Imposto sobre Serviços e os Contratos de Franquia: uma Análise do Julgamento do STF no RE n. 603.136*1

The Brazilian Local Tax on Services and Franchise Agreements: an Analysis of STF’s Ruling of Case RE n. 603.136

Henrique Napoleão Alves

Doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Pós-doutoramento em Direito (Democracia e Direitos Humanos) pela Universidade de Coimbra. Professor, advogado, consultor e parecerista. E-mail: hnalves.dir@gmail.com.

Eduardo Junqueira Coelho

Mestre em Economia pela Universidade Federal de Viçosa. Graduado em Direito e em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor, advogado, consultor e parecerista. E-mail: junqueira@sachacalmon.com.br.

Recebido em: 17-2-2023 – Aprovado em: 19-7-2023

https://doi.org/10.46801/2595-6280.54.9.2023.2326

Resumo

Ao decidir o RE n. 603.136, o STF fixou a tese de que é constitucional a incidência de Imposto sobre Serviços (ISS) sobre contratos de franquia. O presente artigo analisa os fundamentos adotados pelo STF. São analisados criticamente os fundamentos contidos nos votos vencedores e no voto vencido, também a partir da perspectiva do contribuinte (podendo interessar defensores da perspectiva fiscal, pelos argumentos contrários a essa perspectiva). Metodologicamente, o trabalho se enquadra como uma pesquisa de dogmática jurídica e adota a estratégia do estudo de caso. A pesquisa se justifica pela importância jurídica e econômica do tema. O artigo deverá ser de particular interesse para estudiosos do direito tributário, do direito constitucional e da teoria do direito.

Palavras-chave: franquia, ISS, tributário, jurisdição constitucional, argumentação jurídica.

Abstract

When deciding RE 603.136, the Brazilian Constitutional Court (STF) ruled that the Brazilian service tax (ISS) on franchise contracts is constitutional. This article analyzes the reasons adopted by the STF. The reasons of both the prevalent and the minority opinions are critically analyzed from the perspective of the taxpayer. Methodologically, the article is an exercise in legal dogmatics and adopts the case study strategy. It is justified by the legal and economic importance of the subject. The article should be of particular interest to practitioners and academics of tax law, constitutional law, and legal theory.

Keywords: franchising, ISS (Brazilian Service Tax), judicial review, Tax Law, legal argumentation.

1. Introdução

Prática de origem estrangeira, o “franchising” ou franquia se caracteriza pelo acordo entre franqueador e franqueado, por meio do qual o último passa a usar o modelo de negócio e a marca do primeiro. A marca usualmente insere-se, aí, como parte importante do modelo de negócio e como uma das responsáveis por permitir que o franqueado já obtenha um certo número de clientes (por ela atraídos) logo no início de seu novo empreendimento. O conjunto de direitos dados ao franqueado costuma ser amplo, usualmente abarcando um conjunto de marcas e códigos (logotipo, design, uniformes etc.) e, em especial, o “know-how”, cuja transmissão se dá por meio de manuais, programas de treinamento e de suporte2. Neste sentido, a franquia pode ser considerada, em menos palavras, como espécie de “locação” ou “cessão” de um modelo de negócio, mediante pagamento de valor, enquanto durar o uso ou locação do negócio em questão.

A discussão sobre a incidência ou não do Imposto sobre Serviços (ISS) em relação aos contratos de franquia não é nova. Em um artigo publicado em fevereiro de 2005, v.g., Martins e Marone mencionavam essa incidência como “questionável”. O mesmo artigo também menciona precedentes em que essa incidência foi discutida no âmbito normativo anterior à Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003 (LC n. 116)3. Foi apenas recentemente, porém, que o tema foi assentado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em sede de repercussão geral (Tema n. 300). Em 29 de maio de 2020, o Plenário do STF decidiu o Recurso Extraordinário (RE) n. 603.136, quase dez anos após a decisão que havia reconhecido a repercussão geral do caso4. O Tribunal, por maioria de votos, fixou a tese de que “[é] constitucional a incidência de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) sobre contratos de franquia (franchising) (itens 10.04 e 17.08 da lista de serviços prevista no Anexo da Lei Complementar 116/2003)”5.

No presente artigo, analisamos os fundamentos adotados pelo STF na referida decisão do RE n. 603.136 a partir de um enfoque argumentativo que: (i) volta-se à aplicação judicial ou administrativa do Direito e à correção racional dos argumentos empregados nos discursos de justificação das decisões jurídicas; (ii) preocupa-se em buscar não pelo “como”, mas pelo “por que”, i.e, não a explicação de como se forma uma decisão jurídica, mas a sua justificação; (iii) alarga, com isso, o campo do estudo jurídico para não apenas a interpretação do sentido e do alcance das normas, mas para a justificação dessas atribuições de sentido; (iv) preocupa-se com a análise racional de todos os aspectos relevantes da justificação de decisões jurídicas (normas e interpretações de textos normativos, enunciados da dogmática, premissas empíricas usadas por juristas, estrutura lógica das proposições normativas etc.); (v) serve como meio para que os juristas possam compreender melhor a sua própria ação, podendo, com isso, influir e modificar a própria prática social6. Mais informações sobre o referencial teórico encontram-se no tópico 3.1 abaixo.

Ainda nas considerações metodológicas, o artigo se insere no âmbito da chamada dogmática jurídica, aqui entendida como o ramo do conhecimento jurídico voltado, inter alia, a problemas sobre o sentido e o alcance das normas jurídicas e sobre conflitos normativos7.

Para cumprir o objetivo de pesquisa, o trabalho concentrou-se em realizar: (i) por meio de pesquisa jurisprudencial, uma análise descritiva da decisão do STF no RE n. 603.136; (ii) por meio de pesquisa teórica, bibliográfica e jurisprudencial, a compreensão crítica do caso sob estudo segundo princípios de racionalidade8, e também a partir da perspectiva do contribuinte, delineando os possíveis argumentos no sentido da intributabilidade do contrato de franquia – o que, do ponto de vista teórico, também pode interessar os leitores que adotem a perspectiva fiscal, na medida em que delineia os argumentos contrários a essa perspectiva9.

Além de não terem sido encontradas outras publicações que tenham analisado o RE n. 603.136 até o momento, a pesquisa se justifica também pela importância jurídica e econômica do tema, que afeta um número elevado de agentes econômicos no país. Pelo tema e pela abordagem, o presente trabalho deverá ser de particular interesse para estudiosos do direito tributário, da teoria do direito e do direito constitucional. De fato, estudos dentro do campo dogmático podem se beneficiar bastante da estratégia de examinar situações ou casos específicos, afinal, neles as questões normativas emergem com particular configuração e intensidade. O presente artigo adota essa estratégia de estudo de caso com o intuito de se aproveitar das vantagens que essa estratégia confere às investigações jurídicas10.

2. Os fundamentos da decisão

O RE n. 603.136 tem como origem um litígio entre o Fisco do município do Rio de Janeiro e uma empresa de comércio de alimentos que firmou um contrato de franquia empresarial “com uma conhecida rede da fast food, que inclui cessão de uso de marca, treinamento de funcionários, aquisição de matéria-prima etc.”11 O relator designado, Ministro Gilmar Mendes, delimitou a questão constitucional do caso como sendo a de entender o que significa “serviço” passível de tributação municipal, conforme a norma constitucional de competência do art. 156, inciso III, da Constituição, de modo a examinar se o item 17.08 da lista de serviços da LC n. 116 é ou não constitucional12.

O Tribunal decidiu, por maioria, negar provimento ao recurso extraordinário interposto pelo contribuinte, nos termos do voto do Ministro Gilmar Mendes, vencidos os Ministros Marco Aurélio e Celso de Mello13. O voto do Ministro Gilmar Mendes pode ser resumido da seguinte forma:

O texto do inciso III do art. 156 da Constituição remete a definição de serviços tributáveis pelo ISS à legislação complementar. Essa legislação não pode incluir os serviços reservados pela Constituição – art. 155, inciso II – à competência tributária dos estados e do Distrito Federal no âmbito do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Ademais, deverá observar os limites semânticos do conceito de “serviço”, em respeito à norma interpretativa do art. 110 do Código Tributário Nacional (CTN)14.

– Diferentes precedentes do STF indicam que o conceito de “serviço” para fins de incidência do ISS foi demarcado no sentido de incluir: (i) os serviços que relacionam-se com obrigações de “fazer”, em contraposição àqueles caracterizados por obrigações de “dar” (v.g., na jurisprudência do STF que afastou a incidência em relação à locação de bens móveis); (ii) as atividades de caráter misto, i.e., em que há tanto um “dar” quanto um “fazer” (v.g., em decisões sobre a incidência de ISS em relação à operação de leasing financeiro, às atividades realizadas por operadoras de plano de saúde e mesmo à locação de bens móveis quando esta integra um negócio mais amplo e se faz acompanhar de outras atividades, como é o caso da locação de guindastes para emprego em atividades igualmente contratadas)15.

– Os contratos de franquia comumente envolvem perstações que denotam caráter misto, como “a cessão do uso de marca, a assistência técnica, o direito de distribuição de produtos ou serviços, entre outras”. Em virtude disso, não se sujeitam a distinção clássica e rígida entre obrigações de dar, intributáveis pelo ISS, e obrigações de fazer. Ademais, não seria correto entender a franquia fundamentalmente a uma cessão de direitos, sem qualquer prestação de serviços, por haver “inegável aplicação de esforço humano”, por parte do franquador, “destinado a gerar utilidade em favor de outrem – o franqueado”. Por essas razões, os parâmetros relacionados ao leasing financeiro, às operadoras de planos de saúde e à locação de bens móveis acompanhada por outras atividades contratadas seriam os aplicáveis aos contratos de franquia. Neste sentido, a decisão pela incidência tributária em relação aos contratos de franquia não representaria uma inovação em relação aos precedentes do STF sobre a matéria16.

– A distinção entre “atividade-fim”, como a cessão do uso de marca, e “atividade-meio”, como as atividades de treinamento, orientação, publicidade, entre outras, não deveria ter relevância para fins tributários porque: (i) o contrato de franquia é um plexo de obrigações que forma uma unidade, de modo que qualquer distinção e fragmentação desnatura a relação contratual; (ii) se o STF admitisse tratamento tributário diferente das atividades-meio em relação às atividades-fins, de modo que somente as primeiras ficassem sujeitas à incidência do ISS, isso “certamente conduziria o contribuinte à tentação de manipular as formas contratuais e os custos individuais das diversas prestações, a fim de reduzir a carga fiscal incidente no contrato”17.

– Uma decisão de inconstitucionalidade terminaria por criar um “vazio” na “já combalida estrutura fiscal dos estados e municípios”, como ocorreu com a inconstitucionalidade da locação de bens móveis, atividade que escaparia da incidência tanto do ISS quanto do ICMS. Esse fundamento não seria um “elemento extrajurídico e, portanto, alheio a esse julgamento”, mas uma questão relacionada ao “mister constitucional” do STF, que “inclui a proteção dos direitos fundamentais do contribuinte”, assim como “a defesa das competências constitucionais tributárias e – devo dizer – da arrecadação tributária, peça-chave do conceito de Estado Fiscal”18.

Em voto concordante, o Ministro Alexandre de Moraes salientou, em suma, que:

– Num primeiro momento, a jurisprudência do STF teria estabelecido que o ISS incide somente sobre obrigações de fazer. Esse parâmetro foi alargado em outras decisões: (i) no RE n. 547.245, o então Ministro Eros Grau afirmou que há serviços que, por serem “de qualquer natureza”, “não consubstanciam típicas obrigações de fazer” e, além disso, “toda atividade de dar consubstancia também um fazer e há inúmeras atividades de fazer que envolvem um dar”; (ii) no RE n. 651.703, o Ministro Luiz Fux afirmou que “o conceito de prestação de serviços não tem por premissa a configuração dada pelo Direito Civil”, mas refere-se “ao oferecimento de uma utilidade para outrem, a partir de um conjunto de atividades materiais ou imateriais, prestadas com habitualidade e intuito de lucro, podendo estar conjugada ou não com a entrega de bens ao tomador”19.

– O contrato de franquia “não se restringe à cessão de uso das marcas e patentes, pois envolve a prestação de diversos serviços de organização empresarial”. Sendo assim, aplica-se a ele o conceito de serviço e a incidência do ISS, na esteira do voto do Ministro Gilmar Mendes e também de precedentes do Superior Tribunal de Justiça20.

Em voto divergente, o Ministro Marco Aurélio afirmou, em resumo, que:

– A análise da incidência ou não do ISS exige “verificar, a partir da natureza do negócio jurídico, se estão presentes as características típicas de serviço, respeitadas as definições e regramentos trazidos por outros ramos do Direito além do Tributário”. Isso em respeito ao art. 110 do CTN e, mais ainda, à própria “tipologia constitucional de serviço”. Ademais, como o Plenário do STF assentou no julgamento do RE n. 166.772-9/RS, “[o] conteúdo político de uma Constituição não é conducente ao desprezo do sentido vernacular das palavras, muito menos ao do técnico, considerados institutos consagrados pelo Direito.” Assim, a forma jurídica não deve ser relegada a um plano secundário em relação ao conteúdo econômico e, assim, a incidência do ISS deve centrar-se somente à prestação de serviços; somente este é o fato gerador do tributo21.

– O vocábulo “serviços” tem o sentido de obrigação de fazer, como assentado pelo STF na Súmula Vinculante n. 31. Segue, portanto, a distinção clássica entre dar, fazer e não fazer do Direito Civil das obrigações. Ao julgar o RE n. 651.703, o relator designado, Ministro Luiz Fux, asseverou que o sentido civilista não seria “o mais adequad[o] ao enquadramento dos produtos e serviços resultantes da atividade econômica, para fim de aplicação no Direito Tributário”. Essa linha de raciocínio, porém, não coadunaria com a jurisprudência tradicional do STF sobre o tema; e seria, ademais, incompatível com a permanência da eficácia da citada Súmula Vinculante n. 3122.

– No caso dos contratos “híbridos”, o entendimento do STF no âmbito das turmas tem sido o de examinar se a atividade preponderante se traduz num “fazer” para fins de incidência do ISS (v.g., AgInt no RE n. 955.507, Ag n. 982.578). Esse deve ser o critério: analisar a “atividade preponderante”, a “essencialidade da prestação”, o “núcleo da prestação”. Em contratos híbridos ou contratos “complexos”, que podem incluir haver direitos e obrigações variadas – de fazer, dar e não fazer –, deve-se distinguir entre as “atividades-meio” e a “atividade-fim”. As atividades-meio são “as tarefas desempenhadas em atendimento a requisito para a produção de outra utilidade”. A atividade-fim é a própria “utilidade posta à disposição do mercado”. No caso dos contratos de franquia, sua essência está numa obrigação de dar, “revelada na cessão do direito de uso de marca ou patente”. Essa cessão é frequentemente acompanhada por atividades “voltadas a viabilizar a instalação e o desenvolvimento do empreendimento franqueado, tais quais assistência, instrução e treinamento de pessoal”, mas essas últimas não integram o núcleo da prestação23.

3. Análise da decisão

Qualquer decisão jurídica – tal como a que se pretende analisar neste artigo – pode ser entendida como a aplicação de normas e parâmetros jurídicos a fatos determinados ou estabelecidos nos autos, i.e., como a qualificação jurídica de certos fatos. Por isso, a análise de seus elementos pode incluir perguntas sobre os fatos estabelecidos (quais foram as provas produzidas, quais foram os outros elementos fáticos, como os elementos fáticos foram e como devem ser interpretados...), sobre o Direito aplicável (quais as normas, decisões, interpretações doutrinárias e demais fontes diretas e indiretas guardam alguma relação com os fatos estabelecidos) e, finalmente, sobre como esse Direito se aplica aos fatos estabelecidos. No RE n. 603.136, o que suscita debate não é a questão fática, mas como ela deve ser juridicamente entendida. A análise, portanto, centra-se mais no Direito aplicável e em como ele se aplica a contratos de franquia.

Como dito na introdução, o enfoque adotado é argumentativo. É preciso esclarecer melhor o que se entende por isso, uma vez que a argumentação jurídica designa, na verdade, um conjunto de teorias diferentes que possuem características em comum24.

Argumentar é um processo intelectual que envolve fazer afirmações e fornecer razões para essas afirmações. É uma forma específica de pensamento e de linguagem que diz respeito a razões, a meios pelos quais podemos evitar crenças injustificadas25. Argumentos são meios pelos quais podemos expressar razões. Entender os primeiros é compreender essas últimas26. Por isso, argumentos podem ser definidos também por sua estrutura ou pelos elementos que os conformam: argumentos são um conjunto de sentenças, afirmações ou proposições em que parte delas são premissas, e uma delas é a conclusão (as premissas fornecem algum tipo de razão para a conclusão)27.

A definição de argumento acima, depreendida dos trabalhos de Sinnott-Armstrong, Neta e Fogelin, é interessante por várias razões: por indicar quais são as partes que compõem os argumentos – premissas e conclusão; indica de que são feitos os argumentos, i.e., são feitos de linguagem; por dizer qual é o propósito ou a finalidade dos argumentos – fornecer razões para justificar uma conclusão; por ser uma definição flexível, logo, capaz de abarcar os muitos tipos de argumento possíveis e existentes (dos quais o argumento jurídico é, evidentemente, apenas um deles)28.

A partir dessa definição, podemos compreender os argumentos jurídicos como argumentos com conclusões de natureza jurídica. Em sua forma clássica, são argumentos compostos por uma ou mais premissas fáticas, por uma ou mais premissas jurídicas, e por uma conclusão que qualifica os fatos à luz do Direito. Quando uma questão jurídica é controversa, existem argumentos em conflito29.

Resolver esse conflito pressupõe identificar os argumentos. A partir dos votos dados pelos ministros do STF ao julgarem o RE n. 603.136, descritos no tópico anterior, é possível identificar diferentes argumentos a favor e contra a incidência do ISS sobre contratos de franquia que envolvam, como ocorreu no caso concreto, várias atividades diferentes que incluíam a cessão de uso de marca, a aquisição de matéria-prima e o treinamento de funcionários. Trataremos disso no tópico a seguir.

3.1. A linha argumentativa principal

A linha argumentativa principal que prevaleceu na decisão do STF, favorável à incidência, pode ser sintetizada da seguinte forma:

I. A Constituição conferiu aos Estados e ao Distrito Federal a competência de tributar a circulação de mercadorias e a prestação de serviços de telecomunicações e de transporte intermunicipal, e conferiu aos Municípios a competência de tributar os demais serviços. A interpretação da norma de competência do ISS deve respeitar esses limites de competência.

II. A Constituição remete a definição de serviços tributáveis pelo ISS à legislação complementar (art. 156, III), e também confere à legislação complementar o papel de fixar normas gerais em matéria de legislação tributária (art. 146, III). O art. 110 do CTN seria uma norma geral desse tipo. Segundo esse dispositivo, “[a] lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição”.

III. Atento às considerações anteriores, o STF notou, em diferentes precedentes, que o conceito de “serviço” envolve tipicamente obrigações de “fazer”. Assim, atividades que se caracterizariam não como um “fazer”, mas sobretudo como um “dar”, seriam estranhas a esse conceito e, portanto, intributáveis pelo ISS. É o que ocorre, e.g., com a locação de bens móveis.

IV. O mesmo STF, porém, entendeu em outros casos que esse critério não pode ser aplicado às atividades de caráter misto, em que há tanto um “dar” quanto um “fazer”. Para essas atividades (e.g., leasing financeiro, operação de planos de saúde, locação de bens móveis acompanhada por outras atividades contratadas), haveria incidência do ISS.

V. Os contratos de franquia têm caráter misto, pois envolvem não apenas a cessão de uso das marcas e parentes, mas também a prestação de diversos serviços de organização empresarial. Por essa razão, tampouco a eles poder-se-ia aplicar a distinção clássica entre obrigações de fazer, tributáveis pelo ISS, e obrigações de dar. Logo, há incidência do ISS sobre os contratos de franquia, a exemplo do que o STF entendeu em relação a outras atividades de caráter misto.

3.2. A linha argumentativa vencida

A linha argumentativa vencida, expressa no voto do Ministro Marco Aurélio, possui pontos em comum e pontos divergentes em relação à argumentação acima. De fato, ambas as linhas concordam com as premissas I, II e III acima. Ambas as linhas concordam, ademais, em caracterizar o contrato de franquia como um contrato de caráter misto ou híbrido, i.e., como um contrato que envolve várias atividades; e também concordam que essas várias atividades formam uma unidade. A divergência se dá em como os contratos híbridos devem ser interpretados.

Para a linha vencida, deve-se partir da distinção clássica entre os conceitos de dar, fazer e não fazer do Direito Civil das obrigações, em respeito à Constituição e ao art. 110 do CTN, para indagar como a atividade preponderante do contrato misto ou híbrido se enquadra em relação a esses conceitos. Uma maneira de identificar a atividade preponderante se dá pela aplicação dos conceitos de atividades-meio e atividade-fim ao contrato sob análise. No caso dos contratos de franquia, atividades como assistência, instrução e treinamento de pessoal seriam atividades-meio que servem ao fim de viabilizar a instalação e o desenvolvimento do empreendimento franqueado. A essência ou o núcleo do contrato, neste sentido, residiria na cessão do direito de uso de marca ou patente, que não se confunde com um “fazer”.

3.3. Contribuições para o debate sobre a questão central

O entendimento majoritário, tal como expresso no voto do Ministro Gilmar Mendes, foi o de que a distinção entre atividade-meio e atividade-fim não deveria ser aplicada ao contrato de franquia exatamente por ele ser um plexo de obrigações que forma uma unidade, sob pena de fragmentar e desnaturar a relação contratual. A análise descritiva e crítica de decisões judiciais tal qual se propõe no presente artigo nos permite reconstruir o debate e dele participar. Neste sentido, podemos acrescentar que essa crítica à aplicação da distinção entre atividade-meio e atividade-fim não parece ser um argumento forte. A relação contratual não fica desnaturada se se considera que determinado elemento prepondera sobre os demais, ou se se identifica uma relação de instrumentalidade, ou de meios e fins, entre as atividades que a compõem.

A distinção entre atividade-meio e atividade-fim (e sua aplicação ao contrato de franquia) também foi criticada, como vimos, a partir de uma abordagem consequencialista segundo a qual a prevalência do entendimento defendido pelo Ministro Marco Aurélio conduziria o contribuinte à “tentação” de manipular as formas contratuais para evadir-se da tributação. Esse argumento também merece um escrutínio racional. O que ele enuncia é uma previsão e uma causalidade: a previsão de que, se o STF decidisse a favor do contribuinte com base na distinção entre atividade-meio e atividade-fim, muitos adotariam práticas abusivas para evadirem-se da incidência tributária; a causalidade entre a decisão do STF e esse futuro comportamento. Qual é, porém, a base ou o fundamento dessa previsão? Previsões sobre o comportamento de agentes econômicos frente a tributos são difíceis de serem feitas e impõem um ônus de fundamentação que não foi observado no acórdão sob análise30.

Outro argumento consequencialista a favor da incidência tributária foi o de que uma decisão do STF favorável aos contribuintes prejudicaria a “já combalida” capacidade fiscal dos municípios. A argumentação constante do voto descrito anteriormente menciona ainda que ao STF cabe tanto proteger os direitos dos contribuintes quanto defender a arrecadação tributária. Com a devida vênia, porém, também aqui observa-se um argumento preditivo e causal sem que o mesmo traga ou contenha os fundamentos necessários para tanto. Ademais, mesmo se considerarmos como provadas tanto (i) a fragilidade da capacidade fiscal dos municípios quanto (ii) o impacto fiscal relevante da decisão do STF sobre os contratos de franquia, ainda assim caberia o questionamento sobre quais são as formas adequadas de fortalecer a capacidade fiscal desses entes, e a quais poderes da República cabe, precipuamente, essa tarefa.

Nossa análise do caso, por outro lado, coincide, sob a ótica dos contribuintes, com o voto do Ministro Marco Aurélio em linhas gerais, e na aplicação da distinção entre atividade-meio e atividade-fim, mas ressalva que a essência ou o núcleo do contrato de franquia reside não apenas na cessão do direito de uso de marca ou patente, mas na cessão de todo um modelo de negócio. Essa ressalva não altera, pois, a conclusão em prol da intributabilidade.

O contrato de franquia tipicamente abrange prestações recíprocas de natureza variada. Ambas as partes assumem obrigações de dar e de fazer, todavia indivisíveis, porquanto partes de um todo (a franquia), de uma locação ou cessão de todo um modelo de negócio. Neste sentido, foi compreendido como um contrato que abrange “prestações recíprocas e sucessivas com o fim de se possibilitar a distribuição, industrialização ou comercialização de produtos, mercadorias ou prestação de serviços, nos moldes e forma previstos em contrato de adesão”31.

O Direito brasileiro traz sinais de que a franquia pode ser considerada como uma espécie de “locação” ou “cessão” de um modelo de negócio, como foi dito na introdução do presente artigo. Neste sentido, o art. 2º da Lei n. 8.955/1994 define legalmente a “franquia” como o sistema pelo qual o franqueador cede ao franqueado “o direito de uso de marca ou patente”, “o direito de distribuição exclusiva ou semiexclusiva de produtos ou serviços” e “o direito de uso de tecnologia de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvidos ou detidos pelo franqueador” (art. 2º da Lei n. 8.955/1994). A definição legal brasileira tem sua razão de ser. Sendo “locação” ou “cessão” de todo um modelo de negócio, o franchising pode adquirir inúmeras feições, cada qual com um ou mais elementos da definição legal. Independentemente das variações, há algo comum a todo franchising: os diferentes direitos e atividades envolvidos sempre servem ao fim último de proporcionar ao franqueado a reprodução do negócio concebido pelo franqueador.

O fato gerador do ISS comumente enquadra-se no conceito de serviço, prestado com autonomia, na mesma linha da definição do Código Civil já revogado, no seu art. 1.216, constante do art. 594 do Código Civil atual. A franquia, no entanto, não se amoldaria a tal conceito, por ser contrato que envolve prestações recíprocas de natureza variada. O contrato de franquia tem como atividade-fim a cessão de um modelo de negócio (do qual a marca é um dos itens importantes), para o qual concorrem uma multiplicidade de atividades de ambas as partes. Entre as partes há obrigações de dar, de fazer e de não fazer32, indivisíveis porquanto partes de um todo, a franquia, a cessão de um modelo de negócio (que, de sua parte, evidentemente não pode ser reduzido a um fazer). Ceder o modelo de negócio, neste sentido, não se amolda na incidência do ISS33.

3.4. Contribuições sobre a eventual modulação dos efeitos

O acórdão do STF relativo ao RE n. 603.136 foi publicado em 16 de junho de 2020. Houve a interposição de embargos declaratórios nos dias subsequentes e desde o dia 7 de julho de 2020 o processo se encontra concluso ao Relator34. A Consulta ao processo no sítio virtual do STF não permite averiguar se foi suscitada, nos embargos declaratórios, a questão da modulação dos efeitos decisórios. De qualquer forma, a própria discussão entre os Ministros votantes mostra que há espaço para refletir sobre se a decisão pela incidência tributária representa ou não uma mudança jurisprudencial a ponto de justificar, ou até mesmo demandar uma modulação de seus efeitos por parte do Tribunal constitucional.

Decisões como a adotada pelo STF no RE n. 603.136 têm, via de regra, efeitos ex tunc. Esses efeitos são típicos das decisões ditas “declaratórias”, e a Constituição, em diferentes dispositivos, indica o caráter declaratório das decisões do STF em sede de controle de constitucionalidade. Neste sentido, a Constituição refere-se: às ações diretas de inconstitucionalidade e às ações “declaratórias” de constitucionalidade (arts. 102, I, § 2º, e 103); às “declarações” de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, § 2º); e à competência do STF para examinar recursos extraordinários quando a decisão recorrida “declarar” a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal (art. 102, III, “b”).

Ao disciplinar o processo e julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade e da Ação Declaratória de Constitucionalidade perante o STF, a Lei n. 9.868/1999 estabeleceu uma exceção à regra dos efeitos ex tunc: em seu art. 27, estabeleceu que o STF poderá restringir ou modular os efeitos da declaração de inconstitucionalidade em virtude de “razões de segurança jurídica” ou de “excepcional interesse social”. O mesmo foi estentido pela Lei n. 9.882/1999 ao contexto da ação Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. A formulação mais recente e atualmente vigente do Código de Processo Civil (CPC) também tratou do tema. Em seu art. 926, o CPC estabeleceu que “[o]s tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente”; e em seu art. 927, § 3º, o CPC determinou que, “na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica”. Essas normas podem ser entendidas como concretizações legislativas de princípios constitucionais importantes que orientam o agir coerente dos órgãos de Estado frente aos administrados ou jurisdicionados, como os princípios do Estado Democrático de Direito, da segurança jurídica, da legalidade e da moralidade administrativa35.

É bastante amplo o universo de decisões do STF em que o tema da modulação é abordado ou tangenciado. Em matéria tributária, duas decisões sobre modulação, ambas em sede de Repercussão Geral, se destacam: (i) o RE n. 556.664/RS, por meio do qual o Tribunal declarou a inconstitucionalidade dos arts. 45 e 46 da Lei n. 8.212/1991, e do parágrafo único do art. 5º do Decreto-lei n. 1.569/1977, decidindo ainda, por maioria, atribuir efeitos ex nunc para que o novo entendimento fosse aplicado apenas às eventuais repetições de indébito ajuizadas após a decisão36; e (ii) o RE n. 593.849/MG (Tema 201), por meio do qual o Tribunal decidiu, por maioria, que há direito à restituição do ICMS pago a mais, antecipadamente, a título de substituição tributária, quando a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida, nos termos do art. 150, § 7º, da Constituição, estabelecendo a modulação dos efeitos da decisão para que o entendimento passasse a valer somente para os casos futuros, resguardados os casos pretéritos que já estivessem em trâmite judicial37.

Embora um dos principais casos sobre modulação de efeitos em matéria tributária – o citado RE n. 556.664 – tenha sido julgado em junho de 200838, no decorrer dos anos os conceitos de “razões de segurança jurídica” ou de “excepcional interesse social” não foram totalmente cercados pelo Tribunal em decisões subsequentes39. Por outro lado, o exame da jurisprudência do STF permite identificar alguns aspectos ou elementos desses conceitos. Neste sentido, v.g., o Tribunal afirmou que a modulação é exceção a ser atribuída com máxima cautela e com atenção à “repercussão econômico-financeira”40; que a modulação não deve servir para dar validade aos efeitos de normas “claramente inconstitucionais”41; e que o prejuízo à segurança jurídica ou a excepcional interesse social precisa ser demonstrado de forma objetiva, com dados concretos42 e para além de dúvidas43.

No caso do RE n. 603.136, conforme visto no tópico 2 acima, os fundamentos dos votos apontam para a possível necessidade de modulação dos efeitos da decisão a favor do Fisco por razões de segurança jurídica. Neste sentido, o voto condutor dado pelo Ministro Gilmar Mendes afirmou que diferentes precedentes do STF estabeleceram a incidência do ISS em relação aos serviços relacionados a obrigações de “fazer”, em contraposição aos contratos caracterizados por obrigações de “dar”, e que outros precedentes não seguiram essa mesma linha para as atividades entendidas como mistas ou híbridas. Para o Ministro Gilmar Mendes, esses últimos precedentes fazem com que a decisão pela incidência tributária em relação aos contratos de franquia não represente uma inovação jurisprudencial. O Ministro Marco Aurélio, porém, afirmou que a jurisprudência consolidada, inclusive por meio da Súmula Vinculante n. 31, favorecia o contribuinte no caso dos contratos de franquia.

Não houve, no acórdão do RE n. 603.136, nem da parte dos votos a favor do Fisco, nem do voto a favor dos contribuintes, uma análise sistemática e exaustiva dos precedentes dos tribunais superiores sobre a matéria, de modo a permitir argumentos ou inferências mais fortes sobre modificação jurisprudencial. Também não houve considerações específicas sobre como deve ser analisada a possível expectativa legítima do contribuinte diante dos precedentes mencionados tanto pelos votos vendedores quanto pelo voto dissidente. Seja na fundamentação favorável ao Fisco, seja na fundamentação favorável ao contribuinte, depreende-se que os contratos de franquia têm uma configuração particular, complexa, e o RE n. 603.136 representou, de fato, o caso paradigmático no sentido da incidência, i.e., o caso por meio do qual fixou-se, finalmente, o entendimento a favor da incidência.

Como dito anteriormente, é possível que o tema da modulação e todos os seus aspectos específicos sejam abordados pelo Tribunal ao decidir os embargos declaratórios. Independentemente disso, cabe ao Tribunal velar pela segurança jurídica de ofício, dado o seu papel constitucional. Na nossa análise, isso significa que o Tribunal poderia e deveria ter refletido sobre o tema da modulação já no acórdão do RE n. 603.136, independentemente de a questão ser trazida pelas partes em sede de embargos declaratórios.

4. Observações conclusivas

O exposto nos tópicos anteriores permite atender de forma fundamentada ao objetivo geral do artigo: analisar a decisão do STF ao julgar o RE n. 603.136 desde um enfoque argumentativo. A partir do que foi examinado e debatido supra, apresentamos, nos parágrafos seguintes, pontos de síntese e conclusão:

4.1. Qualquer decisão jurídica pode ser entendida como a qualificação jurídica de certos fatos. Por isso, a análise de seus elementos pode incluir perguntas sobre os fatos estabelecidos, sobre o Direito aplicável e sobre como esse Direito se aplica aos fatos estabelecidos. No RE n. 603.136, o que suscita debate não é a questão fática, mas como ela deve ser juridicamente entendida. A análise centra-se no Direito aplicável e em como ele se aplica a contratos de franquia.

4.2. A análise do RE n. 603.136 permite encontrar pontos em comum nos fundamentos da linha argumentativa vencedora e da linha argumentativa vencida. Ambas concordam em relação: (i) à importância da legislação complementar e do art.110 do CTN na determinação do sentido e alcance do termo “serviço” para fins de incidência tributária pelo ISS; (ii) à existência de uma distinção, no âmbito do Direito Civil, entre obrigações de dar, de fazer e de não fazer; (iii) à incidência típica do ISS sobre obrigações de fazer; (iv) ao caráter misto ou híbrido do contrato de franquia, que contém obrigações de vários tipos; (v) ao caráter unitário das obrigações variadas que integram o contrato de franquia.

4.3. A análise do RE n. 603.136 permite identificar os pontos de divergência. Para a linha vencedora, o contrato de franquia envolve várias obrigações, inclusive obrigações de fazer. Por essa razão, o ISS incide sobre contratos híbridos ou mistos como os contratos de franquia. Para a linha vencida, porém, em relação aos contratos mistos é preciso identificar qual é o elemento preponderante, e como ele se relaciona com os conceitos de dar, fazer e não fazer, para então se alcançar a conclusão sobre a incidência tributária. Uma forma de fazer isso é por meio da distinção entre atividades-meio e a atividade-fim. No caso dos contratos de franquia, a atividade-fim seria a cessão do direito de uso de marca ou patente – que não se confundiria com um “fazer” e, por isso, não estaria sob a incidência do ISS.

4.4. Os contrapontos, presentes na linha vencedora, em relação à distinção entre atividade-meio e atividade-fim e à intributabilidade dos contratos de franquia pelo ISS são criticáveis. Foi dito que essa distinção descaracteriza a relação contratual, que é um todo ou uma unidade. Porém, a relação contratual não fica desnaturada se se considera que determinado elemento prepondera sobre os demais, ou se se identifica uma relação de instrumentalidade, ou de meios e fins, entre as atividades que a compõem. Esse tipo de consideração, ao contrário, é bastante comum e necessário para a adequada consecução dos objetivos contratuais. Também foi dito que a decisão pela intributabilidade incentivaria a evasão tributária e enfraqueceria a capacidade fiscal dos municípios. Contudo, esses são argumentos preditivos e causais que não foram acompanhados da fundamentação necessária. Adicionalmente, cabe também o questionamento sobre quais são as formas adequadas de fortalecer a capacidade fiscal, e a quais poderes da República cabe, precipuamente, essa tarefa.

4.5. Aplicável a distinção entre atividades-meio e atividade-fim, entendemos, sob a perspectiva do contribuinte, que o elemento principal do contrato de franquia não é tanto a cessão da marca, embora esta tenha grande importância. A franquia pode ser considerada como uma espécie de “locação” ou “cessão” de um modelo de negócio; aí residiria o seu elemento principal. Essa ressalva não muda a conclusão a que chegaria essa linha de raciocínio: o elemento principal, em qualquer desses cenários, seria per se estranho às obrigações de fazer e, consequentemente, à incidência tributária.

4.6. Por fim, a decisão do RE n. 603.136 não tratou explicitamente da modulação dos efeitos da decisão favorável ao Fisco. Em consulta ao processo, foi possível identificar que houve a interposição de embargos declaratórios, contudo, não é possível confirmar se trataram ou não de modulação. De todo modo, cabe ao Tribunal velar pela segurança jurídica de ofício. Na nossa análise, isso significa que o Tribunal poderia tratar da modulação já no primeiro acórdão, independentemente de a questão ser trazida pelas partes em sede de embargos declaratórios.

Referências

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1* Este artigo representa as opiniões de seus autores em caráter individual.

2 SHERMAN, Andrew J. Franchising & licensing: two powerful ways to grow your business in any economy. 3. ed. New York: American Management Association, 2004, p. 11-12, 107.

3 MARTINS, Ives Gandra da Silva; MARONE, José Ruben. Dos limites do Fisco em face da cobrança de taxa de remuneração de franquia. Revista Dialética de Direito Tributário n. 113. São Paulo: Dialética, fevereiro de 2005, p. 70.

4 BRASIL, 2010, passim.

5 BRASIL, 2020, p. 46.

6 BUSTAMANTE, Thomas; MAIA, Antonio Cavalcanti. Argumentação como justificação: em busca de uma definição comum para as Teorias da Argumentação Jurídica contemporâneas. In: BUSTAMANTE, Thomas. Teoria do direito e decisão racional – temas de Teoria da Argumentação Jurídica. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 357-366.

7 ALVES, Henrique Napoleão; COELHO, Eduardo Junqueira. ICMS e as operações ship-to-ship em Zona Econômica Exclusiva. Revista Direito Tributário Atual vol. 43, ano 37. São Paulo: IBDT, 2019, p. 4.

8 Sobre esse último ponto, é importante destacar que a descrição do caso em que o tema foi judicializado procurou ser a mais fiel possível, com o intuito de evitar distorções argumentativas, uma vez que o debate racional de ideias pressupõe a colocação dos argumentos do interlocutor segundo a sua melhor versão possível. Cf. SINNOTT-ARMSTRONG, Walter; NETA, Ram. Think again: how to reason and argue. Coursera.org, August/December 2015. Disponível em: https://class.coursera.org/thinkagain-006. Acesso em: 9 dez. 2015; FOGELIN, Robert; SINNOTT-ARMSTRONG, Walter. Understanding arguments: an introduction to informal logic. 8. ed. New York: Wadsworth – Cengage Learning, 2010, p. 108. Ademais, as fontes apuradas e consultadas em todo o processo, marcadamente na etapa de compreensão crítica, foram não apenas reproduzidas ou sintetizadas, mas confrontadas entre si e transcendidas por outras formas de raciocínio em busca da posição mais consistente.

9 Para outro estudo de caso que adota a mesma perspectiva de maneira expressa, ver: ALVES, Henrique Napoleão; COELHO, Eduardo Junqueira. ICMS e as operações ship-to-ship em Zona Econômica Exclusiva. Revista Direito Tributário Atual vol. 43, ano 37. São Paulo: IBDT, 2019, p. 175.

10 Como bem colocado por um grande estudioso do Direito Tributário nacional, “[a] melhor compreensão das normas jurídicas, do seu sentido e do seu escopo de aplicação, é favorecida enormemente pela reflexão teórica associada ao exame de casos específicos do ‘mundo da vida’ em que as normas são problematizadas à luz de circunstâncias fáticas sempre mais complexas do que o estudo puro de textos normativos pode nos sugerir. A assertiva é “ainda mais” verdadeira [...] se levarmos em conta o direito tributário brasileiro, esse imenso sistema entrelaçado de textos e contextos de diferentes origens e níveis hierárquicos dentro da complexa estrutura jurídico-estatal que o compõe.” Cf. LOBATO, Valter de Souza. O princípio da confiança retratado no Código Tributário Nacional. A aplicação dos artigos 100 e 146 do CTN. A análise de casos concretos. Revista Brasileira de Direito Tributário e Finanças Públicas vol. 6, n. 35, nov.-dez. 2012, p. 42-70.

11 BRASIL, 2020, p. 5.

12 BRASIL, 2020, p. 5.

13 BRASIL, 2020, p. 46.

14 BRASIL, 2020, p. 6-9.

15 BRASIL, 2020, p. 9-14, 21, 23-24.

16 BRASIL, 2020, p. 14-24, 22 (o “sistema” de franquia envolve muito mais do que apenas uma cessão de marca, envolve diversas formas de prestação de diferentes serviços. Daí a incidência de ISS, como prevê a lei complementar).

17 BRASIL, 2020, p. 24-25.

18 BRASIL, 2020, p. 25.

19 BRASIL, 2020, p. 38-40.

20 BRASIL, 2020, p. 40-45, 44 (referindo-se aos casos: AgInt nos EDcl no AREsp n. 1.182.466/SP, AgInt no AREsp n. 1.087.134/SP, AgRg no REsp n. 1.113.055/RJ).

21 BRASIL, 2020, p. 27-31, 34.

22 BRASIL, 2020, p. 31-33.

23 BRASIL, 2020, p. 33-37, 37 (“Descabe tomar a parte pelo todo: a franquia versa a disponibilização de certa marca ou patente – a saber, a cessão de direito de uso de modelo de negócio –, e não a prestação, em si, de serviço, revelando-se este, caso existente, mero acessório ao cerne do contrato.”).

24 Ver, por todos: ATIENZA, 2005, passim (introdução às principais teorias modernas da argumentação jurídica).

25 SINNOTT-ARMSTRONG, Walter; NETA, Ram. Think again: how to reason and argue. Coursera.org, August/December 2015. Disponível em: https://class.coursera.org/thinkagain-006. Acesso em: 9 dez. 2015; FOGELIN, Robert; SINNOTT-ARMSTRONG, Walter. Understanding arguments: an introduction to informal logic. 8. ed. New York: Wadsworth – Cengage Learning, 2010, p. 4.

26 SINNOTT-ARMSTRONG, Walter; NETA, Ram. Think again: how to reason and argue. Coursera.org, August/December 2015. Disponível em: https://class.coursera.org/thinkagain-006. Acesso em: 9 dez. 2015.

27 FOGELIN, Robert; SINNOTT-ARMSTRONG, Walter. Understanding arguments: an introduction to informal logic. 8. ed. New York: Wadsworth – Cengage Learning, 2010, p. 3.

28 FOGELIN, Robert; SINNOTT-ARMSTRONG, Walter. Understanding arguments: an introduction to informal logic. 8. ed. New York: Wadsworth – Cengage Learning, 2010, p. 4.

29 Sobre o tema, ver também: SUMMERS, Robert F.; TARUFFO, Michele. Interpretation and comparative analysis. In: SUMMERS, Robert; MACCORMICK, Neil. Interpreting statutes: a comparative study. Aldershot: Dartmouth, 1991.

30 Para um exemplo de como isso pode ser complexo, ver, e.g., OECD, 2010. Ver, também, MCKERCHAR, Margaret. Understanding and predicting taxpayers’ behavioural responses to actions by tax administrations. OECD, s.d. Disponível em: http://www.oecd.org/tax/administration/2789937.pdf. Acesso em: 10 set. 2020: “O comportamento dos contribuintes, particularmente no que diz respeito ao cumprimento de normas tributárias, tem sido objeto de muitas pesquisas, provenientes de uma ampla gama de disciplinas, há mais de trinta anos. No entanto, apesar da amplitude e da massa da literatura especializada que surgiu, o problema fundamental de ser capaz de entender por que os contribuintes se comportam de determinada maneira permanece, em grande parte, um problema sem solução. Em vez disso, o que veio à tona é uma aceitação crescente da visão de que as pessoas são criaturas complexas que se comportam de maneiras difíceis de entender e prever”. Tradução livre de: “Taxpayer behaviour, particularly in respect of compliance, has been a subject of a great deal of research emanating from a wide range of disciplines for more than thirty years now. However, in spite of the breadth and mass of literature that has emerged, the fundamental problem, of being able to understand why taxpayers behave in the way that they do, remains largely unsolved. Instead, what has come to light is a growing acceptance of the view that people are complex creatures who behave in ways that are difficult to understand and predict.”

31 SIMÃO FILHO, Adalberto. Franchising. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1998, p. 36, 42.

32 Cf. DERZI, Misabel Abreu Machado. Nota de atualização. In: BALEEIRO, Aliomar; DERZI, Misabel Abreu Machado. Direito tributário brasileiro. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 822 (citando uma decisão do STJ – REsp n. 1.044.239/MG – segundo a qual “[a] mera inserção da operação de franquia no rol de serviços constantes da lista anexa à Lei Complementar 116/2003 não possui o condão de transmudar a natureza jurídica complexa do instituto, composto por um plexo indissociável de obrigações de dar, de fazer e de não fazer. Destarte, revela-se inarredável que a operação de franquia não constitui prestação de serviço (obrigação de fazer), escapando, portanto, da esfera da tributação do ISS pelos municípios.”).

33 O professor Sacha Calmon Navarro Coêlho também concluiu pela intributabilidade da franquia pelo ISS, e inseriu o tema no âmbito de problemas gerais da regulação infraconstitucional desse imposto: “Atualmente a Lei Complementar n. 116, de 31 de julho de 2003, é o assoalho do ISS, enquanto texto de normas gerais do imposto. É um diploma jurídico batido de disceptações interpretativas, legislativamente imperfeito e eivado de algumas inconstitucionalidades, o que tem lhe rendido vida extremamente conturbada enquanto a jurisprudência lhe fixa os conceitos e os rumos definitivos. O seu defeito mais profundo é basear-se em lista de serviços tributáveis. Entram muitos serviços, outros tantos ficam de fora, mas, em compensação, negócios jurídicos, como é o caso da locação de coisas móveis e da franquia, passam a ser tributados, contra a orientação já firmada do STF, que, v.g., nos casos de locação, repeliu a incidência do ICMS. Os problemas da lista são dois: a) nela podem ser postos fatos que não são ou não caracterizam serviços (implicando fazer algo). Exemplos podem ser dados de negócios que não são serviços, já incluídos na lista: compra de faturamento (factoring), franquia (franchising), o arrendamento mercantil (leasing operacional), as cessões de uso de um modo geral, que implicam obrigações de não fazer, eis que a cessão, neste aspecto, é neutra. Cede-se o uso, não se presta serviço; b) dela podem ser tirados serviços verdadeiros, fraudando o querer constitucional, que atribui aos municípios todos os serviços, exceto os de transportes não municipais e de comunicações.” Cf. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 441.

34 BRASIL, 2020.

35 Cf. NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade (coord.). Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015 (comentários ao art. 927 do CPC, itens 30-32); DERZI, Misabel Abreu Machado. Modificações da jurisprudência no Direito tributário: proteção da confiança, boa-fé objetiva e irretroatividade como limitações constitucionais ao poder judicial de tributar. São Paulo: Noeses, 2009, passim (sobre como o princípio da segurança jurídica, em especial na sua manifestação da proteção da confiança, se aplica no caso de modificações jurisprudenciais contrárias aos contribuintes).

36 BRASIL, 2008 (consignando ainda que “[s]ão legítimos os recolhimentos efetuados nos prazos previstos nos arts. 45 e 46 da Lei 8.212/91 e não impugnados antes da data de conclusão deste julgamento.”).

37 Cf. BRASIL, 2016.

38 Na ocasião, a modulação foi justificada pelo relator de então, Ministro Gilmar Mendes, como meio para preservação da segurança jurídica, sem que esse conceito fosse, porém, delimitado com maior precisão. Cf. BRASIL, 2008.

39 Como, por exemplo, nos acórdãos dos casos: BRASIL, 2018; BRASIL, 2017.

40 “A jurisprudência desta Suprema Corte tem sido cautelosa na atribuição de efeitos prospectivos às decisões declaratórias de inconstitucionalidade, principalmente no que tange a causas de tal espécie, nas quais a concessão unilateral de exoneração tributária de ICMS por parte de um dos Estados-membros gera indiscutível repercussão econômico-financeira aos demais Estados” (destaques nossos). Cf. BRASIL, 2014a (demonstrando preocupação com repercussões financeiras de eventual modulação).

41 “[A] jurisprudência do STF não tem admitido a modulação de efeitos no caso de lei estadual instituir benefícios fiscais sem o prévio convênio exigido pelo art. 155, § 2º, XII, g, considerando, portanto, correta a declaração da nulidade de tais normas com os tradicionais efeitos ex tunc. Isso porque, caso se admitisse a modulação de efeitos em situações como a presente, ter-se-ia como válidos os efeitos produzidos por benefícios fiscais claramente inconstitucionais no lapso de tempo entre a publicação da lei local instituidora e a decisão de inconstitucionalidade. Acabaria por se incentivar a guerra fiscal entre os Estados, em desarmonia com a Constituição Federal de 1988 e com sérias repercussões financeiras.” BRASIL, 2014a.

42 “A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a revisão das balizas que determinaram a amplitude da modulação determinada na origem depende da demonstração objetiva de risco à segurança jurídica ou de excepcional interesse social. Na hipótese, o recorrente não trouxe nenhum dado concreto a demonstrar a necessidade de modificação da decisão recorrida.” BRASIL, 2014b. No mesmo sentido: BRASIL, 2014c; BRASIL, 2014d; BRASIL, 2014e; BRASIL, 2013.

43 STF, 2ª Turma, RE n. 845.766 AgR/SC, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 05.04.2016, publ. 11.05.2016 (caso em que os fatos a justificar a modulação foram apresentados como notórios, mas ensejavam dúvidas segundo a ótica do tribunal).