, Paris, L.G.D.J., 1988, p. 82).” (Cf. Voto do Min. Rel. Herman Benjamim no REsp n. 963.387/RS, p. 9)

21 “Ora, seria exatamente isso o que ocorreria caso admitíssemos a incidência de Imposto de Renda sobre o quantum debeatur da indenização, quanto mais diante de ofensa a direitos da personalidade. A tributação da reparação do dano moral, nessas circunstâncias, reduziria a plena eficácia material do princípio da reparação integral, transformando o Erário simultaneamente em sócio do infrator e beneficiário da dor do contribuinte. Uma dupla aberração.” (Cf. Voto do Min. Rel. Herman Benjamim no REsp n. 963.387/RS, p. 9-10)

22 “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

[...]

III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:

a) contrariar dispositivo desta Constituição;

b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;”

23 “Observe-se que a mencionada Arguição de Inconstitucionalidade foi decidida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região em novembro de 2013, quando já firmada a compreensão deste STF (pela infraconstitucionalidade e ausência de repercussão geral da matéria) e, acrescente-se, quando o STJ já firmara seu convencimento no assunto em sede de Recursos Repetitivos. Com as vênias de estilo, penso que a decisão do Órgão Especial do TRF 4ª Região tem a potencialidade de subverter o sistema de precedentes delineados pelo Artigo 102, § 3º da Constituição Federal de 1988, bem como o rito previsto nos artigos 1.029 e seguintes do CPC/2015. Em outras palavras, admitir-se que este Supremo Tribunal seja obrigado a apreciar questão sob a ótica constitucional pelo simples fato de um Tribunal Regional ter decidido pela inconstitucionalidade de norma, após a manifestação deste STF pela infraconstitucionalidade da questão, é, em definitiva, admitir que um Tribunal Federal paute o Supremo Tribunal Federal. O expediente, penso eu, faz tábula rasa da disciplina processual civil prevista nos artigos 1.032 e 1.033 do CPC, a dirimir eventuais dúvidas sobre a natureza das questões discutidas e respectiva competência: […].” (Cf. Voto-vogal do Min. Gilmar Mendes no RE n. 855.091/RS, p. 5)

24 Cf. Voto do Min. Dias Toffoli no RE n. 855.091/RS, p. 9.

25 “Em consonância com o texto constitucional, o art. 43 do Código Tributário Nacional fixa a materialidade do imposto de renda como sendo a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda (produto do capital e/ou trabalho) ou de proventos de qualquer natureza (acréscimos patrimoniais em geral).” (Cf. Voto do Min. Dias Toffoli no RE n. 855.091/RS, p. 5)

26 Cf. Voto do Min. Dias Toffoli no RE n. 855.091/RS, p. 7.

27 “Ementa: Recurso extraordinário. Repercussão geral. Tributário. IRPJ. CSLL. Juros de mora. Taxa SELIC. Repetição do indébito. Declaração de inconstitucionalidade de lei federal por tribunal regional federal. A interposição do recurso extraordinário com fundamento no art. 102, III, b, da Constituição Federal, em razão do reconhecimento da inconstitucionalidade do art. 3º, § 1º, da Lei nº 7.713/1988, do art. 17 do Decreto-lei nº 1.598/1977 e do art. 43, II, § 1º, do CTN por tribunal regional federal constitui circunstância nova suficiente para justificar, agora, seu caráter constitucional e o reconhecimento da repercussão geral da matéria relativa a incidência do imposto de renda das pessoas jurídicas (IRPJ) e da contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL) sobre a taxa SELIC na repetição do indébito.” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 1.063.187 RG, Rel. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgado em 14.09.2017, processo eletrônico, DJe-215, divulg. 21.09.2017, public. 22.09.2017)

28 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 1.063.187. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5230634. Acesso em: 17 out. 2021.

29 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. As indenizações perante o Imposto de Renda. In: MURICI, Gustavo Lanna; CARDOSO, Oscar Valente; RODRIGUES, Raphael Silva (coord.). Estudos de direito processual e tributário em homenagem ao Ministro Teori Zavascki. Belo Horizonte: D’Plácido, 2018, p. 1091.

30 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. As indenizações perante o Imposto de Renda. In: MURICI, Gustavo Lanna; CARDOSO, Oscar Valente; RODRIGUES, Raphael Silva (coord.). Estudos de direito processual e tributário em homenagem ao Ministro Teori Zavascki. Belo Horizonte: D’Plácido, 2018, p. 1091.