Imposto de Renda e o Comércio Eletrônico

Luís Eduardo Schoueri

Professor dos Cursos de Pós-graduação stricto sensu da Universidade Mackenzie, em São Paulo. Professor na EAESP da Fundação Getúlio Vargas. Diretor Executivo do Instituto Brasileiro de Direito Tributário. Mestre em Direito Tributário Internacional pela Universidade de Munique - Alemanha. Doutor e Livre-Docente em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo.

Dentre os campos em que o desenvolvimento do comércio eletrônico1 vem provocando maior perplexidade, destaca-se o da tributação, colocando-se fisco e contribuinte diante de desafios teóricos e práticos que exigem maior reflexão.

A realidade do comércio eletrônico revela uma multiplicidade de transações internacionais2, cuja velocidade muitas vezes dificulta a atividade fiscalizatória por parte dos poderes tributantes.

A par de tais dificuldades, que se resumem na questão “como tributar”, localiza-se outra, não menos importante, cuja fórmula é “quem deve tributar”. Para enfrentar esse último problema - cuja solução, como se mostrará, é fundamental para a solução dos demais - parece relevante retomarem-se alguns conceitos desenvolvidos no campo do direito tributário internacional.

O Problema Clássico do Imposto de Renda: quem deve tributar

Não é nova, na literatura, a discussão sobre qual Estado tem legitimação para tributar a renda gerada numa transação internacional, merecendo menção, neste sentido, os estudos de dois financistas, Wagner e Schanz, desenvolvidos no final do século XIX.

No estudo de Wagner, encontram-se as bases para o princípio que veio a se desenvolver como o da universalidade da tributação (world-wide taxation), que legitimava o Estado onde residisse o contribuinte a exigir tributo não somente sobre a renda auferida nos limites de seu território, mas em bases mundiais3. O estudo de Wagner não entrava no mérito da provável bitributação que sua solução poderia gerar, o que, na análise de Klaus Vogel, bem se explica tendo em vista que Wagner não considerava particularmente desejável o investimento no exterior, o que, ademais, apenas refletia a tendência nacionalista e isolacionista prevalecente na época em que Wagner escrevia4.

Escrevendo em 18925, Schanz trouxe à discussão outros argumentos, sustentando que nem a residência nem a nacionalidade ou a mera presença física poderiam servir como critérios únicos para estabelecer a sujeição tributária pelo imposto de renda, já que tais critérios possibilitariam a tributação de pessoas que não se beneficiam (ou se beneficiam muito pouco) das atividades do Estado. Nesse sentido, seria injusto exigir que tais contribuintes suportassem a carga tributária de um Estado que beneficiaria muito mais a terceiros. Por tal motivo, defendeu Schanz a introdução de um critério que, desde que aplicado consistentemente, poderia afastar tal injustiça: o princípio da pertinência econômica (economic allegiance, wirtschaftliche Zugehörigkeit), assim entendido o vínculo de dependência que se cria entre o indivíduo e o Estado, de modo que esse indivíduo participe da vida econômica e social desse Estado6. A pertinência econômica seria encontrada, caso-a-caso, conforme a natureza do tributo. Assim, quando se tratasse de uma tributação sobre o consumo, a pertinência econômica poderia ser fixada a partir do critério da residência (embora em combinação com outros). Tratando-se de tributação sobre a renda, entretanto, Schanz defende que a residência perde muita força quanto à pertinência econômica, já que, embora os rendimentos de um contribuinte possam ter relação com o lugar em que reside, será o Estado da fonte do rendimento, em caso de a pessoa estar economicamente ligada a Estado diverso de sua residência, que terá maior importância (ou maior relevância econômica) para o gozo dos rendimentos. Por tal razão, Schanz propunha que a tributação se dividisse entre o Estado da fonte e o Estado da residência conforme sua pertinência econômica, sugerindo, afinal, no caso da tributação da renda, uma fórmula segundo a qual três quartos do tributo deveriam ser alocados ao Estado da fonte, ficando o Estado da residência meramente com um quarto da renda tributária.

Em 1921, o Comitê Financeiro da Liga das Nações encarregou quatro especialistas em finanças públicas, Bruins (Holanda), Einaudi (Itália), Seligman (EUA) e Stamp (Reino Unido), de efetuarem um relatório sobre os problemas relativos ao fenômeno da bitributação, bem como as possíveis soluções para sua eliminação. O relatório foi editado em 1923, fazendo referência à pertinência econômica mas, como observa Klaus Vogel7, seu resultado foi praticamente inverso à sugestão de Schanz, já que na visão dos especialistas, deveriam os Estados isentar, reciprocamente, os não residentes da tributação, de tal modo que só restaria a tributação pelo Estado da residência. Nesse sentido, o conceito de “pertinência econômica” era substituído pelo mais amplo de “pertinência econômica estatal”: enquanto o primeiro, buscando vínculos econômicos, possibilitava que uma pluralidade de Estados se julgassem intitulados a tributar, o último conceito, mais tarde explicitado por Dorn e divulgado, entre outros, por Spitaler, investiga qual o Estado que possui mais facilidade para instituir e cobrar o imposto8. Entre 1926 e 1927, com a colaboração de especialistas provenientes principalmente de outros países europeus e dos Estados Unidos, a comissão elaborou quatro modelos de convenções, respectivamente em matéria de imposto de renda, de imposto de sucessões, de assistência administrativa e de assistência judiciária, emendados e aprovados em 1928, desta feita por representantes de vinte e oito Estados. Nesse modelo, prevalecia, para os impostos “pessoais”, o critério da residência, aplicando-se a fonte para os impostos “reais”9. No mesmo ano, instalava-se um comitê permanente para o assunto, do qual se desdobrou um subcomitê, criado mais tarde que, em 1943, reunindo-se no México, propôs um modelo de acordo para evitar a bitributação da renda, no qual prevalecia o interesse dos países importadores de capital. Vale lembrar que aquele colegiado foi composto primordialmente de representantes de países latino-americanos (já que os E.U.A. e os países europeus estavam envolvidos na Segunda Guerra). A este se seguiu outro, celebrado em 1946, no qual os países industrializados tiveram maior peso. Enquanto o modelo mexicano dava maior peso à territorialidade, beneficiando, destarte, os países importadores de capital, o modelo londrino retornava à prioridade do Estado da residência.

Os trabalhos da Liga das Nações tiveram prosseguimento por meio da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE - cujo Conselho, em 1956, instituiu um Comitê Fiscal (a partir de 1971, Comitê para Assuntos Fiscais), composto por autoridades governamentais encarregadas da negociação de acordos de bitributação. Entre 1956 e 1963, o Comitê Fiscal trabalhou na elaboração de um modelo de acordos de bitributação, aprovado em 30 de julho de 1963, juntamente com seus comentários. Esse modelo e comentários foram revistos em trabalho iniciado em 1973, resultando em nova publicação, datada de 1977. Em 1991, o Comitê para Assuntos Fiscais, verificando a necessidade de uma constante avaliação do modelo e comentários, decidiu adotar um modelo em folhas soltas, que permitisse mudanças caso a caso, sem que se fizesse necessária uma revisão completa. Assim, se publicaram emendas em 1992, 1994 e 1995, publicando-se nova edição em 1997.

O modelo da OCDE claramente privilegia o Estado da residência. A ele se opõe o modelo, desenvolvido em 1971, pelos países do Pacto Andino, que enfatiza o princípio da fonte10.

Diante da constatação de que o modelo da OCDE não atentava para a diversidade de níveis de desenvolvimento que pode existir entre as partes contratantes, o Secretário-Geral das Nações Unidas convocou um grupo de peritos, representando países desenvolvidos e em desenvolvimento. O grupo se reuniu por oito vezes, entre 1968 e 1979, culminando com a produção de um modelo de acordo, acompanhado de comentários. Conforme relata Francisco Dornelles, que esteve presente nesses trabalhos, conquanto se insistisse na necessidade de mudar os conceitos incluídos no modelo da OCDE, devendo o modelo a ser elaborado consagrar o princípio da tributação exclusiva no país de origem do rendimento (país de fonte) e, conseqüentemente, a não incidência de imposto no país de residência do beneficiário da renda, acabou por prevalecer o ponto de vista dos países desenvolvidos, de que o grupo deveria tomar por base de trabalho o modelo da OCDE, nele introduzindo modificações destinadas a ampliar o direito de tributar do país em desenvolvimento. Assim, o autor sustenta que o modelo da ONU, ao contrário do que se poderia esperar, não está baseado no princípio da fonte, mas no do domicílio, embora admitindo, em muitos pontos, a tributação também no país de origem11.

À quase unanimidade em favor do princípio da residência, como critério de tributação, opuseram-se, historicamente, os países da América Latina, que defenderam a territorialidade da tributação12. Entretanto, paulatinamente as legislações tributárias daqueles países foram, também elas, afastando-se da territorialidade, admitindo a tributação da renda universal. Tal, por exemplo, o caso do Brasil, com a edição da Lei nº 9.249/95 e Argentina, com as Leis 24.073 e 25.063.

No campo doutrinário, entretanto, a opção pelo princípio da residência nunca deixou de receber críticas, destacando-se, aqui, a liderança de Klaus Vogel13. O professor emérito da Universidade de Munique alega, primeiramente, que o conceito de “fonte” é ambíguo (cada país adota seu conceito para dizer qual o rendimento de “fonte” local, podendo, ademais, o termo se referir tanto à produção do rendimento como a seu pagamento). Em seguida, propõe o professor que se examinem os argumentos colecionados pela doutrina de finanças públicas (cujo mote é a eficiência) e pelos juristas (cujo mote é a justiça).

Voltando-se à questão da eficiência, Vogel lembra que em finanças públicas a eficiência pode ser enfrentada, do ponto de vista da tributação, a partir da neutralidade, que, por sua vez, divide-se em neutralidade de exportação e neutralidade de importação. Quando se fala em neutralidade de exportação, enfoca-se a tributação do investidor, i.e., objetiva-se que o investidor tenha igual carga tributária investindo em seu país ou em qualquer outro lugar, de tal modo que o tributo não seja fator a influir em sua decisão de onde investir. A neutralidade de exportação implica a tributação em bases universais, fundada no princípio da residência, assegurado ao investidor o direito de se creditar dos tributos pagos no exterior. Por outro lado, a neutralidade de importação baseia-se no princípio da fonte, pois enfoca o próprio investimento, a fim de que, onde quer que resida o investidor, tenha ele garantida a mesma tributação, em dado investimento. Para que haja a neutralidade de importação, o Estado da residência deve limitar-se a tributar os rendimentos produzidos em seu território, isentando, pois, os rendimentos de fonte estrangeira.

Apenas em um cenário ideal, com tributações idênticas em todos os países, se poderia cogitar de uma convergência entre neutralidade de importação e exportação. No mais das vezes, a busca da neutralidade de exportação implicará afastar a neutralidade de importação e vice-versa, fazendo-se necessária, pois, uma opção, que a doutrina das finanças públicas propõe a partir do parâmetro da eficiência. Nesse sentido, classicamente se veio defendendo que a solução mais eficiente seria a neutralidade da exportação: por esse critério, o investidor tomaria suas decisões a partir de uma lógica meramente econômica, buscando alocar seus recursos onde eles produzissem maior retorno, garantindo-se, destarte, a otimização da alocação dos fatores. A tal raciocínio pode-se opor, entretanto, a constatação de que uma neutralidade de exportação apenas restringe investimentos internacionais14. O tema é bem explorado por Ganderberger, que faz ver que em caso de neutralidade de exportação, o investidor fica sujeito ao imposto em sua residência, que acaba por diminuir sua capacidade de reinvestimento. Assim, dois investidores sujeitos a cargas tributárias diferentes em seus países de residência terão diferentes capacidades de reinvestimento. Gandenberger traz vários outros argumentos, valendo notar, por seu poder de convencimento, o raciocínio no sentido de que se o nível de tributação em qualquer país deve corresponder ao grau dos serviços oferecidos pelo Poder Público, à menor tributação em determinado país correspondem, proporcionalmente, maiores custos no investimento, para igual grau de satisfação. Assim, se o investidor, residindo em um país desenvolvido (e portanto, com alta carga tributária e elevado grau de serviços públicos) sofre a mesma carga tributária, em seu país de residência, investindo neste ou noutro país que não lhe ofereça serviços públicos adequados, esse investidor será levado a se dirigir a sua residência; desse modo, constata-se que o fator tributário deixa de ser neutro, pesando na decisão do investidor15.

A própria divisão entre neutralidade de exportação e neutralidade de importação, entretanto, não é pacífica, já que se pode sustentar, com True16, que a neutralidade não pode ser vista isoladamente do ponto de vista de cada país, mais valendo a busca da neutralidade entre os países (interestatal). Nesse sentido, a partir da definição de neutralidade como uma tributação que não altera os preços relativos (explícitos ou implícitos) de bens, serviços, atividades, fatores de produção etc. no setor privado, a neutralidade entre os países significaria apenas que nenhum país deva procurar usar seu poder tributário com a finalidade de modificar mais os preços relativos em outro país, que seriam modificados na falta dos tributos.

Neste sentido, parece relevante o argumento de Klaus Vogel, no sentido de que, para um correto juízo da neutralidade, não se devem considerar apenas os tributos, mas também os benefícios, já que para o investidor, o nível dos benefícios é tão importante quanto o nível de tributação. Assim, segurança, estabilidade econômica, infra-estrutura, subsídios diretos, nível da saúde pública e educação etc. são fatores que podem contrabalançar determinada tributação, redefinindo-se, pois, a neutralidade entre os países como a circunstância em que um contribuinte, que exerce atividade em outro país - ou mercado - e utiliza as facilidades oferecidas por aquele outro país (bens públicos) tenha a certeza de que não será mais tributado que qualquer outro que, sob as mesmas circunstâncias, use aquelas facilidades de maneira equivalente17. Ora, prevalecendo o princípio da residência, o contribuinte sofrerá idêntica tributação caso invista em um país que lhe ofereça altos benefícios ou caso se veja obrigado a suportar altos reveses. Noutras palavras, uma neutralidade de exportação de natureza meramente tributária apenas desencoraja os investimentos naqueles países que mais necessitam de investimentos; a neutralidade de importação, outrossim, assegura que o contribuinte tenha uma carga tributária contrabalançada pelas respectivas dificuldades. Percebe-se, daí, que do ponto de vista financeiro, a neutralidade de importação ganha peso, justificando-se a preferência pelo princípio da fonte.

Mesmo que não se considerem investimentos diretos em atividade produtiva, o princípio da residência também enfrenta óbices de natureza econômica. Assim, por exemplo, é o caso dos rendimentos por aplicações financeiras, em que se constata que uma maior tributação implicará a necessidade de o credor exigir maior taxa de juros, para lhe assegurar o mesmo rendimento líquido, daí se concluindo ser mais eficiente que se considere o nível de tributação na praça do devedor (fonte) como o parâmetro adequado para assegurar a neutralidade entre aplicadores nacionais e estrangeiros.

Mas não é apenas do ponto de vista da eficiência que a questão merece ser tratada. Também entre os juristas o tema é defendido, desta feita sob o mote de justiça e igualdade, que se refletem no princípio da capacidade contributiva. Exemplar, neste sentido, a decisão da Corte Fiscal Federal da Alemanha, em agravo que versava acerca do artigo 48 da Comunidade Econômica Européia, quando se decidiu que a tributação da renda mundial auferida por contribuintes seria uma decorrência necessária do princípio da capacidade contributiva18. Tampouco sob este prisma a conclusão fica ilesa às críticas de Klaus Vogel19, que, compulsando a doutrina que versa sobre a capacidade contributiva, revela que não há, em tais estudos, qualquer posicionamento no sentido de que somente a tributação da renda mundial atenderia a capacidade contributiva, lembrando, inclusive, que diversos países onde vige aquele princípio adotam o princípio da territorialidade da tributação. Ademais, como acentua Vogel, se se quisesse buscar uma plena igualdade entre os contribuintes que investem em seu país (sujeitos apenas ao imposto local) e no exterior (sujeitos à tributação em sua residência e no Estado da fonte dos rendimentos), então passar-se-ia a exigir que aqueles que investissem localmente se sujeitassem duas vezes ao imposto local, para terem, aí sim, tratamento igual aos que investem no exterior. Vogel ingressa especificamente na questão da isonomia, que dá base ao argumento da capacidade contributiva, segundo a qual não seria justo que um Estado impusesse menor tributo sobre residentes com rendimentos do exterior que o exigido de residentes com rendimentos de igual monta, auferidos localmente. Para Vogel, este argumento desconsidera o fato de que rendimentos do exterior são auferidos em condições substancialmente diversas das locais. Conforme lembra o autor, “se a tributação do Estado da fonte é menor - e só neste caso é que caberia o argumento basedo na isonomia - também são menores, freqüentemente, as prestações estatais que beneficiam o contribuinte e maiores os seus riscos. Se o contribuinte é um empresário, ele se encontra, no país estrangeiro, em concorrência com outros empresários, que também pagam o menor tributo exigido por aquele Estado; uma tributação complementar por parte de seu Estado de residência prejudica suas condições de concorrência. Finalmente, ele pode nem mesmo ter certeza de que poderá transferir para o País seus rendimentos do exterior”.

O argumento parece convincente, revelando que, de fato, não se pode cogitar em igualdade entre ambos os contribuintes, que, afinal, submeteram-se a riscos completamente díspares, podendo um mesmo resultado financeiro decorrer de investimentos muito diferentes, seja em volume, seja em certeza de rendimentos. Do ponto de vista de igualdade, muito mais certo parece afirmar que aqueles que se submetem a igual risco, em um mercado, devem submeter-se a igual tributação. Esse raciocínio conduz à tributação pelo Estado da fonte. A esse argumento, que considera a igualdade do ponto de vista do contribuinte, deve somar-se a questão da justiça interestatal. Sob este prisma, vê-se que o Estado da residência já se beneficia da tributação sobre o consumo do contribuinte, sendo injusto que ele fique também com a tributação da renda, obrigando o contribuinte a trazer parte dos recursos alocados no Estado da fonte para satisfazer a obrigação tributária no Estado da residência. Com tais argumentos, fica reforçada a discussão, agora baseada em questões de justiça, para que se assegure ao Estado da fonte a prerrogativa de tributar o rendimento.

Em síntese, constata-se que apesar de a prática internacional vir dando preferência à tributação pelo Estado da residência, existem argumentos sólidos, tanto sob a ótica da eficiência, como sob o prisma da justiça, que fundamentam a legitimidade da tributação exclusiva pelo Estado da fonte do rendimento.

O Princípio da Residência e o Estabelecimento Permanente no Comércio Eletrônico

A realidade do comércio eletrônico provoca que se rediscuta o tema acima descrito, diante de mudanças conceituais que não podem passar desapercebidas.

Com o fortalecimento do comércio eletrônico, começa-se a sustentar a existência de um mercado eletrônico, ou mercado virtual, já que se trata de um lugar, dotado de regras, onde há interação social (i.e.: pessoas interagem e fazem ocorrer fenômenos sociais efetivos, que, no caso do comércio eletrônico, produzem rendimentos)20.

A percepção da existência de um mercado virtual, que não se encaixa no tradicional binômio nacional/não nacional, permite que se traga à tona a discussão acima sobre a legitimidade da tributação. Com efeito, o mercado virtual, posto que intangível, não é inexistente: há rendimentos sendo produzidos e diversos Estados buscando a sua tributação.

Defendendo a tributação pelo Estado da residência, encontram-se os estudos presentemente sendo desenvolvidos no âmbito da OCDE. Naquela organização, encontra-se presentemente em elaboração um relatório sobre a tributação do comércio eletrônico que, sintomaticamente, limita-se a estudar a aplicabilidade do conceito de estabelecimento permanente, inserido no artigo 5º do modelo de acordos de bitributação da OCDE, às formas de comércio eletrônico21. Aliás, o próprio comitê para assuntos fiscais, quando encomendou o estudo em referência, já declarava sua crença no sentido de que os princípios que fundamentam a convenção modelo da OCDE seriam capazes de ser aplicados ao comércio eletrônico.

Não causa surpresa a posição da OCDE, coerente com todo o histórico do desenvolvimento da própria convenção, que atende aos interesses dos Estados que a compõem, de regra exportadores de capitais. Os “princípios” que fundamentam a convenção modelo, como mostrado, concentram-se na tributação pelo Estado da residência, exigindo-se uma “residência” no Estado da fonte, por meio de um estabelecimento permanente, para que o último Estado se veja legitimado a também tributar os rendimentos ali produzidos.

Na redação atual do artigo 5º do modelo, dificilmente se poderá constatar a existência de um estabelecimento permanente no país de onde provêm os rendimentos. As discussões giram em torno da questão se a existência de uma máquina, no local, seria suficiente para configurar um estabelecimento permanente. Deixa-se de lado, assim, a constatação de que fortunas circulam sem a existência de qualquer máquina, cuja localização física é irrelevante para a concretização da operação comercial. O resultado, como seria de se esperar, é pela negação, em regra geral, da existência de um estabelecimento permanente, reservando-se toda a tributação para o Estado onde reside o contribuinte.

A título de curiosidade, vale notar que, há mais de dez anos, já se alertava que o princípio do estabelecimento permanente, conquanto, destituído de fundamentos teóricos, cada vez mais serve ao interesse dos países ricos, principalmente em vista do desenvolvimento tecnológico que já se prenunciava.22

A opção, efetuada no âmbito da OCDE e mesmo da ONU, pela tributação no Estado da residência do contribuinte, põe às claras dificuldade própria daquele sistema: como tributar rendimentos que nem sempre são dirigidos aos países de origem dos investimentos. A exclusão da tributação na fonte dos rendimentos favorece o florescimento de empresas comerciais situadas em paraísos fiscais23. Tratando-se de comércio eletrônico, onde a localização física do estabelecimento vendedor desempenha papel ainda mais insignificante, não é difícil conceber que com muito mais força se desenvolvam tais rotas. Enquanto, entretanto, nas formas tradicionais do comércio, pode-se acreditar que uma fiscalização rigorosa, aliada à cooperação internacional, possa prevenir excessos24, tratando-se de comércio eletrônico, nem sempre a questão se resumirá à fiscalização, já que, afinal, muito menos evidências se terá de que o rendimento não foi auferido legitimamente pela empresa situada no paraíso fiscal. Com efeito, no comércio tradicional uma transação pressupõe a existência de uma equipe de vendas e, portanto, uma reunião de esforços que dificilmente se transferirão para os paraísos fiscais; neste caso, é fácil apontar a existência de simulação, justificando a realocação dos lucros contabilizados no paraíso fiscal, para o estabelecimento a quem eles são imputáveis. Regras anti-elusivas versando sobre a simulação, de um lado, e normas específicas sobre preços de transferência, com a análise funcional, darão fundamentação àquela realocação. Tratando-se, no entanto, de uma transação instantânea, que se aperfeiçoa por meios eletrônicos, muito maior dificuldade se terá para se constatar qualquer simulação, ou para concretizar uma análise funcional no âmbito dos preços de transferência, sem que o contribuinte tenha argumentos para sustentar que o rendimento pertence ao estabelecimento situado no paraíso fiscal.

O Comércio Eletrônico e o Princípio da Fonte: rediscutindo o Princípio

A fundamentação teórica da tributação pelo Estado da fonte do rendimento está localizada, em síntese, na circunstância de que naquele Estado se produziu a riqueza. Em última análise, o raciocínio parece prender-se à teoria do benefício ou da utilidade, que procurava justificar a tributação a partir dos benefícios oferecidos pelo Estado. Ora, esta vem há muito sofrendo críticas, tendo em vista, de um lado, sua fraqueza em relação aos impostos (tributos por definição não vinculados), mas também pelo fato de que o contribuinte paga impostos que cobrem não só despesas das quais ele pode tirar algum proveito, mas também aquelas que não lhe aproveitam. Fosse verdadeira a teoria do benefício, então justamente os menos capacitados economicamente, porque dependem mais diretamente do Estado, ou porque gozam de mais benefícios oferecidos pelo Estado, deveriam pagar impostos25.

A par da teoria do benefício, surgiu outra, baseada na idéia de sacrifício. Aqui, já não se cogita de equivalência entre os benefícios oferecidos pelo Estado e o montante da tributação, desenvolvendo-se, em vez disso, a idéia de que todos devem pagar pelas despesas comuns, sendo a ratio da divisão a capacidade individual de pagamento (capacidade contributiva). Tampouco essa teoria ficou ilesa a críticas, já que ela não explica, por exemplo, por que razão um contribuinte deve “sacrificar-se” mais por um Estado que por outro26.

Parece passar desapercebido que, a par da questão do sacrifício do contribuinte, que busca justificar sua tributação individual, torna-se relevante, igualmente, a questão do sacrifício interestatal. Sob este prisma, nasce uma pretensão tributária por parte do Estado que vê sua economia depauperada por conta de um pagamento feito ao exterior. Daí ser possível imaginar, de um lado, um Estado instituindo um imposto sobre ativos no exterior (de que ainda não se cogita, mas que seria viável, do ponto de vista econômico, ainda que indesejável por desincentivar as transações internacionais), e, de outro, um imposto sobre os rendimentos pagos ao exterior (tributação na fonte). Note-se que, aqui, já não se cogita mais em justificar o montante do imposto na capacidade contributiva manifestada, ou nos benefícios oferecidos pelo Estado, mas exclusivamente na circunstância de o Estado ter sua economia nacional diminuída dos recursos enviados ao exterior. O “sacrifício” surge, pois, sob nova forma. Agora, já não mais se trata da circunstância de um rendimento haver sido produzido sob o manto protetor de um Estado (enfoque de benefício), mas de ele ser pago com recursos provenientes do Estado (enfoque do pagamento).

A evolução, de fonte de produção a fonte de pagamento, também mostra sua utilidade, quando se reflete acerca do tema do comércio eletrônico. Afinal, a legislação baseada no conceito da fonte de produção impõe, como condição prévia à tributação, que se afira em que local foi produzido o rendimento. Em caso de transações eletrônicas, a tarefa se revela dificílima, já que o próprio conceito de produção de rendimento (qualquer que seja seu conteúdo) fica extremamente diluído. Não é difícil conceber o desafio dos legisladores nacionais para descrever hipóteses de incidência que captem a realidade em todas as dimensões, sendo provável a existência, de um lado, de lacunas legais e, de outro, de sobreposições que causem a bitributação. Tal sobreposição, se já era denunciada anteriormente ao fenômeno do comércio eletrônico27, diante da plurivalência do termo “fonte”, tem seu potencial aumentado exponencialmente na realidade eletrônica.

Decorre daí a importância da adoção do conceito de fonte de pagamento, que tem a seu favor a maior simplicidade em sua determinação, já que não se indaga onde se produziu o rendimento, mas quem foi que o pagou. Claro que tampouco esse critério fica ileso a críticas, já que nada impede dois Estados se considerarem legitimados a tributar com base nesse critério, por adotarem conceitos diversos para a residência e, assim, ambos entenderem que a fonte pagadora reside em seus respectivos territórios. Igualmente, no comércio eletrônico, poder-se-á enfrentar dificuldade para se apurar a residência de uma fonte pagadora, já que muitas vezes o mero endereço eletrônico não é suficiente para identificar onde está localizada a fonte. De todo modo, parece inegável que tais dificuldades, ao mesmo tempo em que se fazem igualmente presentes nos demais critérios acima discutidos, são infinitamente menores que aquelas próprias dos outros fatores de tributação. Enquanto se pode conceber que o beneficiário do rendimento busque estruturar seus negócios de modo a fugir da tributação pelo critério da residência (por meio de paraísos fiscais, por exemplo) ou da fonte de produção, tratando-se de tributação da fonte de pagamento, esta estará atomizada, sendo mais difícil conceber que uma multiplicidade de consumidores crie estruturas sofisticadíssimas para o pagamento de suas compras eletrônicas.

Tributação do Comércio Eletrônico no Direito Brasileiro: Tendência

Para que se compreenda a questão da tributação do comércio eletrônico no direito brasileiro, impõe que se estude, primeiramente, quando uma pessoa jurídica passa a ser considerada contribuinte do imposto brasileiro, por sua renda mundial, ou quando ela é tratada como não residente.

Nos termos da legislação brasileira, considera-se pessoa jurídica sujeita à tributação dos lucros não só aquela domiciliada no País, mas também as fi­liais, sucursais, agências ou representações no País das pessoas jurídicas com sede no exterior e os comitentes domiciliados no exterior, quanto aos resultados das operações realizadas por seus mandatários ou comissários no País28. A legislação tributária impõe aos não residentes que atuam no País, seja diretamente (por meio de filiais), seja indiretamente (por comissários), não a tributação de rendimentos, mas do próprio lucro auferido no País, apurado contabilmente29. Em caso de não ser possível a determinação do lucro a partir de critérios de balanço, recorre-se, subsidiariamente, ao arbitramento.

O legislador trata da hipótese em que ocorrem vendas diretas do exterior, i.e., quando a pessoa residente no exterior efetua vendas, no País, por intermédio de seus agentes ou representantes30. Nesse caso, o contribuinte não tem qualquer estabelecimento no País, mas não deixa de estar aqui atuando, por meio de seu agente ou representante. Também aqui se tem uma tributação do lucro que, na impossibilidade de ser determinado por meios contábeis (já que inexiste estabelecimento no País), é arbitrado.

Apenas do exame do regime legal acima descrito, já se nota que o legislador pátrio, ao desenhar os limites da incidência do imposto brasileiro, não se fixou na existência de um estabelecimento permanente no País, buscando, isto sim, um negócio aqui gerado. A existência do estabelecimento (caso das filiais) é apenas incidental, já que mesmo na ausência deste, a pessoa jurídica estrangeira se submete ao imposto brasileiro, quando atua indiretamente no País, por meio de seu comissário, ou quando se vale de um agente ou representante. Ao mesmo tempo, nota-se que a conexão escolhida pelo legislador para reputar a venda realizada no País é a existência de uma pessoa (estabelecimento, comissário ou representante) que esteja localizada fisicamente no território nacional.

A separação entre residentes e não residentes, para fins de tributação pelo imposto de renda, apenas faz sentido quando se encontra uma fundamentação constitucional para impor tratamento diverso a uns e outros. Assim, quando um país em que vige o princípio da isonomia impõe regimes tributários diferentes a residentes e a não residentes, necessariamente deve ponderar as circunstâncias em que ambos se encontram, entendendo que as diferenças justificam diverso tratamento tributário. No caso do imposto de renda, não é difícil sustentar que contribuinte que atue dentro do próprio território se encontra em situação diversa daquele que está no exterior. Assim é que se explica, pois, que quando um contribuinte passa a atuar dentro do território nacional, passa ele a receber o mesmo tratamento dos residentes. Vê-se, daí, que a extensão do tratamento dado aos residentes, aos não residentes que aqui atuam, encontra matriz constitucional no próprio princípio da igualdade.

Ao mesmo tempo, nota-se que a equiparação somente se faz com relação aos rendimentos produzidos no País, já que a legislação não pretende tributar os lucros produzidos no exterior, por não residentes. Tratando-se de situação diversa (atuação em mercados diversos), também diferente é o tratamento tributário.

Desenham-se, assim, três regimes: (i) aos residentes, que submetem à tributação todo o seu lucro, onde quer que seja produzido e seja qual for a fonte pagadora; (ii) aos não residentes que aqui não atuam, que sofrem a tributação dos rendimentos (não do lucro), cuja fonte pagadora seja nacional (não importando onde foram produzidos); e (iii) aos não residentes atuando no País, que se submetem à tributação do lucro (não rendimento) produzido no País (qualquer que seja a fonte pagadora).

Ora, retomando a questão do comércio eletrônico, constata-se que empresas domiciliadas no exterior passam a atuar diretamente em igualdade de condições com as empresas brasileiras, independentemente da presença física de representante algum no Brasil. Aceitando-se a existência de um mercado virtual, que não é, propriamente, nem “mercado nacional” nem “mercado internacional”, parece claro que nele atuam em igualdade de condições residentes e não residentes, já que ao consumidor se oferecem produtos e serviços, ao alcance de seu “mouse”, não lhe sendo dado saber, com certeza, a proveniência dos produtos oferecidos. Neste sentido, surge a questão da constitucionalidade do tratamento diferenciado, baseado exclusivamente na residência do contribuinte: por que o contribuinte residente no País é tributado com base em sua renda líquida, deduzindo, destarte, todos os custos e despesas necessários à formação do lucro, enquanto o não residente submete à tributação o rendimento bruto, de fonte pagadora brasileira?

O paradoxo acima apontado exige que se enfrentem, mais uma vez, as linhas divisórias propostas pelo legislador, investigando até que ponto são satisfatórias para se atingir uma tributação adequada e justa.

Como se verificou, o legislador buscou dar tratamento igual àqueles que atuam no País (tributação do lucro). Entretanto, elegeu como critério a presença física no território nacional. O paradoxo se apresenta, justamente, porque se constata que a presença física no País não é critério suficiente para distinguir situações que merecem tratamento tributário diverso. Daí parecer adequada a busca de outro critério para a separação dos negócios celebrados no País ou no exterior.

Surge, assim, a possibilidade de se adotar como critério diferenciador o lugar da constituição da obrigação: obrigações constituídas no País implicam negócios aqui celebrados, sujeitando-se à tributação dos lucros, como os residentes; obrigações constituídas no exterior, por refletir negócios celebrados em condições diversas, podem receber outro tratamento tributário.

Por sua vez, o lugar da constituição da obrigação se rege pelo artigo 9º, § 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil: “a obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente”.

Chega-se, portanto, ao seguinte critério diferenciador: residindo o proponente no País, o lucro da transação deve ser tributado, como qualquer outro negócio celebrado neste mercado.

Resta investigar onde reside o proponente, numa transação típica de comércio eletrônico. Relevante, assim, saber se proponente é o vendedor, que coloca seus produtos em seu site ou o comprador que o acessa.

O conteúdo da proposta deve, necessariamente, conter o desejo, por parte do proponente, de vincular-se juridicamente. Assim, quando, por exemplo, uma mercadoria é exposta à venda numa vitrine, não há, tecnicamente, uma proposta, mas mero convite, formulado aos transeuntes, para que entrem na loja e façam uma proposta (invitatio ad offerendum). Isso fica claro quando se cogita do caso em que o comerciante expõe uma mercadoria à venda e simultaneamente, dois indivíduos ingressam na loja e manifestam sua vontade de ser proprietários da mercadoria. Fosse a mera colocação da mercadoria em exposição uma proposta, então a manifestação dos potenciais compradores já configuraria aceitação, surgindo dois contratos de compra e venda distintos. Ora, pode ocorrer de o lojista só ter uma mercadoria à venda, justamente aquela exposta. Ficaria, então, ele obrigado por dois contratos, quando nunca pretendeu ingressar em tal situação jurídica. Assim, do mesmo modo, a mera apresentação de um bem à venda em um site não representa proposta, mas mera invitatio ad offerendum31. A proposta se concretiza, portanto, quando um interessado acessa o site e, escolhendo o bem, manifesta sua vontade de adquiri-lo. Se o contrato se considera celebrado onde reside o proponente, então a transação eletrônica se considera celebrada no local onde residir aquele que acessa o site.

Nota-se que o estudo das transacões de comércio eletrônico mostra que já não mais se revela adequado tomar a presença física como critério limitador da hipótese de incidência tributária, revelando-se muito mais pertinente investigar o local da residência do proponente, in casu, daquele que acessa o site, pouco interessando onde reside o criador do último.

Nessa perspectiva, outrossim, percebe-se que o local da produção do rendimento, sendo aquele onde o contrato se considera celebrado, acaba se confundindo com o lugar onde reside o adquirente. Convergem, nessas circunstâncias, fonte de produção e fonte de pagamento.

Conclui-se, daí, que é o país onde reside aquele que acessa o site, aquele que deve tributar o rendimento produzido no comércio eletrônico. Esta solução traz a seu favor, de um lado, atender aos reclamos dos defensores da teoria da fonte de produção e da fonte de pagamento e, de outro, reduzir os riscos de bitributação ou de não tributação, que poderiam decorrer de uma tributação pelo Estado da residência.

Por fim, resta ver qual a base de cálculo da tributação. Parece que por consistência com o princípio da isonomia, não seria defensável a incidência do imposto sobre o rendimento bruto do contribuinte. Concorrendo no mesmo mercado das empresas residentes no País, o não residente deve ter o direito de ser tributado por seu lucro. Assim, à falta de um balanço das atividades realizadas neste mercado, resta, à semelhança da hipótese da atuação por meio de procuradores, a alternativa de imposição com base no lucro arbitrado (de regra, vinte por cento acima do lucro presumido, apurado com base na receita do contribuinte).

Revela-se, pois, em consistência com a sistemática imposta pelo princípio da igualdade, a necessidade de a legislação tributária brasileira prever a tributação das atividades aqui desenvolvidas, deixando de lado o critério da presença física do vendedor, que deve passar para a residência do proponente, sendo a base de cálculo apurada por critérios de arbitramento já comuns no ordenamento.

1 A não ser que se faça menção expressa, este estudo tratará, sob o manto do comércio eletrônico, tanto dos casos em que os meios eletrônicos nada mais são que instrumentos de comunicação para a concretização de transações tradicionais (quando se reproduzem, embora com novas fórmulas, modelos jurídicos do comércio já existente), quanto daqueles em que, por meio da internet, ocorre a própria cessão de bens (como os serviços ou os direitos autorais).

2 Não se ignora que o comércio eletrônico pode dar-se também entre empresas localizadas no mesmo território, mas sem dúvida é no campo das transações envolvendo mais de uma jurisidição que as questões jurídicas tributárias tomam maior vulto.

3 Cf. Wagner, A., Finanzwissenschaft, Zweiter Teil: Gebühren-und allgemeine Steuerlehre, 1880, p. 296, apud Klaus Vogel, World-wide vs. Source Taxation of Income - A Review and Reevaluatioon of Arguments, Influence of Tax Differentials on International Competitiveness, Mc. Lure, Sinn, Musgrave et al., Kluwer, Separata, sem data, pp. 117 a 166.

4 Cf. Klaus Vogel, op. cit. (nota 3), p. 121.

5 Cf. Schanz, Zur Frage der Steuerpflicht, Finanzarchiv 1, 4 (1892), apud Klaus Vogel, op. cit. (nota 3), p. 122.

6 Cf. Allix, Repetitions Ecrites de Science Financière, “les Cours de Droit” Répétitions Ecrites & Orales, Paris, 1937-1938, p. 178.

7 Cf. Klaus Vogel, op. cit. (nota 3), p. 123.

8 Cf. Allix, op. cit. (nota 6), p. 181.

9 Cf. Victor Uckmar, I Trattati Internazionali in Materia Tributaria, Corso di Diritto Tributario Internacionale, Victor Uckmar (coord.), Pádua : cedam, 1999, pp. 73 a 109 (84).

10 Cf. Bulletin for International Fiscal Documentation, 1974, Supp. D, p. 309.

11 Cf. Francisco Neves Dornelles, O Modelo da ONU para Eliminar a Dupla Tributação da Renda, e os Países em Desenvolvimento, Princípos Tributários no Direito Brasileiro e Comparado. Estudos em Homenagem a Gilberto de Ulhôa Canto, Rio de Janeiro : Forense, 1988, pp. 195 a 232 (201).

12 Entre outros, cf. Dino Jarach, Aspectos da Hipótese de Incidência, Revista de Direito Público, São Paulo, (17):298, jul./set. 1971.

13 Cf. op. cit. (nota 3).

14 Cf. Thomas Horst, A Note on the Optimal Taxation of International Investment Income, 94 The Quarterly Journal of Economics, 693 (1980), apud Klaus Vogel, op. cit. (nota 3), p. 139.

15 Cf. Gandenberger, Kapitalexportneutralität versus Kapitalimportneutralität, 7 Aufsätze zur Wirtschaftspolitik, Forschungsinstitut für Wirtschaftspolitik an der Universität Mainz (1983), apud Klaus Vogel, op. cit. (nota 3), p. 140.

16 Cf. True, Taxing Foreign Source Income, U.S. Taxation of Amercian Business Abroad, 37 (195=75), apud Vogel, op. cit. (nota 3), p. 141.

17 Cf. Vogel, op. cit. (nota 3), pp. 141-143.

18 Cf. decisão da Corte Fiscal Federal da Alemanha (BFH) de 14 de março de 1993 IstR 1993, p. 272.

19 Cf. Klaus Vogel, Tributação da Renda Mundial, Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas, vol. 7, 1994, pp. 133 a 143.

20 Cf. Carp Garbarino, Nuove Dimensioni della Transnazionalità dell’Imposizione, Lévoluzione dell’Orinamento Tributario Italiano, Atti del Convegno I settanta anni di “Diritto e pratica tributaria”, Victor Uckmar (coord.), Pádua, cedam, 2000, pp. 745 a 773 (746).

21 “5. The Working Party also wishes to repeat that this revised draft is concerned solely with the issue of the application to electronic commerce of the permanent establishment definition as it currently appears in Article 5 of the OECD Model Tax Convention”. Cf. The Application of the Permanent Establishment Definition in the Context of Electronic Commerce: Proposed Clarification of the Commentary on Article 5 of the OECD Model Tax Convention, datado de 3 de março de 2000 e localizável em: http://www.oecd.ort/daf/fa/material/mat 07.htm#material.

22 “Essa concessão, como vimos, é destituída de fundamentos teóricos mais sérios, pois não existe motivo doutrinário para condicionar a tributação dos lucros das empresas, no território de fonte, à existência, nele, de um estabelecimento permanente. Por outro lado, nas relações econômicas internacionais de hoje, grande parte das atividades geradoras de renda pode ser desenvolvida sem referência a estabelecimento. Com o desenvolvimento dos meios de transporte e de comunicação, e com o aperfeiçoamento de certos institutos jurídicos no campo comercial, as empresas de qualquer Estado podem desenvolver atividades em outros Estados, aí auferindo lucros, sem necessitarem manter, nesses outros Estados, estabelecimento permanente.” Cf. Dornelles, op. cit. (nota 11), p. 209.

23 Sobre o “modo de usar” os paraísos fiscais, cf. Hermes Marcelo Huck, Evasão e Elisão, Rotas Nacionais e Internacionais do Planejamento Tributário, São Paulo : Saraiva, 1997, pp. 272 a 278.

24 Cf. OCDE, Harmful Tax Competition, An Emerging Global Issue, Paris : OECD, 1998, p. 69.

25 Cf. Allix, op. cit. (nota 6), p. 186.

26 Cf. Klaus Vogel, op. cit. (nota 19), pp. 134-135.

27 Cf. Klaus Vogel, op. cit. (nota 3), pp. 127 e ss.

28 Cf. art. 147 do vigente Regulamento do Imposto de Renda - RIR/99.

29 Cf. arts. 397 e 398 do RIR/99.

30 Cf. arts. 399 e 539 do RIR/99.

31 Cf. Palandt, Bürgerliches Gesetzbuch, Munique : Beck, 1997, § 145, RZ 2.