O Fim da Era do Sigilo Bancário no Brasil
The End of Bank Secrecy Era in Brazil
Thaís Chanes de Moraes1
Pós-graduada em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo (USP). Advogada em São Paulo. E-mail: thais.chanes@gmail.com.
Resumo
O trabalho discute se o pronunciamento dos países do G-20 sobre o fim da era do sigilo bancário seria aplicável ao Brasil, tendo em vista dois aspectos. O primeiro é a razão de ser do sigilo bancário no sistema jurídico brasileiro. O segundo é o possível controle de constitucionalidade sobre tratados internacionais em matéria tributária relacionados ao intercâmbio de informações bancárias eventualmente adotados pelo país.
Palavras-chave: sigilo bancário, transparência fiscal internacional, intercâmbio de informações, tratados internacionais.
Abstract
This paper discusses whether the announcement made by G-20 countries about the end of the bank secrecy era would be applicable to Brazil, considering two aspects. The first is the rationale for the bank secrecy in Brazilian Law. The second is the possible constitutionality control over international treaties in tax matters related to the exchange of bank information eventually adopted by this country.
Keywords: bank secrecy, international tax transparency, exchange of information, tax treaties.
1. Introdução
Em 2009, os países do G-20 se reuniram em Londres, evento do qual resultou a emblemática frase “the era of banking secrecy is over”.2 Tal pronunciamento representa o leitmotiv do presente artigo, cujo objetivo é analisar sua aplicabilidade em nosso país.
Note-se que há duas razões para que se questione o “fim do sigilo bancário” no Brasil, quais sejam: (i) o sigilo bancário costuma ser interpretado como garantia fundamental do cidadão consagrada pelo texto constitucional; e (ii) a adoção de normas internacionais que o flexibilizem poderia receber manifestação negativa do Supremo Tribunal Federal (STF), na hipótese de órgão ser instado a se manifestar sobre o tema.
Assim sendo, o artigo será dividido em duas partes. A primeira analisará as interpretações que podem ser extraídas daquela frase, considerando o contexto atual de ascensão de medidas de transparência fiscal internacional,3 liderado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Isto é, o conflito que pode surgir entre os institutos sigilo bancário e transparência fiscal internacional. Nesse sentido, serão discutidas as razões de ser de cada instituto, o que demonstrará a impossibilidade de negação de qualquer um deles no ordenamento jurídico brasileiro, bem como a necessidade de outra forma de resolução para eventuais conflitos.
A segunda parte tratará dos obstáculos que podem surgir na adoção de normas internacionais relacionadas ao sigilo bancário no ordenamento jurídico brasileiro, tendo em vista a jurisprudência do Supremo. Considerando a aplicação do critério de hierarquia por aquela Corte, discutiremos o status normativo das normas internas relacionadas ao sigilo e das normas internacionais, especialmente os tratados em matéria tributária. Afinal, a depender do status normativo que se atribua ao fundamento do sigilo bancário e às regras que o regulamentam, o tratado poderá ou não prevalecer.
Quanto à segunda parte, é importante deixar claro que o artigo não discorrerá sobre eventuais convergências ou divergências de conteúdo entre a legislação interna vigente e as atuais orientações internacionais sobre sigilo bancário. Isso porque, independentemente de os Poderes Legislativo e Executivo brasileiros se alinharem ou não às normas internacionais, a adoção das últimas poderá ser obstada pelo controle de constitucionalidade do Supremo. Considerando que o Supremo tende a qualificar o sigilo bancário como garantia fundamental, a análise tratará apenas de duas situações hipotéticas, a saber: (i) tratado que negue ou suprima o sigilo bancário; e (ii) tratado que apenas o flexibilize, regulamentando as hipóteses passíveis de quebra.
Como se verá, a antiga jurisprudência do Supremo (Recurso Extraordinário n. 389.808/PR) sugeria que o primeiro tratado hipotético seria considerado inconstitucional e ineficaz. Ao mesmo tempo, não havia um posicionamento claro daquela Corte quanto à prevalência ou não do segundo tratado hipotético, pois a jurisprudência apontava argumentos para ambos os lados.
Contudo, o STF alterou seu posicionamento recentemente, por meio do julgamento conjunto do Recurso Extraordinário n. 601.314/SP e das Ações Diretas de Inconstitucionalidade ns. 2.390/DF, 2.386/DF, 2.397/DF e 2.859/DF, em sede de repercussão geral.
Até a elaboração desse artigo,4 não houve a publicação de todos os votos do julgamento. No entanto, temos notícias de que a Corte sinalizou orientação favorável à flexibilização do sigilo sob o argumento de atender aos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil.5 Assim, acreditamos que a dúvida se inverteu. Enquanto a nova jurisprudência do STF sugere que o segundo tratado hipotético seria considerado constitucional e eficaz, restam dúvidas sobre a aceitação pela Corte do primeiro tratado hipotético, o qual tornaria o sigilo bancário verdadeira letra morta.
2. Conflito entre Institutos: Sigilo e Transparência
Entendemos que o pronunciamento proferido pelo G-20 é curioso, pois admitimos diversas formas de interpretá-lo. A primeira delas diz respeito a seu sentido literal, como uma espécie de declaração do fim do instituto do sigilo bancário. No entanto, sabe-se que o sigilo permanece resguardado na legislação de diversos países, o que demonstra que a frase não pode ser interpretada por seu “valor de face”, mas como verdadeiro chamado político que levantou a bandeira contra o sigilo bancário.
A segunda forma diz respeito à sugestão de que o sigilo perdeu a razão de ser. Afinal, afirmar que a era de algo acabou pode sugerir que esse algo (no caso, o sigilo bancário) não mais se justifica, tal qual um instituto a ser superado. Esse parece ser o entendimento adotado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).6
Um dos exemplos que justificam essa afirmação é o report “Harmful tax competition: an emerging global issue”, no qual a OCDE demonstra analisar o sigilo bancário de maneira bastante negativa. Segundo a OCDE, as regras sobre o sigilo seriam cada vez mais inadequadas para prevenir o abuso dos regimes preferenciais (harmful preferential tax regimes) pelos contribuintes,7 e a falta de informação, devido a tais regras, seria uma das características mais nocivas desses regimes.8 Assim, o documento recomendou aos países a revisão de leis, regulamentos e práticas sobre sigilo bancário no sentido de remover impedimentos ao acesso dessas informações pelas autoridades fiscais.9
Diante desse cenário, é bastante esclarecedora a oposição de Luxemburgo, país que não aderiu ao report. Conforme demonstra o Anexo II daquele documento (Statements by Luxembourg and Switzerland), Luxemburgo critica a orientação da OCDE afirmando que o report parece estar menos preocupado em conter as práticas prejudiciais do que em abolir o sigilo bancário e, ainda, que este não seria a origem daquele.10
Por fim, ainda há uma terceira forma de interpretar o mencionado pronunciamento, segundo a qual a declaração não teria negado o instituto do sigilo bancário, mas demandado sua flexibilização em face de outros valores buscados pela transparência fiscal internacional. Isto é, o chamado político teria se direcionado à flexibilização do sigilo e não ao seu combate.
Nesse sentido, seria possível inferir duas maneiras para lidar com o conflito entre sigilo bancário e transparência fiscal internacional: (i) o afastamento ou negação do sigilo; ou (ii) a flexibilização do sigilo. Ainda que o afastamento tenha sido adotado pela OCDE, ao menos aparentemente, entendemos que a flexibilização melhor atenderia aos direitos e garantias dos contribuintes, sem tornar ineficazes as medidas de transparência fiscal internacional.
Isso porque há um questionamento a ser feito antes que o instituto seja retirado de campo ou posto no banco dos réus: o sigilo bancário ainda cumpre uma função jurídica e social? Afinal, para que o sigilo seja afastado seria preciso concluir que as razões que o fundamentam passaram a ser inválidas ou ilegítimas. Todavia, isso não parece ocorrer no Brasil, como veremos adiante.
De todo modo, a flexibilização do sigilo tampouco é infensa a questionamentos. Em tal contexto, porém, a pergunta deveria ser outra: os fundamentos da transparência fiscal justificam a flexibilização do sigilo? Em outras palavras, trata-se de analisar em que medida a manutenção do sigilo bancário é a eles incompatível.
Assim sendo, o primeiro conflito será analisado através da comparação entre aquilo que entendemos ser a natureza, o fundamento e o objetivo visado por cada instituto.
2.1. Fundamento do sigilo bancário: direito à intimidade e à privacidade
Desde os anos 1990, a razão de ser do sigilo bancário é motivo de intenso debate doutrinário. Dentre os principais fundamentos citados, destacamos: (i) o segredo profissional, art. 5º, XIV, da Constituição Federal (CF/1988); (ii) o sigilo de dados, art. 5º, XII, da CF/1988; e (iii) a proteção da intimidade e da vida privada, art. 5º, X, da CF/1988.11
Preliminarmente, vale ressaltar não haver dispositivo constitucional expresso que preveja a proteção ao sigilo bancário. No entanto, tanto a doutrina quanto a jurisprudência costumam fundamentar o sigilo em algum dos incisos do art. 5º da Constituição, o que demonstra ser consolidada no Brasil a ideia de que o fundamento do sigilo é um direito ou garantia fundamental do cidadão. Excepcionalmente, há quem defenda o status meramente legal da proteção ao sigilo.12 De qualquer forma, alertamos que não é nosso objetivo esmiuçar tal debate – pois já o fizemos em outra oportunidade.13 Assim, relembraremos os dois primeiros fundamentos, de maneira breve, e aprofundaremos nossa análise apenas quanto ao último.
Além do art. 5º, XIV, da Constituição, há outra base legal utilizada por parte da doutrina14 para justificar o segredo profissional como o fundamento do sigilo bancário, qual seja: o parágrafo único do art. 197 do Código Tributário Nacional (CTN). Esse artigo impõe às instituições financeiras o dever de prestar informações ao Fisco, mas seu parágrafo único exclui de tal dever as informações quanto a fatos sobre os quais o informante esteja legalmente obrigado a observar segredo em razão de cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão. Nesse sentido, seria possível entender que o sigilo bancário estaria relacionado ao sigilo profissional.
Contrariamente, outra parte da doutrina15 sequer discute a limitação do referido parágrafo único, por acreditar que os banqueiros não se submetem às mesmas regras éticas e jurídicas de sigilo impostas a determinados ofícios (por exemplo, advogados, médicos ou padres), pois bancos devem ser procurados para negócios lícitos e confessáveis. Logo, ainda que se diga que o sigilo bancário seja uma espécie de sigilo profissional, essa espécie de sigilo (bancário), por sua particularidade, não poderia ser oponível ao Fisco. Nesse sentido, Tercio Sampaio Ferraz Junior vai além e diz que “nem todo ofício, porém, está protegido pelo sigilo profissional: só aquele que, por sua natureza exige a confidência ampla no interesse de quem confidencia”.16
De nossa parte, acreditamos que: (i) o sigilo bancário não pressupõe a confidência ampla e, consequentemente, não lhe seria aplicável a ideia de segredo profissional; e (ii) o bem jurídico protegido pelo sigilo bancário é o conteúdo privado das informações bancárias e não o vínculo banco-cliente ou o exercício da atividade bancária.17 Nesse sentido, entendemos que o segredo profissional não fundamenta o sigilo bancário, nem justifica a oponibilidade das instituições financeiras à Fazenda Pública.
O segundo fundamento citado é o sigilo de dados, cuja base legal é o inciso XII do art. 5º da Constituição. Trata-se da ideia de que os dados em geral (dentre os quais, as informações bancárias) seriam invioláveis, todavia entendemos que o inciso sugere outra interpretação, já que declara ser inviolável o sigilo “da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial”. Conforme crítica feita por Tercio Sampaio, o termo “‘dados’ não pode ser compreendido como o objeto da comunicação, mas como a modalidade tecnológica de comunicação”.18 Logo, o que se protege no art. 5º, XII, da CF/1988 é a comunicação restringida (sigilo da comunicação), não os dados armazenados em si mesmos (sigilo da informação). Desse modo, acreditamos que o sigilo de dados tampouco pode ser compreendido como fundamento do sigilo bancário.
Finalmente, o terceiro fundamento é a inviolabilidade da intimidade e da vida privada. Em resumo, doutrinadores19 separam os dois institutos da seguinte maneira: (i) privacidade envolve a proteção de formas de convivência que demarcam a individualidade em face de outros ou o direito de partilhar algo a um grupo restrito de pessoas mais íntimas; (ii) intimidade envolve o âmbito exclusivo que alguém reserva para si, sem nenhuma repercussão social, ou o direito de estar sozinho. Assim sendo, alguns doutrinadores20 restringem os institutos aos direitos de personalidade, negando sua extensão aos dados de natureza econômica, como informações bancárias.
No entanto, acreditamos que dados de contas bancárias podem revelar, ao menos indiretamente, aspectos da personalidade, como preferências de consumo, hábitos, estratégia comercial, carteira de clientes, fornecedores etc. Logo, assim como Paulo Roberto Lyrio Pimenta,21 entendemos que o art. 5º, inciso X, da CF/1988 tem amplo alcance, pelo que também seriam protegidos os dados relacionados às contas bancárias.22 Vale destacar que o mesmo entendimento foi manifestado pelo ministro Celso de Mello no julgamento do RE n. 601.314/SP, cujo voto, embora digno de aplausos, restou vencido.23
Note-se que o Supremo Tribunal da Espanha apresenta interessante julgado sobre o tema (STS n. 1.950/2000),24 cuja decisão declarou que alguns dados patrimoniais podem ser, sim, afeitos ao direito de personalidade, enquanto outros não, de tal sorte que a revelação de dados econômicos nem sempre violaria a intimidade.
Em nosso país, o antigo leading case no Supremo Tribunal Federal não chegou a diferenciar as espécies de informações bancárias. Trata-se do Recurso Extraordinário n. 389.808/PR, cujo mérito discutia a possibilidade de quebra direta pelas autoridades administrativas. Isso poderia sugerir que, na visão do Supremo, qualquer espécie de informação estaria relacionada à intimidade. Tal análise sempre nos pareceu prematura, haja vista que o mérito do caso discutia a competência e não o objeto da quebra.
De fato, no recente julgamento da ADI n. 2.390/DF, verificamos que o ministro Dias Toffoli afirmou que as informações elencadas no art. 5º da Lei Complementar n. 105/2001 – isto é, dados cadastrais dos contribuintes e montantes globais das operações – não seriam informações bancárias sigilosas. Dessa forma, ele sugeriu ser possível diferenciar informações bancárias sigilosas e não sigilosas. Infelizmente, não temos notícia de que esse raciocínio tenha sido acolhido pelos demais ministros, uma vez que os demais votos ainda não foram publicados.
De todo modo, considerando que o fundamento do sigilo é a privacidade e a intimidade – direitos fundamentais em um estado democrático de direito –, parece-nos forçoso reconhecer que sua função jurídica e social relativa à proteção do indivíduo face à ingerência indevida do Estado permanece válida e legítima no Brasil, razão pela qual o sigilo bancário não poderia ser peremptoriamente afastado. É bem verdade que o art. 26 da Convenção Modelo da OCDE não faz qualquer referência ao direito à privacidade como possível argumento para a manutenção do sigilo bancário ou para a recusa legítima ao pedido de troca de informações. Entretanto, vale ressaltar que a própria OCDE reconheceu que “a proteção de dados concerne a direitos e liberdades fundamentais de um indivíduo, e em particular, o direto à privacidade, em relação ao processamento automático de dados pessoais”.25
2.2. Transparência fiscal internacional: cooperação entre os países e aplicação da lei tributária
Se, de um lado, o sigilo bancário alberga bem jurídico que não deve restar desprotegido, de outro, as medidas de transparência fiscal internacional também visam a bens jurídicos cujas funções jurídicas e sociais tampouco podem ser ignoradas. Nesse sentido, faz-se necessário analisar os fundamentos da transparência fiscal internacional na legislação brasileira.
Contrariamente ao sigilo bancário, a discussão sobre o tema é recente no Brasil, razão pela qual as manifestações doutrinárias são bem menos expressivas. De todo modo, podemos identificar os seguintes fundamentos:26 (i) o art. 145, parágrafo 1º, da CF/1988; (ii) o art. 4º, IX, da CF/1988; e (iii) o parágrafo único do art. 199 do CTN.
O exercício da atividade de fiscalização pelo Estado encontra respaldo no art. 145, parágrafo 1º, da Constituição, segundo o qual é facultado à Administração Tributária identificar o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte, respeitados os direitos individuais e os termos da lei. É bem verdade que o dispositivo constitucional não trata especificamente da coleta de dados para intercâmbio de informações, mas tampouco a impede. Note-se ainda que a redação do mencionado artigo utiliza o termo “especialmente”, sugerindo que garantir a efetividade da tributação com base na capacidade econômica do contribuinte é a principal função da fiscalização, mas não a única.
Por sua vez, o art. 4º, inciso IX determina que a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade é um dos princípios que regem o estado brasileiro em suas relações internacionais. Ora, se as medidas de transparência fiscal internacional tratam exatamente de formas pelas quais os estados se comprometem à assistência mútua na aplicação da lei tributária, seria possível dizer que o intercâmbio de informações é medida de cooperação internacional albergada pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Note-se que o parágrafo único do art. 199 do CTN é mais assertivo, já que expressamente autoriza a Fazenda Pública da União a permutar informações com Estados estrangeiros no interesse da arrecadação e da fiscalização dos tributos. Ressaltamos que tal dispositivo foi incluído recentemente na legislação, mais especificamente em 2001, ano de edição da Lei Complementar n. 105, cujo conteúdo alterou a regulamentação sobre a quebra de sigilo bancário até então vigente.
Logo, entendemos que no Brasil há dois fundamentos para a transparência fiscal internacional: (i) cooperação entre os povos; (ii) interesse da arrecadação e da fiscalização dos tributos.
Note-se que os objetivos apresentados pela OCDE quanto à transparência parecem ser consentâneos a tais fundamentos. Em linhas gerais, os objetivos27 mais importantes apontados pela OCDE são: (1) assegurar a aplicação das normas específicas de acordos internacionais em contexto bilateral; e (2) assegurar a aplicação da lei tributária interna de cada país, tanto no contexto bilateral quanto no multilateral. Ademais, há outros objetivos recorrentes, como: (3) assistência em matéria criminal;28 (4) promover a internacionalização das relações econômicas;29 (5) combater a evasão tributária;30 (6) combater a lavagem de dinheiro, a corrupção e o financiamento do terrorismo.31 Entendemos que os objetivos citados podem ser justificados, seja pela cooperação entre os povos (objetivos ns. 1, 2, 3, 4, 5 e 6), seja pelo interesse da arrecadação e da fiscalização dos tributos (objetivos ns. 1, 2 e 5).
Portanto, entendemos que, assim como o sigilo bancário, a transparência fiscal internacional é instituto protegido pelo ordenamento jurídico brasileiro, razão pela qual tampouco poderia ser peremptoriamente afastada.
2.3. Conflito entre sigilo e transparência
Tendo em vista que ambos os institutos recebem proteção na legislação brasileira, logo surge a pergunta: qual seria a maneira mais adequada de lidar com o conflito entre eles? A resposta depende do caráter normativo que se atribua a cada instituto. Nesse trabalho tomaremos como premissa a distinção entre princípios e regras feita por Humberto Ávila, segundo o qual os princípios são normas finalísticas que estabelecem um estado ideal de coisas, enquanto as regras são normas descritivas de comportamento.32
Assim sendo, entendemos que a norma relativa ao sigilo descreve um comportamento proibitivo para as instituições financeiras, qual seja, a divulgação de dados bancários de seus clientes. Portanto, o sigilo bancário será qualificado como uma regra. Por outro lado, a transparência fiscal diz respeito a um estado ideal de coisas, um fim para o qual as medidas de intercâmbio de informações constituem um meio. Logo, a transparência fiscal internacional será qualificada como um princípio.
A distinção é relevante se levarmos em consideração a seguinte ideia defendida pelo autor: as regras possuem uma rigidez maior, de modo que sua superação só é admissível quando há motivos fortes para tanto, pela própria finalidade subjacente à regra ou pelos princípios superiores a ela.33
Assim sendo, entendemos que o sigilo impõe uma regra que só poderia ser flexibilizada quando se verificasse: (i) que sua aplicação renega a finalidade subjacente ao sigilo bancário ou (ii) a existência de princípio superior que devesse prevalecer.
Nesse sentido, é necessário verificar como a transparência fiscal internacional justificaria a flexibilização do sigilo. Em outras palavras, trata-se de analisar em que medida a manutenção do sigilo bancário é a ela incompatível. Para tanto, acreditamos oportuno apresentar o seguinte quadro comparativo:
Instituto |
Sigilo bancário |
Transparência fiscal internacional |
Fundamento |
Direito à intimidade e à privacidade |
Cooperação entre os povos, interesse da arrecadação e da fiscalização |
Objetivos |
Proteger o cidadão contra a ingerência indevida do Estado |
Garantir a aplicação da lei tributária e a arrecadação correlacionada, promover relações econômicas internacionais, assistir investigações criminais e combater práticas ilícitas (evasão fiscal, lavagem de dinheiro, corrupção e terrorismo) |
Objeto |
Determinados dados bancários |
Informação de relevância previsível34 |
O quadro tem a intenção de demonstrar três argumentos importantes, discutidos adiante mais detidamente. O primeiro é a ideia de que apenas determinados dados bancários são protegidos pelo sigilo, quais sejam, aqueles cuja revelação possa violar a intimidade. O segundo é o caráter relativo do sigilo bancário,35 pois o que ele previne é a ingerência do Estado qualificada como indevida, mas não aquela justificada pela lei e pelo Poder Judiciário. O terceiro é o equívoco do raciocínio que opõe sigilo bancário (instituto) ao combate à fraude fiscal (objetivo), pois sigilo não é sinônimo de fraude fiscal. Isto é, o sigilo bancário não se presta à evasão tributária – ainda que possa ser desvirtuado para o cometimento de crimes –, mas à proteção da intimidade contra ingerência indevida do Estado em dados cuja revelação possa violar a intimidade.
Tendo em vista que dados bancários certamente constituem informação de relevância previsível para fins fiscais, é fundamental observar quais espécies de dados bancários (protegidos pelo sigilo ou não) estão incluídos entre os dados necessários e suficientes para as medidas de cooperação. Afinal, se tais medidas pudessem ser satisfeitas apenas com dados bancários não protegidos pelo sigilo, o conflito entre sigilo bancário e transparência fiscal internacional sequer existiria.
Nesse sentido, há questionamentos imprescindíveis: afinal, se o que sigilo protege é a intimidade, como os dados bancários se relacionam a ela? Isto é, todos os dados bancários dizem respeito à intimidade ou é possível quebrar o sigilo bancário sem feri-la?
Rodrigo Caramori Petry – com quem concordamos – distingue e postula tratamento diferenciado para os diversos dados bancários, os quais divide em três níveis fundamentais.36 O nível mínimo compreende dados básicos, como as informações cadastrais dos correntistas e a identificação da espécie de investimento, de poupança ou de guarda de bens. O nível médio compreende a identificação de valores, como valor em moeda dos investimentos, da poupança, dos bens custodiados e o valor global da movimentação financeira por período. O nível avançado compreende os detalhes das operações, como a identificação dos destinos e origens dos recursos movimentados.
Como já dissemos, acreditamos que dados bancários revelam aspectos da personalidade, ao menos indiretamente, se permitirem a detecção de preferências de consumo, hábitos, estratégia comercial, carteira de clientes, fornecedores etc. Logo, entendemos que apenas o nível avançado de dados viola a intimidade, pois ele identifica os gastos e as origens de rendimentos do sujeito passivo. Note-se que os dois primeiros níveis de dados, por sua vez, não permitem identificar as preferências, nem o real estado de negócios do sujeito passivo, mas auxiliam no reconhecimento de sinais exteriores de riqueza e indícios de crimes fiscais.
Nesse mesmo sentido, o referido autor afirma que “a identificação dos montantes globais de movimentação financeira permite ao Fisco apenas verificar se há fatos signo presuntivos de riqueza tributável ou eventuais indícios de sonegação fiscal”.37 Ademais, é possível citar também Oswaldo Othon de Pontes Saraiva Filho, para quem as informações cadastrais e os valores globais não estão protegidos por nenhuma das nuances do direito à privacidade.38
Vale observar que se todos os dados bancários fossem invioláveis em si mesmos, restaria inviabilizado o exercício da competência fiscalizadora do Estado, a qual está expressamente prevista em norma também constitucional, como se vê no art. 145, parágrafo 1º. Ora, não faz sentido, de um lado, atribuir à Administração Tributária a faculdade de identificar o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte e, de outro, tornar os mesmos dados invioláveis. É bem verdade que o referido artigo determina o respeito aos direitos individuais e aos termos da lei, contudo impedir a devassa das informações bancárias não implica completa inviolabilidade.
Assim sendo, o sigilo bancário é faculdade39 que protege o direito à intimidade e à vida privada, contudo nem todos os dados bancários revelam aspectos da vida íntima ou privada. Logo, o acesso a dados bancários pode violar ou não a intimidade.
Situações diferentes exigem tratamentos jurídicos distintos. No acesso aos dados de nível máximo, há violação da intimidade e quebra total do sigilo bancário, razão pela qual deve ser exigida a intervenção prévia do Poder Judiciário. Por outro lado, no acesso aos dados de nível mínimo e médio, não há tal violação, mas mera quebra parcial, razão pela qual a quebra poderia ser realizada diretamente pela Administração Fazendária, via deveres instrumentais, desde que fundada em lei de natureza complementar.
Note-se que a imposição de deveres instrumentais limitados à identificação e montantes globais representa um mecanismo de suma importância. De um lado, evita-se a ineficiência de uma administração que só tenha acesso àquilo que é espontaneamente prestado pelos próprios contribuintes.40 De outro, preserva-se o direito à intimidade contra ingerências desproporcionais da Fazenda Pública.
Desse modo, o acesso detalhado à movimentação financeira só deveria ocorrer se houvesse irregularidade ou indício de crime detectado pelo cruzamento de informações e a Fazenda Pública necessitasse de informações adicionais sobre aquele sujeito passivo específico, hipótese na qual seria possível postular em juízo a quebra total nos termos da lei.
Partindo de tal pressuposto, a conclusão é que o conflito entre sigilo bancário e transparência fiscal somente ocorre em relação a determinadas espécies de dados bancários, aqueles relacionados à intimidade, quais sejam: informações que permitam identificar a origem e o destino dos recursos movimentados. Quanto aos demais – informações cadastrais e montantes globais –, entendemos que o conflito é apenas aparente.
Em outras palavras, dados de nível mínimo e médio poderiam ser diretamente acessados pela Fazenda Pública, sem que houvesse verdadeiro conflito porque, de fato, não haveria sigilo dessas informações. Por outro lado, dados de nível máximo estariam protegidos pelo sigilo e não poderiam ser acessados pelas autoridades fiscais, senão com autorização judicial. Logo, apenas o pedido de informação enquadrado na segunda hipótese poderia gerar verdadeiro conflito entre sigilo bancário e transparência fiscal internacional.
De fato, verificamos que o raciocínio relativo ao conflito aparente também foi defendido pelo Ministro Dias Toffoli no julgamento da ADI n. 2.390. Segundo o Ministro, o art. 5º da Lei Complementar se restringe às informações que identificam os titulares das operações e os montantes globais movimentados, as quais são cruzadas com dados fornecidos pelas pessoas físicas e jurídicas nas declarações anuais de imposto de renda, de modo que essas informações já não seriam sigilosas, a rigor.41 No entanto, a autorização judicial para as hipóteses de conflito real não foi corroborada pelo Ministro.
Consequentemente, surgem dois novos questionamentos: (i) na hipótese de conflito aparente, caberia ao legislador descrever essas informações taxativamente ou por meio de cláusula aberta?; e (ii) na hipótese de conflito real, qual interesse deve prevalecer?
Ainda que as cláusulas abertas sejam instrumentos úteis para garantir maior adaptabilidade da norma à realidade, elas representam um elemento de insegurança jurídica no ordenamento. Assim, entendemos que o legislador deveria prever taxativamente os dados objeto de prestação de informações. De fato, essa foi a linha seguida pelo legislador. Isso porque as informações a serem prestadas foram descritas tanto no Decreto n. 4.489/2002 quanto na Instrução Normativa n. 1.571/2015, a qual regulamenta a e-Financeira, dever instrumental que substituiu a antiga Declaração de Informações sobre Movimentações Financeiras (Dimof) para os fatos geradores ocorridos a partir de dezembro de 2015.42 Além disso, vale ressaltar que a própria Lei Complementar n. 105/2001 determina as operações cujos montantes globais devem ser informados, como demonstra seu art. 5º, parágrafo 1º.
Quanto ao interesse que prevalecer na hipótese de conflito real, não há uma regra prefixada. Afinal, a ideia de sopesamento entre interesses públicos e privados, por si só, já rechaça a prevalência predeterminada de um interesse sobre o outro.43 Nesse sentido, entendemos que a quebra total do sigilo fundamentada na superioridade do princípio da transparência fiscal internacional face à regra do sigilo bancário demanda a análise do caso concreto pelo Poder Judiciário. De todo modo, vale ressaltar que o sigilo bancário tem caráter relativo e pode ser flexibilizado em face de outros valores.
Com efeito, acreditamos existirem razões relevantes para a flexibilização do sigilo bancário quando houver indícios de práticas ilícitas, pois o titular de um direito não o pode exercer excedendo manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico e social.44 Logo, o sigilo bancário não pode ser exercido com abuso de direito e, caso isso ocorra, a ingerência do Estado não seria indevida, desde que previamente autorizada pelo Poder Judiciário. Trata-se, portanto, de hipótese em que a aplicação do sigilo renega a própria finalidade subjacente ao sigilo bancário.
Em síntese, acreditamos ser possível entender que no Brasil o sigilo não deve ser afastado ou negado, como parece sugerir a OCDE. Nas hipóteses de conflito aparente (dados mínimos e médios), não deveria haver negação do instituto e de sua função jurídica e social, mas inaplicabilidade devido ao objeto. Por sua vez, nas hipóteses de conflito real (dados máximos) o exercício do sigilo poderia ser flexibilizado – e não rechaçado peremptoriamente – pelo Poder Judiciário diante do caso concreto.
3. Conflito entre Ordens: Normas Internas e Tratados Internacionais
Certo é que a jurisprudência constitui elemento fundamental na construção do sentido dos institutos jurídicos, e com o sigilo bancário não seria diferente. É dizer, ainda que o Poder Legislativo brasileiro aprove tratados internacionais que neguem ou flexibilizem o sigilo bancário e o Poder Executivo os ratifique, o Poder Judiciário pode fazer prevalecer entendimento diverso, caso entenda que a orientação dada pelos demais poderes padece de inconstitucionalidade ou ilegalidade. Assim sendo, vislumbramos um segundo conflito que poderia colocar em xeque o pronunciamento do G-20, qual seja: controle de constitucionalidade ou de legalidade feito pelos órgãos judiciais instados a se manifestar sobre a adoção de normas internacionais relacionadas ao sigilo bancário.
Seguindo tal raciocínio, é fundamental questionar qual o status normativo do sigilo bancário. Afinal, se entendermos que seu fundamento jurídico é matéria constitucional, a jurisprudência do STF passará a ser determinante na aplicação de qualquer norma sobre o tema, seja interna, seja internacional. Portanto, será forçoso reconhecer que a aplicabilidade de qualquer orientação dada pelos instrumentos internacionais de transparência fiscal internacional em relação ao afastamento ou flexibilização do sigilo poderá ter sua eficácia comprometida por manifestação contrária daquela Corte.
Além disso, acreditamos necessário questionar também qual o status hierárquico das normas internacionais recepcionadas pelo ordenamento interno, para que se verifique a possibilidade de que tais normas sejam afastadas em virtude de interpretação conforme à Constituição que privilegie o sigilo bancário, bem como sua relação com as normas infraconstitucionais relacionadas ao sigilo.
Como discutiremos a seguir, entendemos que: (i) sigilo bancário tem fundamento em direito constitucionalmente protegido, mas as regras relativas à sua quebra são matéria de lei complementar (art. 192 da CF/1988); e (ii) no Brasil, vige o princípio da supremacia da Constituição. Por conseguinte, caso o tratado internacional negue ou afaste a aplicação do sigilo bancário no Brasil, será de clara inconstitucionalidade.
Por outro lado, caso o tratado internacional apenas o flexibilize, há dúvidas sobre a sua recepção no ordenamento jurídico brasileiro. Isso porque, de um lado, a jurisprudência do Supremo caminha para a prevalência dos tratados em matéria tributária sobre normas infraconstitucionais, o que conduziria à adoção do tratado. De outro, o Supremo já manifestou pela impossibilidade de que tratados discorram sobre matéria reservada à lei complementar, o que impediria a adoção do tratado.
3.1. Status jurídico do sigilo bancário
Preliminarmente, vale observar que o sigilo bancário (instituto) não se confunde com a intimidade (fundamento). A proteção à intimidade tem status constitucional e constitui garantia fundamental consubstanciada em cláusula pétrea. Por outro lado, entendemos que a regulamentação do sigilo bancário é matéria de lei complementar, haja vista o art. 192 da Constituição.
O mencionado artigo determina que o sistema financeiro nacional deve ser regulamentado por lei complementar. De nossa parte, temos que o mandamento se relaciona à estruturação desse sistema – isto é, dos pilares jurídicos que o viabilizam –, para o qual exige instrumento jurídico próprio. Assim sendo, surge a pergunta: o sigilo é algo que pode ser considerado como parte estrutural do sistema financeiro? Acreditamos que a resposta é positiva, ainda que não seja tão decisiva quanto as atribuições do banco central, a regulamentação do sigilo é fundamental para o próprio exercício da atividade bancária. Consequentemente, o sigilo bancário seria tema reservado à lei complementar.45
Note-se que tal entendimento também foi manifestado por alguns doutrinadores. Arnoldo Wald e Ives Gandra da Silva Martins postulam que o sigilo bancário deve ser regulado “mediante uma única lei complementar, que deverá tratar exaustivamente do assunto”.46 Na mesma linha, Carlos Henrique Abrão critica a Lei n. 8.021/1990 – cujo art. 8º impõe às instituições financeiras o dever de prestar informações quanto à identificação de contribuintes – por entender que a legislação bancária tem conotação de natureza complementar, razão pela qual não poderia ser atacada por norma inferior, como a mencionada lei, de status ordinário.47 Ainda, Geraldo de Camargo Vidigal cita a opinião do Ministro Sidney Sanches, pela qual “somente por lei complementar una, que dê estrutura a todo o sistema bancário, pode ser alterada norma contida na Lei n. 4.595/64”.48
Além disso, encontramos na jurisprudência do Supremo outra manifestação favorável a esse raciocínio. Trata-se do voto do Ministro Carlos Velloso no Mandado de Segurança n. 21.729/DF, no qual defendeu que as regras de quebra do sigilo bancário são matéria de lei complementar.49
É bem verdade que o art. 113, parágrafo 2º, do CTN permite a criação de deveres instrumentais por meio da legislação, a qual inclui tratados e convenções internacionais (art. 96 do CTN). Contudo, todo dever instrumental, mesmo que regulamentado por legislação tributária, deve sempre encontrar fundamento na lei stricto sensu, em obediência ao art. 5º, II, da Constituição. Logo, o art. 113, parágrafo 2º, do CTN deve ser interpretado em conformidade com o texto constitucional, de tal sorte que deveres instrumentais cujo objeto seja informações bancárias deverão encontrar fundamento de validade em lei complementar.
Ainda assim, afirmar que o sigilo bancário deve ser regulamentado por lei complementar traz o seguinte questionamento: se o fundamento do sigilo é cláusula pétrea, como é possível haver regulamentação do instituto por lei complementar? Isto é, trata-se de relativização indireta de cláusula pétrea por lei infraconstitucional?
De acordo com o art. 60, parágrafo 4º, IV, da CF/1988, são vedadas emendas constitucionais tendentes a abolir os direitos e as garantias individuais. Ora, a Constituição fala em abolir, o que traz outra pergunta: o termo “abolir” compreende apenas a supressão ou também a alteração?
Oswaldo Othon de Pontes Saraiva Filho responde a dúvida citando o entendimento do Ministro Moreira Alves, segundo o qual a Constituição não pretende tornar as cláusulas pétreas algo insuscetível de alterações, sendo possível haver alteração tolerável “até imediatamente antes do ponto em que se caracteriza a tendência à abolição”.50 Concordamos com o Ministro, haja vista que nenhum direito é absoluto, mesmo quando consubstanciado em cláusula pétrea. No entanto, forçoso reconhecer que a qualidade de tolerável e o referido ponto não estão claros.
Por sua vez, Hamilton Dias de Souza cita o entendimento do Ministro Paulo Brossard, segundo o qual a Constituição veda abolir, não alterar, modificar ou reduzir.51 Nesse sentido, o autor afirma que, tratando-se de cláusula pétrea, é preciso verificar se a norma implica alteração substancial do direito fundamental ou se ela apenas o delimita, sem o suprimir. No que diz respeito ao sigilo bancário, especificamente, sustenta que a violação direta pelos agentes fazendários não é caso de mera delimitação, mas de alteração substancial.52
Assim sendo, entendemos que o bem jurídico protegido pelo sigilo bancário (intimidade) é matéria constitucional, porém pode ser delimitado por lei de status complementar, desde que a regulamentação não implique supressão do direito ou modificação de efeito análogo. Em outras palavras, o que está vedado pela Carta Maior é a abolição do sigilo bancário e da proteção à intimidade, mas não sua regulamentação, para a qual exige lei complementar, papel atualmente desempenhado pela LC n. 105/2001.
Consequentemente, a jurisprudência do STF é determinante na aplicação de qualquer norma sobre o tema, seja interna, seja internacional. Portanto, entendemos que qualquer orientação dada pelos instrumentos internacionais de transparência fiscal internacional em relação ao afastamento ou flexibilização do sigilo poderá depender, no final do dia, da anuência do Supremo, caso o tema seja submetido à apreciação do órgão.
3.2. Status jurídico dos tratados internacionais
A adoção de tratados relacionados à transparência é questão prejudicial na resolução de possível conflito com normas internas que protejam o sigilo bancário. Isso porque a aplicação do critério de hierarquia é uma das formas usualmente utilizadas para resolução de antinomias. Nesse sentido, havendo conflito entre normas internas protetivas e normas internacionais flexibilizadoras do sigilo, a relação hierárquica entre elas será determinante.
De fato, há certa discussão quanto ao uso do critério de hierarquia para a resolução de conflitos entre a ordem interna e a ordem internacional, havendo quem considere mais adequado o critério da especialidade.53 No entanto, essa discussão não será aqui tratada. Isso porque, nos precedentes analisados nesse artigo, o Supremo discutiu reiteradamente o critério de hierarquia.
Tendo em vista que o fundamento do sigilo é cláusula pétrea e sua regulamentação matéria de lei complementar, surge a pergunta: é possível que um tratado disponha sobre o sigilo de maneira contrária à Constituição e à lei complementar?
É bem verdade que o art. 98 do CTN determina que os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha. Contudo, é preciso ter cuidado na análise desse dispositivo.
Em primeiro lugar, a doutrina e a jurisprudência já se manifestaram de maneira contrária ao termo “revogam”, pois efetivamente a aprovação de um tratado não implica revogação da lei interna. Segundo Luís Eduardo Schoueri, o art. 98 não suscita uma questão de hierarquia ou prevalência, mas sim de competência, pois os tratados fixam limites para a jurisdição.54
Em segundo lugar, é preciso ter em vista que o dispositivo se refere ao conceito legal de “legislação tributária” tal qual definido no art. 96 do mesmo Código. Portanto, a legislação tributária sobre a qual os tratados e convenções devem prevalecer compreende leis, decretos e normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes.
Nesse sentido, vê-se que o conceito legal não abarca a Constituição, nem a lei complementar. É bem verdade que o art. 96 usa o termo “leis” sem especificar quaisquer de suas espécies, isto é, lei complementar ou lei ordinária. Entretanto, à época da edição daquele código, a lei complementar sequer existia no ordenamento jurídico brasileiro. Portanto, não parece plausível dizer que o legislador desde 1966 já tratava de figura ainda inexistente, razão pela qual entendemos que o termo “leis” se dirige às leis ordinárias.
Nem se diga que a expressão “normas complementares” permitiria a inclusão das leis complementares no rol da legislação tributária. Afinal, trata-se de conceito legal definido pelo art. 100 do Código, o qual inclui: (i) atos normativos expedidos pelas autoridades administrativas; (ii) as decisões dos órgãos singulares ou coletivos de jurisdição administrativa, a que a lei atribua eficácia normativa; (iii) as práticas reiteradamente observadas pelas autoridades administrativas; e (iv) os convênios que entre si celebrem a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.
De todo modo, mesmo que se admita que o referido termo trate de leis ordinárias e leis complementares, vale observar que o STF já negou a possibilidade de que tratados internacionais versem sobre matéria reservada à lei complementar. Trata-se da importante Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.480/1997, a qual será analisada adiante.
Assim sendo, entendemos que o art. 98 do CTN, por si só, não permite que os tratados e convenções internacionais em matéria tributária prevaleçam sobre a Constituição, tampouco sobre leis complementares. Afinal, a jurisprudência do STF quanto à internalização de tratados em geral, também determina a observância da Constituição e a reserva de lei complementar.
Fato é que a posição hierárquica dos tratados internacionais na ordem interna é matéria bastante discutida no Supremo, com soluções diversas de acordo com a natureza do tratado, a saber: (i) tratados em geral; (ii) tratados em matéria de direitos humanos; e (iii) tratados em matéria tributária.
Em um primeiro momento,55 a jurisprudência do STF se firmou no sentido de primazia do direito internacional, pois se entendia que norma internacional tem forma própria de revogação – a denúncia –, a qual só poderia ser alterada por outra norma de categoria igual ou superior, internacional ou supranacional, jamais pela inferior, interna ou nacional.56
Todavia, em 1977, o STF mudou de orientação com o julgamento do RE n. 80.004/SE, no qual venceu a tese de que tratados são recepcionados como lei interna, sem que haja primazia da norma internacional. Segundo voto do Ministro Cunha Peixoto, inexistia dispositivo constitucional que garantisse a irrevogabilidade de lei positiva brasileira que tivesse origem em tratado.57 No mesmo sentido, o ministro Cordeiro Guerra afirmou que a Constituição anterior deferia ao STF competência para declarar a inconstitucionalidade de tratado ou de lei, em pé de igualdade, sem dar ao tratado internacional forma superior à da lei.58 Por fim, o Ministro Leitão de Abreu também negou que o tratado não pudesse ser modificado ou revogado como qualquer outro diploma legal, pois o contrário implicaria qualificar o tratado como superlei, em situação superior à própria Constituição.59
Em 1995, no julgamento do HC n. 72.131, o STF definiu que os tratados internacionais ingressam no ordenamento jurídico brasileiro tão somente como lei ordinária. Note-se que os Ministros Moreira Alves,60 Francisco Rezek61 e Celso de Mello62 concordaram quanto à impossibilidade de que tratados restringissem o alcance das disposições previstas no texto constitucional. Na mesma linha, o Ministro Maurício Correa63 defendeu que normas decorrentes de tratados poderiam ser submetidas ao controle de constitucionalidade pelo Supremo.
Em 1997, houve importante manifestação da Corte na ADI n. 1.480/1997. Nessa oportunidade, o STF entendeu que: (i) os tratados estão hierarquicamente subordinados à autoridade normativa da Constituição, o que torna sem nenhum valor jurídico os tratados incorporados ao sistema de direito positivo interno que transgridam o texto constitucional; (ii) o exercício do “treaty-making power” do Estado brasileiro está adstrito às limitações jurídicas impostas pela Constituição; (iii) os atos internacionais são recebidos como leis ordinárias, de modo que a eventual precedência sobre as regras infraconstitucionais internas somente se justifica quando a situação de antinomia impuser a aplicação alternativa do critério cronológico ou do critério da especialidade; e (iv) os tratados internacionais celebrados pelo Brasil não podem versar sobre matéria posta sob reserva constitucional de lei complementar.64
Vale ressaltar que houve ampla discussão no que diz respeito à reserva de lei complementar, uma vez que a maioria65 do tribunal entendeu que esse tipo de lei detém conteúdo temático próprio (aspecto material), além da exigência de aprovação por maioria qualificada (aspecto formal).
Em 2008, porém, houve uma mudança de orientação da Corte com o julgamento conjunto dos Recursos Extraordinários n. 349.703/RS e n. 466.343/SP e do Habeas Corpus n. 87.585/TO. Devido à alteração do parágrafo 3º do art. 5º pela Emenda Constitucional n. 45/2004, a Corte passou a diferenciar o tratamento aplicável aos tratados em geral e aos tratados em matéria de direitos humanos, conferindo às normas dessa última espécie o status normativo de supralegalidade.
Nesses três julgados se destacam os votos dos Ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello. O primeiro defendeu o caráter supralegal das normas internacionais de direitos humanos e sustentou que tratados devem ser celebrados em consonância com o procedimento formal descrito na Constituição e com respeito ao seu conteúdo material, especialmente em tema de direito e garantias fundamentais.66 O segundo defendeu o caráter constitucional67 das normas internacionais de direitos humanos e argumentou ter por irrecusável a supremacia da CF sobre todos os tratados internacionais, inclusive os de direitos humanos, desde que as convenções importem supressão, modificação gravosa ou restrição a prerrogativas essenciais ou liberdades fundamentais asseguradas pelo texto constitucional.68
Ocorre que as questões de mérito nos julgados anteriores não versavam sobre tratados em matéria tributária. Assim, nos casos em que a questão surgiu, a discussão foi meramente incidental. De todo modo, já se nota a existência de tratamento diferenciado para tratados dessa natureza, o que foi confirmado pelo Supremo em julgados especificamente tributários.
Em 1954, encontramos a Apelação Cível n. 9.594/RS, que tratava de estender ao adicional de impostos aduaneiros a isenção a eles concedida por tratado. Nesse caso, o Ministro Orosimbo Nonato afirmou que os tratados deveriam ser interpretados com “ânimo liberal e generoso”, ou seja, sem restrições que “o seu espírito e a sua finalidade não comportem”.69 Note-se que o julgado é anterior ao art. 98 do CTN, mas consentâneo à jurisprudência do STF à época, na qual havia primazia da ordem internacional.
Em 1977, no já citado RE n. 80.004/SE, o Ministro Cunha Peixoto diferenciou os tratados normativos e contratuais – cujas normas atribuiu a função de traçar regras de interesse geral e de criar direitos subjetivos, respectivamente – para concluir que o art. 98 do CTN impede a revogação de tratado por lei interna, porque se trata de um contrato que deve ser respeitado pelas partes. De todo modo, afirmou que o dispositivo seria de constitucionalidade duvidosa.70
Em 1980, houve julgamento do RE n. 90.824/SP, no qual se determinou a obediência da legislação fiscal brasileira ao Tratado de Montevidéu, inclusive aquela posterior. O Ministro Moreira Alves afirmou que, em matéria tributária, independentemente da natureza do tratado internacional, observa-se o princípio contido no art. 98 do CTN.71 No mesmo sentido, o Ministro Cordeiro Guerra defendeu que, se o tratado for de matéria tributária, não poderá ser alterado por lei interna, contrariamente, se o tratado for de matéria não tributária, poderá ser alterado, conforme decidido pelo Supremo no RE n. 80.004/SE.72
Em 2007, no julgamento do RE n. 229.096/RS, o Ministro Ilmar Galvão defendeu que: (i) tratados são irredutíveis a um contrato; (ii) o CTN, enquanto lei de caráter nacional, estabeleceu a proeminência dos tratados de natureza tributária sobre leis (federais, estaduais ou municipais) e neles reconheceu fonte normativa nacional. Nesse sentido, concluiu que o art. 98 do CTN proclama a supremacia dos acordos internacionais em matéria tributária sobre a lei.73
Em 2008, no emblemático RE n. 466.343/SP, o Ministro Gilmar Mendes afirmou que no Direito Tributário vige o princípio da prevalência do direito internacional sobre o direito interno infraconstitucional, em razão do art. 98 do CTN. Assim sendo, admitiu caráter especial e superior (hierarquicamente) dos tratados sobre matéria tributária em relação à legislação infraconstitucional.74
As principais razões apontadas pelo Ministro para tal conclusão são:75 (i) os tratados em matéria tributária são peculiares porque demandam extenso e cuidadoso processo de negociação; (ii) a cooperação internacional é garantida essencialmente pelo pacta sunt servanda; (iii) o Estado Constitucional Cooperativo reivindica a manutenção da boa-fé e da segurança dos compromissos internacionais, cujo descumprimento colocaria em risco os benefícios de cooperação cuidadosamente articulada; (iv) a tese da legalidade ordinária conflita com princípios fixados pela Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados (art. 27), pois permitiria ao Estado brasileiro descumprir unilateralmente um acordo internacional; (v) inexiste justificativa para a restrição da cooperação internacional pelo Brasil por motivos de regramentos típicos de âmbito interno, sendo o afastamento de normas internacionais pela legislação interna – treaty override – possibilidade defasada com relação às exigências de cooperação, boa-fé e estabilidade do atual panorama internacional; e (vi) o Estado brasileiro, como sujeito de direito público externo, não poderia assumir obrigações nem criar normas jurídicas internacionais à revelia da Constituição.
Por fim, a mais recente manifestação sobre o tema ocorreu em 2011, outra vez em voto do Ministro Gilmar Mendes. Trata-se do “caso Volvo” (RE n. 460.320), ainda pendente de julgamento,76 cuja questão de mérito trata da aplicação de tratado para evitar a bitributação assinado entre o Brasil e a Suécia. Conforme o Informativo n. 638 do STF, o referido Ministro reiterou os argumentos anteriores e acrescentou que: (i) os tratados em matéria tributária são peculiares porque tocam em pontos sensíveis da soberania dos Estados; e (ii) a recepção do art. 98 do CTN pela Constituição independe da desatualizada classificação em tratados-contratos e tratados-leis.
Ainda que o posicionamento de Gilmar Mendes se torne a nova orientação do STF, existem dúvidas sobre o resultado prático da aplicação desse raciocínio aos tratados cujos mecanismos de transparência fiscal impliquem supressão ou modificação de efeito análogo ao sigilo bancário. Afinal, mesmo que se atribua caráter “supralegal” a tratados internacionais em matéria tributária, o próprio Ministro reconheceu que o Estado brasileiro não poderia criar normas jurídicas à revelia da Constituição.
Considerando a hipótese em que um tratado afastasse qualquer aplicação do sigilo bancário, a regra prevalecente poderia variar de acordo com o status que se atribuísse ao fundamento do sigilo. Assim como o STF, entendemos que o bem jurídico protegido pelo sigilo tem bases constitucionais, portanto, o tratado hipotético deveria ser qualificado como inconstitucional por abolir direito fundamental (intimidade). Consequentemente, o Supremo deveria torná-lo ineficaz, a despeito do desgaste internacional que isso representaria ao Estado brasileiro.
Por outro lado, se o tratado hipotético apenas flexibilizasse a aplicação do sigilo, também seria incerto qual norma deveria prevalecer. Caso os tratados em matéria tributária fossem recebidos com caráter supralegal, então seu status normativo estaria abaixo da Constituição, mas acima das normas infraconstitucionais. Logo, o conflito entre lei complementar interna que regulamentasse o sigilo bancário e o tratado internacional com o mesmo objeto poderia resultar na prevalência do último. Ainda assim, resta a dúvida sobre a antiga jurisprudência do STF quanto à impossibilidade de matérias reservadas à lei complementar pela Constituição serem regulamentadas por tratado internacional (ADI n. 1.480/1997).
De fato, até o recente julgamento das ações sobre sigilo bancário em repercussão geral, era possível entender que: (i) o tratado cujas normas suprimissem o sigilo bancário seria, provavelmente, considerado inconstitucional; e (ii) não havia uma definição clara quanto ao posicionamento do Supremo no que diz respeito à aplicação de tratados internacionais em matéria tributária cujos efeitos implicassem a flexibilização do sigilo bancário e, consequentemente, limitação do direito fundamental à intimidade. De todo modo, para aqueles que atribuem ao sigilo bancário o status meramente legal, possivelmente a questão não suscitaria maiores dúvidas, já que a interpretação dada ao art. 98 do CTN pelo Supremo indicaria a prevalência do tratado hipotético sobre a lei interna infraconstitucional.
Recentemente, o STF firmou orientação pela constitucionalidade do acesso aos dados bancários dos contribuintes pelas autoridades fiscais sem a necessidade de autorização judicial, a despeito das manifestações contrárias dos Ministros Marco Aurélio e Celso de Mello. Apesar de o mérito desses casos não ter sido discutir o conflito entre normas internacionais e o sigilo bancário, temos notícias de que os Ministros Edson Fachin e Dias Toffoli77 manifestaram orientação favorável à flexibilização do sigilo sob o argumento de atender aos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil. Contudo, como os demais votos não foram publicados, não podemos afirmar que essa é a nova orientação do Supremo. Por oportuno, destacamos que o Ministro Marco Aurélio se manifestou de forma contrária, alegando que a cooperação internacional não poderia prescindir da observância constitucional.78
Considerando que o STF tenha efetivamente acolhido a prevalência da transparência fiscal internacional em detrimento do sigilo bancário, acreditamos que o julgamento terá invertido nossas expectativas sobre os tratados hipotéticos no seguinte sentido: (i) não haveria um posicionamento claro da Corte sobre a possível aceitação de um tratado que suprimisse o sigilo bancário, o que o tornaria verdadeira letra morta; e (ii) o segundo tratado hipotético, cujas normas apenas flexibilizassem o sigilo bancário, seria considerado constitucional.
4. Conclusão
A frase “the era of banking secrecy is over” não pode ser tomada por seu valor de face, mas permite inferir duas formas de lidar com o possível conflito entre sigilo bancário e transparência fiscal internacional, a saber: (i) o afastamento ou negação do sigilo; ou (ii) a flexibilização do sigilo.
Ocorre que o fundamento do sigilo bancário é a proteção à intimidade e à privacidade, direito fundamental consagrado pelo art. 5º, inciso X, da Constituição Federal como cláusula pétrea, o que impede seu afastamento ou negação na ordem interna brasileira.
Ao mesmo tempo, o fundamento da transparência fiscal internacional é a cooperação entre os povos (art. 4º, inciso IX, da Constituição) e o interesse da arrecadação e da fiscalização (art. 145, parágrafo 1º, da Constituição e art. 199, parágrafo único, do CTN), o que também é protegido pela legislação brasileira, razão pela qual o instituto da transparência tampouco poderia ser afastado ou negado.
Como nem todos os dados bancários estão protegidos pelo sigilo, mas apenas aqueles relacionados à intimidade, o conflito entre os institutos pode ser aparente ou real. Nas hipóteses de conflito aparente (dados mínimos e médios), não deveria haver negação do sigilo e de sua função jurídica e social, mas inaplicabilidade devido ao objeto. Por sua vez, nas hipóteses de conflito real (dados máximos) o sigilo deveria ser flexibilizado – e não rechaçado peremptoriamente – pelo Poder Judiciário diante do caso concreto. Tal entendimento poderia garantir o exercício da fiscalização e o monitoramento dos contribuintes, sem a violação de sua intimidade.
De todo modo, qualquer orientação dada pelos instrumentos internacionais de transparência fiscal internacional em relação ao afastamento ou flexibilização do sigilo poderá ser rechaçada por manifestação negativa do Supremo, caso a adoção de tais instrumentos seja submetida à apreciação do órgão.
A antiga orientação do Supremo (RE n. 389.808/PR) sugeria uma interpretação mais garantista da Constituição. Assim, considerávamos que um tratado cujo conteúdo fosse suprimir o sigilo bancário seria considerado inconstitucional, já que seu efeito seria a abolição de direito fundamental (intimidade). Por outro lado, entendíamos como incerta a adoção de um tratado cujo conteúdo apenas flexibilizasse o sigilo bancário. Caso os tratados em matéria tributária fossem internalizados com caráter supralegal, o conflito poderia resultar na prevalência do tratado sobre lei complementar interna que regulamentasse o sigilo bancário. No entanto, restava a dúvida sobre a aplicabilidade da ADI n. 1.480/1997, na qual restou consignada a impossibilidade de que tratado regulamente matérias reservadas à lei complementar pela Constituição.
No entanto, a nova orientação adotada pelo Supremo no sentido de considerar constitucional a flexibilização do sigilo, inclusive para atender aos compromissos internacionais relacionados à transparência fiscal internacional, modificou nossas expectativas. Assim, entendemos que a nova tendência do Supremo será acolher os tratados que apenas flexibilizem o sigilo bancário, sendo incerta a possível adoção de tratados que neguem ou suprimam o sigilo.
Inicialmente, entendíamos ser improvável que a ordem jurídica brasileira permitisse o fim do sigilo bancário, em virtude da Constituição e da Lei Complementar n. 105/2001. Atualmente, porém, a jurisprudência do Supremo assusta, por diversas razões.
Em primeiro lugar, ressaltamos que a quebra do sigilo existe quando a informação é prestada a qualquer terceiro, dentre os quais a Fazenda Pública, ainda que se utilize o eufemismo de transferência.79 Assim, não concordamos com o raciocínio adotado de que só há quebra na divulgação dos dados ao público em geral, já que se trata de preocupante inflexão hermenêutica, como apontado no louvável voto de Celso de Mello no RE n. 601.314/SP.80
Em segundo lugar, se considerarmos que o argumento favorável à adoção de instrumentos internacionais é motivado pelo combate a crimes, ressaltamos que a jurisprudência do Supremo já era favorável à flexibilização do sigilo em tais hipóteses. Assim, resta a dúvida sobre o impacto dessa nova orientação sobre o contribuinte não criminoso, que poderia ter seus dados acessados pelo Fisco, eventualmente, apesar de inexistentes indícios de conduta ilícita.
Em terceiro lugar, advertimos que a exigência de um poder equidistante para autorizar a quebra do sigilo fiscal não implica deixar impune o criminoso – o qual, frise-se, deve ser punido nos termos da lei –, mas apenas garantir que o cidadão não criminoso tenha a possibilidade de defender sua privacidade na hipótese de ingerência indevida do Estado.
Uma vez que as discussões sobre transparência fiscal internacional são recentes no Brasil e não compunham o escopo do julgamento sobre dados bancários, o rumo que o tema seguirá ainda é incerto, pelo que parece ser prematuro adiantar conclusões sobre o destino do sigilo bancário. Dessa maneira, embora provável, não ousamos concluir que a frase inicial seja aplicável ao Brasil. Todavia, reconheceríamos sua plena aplicabilidade, caso fosse alterada para “the great times of banking secrecy are over”.
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WALD, Arnoldo. “O sigilo bancário no projeto de Lei Complementar n. 70”. Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas n. 1. São Paulo, outubro/dezembro de 1992.
–; e MARTINS, Ives Gandra da Silva. “A Constituição e o sigilo bancário”. Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas v. 6, n. 23. São Paulo, abril/junho de 1998.
Jurisprudência
Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.161.467/RS, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 17 de maio de 2012.
Supremo Tribunal Federal. Apelação Cível n. 7.872/RS, Rel. Min. Philadelpho Azevedo, julgada em 11 de outubro de 1943.
Supremo Tribunal Federal. Apelação Cível n. 9.587/DF, Rel. Min. Lafayette de Andrada, julgada em 21 de agosto de 1951.
Supremo Tribunal Federal. Apelação Cível n. 9.594/RS, Rel. Min. Afrânio Antônio da Costa, julgada em 26 de outubro de 1954.
Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 72.131/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 23 de novembro de 1995.
Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança n. 21.729/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 5 de outubro de 1995.
Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 71.154/PR, Rel. Min. Oswaldo Trigueiro, julgado em 4 de agosto de 1971.
Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 80.004/SE, Rel. Min. Xavier de Albuquerque, julgado em 1º de junho de 1977.
Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 90.824/SP, Rel. Min. Moreira Alves, julgado em 25 de junho de 1980.
Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário n. 229.096-0, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 16 de agosto de 2007.
Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 466.343-1/SP, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 3 de dezembro de 2008.
Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 601.314/SP, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 24 de fevereiro de 2016.
Tribunal Supremo de Espanha. Sentencia n. 1.950/2000, n. de recurso 3.931/1995, Rel. Pascual Sala Sanchez, julgado em 11 de março de 2000.
1 A autora agradece as críticas feitas por Mateus Calicchio Barbosa na elaboração desse artigo.
2 Destacamos o trecho da Declaração dos Líderes do G20 em Londres, datada de 2 de abril de 2009: “15. To this end we are implementing the Action Plan agreed at our last meeting, as set out in the attached progress report. We have today also issued a Declaration, Strengthening the Financial System. In particular we agree: (...) to take action against non-cooperative jurisdictions, including tax havens. We stand ready to deploy sanctions to protect our public finances and financial systems. The era of banking secrecy is over. We note that the OECD has today published a list of countries assessed by the Global Forum against the international standard for exchange of tax information.” (Cf. G20. London Summit – Leaders’ Statement, 2009. Disponível em http://www.oecd.org/g20/meetings/london/G20-Action-Plan-Recovery-Reform.pdf. Acesso em 27 de fevereiro de 2016) No mesmo sentido, podemos citar a descrição do vídeo “Crackdown on tax evasion”, publicado em 29 de outubro de 2014 no canal da OCDE no Youtube: “Bank secrecy for tax purposes is coming to an end as a growing number of countries commit to automatic exchange of information. Soon there will be nowhere left for tax cheats to hide.” Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=qZQ-WkM7puI. Acesso em 27 de fevereiro de 2016.
3 Ainda que a ideia de transparência fiscal internacional esteja relacionada a diversos temas (tributação em bases universais, qualidades de um sistema tributário ideal, postura da Administração em relação aos contribuintes etc.), o conceito de “transparência” utilizado nesse trabalho será limitado ao âmbito das medidas de intercâmbio de informações. Em outras palavras, o conceito será interpretado de maneira mais restrita, como espécie de antítese do sigilo. Para maior aprofundamento sobre o caráter plurívoco do conceito, cf. SCHOUERI, Luís Eduardo; e BARBOSA, Mateus Calicchio. “Transparency: from tax secrecy to the simplicity and reliability of the tax system”. British Tax Review n. 5, 2013, pp. 677-680.
4 A redação desse artigo foi finalizada no dia 1º de março de 2016.
5 Por oportuno, destacamos trechos de notícia publicada no site do STF: “Relator do Recurso Extraordinário (RE) 601.314/SP, o ministro Edson Fachin destacou, em seu voto, o caráter não absoluto do sigilo bancário, que deve ceder espaço ao princípio da moralidade, nas hipóteses em que transações bancárias denotem ilicitudes. O ministro destacou também que a lei está em sintonia com os compromissos assumidos pelo Brasil em tratados internacionais que buscam dar transparência e permitir a troca de informações na área tributária, para combater atos ilícitos como lavagem de dinheiro e evasão de divisas. (...) Relator das quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade que questionam a lei – ADIs 2.390, 2.386, 2.397 e 2.859 – o ministro Dias Toffoli destacou, em seu voto, que a prática prevista na norma é corrente em vários países desenvolvidos e a declaração de inconstitucionalidade do dispositivo questionado seria um retrocesso diante dos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil para combater ilícitos, como a lavagem de dinheiro e evasão de divisas, e para coibir práticas de organizações criminosas.” Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=310670&caixaBusca=N. Acesso em 28 de fevereiro de 2016.
6 Cf. OECD. “Update to article 26 of the OECD Model Tax Convention and its Commentary”. Paris, 2012, p. 16: “19.11 Paragraph 5 stipulates that a Contracting State shall not decline to supply information to a treaty partner solely because the information is held by a bank or other financial institution. Thus, paragraph 5 overrides paragraph 3 to the extent that paragraph 3 would otherwise permit a requested Contracting State to decline to supply information on grounds of bank secrecy. The addition of this paragraph to the Article reflects the international trend in this area as reflected in the Model Agreement on Exchange of Information on Tax Matters and as described in the report ‘Improving Access to Bank Information for Tax Purposes’. In accordance with that report, access to information held by banks or other financial institutions may be by direct means or indirectly through a judicial or administrative process. The procedure for indirect access should not be so burdensome and time-consuming as to act as an impediment to access to bank information.”; cf. OECD. “Manual on the implementation of exchange of information provisions for tax purposes”. Paris, 2006, pp. 15-16: “44. Both the Model Convention and the Model Agreement stipulate that bank secrecy can not form the basis for declining to provide information. Thus, the competent authorities of the contracting parties need to have the authority to access, either directly or indirectly, through a judicial or administrative process, information held by banks or other financial institutions and to provide such information to the other contracting party.”
7 Cf. OECD. “Harmful tax competition: an emerging global issue”. Paris, 1998, p. 30: “65. The limited access that certain countries have to bank information for tax purposes (e.g., because of bank secrecy rules) is increasingly inadequate to detect and to prevent the abuse of harmful preferential tax regimes by taxpayers.”
8 Ibidem, p. 33: “75. Lack of access to information, whether because of bank secrecy, anonymous debt instruments or bearer shares, may constitute one of the most harmful characteristics of a regime. The availability of protection from enquiries by tax authorities is one of the biggest attractions of many harmful regimes.”
9 Ibidem, p. 45: “7. Recommendation concerning access to banking information for tax purposes: in the context of counteracting harmful tax competition, countries should review their laws, regulations and practices which govern access to banking information with a view to removing impediments to the access to such information by tax authorities.”
10 Ibidem, p. 74: “By taking an almost unilateral approach with respect to the prescribed measures, the Report gives the impression that its purpose is not so much to counter harmful tax competition where it exists as to abolish bank secrecy. Luxembourg does not share the Report’s implicit belief that bank secrecy is necessarily a source of harmful tax competition.”
11 Gilmar Mendes e Ives Gandra citam ainda o direito de autodeterminação sobre as informações presente no direito alemão. Cf. MARTINS, Ives Gandra da Silva; e MENDES, Gilmar. “Sigilo bancário, direito de autodeterminação sobre informações e principio da proporcionalidade”. IOB – Repertório de jurisprudência: tributário, constitucional e administrativo n. 24. São Paulo, dezembro de 1992, p. 438.
12 Destacamos os seguintes autores, segundo os quais o tema do sigilo bancário é infraconstitucional: cf. LIMA, João Frazão de Medeiros. “Sigilo bancário não existe constitucionalmente”. IOB – Repertório de jurisprudência: tributário, constitucional e administrativo n. 11. São Paulo, junho de 1997, p. 262; BINS, Luiz Antônio. “O sigilo bancário e sua inoponibilidade perante o Fisco”. Direito tributário em questão. V. 1, n.1. Porto Alegre, 2008, p. 151. Na jurisprudência do STF é possível citar o Ministro Francisco Rezek, segundo o qual o sigilo bancário é instituto consagrado pela lei complementar e não pela Constituição Federal. Cf. STF, Mandado de Segurança n. 21.729/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 5 de outubro de 1995, p. 117.
13 Para uma análise mais profunda, cf. MORAES, Thaís Chanes de. “Sigilo bancário e as hipóteses de quebra na Lei Complementar nº 105/01”. Revista Direito Tributário Atual v. 33. São Paulo: Dialética e IBDT, 2015, pp. 484-488.
14 Cf. MACHADO, Hugo de Brito. “A quebra do sigilo bancário”. IOB – Repertório de jurisprudência: tributário, constitucional e administrativo n. 9. São Paulo, maio de 2001, p. 254; e SCAFF, Fernando Facury. “Estado mínimo do contribuinte”. Revista da Procuradoria Geral do Estado v. 24, n. 53. Porto Alegre, 2001, pp. 109-110.
15 SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. “Sigilo bancário: relatividade frente ao Fisco”. IOB – Repertório de jurisprudência: tributário, constitucional e administrativo n. 5. São Paulo, março de 1995, p. 95.
16 FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. “Sigilo de dados: o direito à privacidade e os limites à função fiscalizadora do Estado”. Cadernos de Direito Tributário e de Finanças Públicas v. 1, n. 1. São Paulo, outubro/dezembro de 1992, p. 144.
17 Para uma visão contrária, cf. WALD, Arnoldo. “O sigilo bancário no projeto de Lei Complementar n. 70”. Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas n. 1. São Paulo, outubro/dezembro de 1992, p. 198.
18 FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. “Sigilo de dados: o direito à privacidade e os limites à função fiscalizadora do Estado”. Cadernos de Direito Tributário e de Finanças Públicas v. 1, n. 1. São Paulo, outubro/dezembro de 1992, p. 145.
19 Cf. FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. “Sigilo de dados: o direito à privacidade e os limites à função fiscalizadora do Estado”. Cadernos de Direito Tributário e de Finanças Públicas v. 1, n. 1. São Paulo, outubro/dezembro de 1992, pp. 142-145; e SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. “O sigilo bancário e a Administração Tributária”. Revista Fórum de Direito Tributário v. 6, n. 34. Belo Horizonte, julho/agosto de 2008, pp. 41-42.
20 Cf. FREIRE JÚNIOR, Américo Bedê. “A possibilidade de quebra do sigilo bancário por parte da Receita Federal como forma de viabilizar a justiça fiscal”. Revista Dialética de Direito Tributário n. 97. São Paulo: Dialética, outubro de 2003, p. 17; BINS, Luiz Antônio. “O sigilo bancário e sua inoponibilidade perante o Fisco”. Direito tributário em questão. V. 1, n. 1. Porto Alegre, 2008, p. 139; SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. “O sigilo bancário e o direito à intimidade e privacidade das pessoas”. Revista Tributária e de Finanças Públicas v. 10, n. 42. São Paulo, janeiro/fevereiro de 2002, p. 243; SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. “O sigilo bancário e a Administração Tributária”. Revista Fórum de Direito Tributário v. 6, n. 34. Belo Horizonte, julho/agosto de 2008, p. 40.
21 PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio. “A quebra do sigilo bancário pelo Fisco: inconstitucionalidades da Instrução Normativa nº 802/2007 da Receita Federal do Brasil”. Revista Dialética de Direito Tributário n. 151. São Paulo: Dialética, abril de 2008, p. 81.
22 No mesmo sentido, Cf. MARTINS, Ives Gandra da Silva. “Sigilo bancário e tributário”. Scientia Ivridica: revista de direito comparado português e brasileiro v. 50, n. 290. Braga, maio/agosto de 2001, p. 51.
23 STF. Recurso Extraordinário n. 601.314/SP, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 24 de fevereiro de 2016, p. 1: “Cabe esclarecer, desde logo, que a noção de privacidade leva em consideração as múltiplas dimensões em que essa ideia nuclear se desenvolve, projetando-se, p. ex., no plano da privacidade financeira, que se revela comum tanto às pessoas físicas quanto às pessoas jurídicas.” Disponível em http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/RE601314CM.pdf. Acesso em 28 de fevereiro de 2016.
24 A Sentencia n. 1950/2000 diferencia dados econômicos e dados privados. Contudo, é preciso ter cuidado em sua análise. De um lado, ela afasta a ideia de que dados econômicos e dados privados são necessariamente coincidentes, isto é, nega que todo dado econômico é pessoal e protegido pelo direito à intimidade. Por outro lado, não afirma que essas qualidades são excludentes, ou seja, que ou o dado é econômico ou é pessoal. Logo, um dado econômico pode ser também pessoal e protegido pelo direito à intimidade. Cf. Tribunal Supremo de Espanha. Sentencia n. 1.950/2000, n. de recurso 3.931/1995, Relator Pascual Sala Sanchez, julgado em 11 de março de 2000.
25 OECD. “Update to article 26 of the OECD Model Tax Convention and its Commentary”. Paris, 2012, p. 8: “Contracting States which are required, according to their law, to observe data protection laws, may wish to include provisions in their bilateral conventions concerning the protection of personal data exchanged. Data protection concerns the rights and fundamental freedoms of an individual, and in particular, the right to privacy, with regard to automatic processing of personal data. See, for example, the Council of Europe Convention for the Protection of Individuals with regard to Automatic Processing of Personal Data of 28 January 1981.” Por oportuno, destacamos o fato de a OCDE já ter afirmado que os países-membros reconheciam o papel legítimo do sigilo bancário na proteção do sigilo das operações financeiras de pessoas físicas e jurídicas. Cf. OECD. “Improving access to bank information for tax purposes”. Paris, 2000, p. 4: “They have agreed in particular to continue the dialogue on these issues, taking into account that bank secrecy is widely recognized as playing a legitimate role in protecting the confidentiality of the financial affairs of individuals and legal entities, as well as the larger dialogue being undertaken at the OECD on improving international co-operation in the tax area.”
26 TONELLI JUNIOR, Renato Adolfo. A troca internacional de informações em matéria tributária e a cláusula due process of law: uma análise do contexto brasileiro. Trabalho de conclusão de curso (Graduação em Direito). São Paulo: Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2014.
27 Cf. OECD. “Update to article 26 of the OECD Model Tax Convention and its Commentary”. Paris, 2012, p. 2: “2. Therefore the present Article embodies the rules under which information may be exchanged to the widest possible extent, with a view to laying the proper basis for the implementation of the domestic tax laws of the Contracting States and for the application of specific provisions of the Convention. The text of the Article makes it clear that the exchange of information is not restricted by Articles 1 and 2, so that the information may include particulars about non-residents and may relate to the administration or enforcement of taxes not referred to in Article 2.”; OECD. “Manual on the implementation of exchange of information provisions for tax purposes”. Paris, 2006, pp. 4-5: “8. Information is typically exchanged for one of two purposes: First, information is exchanged in order to ascertain the facts in relation to which the rules of an income tax convention are to be applied. Second, information is exchanged with a view to assisting one of the contracting parties in administering or enforcing its domestic tax law. The former case only arises in connection with exchange of information on the basis of a bilateral income tax convention whereas the latter may arise in the context of either a bilateral income tax convention or a bilateral or multilateral mutual assistance or exchange of information agreement.”
28 OECD. “Manual on the implementation of exchange of information provisions for tax purposes”. Paris, 2006, p. 6: “12. Article 26 of the Model Convention and Article 1 of the Model Agreement permit exchange of information in cases that involve criminal tax offences. (…)”
29 OECD. “Update to article 26 of the OECD Model Tax Convention and its Commentary”. Paris, 2012, p. 2: “1. There are good grounds for including in a convention for the avoidance of double taxation provisions concerning co-operation between the tax administrations of the two Contracting States. In the first place it appears to be desirable to give administrative assistance for the purpose of ascertaining facts in relation to which the rules of the convention are to be applied. Moreover, in view of the increasing internationalization of economic relations, the Contracting States have a growing interest in the reciprocal supply of information on the basis of which domestic taxation laws have to be administered, even if there is no question of the application of any particular article of the Convention.”
30 Cf. OECD. “Standard for automatic exchange of financial account information in tax matters”. Paris, 2014, p. 9: “1. As the world has become increasingly globalised it is easier for all taxpayers to make, hold and manage investments through financial institutions outside of their country of residence. (...) Countries have a shared interest in maintaining the integrity of their tax systems. Co-operation between tax administrations is critical in the fight against tax evasion and in protecting the integrity of tax systems. A key aspect of that co-operation is exchange of information.”; OECD. “Automatic exchange of financial account information: background information brief”. Paris, 2016, p. 2: “Vast amounts of money are kept abroad and go untaxed to the extent that taxpayers fail to comply with tax obligations in their home jurisdictions. Jurisdictions around the world, small and large, developing and developed, OECD and non-OECD, stand united in calling for further action to address the issues of international tax avoidance and evasion. Co-operation between tax administrations is critical in the fight against tax evasion and a key aspect of that co-operation is exchange of information.”
31 OECD. “Update to article 26 of the OECD Model Tax Convention and its Commentary”. Paris: 2012, p. 11: “It allows the sharing of tax information by the tax authorities of the receiving State with other law enforcement agencies and judicial authorities in that State on certain high priority matters (e.g., to combat money laundering, corruption, terrorism financing).”
32 ÁVILA, Humberto Bergmann. Sistema constitucional tributário. São Paulo: Saraiva, 2004, pp. 38-40.
33 Ibidem, p. 40.
34 O intercâmbio de informações previsto na convenção modelo da OCDE tem como objeto a informação qualificada como “previsivelmente relevante”, cf. OECD. “Model convention with respect to taxes on income and on capital”. Paris, 2014: “Article 26 Exchange of Information 1. The competent authorities of the Contracting States shall exchange such information as is foreseeably relevant for carrying out the provisions of this Convention or to the administration or enforcement of the domestic laws concerning taxes of every kind and description imposed on behalf of the Contracting States, or of their political subdivisions or local authorities, insofar as the taxation thereunder is not contrary to the Convention. The exchange of information is not restricted by Articles 1 and 2.”
35 Note-se que a doutrina é pacífica quanto ao caráter relativo do sigilo, sobre o tema, cf. MORAES, Thaís Chanes de. “Sigilo bancário e as hipóteses de quebra na Lei Complementar nº 105/01”. Revista Direito Tributário Atual v. 33. São Paulo: Dialética e IBDT, 2015, pp. 482.
36 PETRY, Rodrigo Caramori. “O sigilo bancário e a fiscalização tributária”. Revista Dialética de Direito Tributário n. 190. São Paulo: Dialética, julho de 2011, pp. 112-113.
37 Ibidem, p. 125.
38 SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. “O direito do contribuinte ao sigilo bancário”. IOB – Repertório de jurisprudência: tributário, constitucional e administrativo n. 9. São Paulo, maio de 2000, p. 222.
39 Utiliza-se o termo “faculdade”, pois entendemos que o sigilo não é um direito em si, mas uma faculdade que protege a um direito, nesse caso, a intimidade e a vida privada. Para maiores esclarecimentos sobre essa discussão, cf. MORAES, Thaís Chanes de. “Sigilo bancário e as hipóteses de quebra na Lei Complementar nº 105/01”. Revista Direito Tributário Atual v. 33. São Paulo: Dialética e IBDT, 2015, p. 489.
40 SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. “O sigilo bancário e a Administração Tributária”. Revista Fórum de Direito Tributário v. 6, n. 34. Belo Horizonte, julho/agosto de 2008, p. 57.
41 Por oportuno, citamos trecho do voto do ministro nesse julgamento, cf. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.390/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 24 de fevereiro de 2016: “Em seguida, pode-se observar o desenvolvimento paulatino da atuação fiscalizatória, que se inicia com meios menos gravosos ao contribuinte: é que a natureza das informações acessadas pelo Fisco na forma do art. 5º da lei complementar é, inicialmente, bastante restrita, limitando-se, conforme dispõe o seu § 2º, à identificação dos ‘titulares das operações e dos montantes globais mensalmente movimentados, sendo vedada a inclusão de qualquer elemento que permita identificar sua origem ou a natureza dos gastos a partir deles efetuados’. Perceba-se, pois, que, com base nesse dispositivo, a Administração tem acesso apenas a dados genéricos e cadastrais dos correntistas. Essas informações obtidas na forma do art. 5º da LC são cruzadas com os dados fornecidos anualmente pelas próprias pessoas físicas e jurídicas via declaração anual de imposto de renda, de modo que tais informações já não são, a rigor, sigilosas.” Disponível em http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI2390.pdf. Acesso em 28 de fevereiro de 2016.
42 O Decreto n. 4.489/2002 define a forma de identificação dos contribuintes em seu art. 2º, parágrafo 3º, e das operações relacionadas aos montantes globais em seu art. 3º. Por sua vez, a Instrução Normativa n. 1.571/2015 descreve tais informações em seu art. 5º. Por oportuno, observamos que a antiga Dimof também definia dados objeto de prestação nos termos do art. 2º da Instrução Normativa n. 811/2008.
43 Tal ideia tem inspiração em Humberto Ávila, para quem a relação condicionada de prioridade entre interesse público e interesse privado somente pode surgir no caso em concreto, nunca antes ou aprioristicamente (ÁVILA, Humberto Bergmann. “Repensando o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado”. Revista Trimestral de Direito Público v. 24. São Paulo, 1998, p. 167).
44 Art. 187 do Código Civil.
45 Para uma análise mais aprofundada, cf. MORAES, Thaís Chanes de. “Sigilo bancário e as hipóteses de quebra na Lei Complementar nº 105/01”. Revista Direito Tributário Atual v. 33. São Paulo: Dialética e IBDT, 2015, pp. 481-508.
46 WALD, Arnoldo; e MARTINS, Ives Gandra da Silva. “A Constituição e o sigilo bancário”. Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas v. 6, n. 23. São Paulo, abril/junho de 1998, p. 23.
47 ABRÃO, Carlos Henrique. “Os sigilos bancário e fiscal na cobrança da dívida ativa”. Revista Dialética de Direito Tributário n. 30. São Paulo: Dialética, março de 1998, p. 15.
48 VIDIGAL, Geraldo de Camargo. “Devolução do IPMF: deve ser feita através dos bancos”. Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas v. 2, n. 6. São Paulo, janeiro/março de 1994, p. 68.
49 STF. Mandado de Segurança n. 21.729/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 5 de outubro de 1995, p. 135.
50 SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. “O direito do contribuinte ao sigilo bancário”. IOB – Repertório de jurisprudência: tributário, constitucional e administrativo n. 9. São Paulo, maio de 2000, p. 223.
51 Verificar a nota de rodapé nº 17 do seguinte artigo: cf. SOUZA, Hamilton Dias de. “Sigilo bancário e o direito à liberdade”. Revista Dialética de Direito Tributário n. 51. São Paulo: Dialética, dezembro de 1999, p. 65.
52 Ibidem, p. 65.
53 Nesse sentido, é possível citar o voto do Ministro Celso de Mello na ADI n. 1.480/DF. Cf. STF. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.480/DF, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 4 de setembro de 1997, p. 283. Note-se, ainda, que o critério da especialidade foi um dos elementos decisivos para a fundamentação do conhecido “Caso Copesul”. Cf. Superior Tribunal de Justiça. REsp n. 1.161.467/RS, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 17 de maio de 2012.
54 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 4ª ed.. São Paulo: Saraiva, 2014, pp. 102-108.
55 Sobre o tema, cf. STF. Apelação Cível n. 9.587/DF, Rel. Min. Lafayette de Andrada, julgada em 21 de agosto de 1951; e STF. Apelação Cível n. 7.872/RS, Rel. Min. Philadelpho Azevedo, julgada em 11 de outubro de 1943; STF. Recurso Extraordinário n. 71.154/PR, Rel. Min. Oswaldo Trigueiro, julgada em 4 de agosto de 1971.
56 É o que consta no voto do Ministro Xavier de Albuquerque no RE n. 80.004/SE. Cf. STF. Recurso Extraordinário n. 80.004/SE, Rel. Min. Xavier de Albuquerque, julgado em 1º de junho de 1977, pp. 928 e 931.
57 Ibidem, p. 953.
58 Ibidem, p. 968.
59 Ibidem, p. 977.
60 Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n. 72.131/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado 23 de novembro de 1995, p. 8.686.
61 Ibidem, p. 8.695.
62 Ibidem, pp. 8.726 e 8.728.
63 Ibidem, p. 8.688.
64 STF. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.480/DF, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 4 de setembro de 1997, pp. 214-215.
65 Nesse sentido estão os votos dos Ministros Celso de Mello, Nelson Jobim, Marco Aurélio e Néri da Silveira.
66 STF. Recurso Extraordinário n. 466.343-1/SP, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 3 de dezembro de 2008, p. 1.139.
67 Ibidem, p. 1.234.
68 Ibidem, p. 1.255.
69 STF, Apelação Cível n. 9.594/RS, Rel. Min. Afrânio Antônio da Costa, julgada em 26 de outubro de 1954, p. 60.
70 STF. Recurso Extraordinário n. 80.004/SE, Rel. Min. Xavier de Albuquerque, julgado em 1º de junho de 1977, p. 956.
71 STF. Recurso Extraordinário n. 90.824/SP, Rel. Min. Moreira Alves, julgado em 25 de junho de 1980, p. 447.
72 Ibidem, p. 488.
73 STF, Recurso Extraordinário n. 229.096-0, Rel. Min. Carmen Lúcia, julgado em 16 de agosto de 2007, pp. 993-995.
74 STF. Recurso Extraordinário n. 466.343-1/SP, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 3 de dezembro de 2008, p. 1.156.
75 Ibidem, pp. 1.323-1.326.
76 A última movimentação do RE n. 460.320 ocorreu no dia 30 de setembro de 2014, quando o Ministro Dias Toffoli pediu o adiamento de seu julgamento.
77 Cf. STF. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2.390/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 24 de fevereiro de 2016, pp. 21-26: “Atente-se que o Brasil assumiu compromissos internacionais relativos à transparência e ao intercâmbio de informações financeiras para fins tributários e de combate à movimentação de dinheiro de origem ilegal no mundo. (...) O Brasil se comprometeu, perante o G20 e o Fórum Global, a adotar esse padrão a partir de 2018, de modo que não deve o Estado brasileiro prescindir do acesso automático aos dados bancários dos contribuintes por sua administração tributária, sob pena, inclusive, de descumprimento de seus compromissos internacionais. (...) Considerando o cenário internacional aqui exposto, fica claro que eventual declaração de inconstitucionalidade dos arts. 5º e 6º da Lei Complementar 105/2001 poderia representar um retrocesso de nosso país em matéria de combate à sonegação fiscal e a uma série de crimes que envolvem a circulação internacional de dinheiro de origem ilícita. Tenho, por tudo quanto abordado no presente tópico, que a atuação fiscalizatória traçada nos arts. 5º e 6º da LC nº 105/01 e em seus decretos regulamentadores (Decretos nº 3.724/2001 e nº 4.489/2002) não encerra inconstitucionalidade; ao contrário, retrata o pleno cumprimento dos comandos constitucionais e dos compromissos internacionais assumidos nessa seara pela República Federativa do Brasil.”
78 Por oportuno, destacamos trecho de notícia publicada no site do STF: “Ao abrir divergência, o ministro Marco Aurélio afirmou que a revisão da jurisprudência, firmada em 2010 no sentido de condicionar o acesso aos dados bancários à autorização judicial, gera insegurança jurídica. O ministro afirmou que somente o Poder Judiciário, órgão imparcial e equidistante, pode autorizar tal providência, não cabendo ao Fisco, que é parte na relação jurídica, obter tais informações automaticamente. ‘Não pode entrar na minha cabeça que a Receita, que é órgão arrecadador, tenha uma prerrogativa superior à garantida pela Constituição ao Judiciário’, enfatizou. Segundo o ministro, a cooperação internacional no combate a ilícitos tributários não pode prescindir da observância constitucional.” Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?
idConteudo=310670&caixaBusca=N. Acesso em 28 de fevereiro de 2016.
79 Cf. MORAES, Thaís Chanes de. “Sigilo bancário e as hipóteses de quebra na Lei Complementar nº 105/01”. Revista Direito Tributário Atual v. 33. São Paulo: Dialética e IBDT, 2015, pp. 489-490. No mesmo sentido, apontamos trecho do voto do Ministro Celso de Mello no julgamento do RE n. 601.314, p. 5: “Vejo, nessa alegação, um claro eufemismo que mal consegue disfarçar uma situação de evidente inconstitucionalidade que afeta a pretensão do Estado de manter, por deliberação própria e sem controle jurisdicional prévio, uma contínua fiscalização do Poder sobre os sujeitos passivos da relação jurídico-tributária.”
80 Ibidem, p. 1: “Entendo, Senhor Presidente, e já o disse neste Tribunal, que a majestade da Constituição não pode ser transgredida nem degradada pela potestade do Estado, pois, em um regime de perfil democrático, ninguém, a começar dos agentes e autoridades do aparelho estatal, pode pretender-se acima e além do alcance da normatividade subordinante dos grandes princípios que informam e dão essência à Lei Fundamental da República. Por tal razão, votarei vencido neste caso, que se soma aos dois julgamentos realizados na semana passada em cujo âmbito registrou-se – e digo isto com todo o respeito – preocupante inflexão hermenêutica, de índole regressista, em torno do pensamento jurisprudencial desta Suprema Corte no plano sensível dos direitos e garantias individuais, retardando, em minha percepção, o avanço de uma significativa agenda judiciária concretizadora das liberdades fundamentais em nosso País.”