Regras de Competência e a Textura Aberta da Linguagem Natural

Rules of Competence and the Open Texture of Natural Language

Hugo de Brito Machado Segundo

Mestre e Doutor em Direito. Professor Associado da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, de cujo Programa de Pós-graduação (Mestrado/Doutorado) foi Coordenador (2012/2016) e do Centro Universitário Chrisuts (Unichristus). Membro do ICET – Instituto Cearense de Estudos Tributários, do IBDT – Instituto Brasileiro de Direito Tributário e da WCSA – World Complexity Science Academy. Advogado. Visiting Scholar da Wirtschaftsuniversität, Viena, Áustria. E-mail: hugo.segundo@gmail.com.

Recebido em: 20-3-2022

Aprovado em: 25-3-2022

Resumo

Na literatura do Direito Tributário no Brasil, o dissenso entre os que consideram serem as normas de competência veiculadas por intermédio de palavras utilizadas como tipos, ou como conceitos, é semelhante ao estabelecido nos anos 1960 na Argentina entre Genaro Carrió e Sebastian Soler, relativamente ao qual a razão assistia ao primeiro. A textura aberta da linguagem, e a impossibilidade de um ajuste perfeito das realidades às palavras que as designam, remetem à conclusão de que todas as palavras, contidas em normas de competência ou não, à exceção das que se reportam a realidades matemáticas ideais, têm o seu significado determinado como tipos. Mas daí não se deve incorrer na falsa dicotomia de que, como consequência, inexistem normas porquanto seria total o arbítrio do intérprete na tarefa de lhes atribuir significado. O contexto determina esse sentido, fornecendo informações capazes de eliminar vaguidade e ambiguidade presentes em todas as palavras consideradas em abstrato. No caso das normas de competência tributária, por exemplo, há fatores contextuais como o contraste delas com outras normas de competência, com as quais não se devem sobrepor, bem como a observação dos debates constituintes e dos tributos que os antecederam, em textos constitucionais revogados, que permitem uma mais precisa atribuição de significado aos termos que as veiculam.

Palavras-chave: tipos, conceitos, regras de competência tributária, textura aberta da linguagem.

Abstract

Among Brazilian Tax Law Scholars, the controversy among those who consider that rules of competence are conveyed through words used as types, or as concepts, is similar to that established in the 1960s in Argentina between Genaro Carrió and Sebastian Soler, in relation to which the first was right. The open texture of language, and the impossibility of a perfect adjustment of the realities assigned to the words that designate them, lead to the conclusion that all words, used or not in norms of competence, with the exception of those that designate ideal mathematical realities, have their meaning determined as types. But from there, one should not fall into the false dichotomy that, as a consequence, there are no norms, since the interpreter would have total discretion in the task of attributing meaning to them. The context determines this meaning, providing information capable of eliminating vagueness and ambiguity present in all words abstracted considered. In the case of tax competence rules, for example, there are contextual factors such as their contrast with other rules of competence, which they should not overlap, as well as the observation of the legislative debates and the taxes that preceded them, in previous Brazilian constitutions, which allow a more precise attribution of meaning to the terms that convey them.

Keywords: types, concepts, tax competence rules, open texture of language.

Introdução

Há algum tempo, debate-se, na literatura especializada de Direito Tributário, no Brasil, a existência de “tipos”, ou de “conceitos”, nos textos que veiculam regras jurídicas, notadamente naquelas dedicadas ao estabelecimento das competências tributárias.

No presente texto se pretende retornar a esse debate, para destacar, especialmente, que ele recorda, em alguma medida, a polêmica estabelecida na Argentina entre Sebastián Soler e Genaro Carrió, em torno da textura aberta da linguagem e a necessária rigidez das normas jurídicas. Talvez uma maior atenção à forma como se constroem e se usam conceitos, em qualquer ato de fala, revele que a rigidez e o fechamento de conceitos, com limites claros e precisos, seja uma ilusão.

Isso não quer dizer que as palavras não tenham significado algum, ou que possam ter qualquer um, motivo pelo qual, além de revisitar a polêmica, este texto almeja examinar algumas decisões do Supremo Tribunal Federal, tidas como supostamente aplicadoras da ideia de que as regras de competência contêm tipos, para verificar se essa aplicação se deu devidamente, e se as balizas e vetores que devem orientar a interpretação das normas de competência foram observadas.

1. Recordando a polêmica sobre tipos ou conceitos

No âmbito do Direito Tributário, há autores que sustentam serem as normas jurídicas veiculadas por textos compostos por tipos, entendidos na acepção que lhes deu Karl Larenz a partir da segunda edição do livro Metodologia da Ciência do Direito1, ou seja, designações de parcelas da realidade abertas2, que indicam características que podem estar presentes ou não. Nas palavras de Raquel Cavalcanti Ramos Machado, descrito o

“[...] tipo, ou o exemplar típico, porém, sabe-se que ao termo a ele associado podem corresponder também parcelas da realidade ligeiramente diferentes daquela descrita (típica), que até podem não ter todas as características do exemplo ‘típico’.”3

Há os que consideram que todas as normas, inclusive as normas legais que criam tributos, são compostas ou veiculadas com o uso de tipos4. Outros, como Luís Eduardo Schoueri, entendem que as regras da Constituição utilizam-se de tipos, os quais se podem referir a realidades típicas, ou mesmo ao “típico tributo”, assim entendido aquele preexistente ao texto constitucional, por ele muitas vezes apenas rebatizado, cabendo ao legislador complementar, com amparo no art. 146, I e III, “a”, da Constituição, definir melhor e com mais precisão seus contornos, estabelecendo conceitos fechados5. No lado oposto, há autores que consideram já definidos, de modo implícito ou explícito, no texto constitucional, de maneira precisa e rigorosa, todos os limites das normas de competência, veiculadas com o emprego de conceitos inteiramente cerrados6. Análise de cada uma das palavras utilizadas na construção das regras de competência, e o contraste entre elas e outros dispositivos da Constituição, seria suficiente para encontrar esses conceitos.

Ao usar as palavras como tipos, associam-se-lhes algumas características, mas para que uma parcela da realidade seja validamente designada por elas, não é preciso que tais características estejam todas preenchidas. Basta que um número mínimo o esteja, para que a semelhança entre a realidade e a versão “típica” daquela realidade usada na formação da palavra seja suficiente para que uma identifique a outra.

Um exemplo de uso explícito de um “tipo” pela legislação tributária pode ser encontrado no art. 32, § 1º, do Código Tributário Nacional, quando ali se estabelecem os limites a serem observados pelos Municípios na definição de sua “zona urbana”:

“Art. 32. [...]

§ 1º Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal; observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público:

I – meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais;

II – abastecimento de água;

III – sistema de esgotos sanitários;

IV – rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;

V – escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado.”

Sabe-se que os limites de uma cidade – como o das realidades fenomênicas em geral – são imprecisos, além de não ser possível indicar com segurança quais características devem estar rigorosamente presentes, ou ausentes, para que se possa estabelecê-los com absoluta precisão7. Daí por que o CTN preconiza que, presentes dois dos melhoramentos, desde que construídos pelo Poder Público, pode-se dizer que se trata de uma zona urbana. Veja-se então que uma zona pode ser classificada pela lei municipal como urbana, com o traçado de uma linha mais precisa, por possuir abastecimento de água e esgoto, ainda que careça de rede de iluminação. Outra pode possuir meio-fio e iluminação, mas não esgoto. Se se tratasse de um conceito fechado, haveria um rol de características que, tal como em um check-list, deveriam estar todas presentes. Ausente apenas uma, não poderia haver a subsunção da realidade ao conceito, que não poderia assim ser por ele identificada ou designada.

A questão, no caso, é saber se as palavras usadas nas normas jurídicas em geral, e nas tributárias em particular, notadamente nas de competência, veiculam conceitos fechados, ou tipos abertos. E, como dito na introdução, ela relembra, com muita semelhança, aquela havida no Direito Argentino, entre Soler e Carrió, em torno do livro Notas sobre derecho y lenguage, de Carrió, e do livro Las palavras de la ley, de Soler. Vale a pena, portanto, relembrar os argumentos usados na ocasião.

2. O debate entre Carrió e Soler na Argentina

Genaro Carrió em 1964 publicou, na Argentina, livro intitulado Notas sobre derecho y lenguage, no qual sustenta, em suma, que as normas jurídicas são veiculadas por textos que fazem uso de linguagem natural (português, inglês, espanhol...), e, nessa condição, há uma textura aberta ineliminável. Vaguidade e ambiguidade, por exemplo, são potencialmente insuprimíveis8, e só à luz do contexto é possível afastá-las.

Só se sabe se “careca” designa uma pessoa calva, ou um pneu automotivo desgastado, por exemplo, à luz das circunstâncias concretas em que a palavra é utilizada, que podem mesmo indicar, com bastante obviedade, tratar-se de um significado ainda diverso destes dois aqui usados como exemplo. Não se pode, abstratamente e a priori, eliminar essa imprecisão, passível de afastamento apenas diante de cada contexto em que empregada a palavra.

Na mesma ordem de ideias, amparado em John L. Austin9, Carrió lembra que com as palavras não apenas se designam parcelas da realidade. Com elas também se fazem coisas10. Por seu intermédio as pessoas prometem, seduzem, ameaçam, ofendem, agridem, batizam, elogiam etc., sendo por igual o contexto que definirá, com a necessária clareza, se alguém está fazendo uma previsão, ou uma promessa; se agride ou elogia, ou se com o elogio tenta seduzir ou enganar.

Daí por que, quando o contexto de aplicação de uma regra é muito semelhante àquele idealizado pelo legislador quando redigiu o texto que a veicula, têm-se casos que podem ser considerados “fáceis”. Quando o contexto de aplicação se modifica, surgem situações de penumbra, a dificultar o trabalho dos intérpretes, instados a recorrer a elementos extratextuais (se considerado apenas o texto da regra) para auxiliar a determinação do sentido11.

Essa obra de Carrió suscitou divergência com Sebastián Soler, defensor da ideia de que normas jurídicas fazem uso de conceitos fechados, em torno dos quais é possível, sim, eliminar vagueza e ambiguidade. As ideias de Carrió seriam incompatíveis com a segurança e a rigidez inerentes ao Direto, cuja linguagem seria não a natural, de textura aberta, mas uma artificial, tal como a da matemática, permitindo a criação de conceitos inteiramente precisos12. Além do “as palavras da lei”, destinado especificamente a criticar Carrió, Soler publicou outras obras aprofundando e complementando tais ideias:

“El contenido del concepto jurídico es, pues, exactamente el que el legislador le ha acordado, y en esto la semejanza entre esta clase de conceptos y los conceptos matemáticos es profunda. Entre el concepto de hipoteca y el de triángulo existe la coincidencia de que ambos están constituidos por un número limitado de elementos puestos.”13

A ideia de Soler era, como dito, a de associar a linguagem do direito a uma linguagem artificial, tal como a da matemática, para com isso tornar possíveis conceitos rigidamente definidos, e dotados de limites absolutamente precisos. Estudiosos contemporâneos da linguagem, com efeito, observam que somente nesse terreno, das realidades puramente ideais, talvez seja possível eliminar a vagueza da linguagem14. Acentuando-a, Soler exemplifica:

“Si hay un acuerdo para transferir el dominio de una cosa mediante un precio, hay compraventa; si suprimimos el precio, hay donación; si en vez de la cosa suponemos un crédito, hay cesión; si no hay acuerdo sino engaño, hay estafa. De aquella primera definición no podemos tocar nada, según se ve, sin que la figura se desmorone, como cuando a un triángulo le quitamos un lado.”15

Talvez por partir de semelhante premissa quanto à possibilidade de se obter precisão a priori e abstrata na definição do sentido das palavras usadas pela legislação, Humberto Ávila faz importante crítica a algumas posturas interpretativas no âmbito do Direito Tributário, e afirma que

“não pode o intérprete alterar o significado fixado pelo legislador em favor de outro que entenda melhor, de um lado, porque tal estratégia argumentativa, no âmbito de dispositivos que atribuem poder ao Estado ou que asseguram garantias ao indivíduo, transforma a interpretação em criação de significados”16.

Na mesma ordem de ideias, aduz que

“se a Constituição regrou determinada matéria referindo diretamente aquilo que é permitido, proibido ou obrigatório, não cabe ao intérprete, mesmo que se socorrendo de um princípio, substituir o que a Constituição diretamente definiu como permitido, proibido ou obrigatório por aquilo que ele próprio entende deva ser considerado permitido, proibido ou obrigatório – repita-se, por melhores e mais cativantes que sejam suas intenções”17.

Assiste-lhe inteira razão. O grande problema, contudo, é anterior, e consiste em saber o que está diretamente definido como permitido, proibido ou obrigatório, bem como determinar qual foi o “significado fixado pelo legislador”. A lei não costuma definir os significados dos termos que usa, e menos ainda a Constituição. E se o fizesse, não resolveria o problema, pois cair-se-ia em um regresso ao infinito diante da necessidade de definir cada palavra usada nas definições, e assim sucessivamente.

Carrió apresentou uma réplica a Soler, defendendo sua posição já a partir do título. O escrito, depois incorporado às edições seguintes do Notas sobre derecho y lenguage, chama-se Algunas palabras sobre las palabras de la ley18, gerando de saída a dúvida: reporta-se às palavras das leis em geral, ou ao livro de Soler, intulado Las palavras de la ley? Para Carrió, podemos tomar como exemplo

“la palabra ‘compraventa’. No discutimos que para que ella sea aplicable a una cierta transacción tiene que haber precio. Pero, si se me permite el giro, ¿Cuánto precio? Porque si la cantidad de dinero prometida o entregada a cambio de una cosa es insignificante en relación con el valor de ésta, los juristas dirán, sin duda, que hay una donación encubierta de la cosa, y no una compraventa. Y si el valor del dinero es desproporcionadamente mayor que el de la cosa, dirán que habido una donación encubierta de dinero, y no una compraventa. ¿Por dónde pasa la línea, que separa las compraventas genuinas de las donaciones encubiertas? No más es atinado decir que hay aquí una apreciable zona de penumbra, a semejanza de lo que ocurre con ‘calvo’, ‘joven’ y ‘alto’, y a la diferencia de lo que acontece con ‘triangulo’ o ‘cubo’ (en el uso que dan a estas palabras quienes hacen geometría pura)?”

Poder-se-ia apresentar a objeção de que tais conclusões conduzem à insegurança. Entretanto, se a textura aberta da linguagem natural for uma característica insuprimível e ineliminável, como parece ser, a circunstância de isso ter efeitos nocivos, ou de se desejar o contrário, não é suficiente, nem motivo, para se deixar de reconhecer essa realidade como um fato. O câncer é uma doença grave, e pode matar, o que deve ser reconhecido como um fato, ainda que esse fato não seja bom ou desejável. Fechar os olhos para a realidade não é uma boa solução, sendo preferível conhecê-la para tentar lidar com ela. De outro lado, é preciso ter em mente a advertência de Carrió, sobre a crítica dos autores que ele define como “formalistas” e “realistas”. Para ele,

“unos y otros presuponen sin análisis la verdad de esta alternativa: o las normas determinan la totalidad de la conducta o no hay normas sino puras decisiones individuales.

[…]

La buena tesis consiste en rechazar por inaceptable el dilema. Ese rechazo halla fundamento seguro en un buen análisis de las características del lenguaje. Hay normas jurídicas e ellas desempeñan un papel indispensable en la práctica cotidiana del derecho. Pero esas normas no determinan toda zona de penumbra, dentro de la cual el intérprete tiene que decidir bajo su responsabilidad. Tal decisión no puede ser razonablemente descripta como una simple deducción a partir de reglas que ya tenían un significado que aquél se limitó a descubrir. En otros términos, las reglas del sistema controlan los casos claros, pero no los de la penumbra. Y en eso exhiben las mismas características que el lenguaje natural.”19

A razão parece estar uma vez mais com Carrió, o que, como ele próprio explica, se confirma quando se recorda como se formam e se usam palavras. É interessante ter atenção a isso, e, especialmente, às consequências de se afastar o “falso dilema” a que ele se refere, no qual ou tudo já está previamente definido em conceitos fechados e perfeitamente delimitados em seus contornos, ou não existem normas (ou elas não estão sendo respeitadas), mas apenas decisões individuais arbitrárias. O paralelo com a maneira como usamos as palavras – que também não abarcam todas as situações possíveis, mas isso tampouco significa que seu uso seja arbitrário – é bastante elucidativo.

3. Como se formam e se usam as palavras

Embora pelo menos desde o Crátilo20, de Platão, a humanidade debata a respeito da origem do significado das palavras, estudos contemporâneos de Teoria da Cognição e de Inteligência Artificial têm lançado novas luzes sobre o tema. É interessante observar o que se tem defendido nessas áreas.

No Crátilo, Platão introduz a problemática de saber se as palavras têm um significado prévio, dado pela natureza, cabendo aos seus usuários apenas descobri-lo, ou se se trata de uma convenção, cabendo aos falantes definir o significado das palavras que usam em cada contexto, arbitrariamente. E, ao fazê-lo, usando a figura de Sócrates, demonstra que ambas as posições – no texto defendidas por Hermógenes e Crátilo – são equivocadas, embora, como invariavelmente se dá nos diálogos platônicos, Sócrates termine por abandonar a cena sem dar ao problema uma solução. Mas note-se que Crátilo e Hermógenes defendem exatamente os extremos do “falso dilema” a que alude Carrió: ou tudo está previamente definido, cabendo apenas descobrir, ou há ilimitada liberdade por parte de quem os maneja.

No século XX, notadamente em virtude da obra do segundo Wittgenstein21, ganhou corpo a ideia de que as palavras adquirem significado no contexto em que são usadas, no âmbito dos chamados jogos de linguagem. Usos anteriores fornecem indicativos, ou pistas, dos significados que podem ter a cada novo contexto, acrescentando ou enriquecendo os significados possíveis, mas elementos novos podem alterá-los em seu sentido e alcance. Já no início do século XXI, quando se começam a aprimorar máquinas minimamente capazes de interpretar e compreender a linguagem natural – escrita ou falada – a maneira como esse processo ocorre começa a ficar ainda mais visível.

O significado de uma palavra é criado, ou determinado, por meio de analogias. É a presença de um mesmo elemento relevante em diferentes situações, objetos, ideias, ações, enfim, pensamentos, que faz com que a mente humana crie ou aprenda uma associação a uma palavra para designar aquele conjunto de coisas que têm o elemento relevante em comum. Mas, por analogia, a presença desse mesmo elemento relevante, em maior ou menor medida, em outras realidades, pode fazer com que para designá-las também se faça uso dessa palavra, que assim vai mudando de sentido ao longo do tempo. A mente humana identifica semelhanças entre diferentes objetos, ações, situações ou realidades – culturais, naturais, biológicas etc. – e constrói, por raciocínio analógico, conceitos ou categorias, destinadas a identificar ou permitir a referência a tais objetos22. Em seguida, tais conceitos e categorias são aplicados, ou utilizados, para referir objetos (ou situações, qualidades ou ideias) semelhantes, equivalentes ou análogos. A questão é que não existe total identidade entre os objetos, qualidades ou ideias, seja entre os que foram observados na construção do conceito, seja entre aqueles aos quais o conceito será aplicado depois. Daí por que o significado das palavras se altera com o tempo, evolui23, e existem as apontadas zonas de penumbra; o que se dá não só com tipos, mas talvez mesmo com conceitos24, que muitas vezes, embora não se perceba, são usados como tipos, tornando sem muito sentido a própria distinção, salvo no que tange às apontadas realidades geométricas ou matemáticas.

Exemplificando, uma criança, nos seus primeiros meses de vida, associa a pessoa que lhe traz alimento, acolhimento, proteção e carinho à palavra mãe, sendo invariavelmente uma das primeiras que aprende a balbuciar. Para ela, mãe é aquela pessoa, e ninguém mais.

Com o tempo, além de aprender que outras pessoas de seu convívio se identificam por outras palavras (pai, tia...), essa criança pode, talvez quando começar a entrar em contato com outras crianças, descobrir que elas chamam outras pessoas de mãe. E mesmo que sua avó é a mãe da sua mãe. Pode-se dizer que, com isso, começa a se formar lentamente o conceito para ela, que passa a conseguir aplicá-lo a outras pessoas diversas de sua própria mãe.

Seria esse um “conceito fechado”? Mãe é o ser humano do sexo feminino que gerou o filho em seu útero? Certamente não é assim que o significado da palavra surge, e, ainda que o fosse, ele não daria conta dos inúmeros outros usos que ela, com o tempo, sempre por analogia, passa a receber: mãe adotiva, mãe de aluguel, placa-mãe do computador, nave mãe, orientador que é verdadeira mãe com seus alunos...

A leitora pode mesmo observar a maneira como usa as palavras, e, às vezes, em grupos de amigos, surgem palavras novas, neologismos que são o fruto, ou instrumento, de piadas internas. Imagine-se que em um grupo de amigos, universitários com poucos recursos para gastar em festas na noite, um deles, de nome Luís, quando vão todos a um restaurante dispostos a dividir a conta, tem o hábito pedir o prato mais caro do cardápio. Esse fato é observado pelos amigos. Em outra ocasião, na qual Luís sequer teve como acompanhar a turma em uma visita a um novo restaurante, outro deles, de nome José, faz seu pedido, e os demais observam que se trata do prato mais caro do cardápio. Então perguntam, rindo: “Vai ‘Luisar’, José?”

Como explica Raquel Machado, talvez mesmo a linguagem natural, na formação do sentido das palavras e na evolução desse sentido com o tempo, faça sempre e necessariamente uso de palavras com a estrutura que se convencionou chamar de “tipo”25, mesmo quando se diz que se trata de conceito. Por mais fechado que este seja, para defini-lo será preciso fazer uso de palavras, e estas levarão ao mesmo problema de delimitação de sentido. É o exemplo de Carrió, anteriormente citado: se se entender que o contrato de compra e venda é aquele no qual se entrega uma coisa mediante a contraprestação do pagamento de um preço, pode-se questionar: e o que é “coisa”? O que é “preço”? Quais características a coisa precisa ter, ou não ter, para ser assim considerada? Quanto ao preço, se o valor de mercado do bem é aproximadamente R$ 10.000,00, uma contraprestação de R$ 100,00 poderá ser designada como “preço”?

Note-se que não se trata de uma questão apenas jurídica, muito menos apenas de Direito Tributário. Não há como se definir previamente, de forma inalterável, e exauriente, o significado de nenhuma palavra que se reporte à realidade fenomênica. Trata-se de algo intrínseco à linguagem natural, por meio da qual se expressam as normas. E isso decorre da constatação de que as realidades futuras não são inteiramente previsíveis. Não se pode antecipar, na definição do significado de uma palavra (e, a fortiori, de uma norma que se expressa por palavras), em quais contextos futuros ela terá sua aplicação suscitada.

Reconheça-se, quanto a este ponto, que a preocupação dos que defendem a rigidez conceitual das normas de competência é inteiramente legítima. Se elas puderem significar o que o intérprete desejar que signifiquem, perdem completamente o sentido. Uma regra de competência só faz sentido se delimitar o que se pode legitimamente fazer, e, a contrario, o que não se pode. É isso que por meio delas se procura fazer. Mas daí não decorre que o significado de seus termos seja sempre preciso e, menos ainda, que não se possa alterar ao longo do tempo, não porque o intérprete quer, mas porque a própria realidade designada pelas palavras e expressões se modificou. Vale lembrar do “falso dilema” denunciado por Carrió. Reconhecer onde estão os verdadeiros limites ao arbítrio do intérprete é importante para a referida preocupação de evitar que sejam as regras de competência estioladas pelo poder de tributar.

4. Ausência de precisão nos limites não é ausência de limites

Reitere-se que o fato de não existirem limites rígidos, predefinidos e inalteráveis não significa que esses limites não existam em absoluto, e muito menos que caiba ao arbítrio de quem usa as palavras manejá-los como quiser. É preciso afastar o falso dilema apontado por Carrió, porquanto o significado é determinado no contexto, mas este, o contexto, é determinante. Não se trata de deixar as coisas ao sabor da vontade do intérprete.

Imagine-se, por exemplo, a palavra “velho”. Se usada para designar crianças que não podem jogar na seleção de futebol de seu clube, na categoria “Sub-9”, se pode dizer que se aplica a indivíduos de 11 anos. Se se estiver falando de um Ministro de uma Corte Superior, já na casa dos 45, se pode dizer que a ele não se aplica, por ser jovem para ser ministro. Se a palavra for usada entre amigos de uma turma, uns com os outros independentemente da idade, ter-se-á um cumprimento. E se for o filho falando que naquele dia está triste porque teve uma discussão com “seu velho”, não depende da vontade do intérprete saber que ele se refere ao próprio pai. Nenhuma dessas modificações no significado da palavra velho, em cada contexto, depende da arbitrariedade dos falantes, podendo-se dizer mesmo que eles são vinculados ou limitados pelo contexto a encontrar aquele, e somente aquele significado. Apenas não se pode dizer que tal significado pode ser prévia e precisamente definido unicamente a partir do texto.

É por isso que as máquinas têm tanta dificuldade em interpretar textos simples, por não terem o senso comum necessário a que, de modo intuitivo, possam perceber, no contexto, elementos que sinalizam o sentido a ser dado às palavras e expressões a serem interpretadas. Em um sistema aberto a infinitas possibilidades, o futuro nunca é inteiramente igual ao passado, motivo pelo qual eventos impossíveis de serem antecipados e previstos – na aplicação de uma norma, ou mesmo no uso de uma palavra – são difíceis para as máquinas, diversamente, por exemplo, do que se dá em sistemas fechados e previsíveis (desde que haja elevado poder de cálculo das possibilidades, que são muitas, mas limitadas) como o xadrez, jogo no qual computadores se tornaram insuperáveis há algum tempo. Ao tentar criar máquinas capazes de lidar com sistemas abertos – como é o caso da realidade e da linguagem natural que a refere – o ser humano termina por racional e conscientemente perceber o processo que ele próprio leva a efeito, até então de modo intuitivo, sendo por isso que a ciência da computação, nessa parte, tem muito a aprender com a hermenêutica, e vice-versa, estando ambas a integrar, junto com tantas outras, o leque das chamadas “ciências cognitivas”26.

A mente humana parece aplicar, na determinação do sentido das palavras que usa e ouve, método falibilista, semelhante ao que se emprega na compreensão da realidade fenomênica em geral, e que, no conhecimento, deve pautar o método científico. Como não se tem – e nunca se terá – plena e absoluta certeza de se ter chegado a um resultado correto, buscam-se razões suficientes para fundamentar a crença que se tem (de que o significado da palavra em determinado contexto é “X”, ou de que a natureza de um corpo celeste é “Y”, ou que as causas de uma crise são “Z”), mas mantendo-se aberto para, diante de novas evidências de atualização nas informações até então obtidas, se alterar aquela conclusão.

Interessante notar que a indução, como forma de se realizarem inferências lógicas, é problemática exatamente por isso, por não se poder garantir que o futuro será igual ao passado27. Recorde-se a figura do “peru indutivo”, usada por Bertrand Russel para ilustrar o problema da indução, tendo a ave a certeza, pela observação empírica da realidade, que todos os dias em determinado horário seria alimentada. Essa certeza, decorrente da indução, foi contrariada na véspera de Natal, quando a ave, esperando receber a refeição diária, foi em verdade abatida e levada ao forno. É esse o motivo, aliás, pelo qual, mesmo com grandes volumes de dados (big data), as máquinas, realizando inferências por indução, nem sempre conseguem chegar a resultados satisfatórios, nos mais variados campos, notadamente diante de situações novas e imprevisíveis28.

“Alta”, em princípio, significa a designação de alguém com estatura acima da média. Mas quando novas informações são acrescentadas, dado o contato que o intérprete tem com o contexto – a amiga que disse “estou alta” depois de ter bebido algumas cervejas – o referido significado pode mudar. Mesmo depois da mudança, porém, a mente do intérprete continua aberta à possibilidade de novas informações novamente alterarem – ou confirmarem – a interpretação encontrada. Se se questiona: “Alta?”, e amiga retruca: “sim, vou parar de beber”, confirma-se que “alta” designa um pouco bêbada. Mas se a amiga diz: “Sim, esses saltos que você me emprestou são maravilhosos!”, confirma hipótese diversa.

Imagine-se, em mais um exemplo, a palavra “social”. Impressa em um convite para uma festa, certamente designa a forma como os convidados devem se trajar (“traje social”). Caso, porém, seja pronunciada pelo porteiro de um edifício residencial, no interfone, depois de anunciar a chegada de um pedido de delivery de refeição feito por um dos condôminos (“Está no social!”), ele pode sugerir que a embalagem com a comida está subindo pelo elevador social. Se o porteiro tem por hábito fazer essa gentileza ao morador, talvez na primeira vez tenha falado: “seu lanche está subindo pelo elevador social”, mas, depois de umas duas ou três vezes em que isso se repete, apenas interfona e fala “social!”, e o condômino já sabe do que se trata. Não é admissível, apenas por conta dessa pluralidade de sentidos em tese possíveis, que o intérprete “decida arbitrariamente” que “social”, dito pelo porteiro, naquele contexto, significa um elogio ao condômino por ter muitos amigos.

Se a esposa diz ao marido: “ – Amor, já que vai ao mercado comprar cerveja, se tiver leite, você traz cinco caixas?”, uma máquina não saberia bem interpretar uma mensagem. Mas qualquer humano sabe que a esposa quer que, se tiver leite, o marido traga cinco caixas de leite. Máquinas talvez, diante da constatação visual de que há leite nas prateleiras do mercado, trouxessem cinco caixas de cerveja, e a internet está repleta de memes ilustrando equívocos interpretativos assim. O humor decorre da obviedade de que o marido não deveria, a luz do contexto, entender a frase, conquanto dúbia, do jeito que quisesse29. Deveria, à luz do contexto, ter trazido cinco caixas de leite, além das cervejas que eventualmente estivesse propenso a comprar.

É isso que se quer dizer quando se afirma que as palavras são vagas, e ambíguas, sendo o contexto que as define com precisão. O contexto, não o querer do intérprete.

No caso das normas jurídicas em geral, e das regras constitucionais de competência em particular, não é diferente. Embora renda possa, como se sabe, designar tecido transparente de malha aberta, fina e delicada, o contexto em que essa palavra se acha utilizada no art. 153, III, da Constituição Federal sugere evidentemente outra coisa. E é do contraste desse inciso com outros artigos da Constituição, de sua comparação com Constituições anteriores, a verificação dos debates constituintes30, enfim, uma série de elementos31 indicativos do significado que o intérprete pode validamente atribuir à palavra naquele contexto, que está devidamente explicado no art. 43 do Código Tributário Nacional.

Esse é o problema de algumas decisões do Supremo Tribunal Federal, que parecem usar a ideia de que as palavras usadas pela Constituição seriam “tipos” como falsa premissa para, a rigor, dar a elas o significado que convém a uma maior arrecadação tributária, sem atenção aos elementos contextuais e extratextuais que devem pautar a interpretação.

Um fator contextual a ser considerado, na interpretação das regras de competência, é o de que elas não se podem se sobrepor, salvo quando consta ressalva expressa nesse sentido no texto constitucional. O significado das palavras usadas por uma, assim, não pode ser definido de modo a que ela se sobreponha às outras.

Essa conclusão decorre dos dispositivos que dão à lei complementar o papel de dirimir conflitos de competência, pois se pudesse haver sobreposição, sequer seria possível falar em conflito, muito menos na necessidade de serem dirimidos (CF/1988, art. 146, I). E, também, da regra definidora das competências extraordinária e residual. A primeira expressamente indica a possibilidade de sobreposição, mas só na excepcionalidade de uma guerra. A segunda de modo expresso a afasta32. Dessas disposições se deduz, então, que, por mais que a palavra “serviço” possa designar realidades diferentes, as quais evoluíram ao longo do tempo, ou nas quais podem estar presentes várias características entrelaçadas mas nenhuma por si necessária, por serviço não se deve abarcar aquilo que for considerado operação de crédito, câmbio e seguro, sujeito à tributação pelo IOF.

Daí o desacerto, com todo o respeito, das conclusões a que chegou o Supremo Tribunal Federal, no que tange à incidência do ISS sobre leasing. Tampouco se pode admitir que toda realidade nova deva obrigatoriamente ser subsumida às regras de competência preexistentes, assim esticadas à força para abrangê-las, pois isso torna sem qualquer sentido a figura da competência residual.

De forma igualmente desacertada, com todo o respeito, entendeu o STF que a locação de bens móveis não configuraria serviço (Súmula Vinculante n. 31), mas o leasing sim, justificando que este, embora muito semelhante àquela (e inclusive previsto no mesmo item da lista de serviços), teria uma “natureza de financiamento”33. Essa distinção, se procedente, faria com que o leasing, se fosse o caso, se submetesse ao IOF, não ao ISS.

O mesmo pode ser dito do ISS sobre o seguro saúde, visto que operações de seguro se encontram no âmbito de competência referente ao IOF, conforme terminou por reconhecer o STF no âmbito do RE n. 651.703, depois do julgamento de embargos declaratórios. Nesse ponto, pelo menos, a Corte corretamente consignou que a incidência de um desses impostos exclui a do outro, em respeito à vedação à bitributação e ao bis in idem que se extrai dos arts. 146, I, e 154 da CF/1988. Embora os planos de saúde desempenhem atividade com natureza semelhante, também sujeita ao fator aleatório, pode-se admitir que estaria dentro do papel da lei complementar definir se estariam sujeitos ao ISS, ou ao IOF. No caso do seguro saúde, não, dada a maior coincidência com os significados minimamente atribuíveis às palavras usadas para veicular a norma de competência referente ao imposto federal.

Na mesma ordem de ideias, tendo o STF admitido que sobre as atividades de factoring incide o IOF (ADI n. 1.763), pois seriam subsumíveis à noção de “operação de crédito”, isso deve levar ao reconhecimento da inconstitucionalidade da pretensão dos Municípios, amparados em disposições da LC n. 116/200334, de tributar essas mesmas atividades como se serviços fossem.

Como se percebe, melhor do que insistir em uma suposta determinação precisa e a priori do significado das palavras usadas pela Constituição, no que mais parece uma briga de dicionários, o relevante, portanto, é, na apresentação de razões que fundamentem uma determinada interpretação35, indicarem-se os fatores contextuais que impõem esta e não aquela conclusão. A apresentação de razões é decisiva, a afastar a noção de arbítrio ou ampla liberdade interpretativa.

Conclusão

Não apenas as regras de competência, mas todas as palavras, usadas em quaisquer textos normativos, são ferramentas da chamada linguagem natural e, nessa condição, há uma textura aberta que lhes é insuprimível. São vagas, e ambíguas, potencialmente, características que só se reduzem à luz de cada contexto em que são empregadas, do qual se extraem elementos capazes de dar precisão ao que com elas se pretendeu significar.

Essa é constatação decorrente do estudo da linguagem, que se faz mais visível quando se tenta programar máquinas capazes de interpretar. Mesmo dotadas das informações constantes em todos os dicionários do mundo, cometem deslizes banais na determinação do sentido de textos que para humanos parecem bastante claros, apenas pela falta dos aludidos elementos extratextuais (circunstâncias da realidade e valores a serem buscados). Não se trata de algo que se possa decidir aceitar, ou lutar contra, em nome de valores ou ideais. A linguagem natural é assim.

Mas daí não decorre que o intérprete possa dar ao texto o sentido que quiser. Pelo contrário. O intérprete tem pouca, ou nenhuma liberdade, à luz do contexto. É este, o contexto, que determina, ou define, o significado. Em se tratando de normas de competência tributária, não só o contraste com outras normas de competência (com as quais não se podem sobrepor), mas a consideração da evolução histórica do tributo (ou de seu antecessor) em Constituições anteriores, os debates havidos nos trabalhos constituintes, tudo isso é relevante para indicar ao intérprete o significado a ser a elas atribuído. É possível, portanto, afirmar equivocada, com todo o respeito, a consideração, pelo STF, de que o leasing, por ser uma forma de financiamento, seria um serviço sujeito ao ISS, podendo-se dizer o mesmo da decisão – posteriormente retificada – que submeteu o seguro saúde – situado na órbita de incidência do IOF – ao ISS.

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1 LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 3. ed. Tradução de José Lamego. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1997, p. 300 e ss.

2 Cf., v.g., TORRES, Ricardo Lobo. Interpretação e integração da lei tributária. In: MACHADO, Hugo de Brito (coord.). Interpretação e aplicação da lei tributária. São Paulo/Fortaleza: Dialética/ICET, 2010, p. 351-352.

3 MACHADO, Raquel Cavalcanti Ramos. Competência tributária: entre a rigidez do sistema e a atualização interpretativa. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 96.

4 Cf., v.g., TORRES, Ricardo Lobo. Interpretação e integração da lei tributária. In: MACHADO, Hugo de Brito (coord.). Interpretação e aplicação da lei tributária. São Paulo/Fortaleza: Dialética/ICET, 2010, p. 351-352.

5 SCHOEURI, Luís Eduardo. Direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 248

6 Cf., v.g., CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 21. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 432.

7 DEEMTER, Kees Van. Not exactly: in praise of vagueness. Oxford: Oxford University Press, 2010, passim.

8 CARRIÓ, Genaro. Notas sobre derecho y lenguage. 6. ed. Buenos Aires: Abeledo Perrot, 2011, p. 36.

9 AUSTIN, John L. How to do things with words. The William James lectures delivered at Harvard University in 1955. Oxford UP, 1962, passim.

10 CARRIÓ, Genaro. Notas sobre derecho y lenguage. 6. ed. Buenos Aires: Abeledo Perrot, 2011, p. 19-21.

11 Por isso mesmo, pode-se dizer que a “clareza” de um texto legal decorre da falta de imaginação do intérprete, incapaz de pensar em situações futuras, diversas daquelas tidas como “padrão” pelo idealizador da norma, nas quais seu sentido, alcance e aplicabilidade não seriam assim tão nítidos. Cf. PERELMAN, Chaïm. Lógica jurídica. Tradução de Vergínia K. Pupi. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 51.

12 SOLER, Sebastian. Las palabras de la ley. México: Fondo de Cultura Economica, 1969.

13 CARRIÓ, Genaro. Notas sobre derecho y lenguage. 6. ed. Buenos Aires: Abeledo Perrot, 2011, p. 50, transcrevendo trecho da página 162 de Fe en el derecho, de Soler.

14 DEEMTER, Kees Van. Not exactly: in praise of vagueness. Oxford: Oxford University Press, 2010, p. 96.

15 CARRIÓ, Genaro. Notas sobre derecho y lenguage. 6. ed. Buenos Aires: Abeledo Perrot, 2011, p. 51, transcrevendo trecho da página 42 de La interpretacion de la ley, de Soler.

16 AVILA, Humberto. Constituição, liberdade e interpretação. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 59.

17 AVILA, Humberto. Constituição, liberdade e interpretação. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 24.

18 CARRIO, Genaro. Algunas palabras sobre las palabras de la ley. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1971, 96p.

19 CARRIÓ, Genaro. Notas sobre derecho y lenguage. 6. ed. Buenos Aires: Abeledo Perrot, 2011, p. 71-72.

20 PLATÃO. Obras completas. 2. ed. Madrid: Aguilar, 1993.

21 WITTGENSTEIN, Ludwig. Investigações filosóficas. Tradução de José Carlos Bruni. São Paulo: Nova Cultural, 2000, passim.

23 Por isso, “each concept in our mind owes its existence to a long succession of analogies made unconsciously over many years, initially giving birth to the concept and continuing to enrich it over the course of our lifetime” (HOFSTADTER, Douglas; SANDER, Emmanuel. Surfaces and essences. Analogy as the fuel and fire of thinking. New York: Basic Books, 2013, p. 3).

24 Schauer, ao afastar teorias que buscam apenas o que é “essencial” ao Direito, em um raciocínio voltado para conceitos fechados, afirma: “The nature or essence of any concept might sometimes, often, or always be a cluster of interrelated properties, none of which is individually necessary. Or it may be that the concept, category or institution of law, at least has no essence, it being too diverse a collection of phenomena to be captured or explained by one or more necessary properties.” (SCHAUER, Frederick. The force of law. Cambridge: Harvard University Press, 2015, p. 4). Uma nebulosa de características inter-relacionadas, nenhuma delas necessária em si, é exatamente o que se dá com o uso de tipos!

25 MACHADO, Raquel Cavalcanti Ramos. Competência tributária: entre a rigidez do sistema e a atualização interpretativa. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 86 e ss.

26 BROZEK, B; HAGE, Jaap; VINCENT, Nicole. Law and mind: a survey of law and the cognitive sciences. Cambridge: Cambridge University Press, 2021, passim.

27 POPPER, Karl. O problema da indução. In: MILLER, David (org.). Popper: textos escolhidos. Tradução de Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Contraponto, 2010, p. 101-115.

28 LASRON, Erik J. The mith of artificial intelligence: why computers can’t think the way we do. Cambridge, Massachusetts/London, England: The Belknap Press of Harvard University Press, 2021. Em suas palavras, “But all machine learning is a time-slice of the past; when the future is open-ended and changes are desired, systems must be retrained.” (p. 140)

29 Há vários outros exemplos semelhantes, a indicar a maneira intuitiva – e por isso nem sempre percebida – como se fazem inferências a partir do contexto, ou usando elementos que estão para além do texto, para compreendê-lo, o que se mostra dificílimo para as máquinas. “Joan made sure to thank Susan for all the help she had given. Who had given the help? a) Joan; b) Susan”. Ou então: “The town councilors refused to give the angry demonstrators a permit because they feared violence. Who feared violence? a) The town councilors; b) The angry demonstrators.” Para um humano as respostas são fáceis, para uma máquina, não. A leitora certamente pode apresentar razões, ancoradas em fatores extratextuais, pelas quais a resposta correta em ambos os casos é “b” (LASRON, Erik J. The mith of artificial intelligence: why computers can’t think the way we do. Cambridge, Massachusetts/London, England: The Belknap Press of Harvard University Press, 2021, p. 166).

30 Confira-se, a esse respeito, BALEEIRO, Aliomar. Alguns andaimes da Constituição. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 10 e 11.

31 Muitos deles muito bem explorado em ÁVILA, Humberto. Conceito de renda e compensação de prejuízos fiscais. São Paulo: Malheiros, 2011, passim.

33 “Financiamento é serviço, sobre o qual o ISS pode incidir, resultando irrelevante a existência de uma compra nas hipóteses do leasing financeiro e do leaseback. Recurso extraordinário a que se nega provimento.” (RE n. 592.905, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, j. 2.12.2009)

34 Item 10.04 da lista anexa à LC n. 116/2003.

35 É o que faz, por exemplo, Humberto Ávila, ao fundamentar situações nas quais se deve dar sentido mais amplo ao termo “casa”, ou mais restrito ao termo “receita”, com o fito de prestigiar a liberdade cuja proteção incumbe primordialmente à Constituição, que tem em seu resguardo, historicamente, sua razão de ser. Cf. ÁVILA, Humberto. Conceito de renda e compensação de prejuízos fiscais. São Paulo: Malheiros, 2011, passim.