Legalidade, Presunções e Ficções Tributárias: do Mito à Mentira Jurídica

Legality, Presumptions and Fictions in Tax Law: from Myth to Legal Lie

Carlos Renato Cunha

Doutorando e Mestre em Direito do Estado pela Universidade Federal do Paraná – UFPR. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Londrina – UEL. Procurador do Município de Londrina (PR). Advogado. E-mail: carlos@cko.adv.br.

Resumo

Artigo que visa analisar e conceituar as presunções e ficções tributárias em face do Princípio da Legalidade Tributária.

Palavras-chave: Direito Tributário, Princípio da Legalidade, presunções e ficções tributárias.

Abstract

Article that aims to analyse and to conceptualize tax fictions and presumptions in face of the Legality Principle.

Keywords: Tax Law, Legality Principle, tax presumptions and fictions.

1. Notas Introdutórias

O interesse em estudos sobre as presunções e ficções tributárias vem crescendo atualmente, quiçá pelo seu cada vez mais frequente uso pelo Fisco, buscando formas mais econômicas de aplicação da legislação tributária.

O tema, que é realmente deveras instigante, ganha em profundidade quando apanhamos o direito em sua realidade linguística. Ao observar o objeto de estudo através da lente da linguagem, surgem contornos antes omitidos, que potencializam a análise.

Como no Direito Tributário se costuma apontar uma rigidez na legalidade somente encontrada, quiçá, no Direito Penal, não é rara a afirmação de que não é possível a utilização de presunções e ficções jurídicas no que se refere aos tributos1.

A questão que nos impele no presente trabalho é exatamente esta: permite a Legalidade Tributária a utilização de ficções e presunções jurídicas no Direito Tributário?

Claro que, para intentarmos responder à indagação, há um caminho a percorrer. Necessitamos, primeiramente, de uma noção do que venha a ser uma ficção e uma presunção. Após, far-se-á vital uma breve análise sobre a Legalidade Tributária, para que então possamos apreender um conceito das presunções e ficções jurídicas.

Encerra-se a análise com o cotejo entre a Legalidade Tributária e as ficções e presunções jurídicas, tudo isto dentro dos estreitos limites que se apresentam a um trabalho desse porte.

2. Ficções, Presunções, Mitos e Mentiras

A linguagem, de origem tão misteriosa quanto a própria consciência humana, dá ao homem a capacidade de transmitir informações de forma quase ilimitada2. Não só transmitir informações, mas também atingir outras finalidades, bem apontadas por Jakobson, ao aludir às funções da linguagem3. Dentre elas, convém ressaltar que a “linguagem fala de si mesma”, quando temos a chamada metalinguagem4.

Interessa-nos também mais proximamente no presente trabalho a função conativa ou imperativa, que visa “conseguir uma determinada conduta do agente”5. Isso porque o Direito é uma linguagem que visa regular a conduta humana intersubjetiva6. E a ontologia linguística do Direito tem sido ressaltada nas últimas décadas, afinal, “o direito aparece ou se manifesta como texto, sua essência é ser texto, e sua existência real é idêntica à existência real de um texto”7.

Antes, no entanto, de ultrapassarmos o umbral do jurídico, vale a pena fixar noções prévias, essenciais para o estudo que aqui se pretende. Para tanto, convém diferençar as ficções das presunções, e ambas de figuras próximas, que possuem em comum o fato de serem formas de utilização da linguagem, mas que não se confundem.

Numa ficção utiliza-se a linguagem não para descrever a realidade, mas desconsidera-se o mundo real, com alguma finalidade, seja ela “contar uma história, construir modelos científicos e até mesmo criar direitos e obrigações”8. É uma simulação, o ato ou efeito de fingir9. E a ficção exige, como bem aponta Cristiano Carvalho, que “o falante esteja na posição reconhecida de ‘contar ou representar uma estória’ e que o ouvinte reconheça essa posição do falante”, apesar dos riscos de falhas, nos casos em que ela é considerada realidade10.

Não se confunde a ficção e a mentira, afinal, nesta, há um desacordo intencional entre a linguagem e a realidade, mas o falante tem a intenção de que o ouvinte considere sua fala como se de realidade se tratasse, enquanto naquela a verdade é colocada entre parênteses11. Por sua vez, as presunções são “o resultado do processo lógico mediante o qual do fato conhecido cuja existência é certa se infere o fato desconhecido cuja existência é provável”12.

E os mitos, que relação possuem com o presente trabalho? Em seu sentido denotativo, um mito é uma “fábula que relata a história dos deuses, semideuses e heróis da Antiguidade pagã”, uma “interpretação primitiva e ingênua do mundo e de sua origem”, ou ainda uma “tradição que, sob forma alegórica, deixa entrever um fato natural, histórico ou filosófico”13. Vê-se que apesar de ser uma figura próxima das ficções, com elas não se confunde, pois esta “nunca pretende descrever a realidade”14.

Em seu sentido denotativo, os mitos não nos interessam particularmente no momento, ainda que sirvam para fixar mais claramente uma ideia de “ficção”. Interessa-nos um de seus significados conotativos, como o de um “enigma, ou de uma “pessoa ou coisa incompreensível”15. Nesse sentido, metaforicamente, podemos afirmar serem as presunções e ficções jurídicas um mito.

3. A Legalidade Tributária

A Legalidade, no sistema brasileiro, encontra-se prevista de forma genérica no art. 5º, inciso II, da Constituição Federal, além das previsões específicas do art. 37, caput (que se refere à submissão a ela da Administração Pública) e do art. 150, inciso I, que, segundo alguns de forma redundante, mas infelizmente necessária pela experiência nacional, determina que nenhum tributo poderá ser criado ou majorado senão por lei16.

Sua origem remonta a período ainda anterior à Magna Carta, de 1215, estando, de qualquer modo, sempre ligada a uma ideia de autoconsentimento para a criação de obrigações por parte do monarca17.

Como bem aponta José Roberto Vieira, há alguns princípios que alicerçam a ideia de legalidade em nosso ordenamento18. De forma breve, pode-se afirmar que são eles o da representatividade e o da segurança jurídica19. Tratam-se de princípios que se subsumem em vetores axiológicos diversos, mas que redundam na mesma determinação de que obrigações, e as que nos interessam em particular, as obrigações tributárias, necessitam ser inseridas no sistema jurídico através do veículo lei20.

A segurança jurídica encontra expressão na legalidade, pois esta dá “previsibilidade, clareza e durabilidade” ao direito, ou, em resumo, certeza do direito vigente21. O mesmo ocorre em relação à representatividade, pois, com ela, o povo, através de seus representantes, consente com as obrigações, que são autoimpostas. No caso específico do direito tributário, fala-se de autotributação22.

Não resta dúvida, dessarte, que a legalidade tributária exige que a criação ou majoração de tributos se realize através do veículo lei. O que vem a ser “criar tributos” já foi enfaticamente exposto por Vieira: “a competência tributária é uma competência legislativa. É legislando que se institui um tributo. E sigamos adiante: (...) é editar, com suas minúcias todas, a norma jurídica tributária de incidência”23.

Aqui, um aparte: lei e norma jurídica não se confundem24. Aquela é um instrumento introdutor de normas jurídicas, tanto quanto um regulamento, uma sentença ou um ato administrativo de lançamento25. Mas, pelos ditames de nosso ordenamento, a lei é o instrumento por excelência para a introdução, no ordenamento jurídico, de normas gerais e abstratas26. Com base em tais normas, o aplicador do Direito expede normas individuais e concretas, inseridas através de uma decisão judicial ou administrativa, v.g.27

Segundo diversos e respeitados autores, a Legalidade Tributária possui uma rigidez somente comparável à do Direito Penal, falando-se da tipicidade tributária28. Em síntese, seria a necessidade de o fato jurídico tributário se ajustar rigorosamente à descrição do legislador, em todos os seus elementos29. Convém recordar do esclarecimento feito por Misabel Derzi acerca do equivocado uso que se tem feito do termo “tipo” no Direito30. Todavia, utilizaremos a expressão no sentido tradicionalmente apontado pela doutrina pátria, para os fins do presente estudo.

Cristiano Carvalho aponta interessante questão sobre o tema, ao afirmar que o fundamento constitucional da tipicidade tributária não se encontra na legalidade, mas no art. 146, inciso III, alínea “a” da Carta Maior, e, com fundamento em tal dispositivo, no próprio Código Tributário Nacional31.

Seja como for, vemos que a lei que cria ou majora tributos deve prever, de forma pormenorizada, os elementos da norma de incidência tributária. Nesse ponto, importa recordar o formidável estudo da norma tributária realizado por Paulo de Barros Carvalho, por ele chamada também de Regra-matriz de Incidência Tributária32.

Referido autor decompôs os elementos da norma de incidência tributária, formada, como toda norma jurídica, por um antecedente e um consequente, apontando como seus elementos, que devem estar previstos em lei, no antecedente, o critério material (o comportamento de uma pessoa), o temporal (condição de tempo) e o espacial (condição de espaço), em que se descreve hipoteticamente um fato, que, se ocorrido, ensejará um consequente normativo, que prescreve uma relação jurídica, formado pelos critérios pessoal (que indica o sujeito ativo e passivo da relação jurídica) e quantitativo (formado pela base de cálculo e pela alíquota do tributo)33.

Eis uma visão panorâmica do tema. É hora de voltar ao mito.

4. Desmistificando as Presunções e Ficções Jurídicas

É comum afirmar-se que o Direito constrói suas próprias realidades34. Dada a premissa adotada neste trabalho, de que o Direito se constitui pela linguagem num uso socialmente estipulado para a regulação da conduta humana intersubjetiva, consideramos a afirmação tão verdadeira quanto a de que a linguagem, ela própria, constrói sua própria realidade.

Como já visto, a linguagem pode falar do mundo sensorial, ou até mesmo falar da própria linguagem, situação em que temos a chamada metalinguagem. Não é diferente a situação do Direito. As normas jurídicas se voltam para as condutas humanas, que se encontram no mundo fenomênico. Mas, muitas vezes, as normas jurídicas se referem de forma mediata à regulação da conduta humana, se voltando antes à própria criação de normas jurídicas, numa função tipicamente metalinguística. Paulo de Barros Carvalho nos fala das normas de conduta, que “estão diretamente voltadas à conduta das pessoas”, e de estrutura, que tem “por objeto, porém, os comportamentos relacionados à produção de novas unidades deôntico-jurídicas”35.

Numa situação do mundo social, homens exercem um labor para outrem, e recebem, deste, uma quantia pecuniária. O Direito, regulando tal situação, cria as noções de “contrato de prestação de serviço”, “contrato de emprego”, “vínculo estatutário”, “trabalho voluntário com reembolso de despesas”, “contrato de empreitada”, “serviço militar obrigatório” etc. Tais situações normativas, apesar de se referirem a uma realidade, com ela não se confundem. Temos o mundo do dever-ser e do ser, devidamente singularizados.

Outras normas jurídicas preveem, por sua vez, que se estamos diante de um “contrato de prestação de serviço” ou de “vínculo estatutário”, uma ação judicial que visa discuti-los deve ser ajuizada na Justiça Comum Estadual ou Federal, conforme o caso. Se temos um “contrato de emprego”, tal ação será de competência da Justiça do Trabalho. Vemos que estas segundas normas tratam de situações reguladas sobre as primeiras.

Feita a introdução, é hora de intentar-se desmistificar o tema objeto do estudo.

O estudo sobre as ficções e presunções jurídicas iniciou-se na Ciência do Direito voltada para o Direito Civil36.

Tradicionalmente aponta-se a existência, no Direito, de presunções legais e hominis, quando o critério é a sua fonte de emanação, e em presunções absolutas ou juris et de jure e relativas ou juris tantum, no que tange ao critério da forma de admissão da prova em sentido contrário, além das ficções jurídicas37.

Numa primeira aproximação, diferenciemos tais conceitos. Como bem aponta Maria Rita Ferragut, em comentário reiterado por Cristiano Carvalho, a rigor, toda presunção é “legal”38. A diferença entre as chamadas “presunções legais” e as hominis se dá no tipo de norma em que se verificam: as primeiras, em normas gerais e abstratas, as segundas, em normas individuais e concretas.

De um fato conhecido (o indício), conclui-se a existência de um fato desconhecido. Esse raciocínio é uma presunção39. Há discussão acerca da natureza de tal raciocínio, se dedutivo ou indutivo, mas ficamos com Carrazza, quando afirma que “pouco importa se obtida (a presunção) por dedução ou indução”40.

No Direito, encontra-se o raciocínio presuntivo no momento de sua aplicação, quando da enunciação da norma individual e concreta. Insere-se na discussão acerca das provas41. Com efeito, tanto o Judiciário, quanto a Administração, ao emitirem norma individual e concreta, muitas vezes se socorrem de provas indiretas, indícios, num raciocínio presuntivo42. Eis a chamada presunção simples, ou do homem (presunção hominis), que se insere “no âmbito processual das provas, refere-se a norma individual e concreta, na fase de aplicação”43.

Não é objeto do presente trabalho a análise da possibilidade do uso de tais presunções no Direito. Afinal, por se tratar de matéria afeta à enunciação da norma individual e concreta, sejam levadas a efeito, por exemplo, numa sentença judicial ou num ato administrativo de lançamento, refogem aos limites do presente arrazoado, que visa analisar as presunções e ficções jurídica trazidas pela lei.

No que se refere a elas, como já exposto, costuma-se apontar a existência das presunções absolutas (jure et de jure) e relativas (jure tantum), afora as ficções jurídicas, que teriam diversa natureza.

A nosso ver, as presunções relativas, ainda que previstas também através de veículo legal, diferem ontologicamente das presunções absolutas44. E estas, na realidade, não passam de sinônimo de ficções jurídicas. Expliquemos.

As presunções legais relativas tratam, assim como as presunções hominis, de matéria probatória45. Distribuem o ônus probatório de determinada maneira. São, portanto, normas processuais (judiciais ou administrativas)46. A diferença entre ambas é que as legais são previstas em normas gerais e abstratas, invertendo o ônus probatório quando da enunciação da norma individual e concreta. Já as presunções hominis são realizadas diretamente quando da expedição de normas individuais e concretas.

Quando dizemos que há distribuição do ônus probatório, não afirmamos que haja sua “inversão”. Há, na realidade, “a transferência do objeto da prova, já que o fato principal não necessita ser provado de forma direta”47.

Já a problemática e secular discussão acerca das diferenças entre presunções absolutas e ficções jurídicas pode, inicialmente ao menos, ser desanuviada pela constatação de que tais termos são utilizados em dois sentidos diversos, sem a devida diferenciação. Eis uma segunda aproximação do objeto de estudo. No primeiro caso, a presunção se dá pelo cotejo entre o conteúdo normativo e um evento do mundo real. No segundo, a relação se faz entre um conteúdo normativo e outro.

Autores há que diferenciam a presunção absoluta da ficção legal. Já Pontes de Miranda apontava que “se, em verdade, há fundo comum, as ficções são mais do que presunções legais, ainda absolutas”, pois “a ficção enche de artificial o suporte fáctico; a presunção legal apenas tem como acontecido, ou não acontecido, o que talvez não aconteceu, ou aconteceu”48. Outrossim, Becker afirma que na “ficção a lei estabelece como verdadeiro um fato que é provavelmente (ou com toda a certeza) falso”, enquanto que, “na presunção, a lei estabelece como verdadeiro um fato que é provavelmente verdadeiro”49. A nota diferencial se dá, para referido autor, na “falta de correlação natural de existência” entre o fato conhecido e o desconhecido50.

Contudo, veja-se um importante senão nesta diferenciação: ela contrapõe a previsão normativa à realidade fenomênica. Vale dizer, o juízo que afirma que o caso “x” é uma ficção, e não uma presunção absoluta compara elementos do mundo do dever-ser com outros, do mundo do ser. Por isso entendemos que Becker mais uma vez andou bem, ao consignar que

“(...) A distinção entre a presunção e a ficção existe apenas no plano pré-jurídico, enquanto serviam de elemento intelectual ao legislador que estava construindo a regra jurídica. Uma vez criada a regra jurídica, desaparece aquela diferenciação porque tanto a presunção, quanto a ficção, ao penetrarem no mundo jurídico por intermédio da regra jurídica, ambas entram como verdades (realidades jurídicas).”51 (Itálicos no original)

Pontes de Miranda expõe com maestria essa questão:

“Presunção iuris et de iure não existe como ‘prova’. Nem é ‘prova’ a ficção. Ambas são expedientes de técnica legislativa, que, feita a lei, não mais se veem. As regras jurídicas sobre presunções iuris tantum, sim: veem-se (...). Devemos, pois, eliminar, na exposição sistemática de lex lata, qualquer alusão à ficção ou à presunção iuris et de iure, expedientes técnicos de que pode ter-se servido o legislador. (...)”52 (Itálicos no original)

Ou seja: tal espécie de juízo acerca das presunções absolutas e ficções legais, vitais num estudo de Política do Direito, parece perder relevância numa análise que pretenda pertencer à Ciência do Direito em sentido estrito.

Em sentido contrário ao ora exposto, Cristiano Carvalho considera uma impropriedade falar-se que a presunção legal só existe numa análise pré-jurídica, assentando que

“É preciso abandonar preconceitos que excluem o legislador do campo do jurídico, como se o processo legislativo fosse ‘pré-jurídico’. O legislador é tão parte do processo autogerativo do direito quanto o juiz ou o agente público. Em muitas situações, a atitude mental é a mesma, tanto de quem produz o direito material como de quem o aplica ao caso concreto.”53

Discordamos de referido autor, contudo. É que ainda que efetivamente o legislador ou o aplicador do Direito tenham realizado um raciocínio presuntivo ou ficcional, isso se perde no momento da enunciação da norma, geral e abstrata ou individual e concreta. Queda a descrição em abstrato ou em concreto de um fato, que, se ocorrido, dará ensejo a uma relação jurídica. A afirmação de que o órgão emissor da norma utilizou-se de uma presunção é realizada pelo Cientista do Direito, e, enquanto calcada no cotejo entre a norma expedida e a realidade fática, também será uma presunção ou ficção, dessa vez científica, pois a intenção do emissor da mensagem se perde no espaço-tempo. Objetivamente, à Ciência do Direito resta o suporte físico, que é apenas o primeiro dos quatro subsistemas no percurso construtor de sentido do direito54. Purificando a linguagem natural do legislador, podemos chegar a uma presunção absoluta ou ficção puramente jurídicas.

Na realidade, pode-se afirmar que toda norma jurídica geral e abstrata, cujo veículo proeminente hodiernamente é a lei, é fundada em presunções absolutas ou ficções, levadas a cabo pelo seu órgão emissor. O Código Civil, ao tratar da capacidade civil, determina, em seu art. 3º, inciso I, a incapacidade para o exercício pessoal de atos civis aos menores de 16 anos55. Eis a determinação normativa, pura e simples. Pode-se inferir que o legislador presumiu a incapacidade dos menores de 16 anos, apesar de ser plenamente possível que, num caso concreto, haja um garoto de idade inferior ao limite legal com plena maturidade e capacidade psicológica de compreender as consequências de seus atos. Os exemplos são inúmeros56.

Preferimos não especular sobre a existência de presunção ou ficção do emissor da norma em relação à realidade fática, pois, como exposto, além de se tratar do óbvio, não nos parece uma análise útil: de qualquer modo, seja ou não de presunção ou ficção, a norma expedida terá como limite as disposições constitucionais, referentes à competência legislativa como um todo57.

Em remate, a presunção absoluta e a ficção jurídica não são regras de ônus probatório. São de direito substantivo58. E, de qualquer modo, a presunção absoluta ou a ficção, se existentes, encontram-se fora dos limites do jurídico, como exposto. Não vemos diferença, portanto, desde uma análise puramente jurídica, entre “ficção jurídica” e “presunção absoluta”59. Utilizaremos tais expressões como sinônimas no presente trabalho.

Nesse sentido, aduz Maria Rita Ferragut:

“Assim, embora não pudéssemos deixar de reconhecer que as regra de ‘presunção absoluta’ traduzam um raciocínio presuntivo pré-jurídico, como presunção não podem ser consideradas, por não admitirem a produção de provas contrárias.

Esclareça-se, apenas, que o reconhecimento da existência do raciocínio presuntivo, e da probabilidade a ele inerente, interessará somente para fins de diferenciá-las das ficções jurídicas, muito embora a utilidade dessa diferenciação seja altamente questionável já que, sempre que a utilização válida dessas espécies normativas for possível, o regime jurídico aplicado é o mesmo para ambas.”60

Convém ressaltar, de qualquer modo, a existência de entendimento contrário ao ora esposado. Para Angela Pacheco, as presunções absolutas e as ficções são de diversa natureza, mesmo juridicamente, pois enquanto na ficção “a lei prevê um fato jurídico que sabe diverso dos fatos jurídicos previstos em outras leis do sistema”, na presunção absoluta, “a lei prevê dois fatos: um conhecido e outro desconhecido, sendo o primeiro a causa do segundo”61.

Fixado tal ponto, uma reflexão se faz necessária: se o Direito é uma forma de linguagem, e, como visto, “constrói suas próprias realidades”, pertinente é o questionamento realizado por Angela Pacheco: “Se o Direito constrói a si próprio (...), o que vem a ser Ficção Jurídica?”62.

Diego Marín-Barnuevo Fabo traz uma interessante definição sobre ficção jurídica: “disposição normativa que simula a identidade de dois fatos que se sabe diferentes, com a finalidade de atribuir ao segundo o mesmo regime jurídico que já havia sido descrito para o primeiro”63.

Concordamos, em essência, com tal definição, mas é necessário um esclarecimento. Grande parte da identificação de ficções jurídicas se dá pela mera comparação entre dispositivos de lei. Entendemos ser completamente irrelevante a forma de expressão do legislador, que se dá em linguagem técnica, longe da tendência à pureza que uma linguagem científica busca, e que pode, por isso, utilizar expressões como, por exemplo, “se presume”, para o fim de se reconhecer a existência de verdadeira presunção jurídica64:

“(...) existem muitíssimas regras jurídicas com estrutura lógica e atuação dinâmica, idêntica à da presunção juris et de jure, porém esta identidade costuma passar despercebida porque não é necessário que a fórmula literal legislativa utilize o vocábulo ‘presunção’ e nem é preciso que esteja gramaticalmente construída à semelhança das regras de prova.65 (Itálicos no original)

Para que encontremos uma ficção jurídica, entendemos necessária uma análise do Direito num nível mais formalizado, o das normas jurídicas66.

Angela Pacheco afirma que “quando a lei disser: Considera-se pessoa jurídica (uma pessoa que não o é), aí sim estará construída a ficção jurídica (...).”67 Como exposto, não compartilhamos de tal entendimento, pois, para se encontrar uma verdadeira ficção jurídica, a comparação não nos parece que deva se dar entre dispositivos legais, mas sim entre normas jurídicas, conceitos que, como já visto, não se confundem. No exemplo dado, bastaria ao legislador incluir a tal “pessoa que não o é” no mesmo artigo de lei onde se encontra o conceito de “pessoa jurídica”, e não se poderia falar em “ficção jurídica”.

Claro que podemos até nos referir a uma “ficção do legislador” (ao comparar a disposição legislativa ao mundo real, no que seríamos redundantes, pois, como visto, todo o Direito se funda em tal espécie de ficção, até mesmo por se constituir em linguagem). Podemos também nos referir a “ficções de dispositivos legais”, caso em que, como o exemplo referido no parágrafo anterior, um artigo de lei “equipara” um fato a outro, referido em outro artigo de lei. Mas, nesse caso, numa análise que consideramos ainda superficial do Direito, pois presa apenas ao seu suporte físico, estaríamos tão somente classificando a linguagem natural do legislador entre aquela em que ele preferiu colocar toda a matéria num só dispositivo legal e aquela em que ele preferiu por técnica redacional separar a matéria em dois ou mais dispositivos, utilizando os verbos “equiparar”, “considerar”, “presumir”, v.g. Não se trata, no entanto, a nosso ver, de uma real ficção jurídica, cuja identificação demanda mais aprofundada observação do objeto de estudo.

Afirma Angela Pacheco que

“As ficções jurídicas não são produtos diretos da qualificação jurídica do fato fenomênico. O referencial da ficção jurídica é outra norma jurídica, como tal já pertencente ao ordenamento jurídico, quer a norma de ficção remeta ou não àquela.”68

Referida autora conclui que “a norma jurídica introdutora de ficção no sistema tem que ser analisada em relação a outras normas já nesse existentes”69. Para ela, as ficções jurídicas se encontram na figura da “remissão legal” e nas “ficções jurídicas autônomas”, que são “introduzidas diretamente no ordenamento jurídico como normas de 2ª geração”70.

Com ela concordamos parcialmente. Como exposto, a mera figura da “remissão legal” limitada a uma análise do suporte físico (texto de lei, v.g.), não configura uma ficção jurídica, que deve ser buscada em nível mais formalizado, nas normas jurídicas. Ali, onde vislumbramos o mínimo deôntico irredutível, nos dizeres de Paulo de Barros Carvalho, é onde encontramos, em sua crueza, as ficções jurídicas71.

Por sua vez, Cristiano Carvalho considera existente uma ficção jurídica quando o ato de fala, de modo proposital, desvincula a regra, em algum ponto, da realidade: (a) jurídica (ficção de terceiro grau); (b) institucional (ficção de segundo grau); e (c) objetiva (ficção de primeiro grau)72. As de segundo grau seriam aquelas que desconsideram a realidade institucional, como por exemplo, a economia73. Em nosso entender, efetiva ficção jurídica somente existe nas chamadas ficções de terceiro grau, segundo a proposta classificatória do autor, quedando as outras duas num juízo que realiza o cotejo entre a norma jurídica e o mundo fenomênico, que, como já exposto, não nos parece ser relevante para a Ciência do Direito em sentido estrito.

Fixadas tais premissas, tidas por definições por redefinição, convém assentar uma questão de suma importância74. Se uma norma Nj1 tem por critério material o evento E do mundo fenomênico, como já visto, por mais desalinhada que possa parecer a previsão normativa se comparada ao mundo fenomênico, não se trata de presunção ou ficção jurídica, mas de mero instrumento de regulação de conduta, que pode se encontrar ou não permitida pelo ordenamento jurídico, nos termos das normas de competência previstas, em nosso caso, pela Constituição da República75. Pode ser, até, uma realidade presumida ou ficta, mas tal dado se perde no ato de enunciação da norma, e já não possui qualquer relevância numa análise de Ciência do Direito em sentido estrito. É criação do direito, não ficção jurídica76.

Todavia, se uma norma Nj2 se refere, ainda que indiretamente, à norma Nj1, dando por certa a ocorrência de um de seus elementos, simplificando sua execução, têm-se três situações distintas:

a) se são normas de mesmo grau hierárquico e de mesma generalidade, na realidade, temos uma revogação (vale dizer, mera construção jurídica);

b) se são normas de mesmo grau hierárquico, mas uma é mais específica em relação à outra, temos uma derrogação (ou seja, outra mera construção jurídica); e, por fim,

c) se são normas de grau hierárquico diverso, temos, finalmente, uma presunção ou ficção jurídica, situação em que nossa definição se iguala à de Angela Pacheco, no que se refere às ficções jurídicas autônomas, ou às ficções de terceiro grau de Cristiano Carvalho77.

Exemplo da primeira hipótese é, em nosso entender, o caso do art. 80 do Código Civil: o direito à sucessão aberta não é fictamente bem imóvel para o Direito. É, simplesmente, bem imóvel, já que tal “equiparação” se dá para “todos os fins legais”, vale dizer, será regulada pelas mesmas normas aplicáveis aos bens previstos no art. 79 do mesmo Diploma Legal78.

Em relação ao segundo caso, nos parece clara a hipótese do art. 1.473 do mesmo Código Civil, pois, apenas para fins de garantia de dívida, os navios e aeronaves são bens imóveis (i.é., nesta matéria, serão regulados pelas mesmas normas que tratam dos demais bens imóveis)79.

Tem-se como exemplo de efetiva ficção jurídica o caso do § 2º do art. 55 da Lei Federal 8.213/1991, que determina que a contagem do tempo de contribuição (previsão constitucional) far-se-á, no caso do trabalhador rural, até a entrada em vigor da lei, pela contagem do tempo de serviço (situação já não albergada constitucionalmente).

Vê-se, portanto, que encontramos as ficções como proposta classificatória da Ciência do Direito80. E há que cuidar para não se confundir esses dois planos de linguagem, como bem alertam Paulo de Barros Carvalho e José Artur Lima Gonçalves81.

Desse modo, chegamos às seguintes conclusões, ao final do presente tópico:

a) a presunção hominis encontra-se em normas jurídicas individuais e concretas;

b) a presunção relativa pode ser definida como o juízo descritivo da Ciência do Direito que identifica uma norma jurídica geral e abstrata que determina a distribuição de ônus probatório, de forma a permitir a comprovação indireta de um fato jurídico;

c) a presunção absoluta é equivalente à ficção jurídica;

d) a ficção jurídica pode ser definida como o juízo descritivo da Ciência do Direito que identifica, no confronto entre elementos de duas normas jurídicas gerais e abstratas de grau hierárquico diverso, a simplificação da execução da norma hierarquicamente superior pela inferior, pela desconsideração, por esta, do conceito jurídico fixado por aquela.

5. A Legalidade, as Presunções, as Ficções e as Mentiras Tributárias

Se quedássemos na definição de ficção jurídica que cotejasse a previsão normativa com a realidade fática, o Direito Tributário seria, nesse sentido, todo alicerçado em ficções. Isso porque dentre todo o universo de eventos, o legislador tributário pinça aqueles que são signos de riqueza:

“É nas vias de acesso à renda e ao capital que surge a multiplicidade das naturezas jurídicas dos tributos, porque, a exemplo dos arquipélagos, apenas os prolongamentos da renda e do capital emergem no mundo jurídico, a fim de participarem, como fato-signo presuntivo, na composição da hipótese de incidência da regra jurídica de tributação. E a Ciência Jurídica demonstra que estes signos presuntivos são genuínas presunções juris et de jure e como tal se comportam na fenomenologia da incidência da regra jurídica e resultante irradiação dos efeitos jurídicos.”82 (Itálicos no original)

Afastamos no tópico anterior, no entanto, tal definição, que impede, a nosso ver, uma profícua análise do problema a que nos dispomos a enfrentar. No entanto, apesar dos estreitos limites que demos ao conceito de ficção jurídica, não temos dúvida de que no Direito Tributário a encontramos em grande e cada vez maior número, visando garantir operacionalidade ao sistema, dando solução a impasses que, se demandassem abertura à discussão, não teriam fim, ou o custo para alcançá-lo seria desproporcional à finalidade normativa:

“A tipificação e a conceitualização abstrata estão, portanto, relacionadas com o princípio da praticabilidade, o qual se manifesta pela necessidade de utilização de técnicas simplificadoras da execução das normas jurídicas. Todas essas técnicas, se vistas sob o ângulo da praticabilidade, têm como objetivo:

• Evitar a investigação exaustiva do caso isolado, com o que se reduzem os custos na aplicação da lei;

• Dispensar a colheita de provas difíceis ou até mesmo impossíveis em cada caso concreto ou aquelas que representem ingerência indevida na esfera privada do cidadão e, com isso, assegurar a satisfação do mandamento normativo.”83

E, como bem lembra Misabel Derzi, as presunções e ficções legais são formas a que o legislador se socorre tendo em vista a praticidade da tributação84.

Se filtrarmos cuidadosamente os critérios materiais previstos constitucionalmente, verificaremos que a tributação se dá sempre sobre fatos juridicamente regulados em outras searas do direito. Temos, por exemplo, o “ser proprietário de imóvel”, o “realizar operações de circulação de mercadoria”, o “prestar serviços”, o “transferir a propriedade de imóveis”, todos dependentes de normas insertas no Código Civil; ou mesmo o “prestar serviço público” ou “exercer o poder de polícia”, determinados por normas de Direito Administrativo.

Em tais casos, a norma jurídica de incidência tributária possui como antecedente uma hipótese que é regulada por outra norma jurídica. Tal situação favorece o aparecimento das ficções jurídicas, pois na seara tributária, há diversos limitadores de ordem constitucional e/ou previstos em lei complementar. E temos claro, assim como Cristiano Carvalho, que “sempre que uma regra tributária alterar conceitos oriundos do próprio direito, estaremos diante de uma ficção de terceiro grau”, que, para nós, é a única forma de ficção jurídica85.

Inicialmente, algumas palavras sobre as presunções legais relativas. Não nos parece que sua utilização na seara do Direito Tributário, se detidamente prevista em lei, seja contrária, de per si, à Estrita Legalidade ou ao seu desdobramento, a tipicidade tributária. E nisso estamos na boa companhia de Maria Rita Ferragut:

“Discordamos do entendimento daqueles que vêm, na tipicidade, a vedação para a utilização válida das presunções na instituição de tributos, pois os critérios para identificação da ocorrência do fato típico permanecem sendo os mesmos, ainda que se requeira a existência de um outro fato, indiciário, para comprovar indiretamente a existência daquele cujo evento descrito no fato não é diretamente conhecido.”86

Típico exemplo da utilização das presunções legais relativas é previsão do art. 42 da Lei Federal 9.430, de 27 de dezembro de 199687. Veja-se que ela não iguala os depósitos bancários à renda não declarada. Mas presume que o sejam, caso o contribuinte não comprove o contrário. Vale dizer, distribuiu o ônus probatório de forma a obrigar o contribuinte à comprovação de que os depósitos não são renda omitida. E, como exposto, não vemos maiores problemas na utilização de tais presunções, calcadas na praticidade da tributação, desde que observada a Legalidade, e efetivamente garantidos a ampla defesa e o contraditório88. Claro que, com isso, se estivermos diante de prova impossível, está desfigurada a constitucionalidade do artifício legal89.

No que se refere às ficções jurídicas, a questão se mostra mais complexa.

Para Carrazza, os tipos tributários “fecham a realidade tributária, não podendo ser alargados por meio de presunções, ficções ou meros indícios”, devendo ser utilizadas com “parcimônia – quando não com mão avara”90. Angela Pacheco, a técnica das presunções absolutas e ficções, que não admitem prova em contrário, cada vez mais comuns, cria privilégios probatórios que não se coadunam com a tipologia tributária, o devido processo legal e a capacidade contributiva91. Para ela, muitas vezes tais normas serão inválidas, se pretendem estender a abrangência de outras normas, se afrontam a Constituição ou leis complementares de nível hierárquico superior, ou ainda leis ordinárias em processo de coordenação92. Por sua vez, Cristiano Carvalho alerta que em algumas situações pode haver ficções tributárias constitucionais, desde que não afrontem a capacidade econômica ou contributiva do contribuinte, tendo por única finalidade tornar o sistema operacional93. Misabel Derzi realça que a execução simplificadora de normas no plano vertical tende à inconstitucionalidade94.

Luís Cesar Souza de Queiroz, por sua vez, afirma que “não se pode usar a ficção para construir a hipótese de incidência tributária, porque isso acarretaria uma hipótese de incidência não tributária”95. José Artur Lima Gonçalves, peremptório, aduz que o “instituto da ficção não se insere no repertório do subsistema constitucional tributário brasileiro, ao menos no que diga respeito à detecção da ocorrência de fato imponível e quantificação da base de cálculo de tributo”96. Para Alessandro Mendes Cardoso, o uso das presunções e ficções não fere a segurança jurídica, desde que observada a proporcionalidade97.

Maria Rita Ferragut é enfática:

“É inconstitucional a utilização das ficções jurídicas em Direito Tributário, especificamente no que tange à criação de obrigações tributárias, já que na ficção jurídica considera-se como verdadeiro aquilo que, da perspectiva fenomênica, é falso, ou seja, tem-se como fato jurídico tributário um fato que, diante da realidade fática e jurídica comprovada, não é. E a razão desse entendimento é a violação a diversos princípios constitucionais, dentre os quais a legalidade, a tipicidade e a discriminação constitucional de competências.”98

Encontram-se ficções tributárias em quaisquer dos critérios da norma de incidência tributária, e os exemplos se multiplicam. No antecedente normativo, vemos como exemplos, no critério material, a ficção de existência de renda no Imposto sobre a Renda, apontada por José Artur Lima Gonçalves; no critério espacial, o local da prestação do serviço no Imposto sobre Serviços, como recorda Angela Pacheco; no critério temporal, a consideração da saída da mercadoria do estabelecimento do contribuinte para outro estabelecimento do mesmo titular, do ICMS, como bem aponta Cristiano Carvalho; já no consequente normativo, no critério quantitativo, mais especificamente na base de cálculo dos tributos, tem-se a planta de valores dos cadastros imobiliários municipais, apontado por Misabel Derzi; e no critério pessoal, a substituição tributária “para a frente” no ICMS, apontada por Luís Cesar Souza de Queiroz e Alessandro Mendes Cardoso99.

Coadunar as ficções jurídicas e todo o arcabouço constitucional tributário brasileiro não é tão simples. Afinal, em nome da praticidade, pode-se estar à margem da Estrita Legalidade, que envolve não somente a previsão em lei, mas também a observância da tipicidade e da detalhada delimitação de competências tributárias realizada na Carta Maior. Pode-se, ademais, estar diante de lesão à Capacidade Contributiva e à ampla defesa e o contraditório. No entanto, o limite de nossa análise será a primeira filtragem constitucional: a Estrita Legalidade Tributária.

Cristiano Carvalho afirma que a mera utilização do Princípio da Legalidade não permite dizer ser inconstitucional a utilização de ficções tributárias, pois, “do ponto de vista meramente formal, a lei pode instituir ficções tributárias sem ferir o referido princípio”, sendo necessário o apelo à tipicidade cerrada para tanto100.

Como visto antes, só se pode falar propriamente em ficção jurídica (incluindo aqui as presunções absolutas), se uma norma modifica a realidade jurídica estabelecida por outra, de grau hierárquico superior, simplificando sua execução. Desse modo, qual seria o limite para criação de ficções jurídicas pela lei? As próprias limitações estabelecidas nas normas de grau hierárquico superior, notadamente, no caso do sistema tributário brasileiro, as previstas na Constituição Federal e em leis complementares, de acordo com a matéria.

Um exemplo pode ser esclarecedor. A Constituição Federal outorga competência aos Municípios para instituírem imposto sobre serviços. Ela não define serviço, mas remete a lei complementar à definição dos tributos e de seus fatos geradores (art. 146, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal)101. Inicialmente, vem a norma geral em matéria tributária e estabelece que não pode o legislador tributário modificar o conteúdo dos conceitos de direito privado (art. 110 do CTN), criando limites à atuação do legislador ordinário102. O Código Civil vigente trata da prestação de “serviço” nos arts. 593 a 609, diferenciando-o do contrato de locação, prevista nos arts. 565 a 578103. Finalmente, o legislador municipal ordinário prevê que locação de bens móveis é serviço, para fins de incidência do ISS.

O legislador tributário está, sem dúvida, criando a ficção jurídica de que o critério material “locação de bens móveis” encontra-se abrangido no conceito de “prestação de serviços”, se compararmos as normas de grau hierárquico diverso. Tal ficção, no entanto, é vedada por nosso ordenamento jurídico, pois:

a) A Constituição Federal outorga competência aos Municípios para instituírem impostos sobre “serviços”;

b) Por força do art. 110 do CTN, fulcrado no art. 146, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal, não poderia a legislação tributária modificar o conceito de “serviço”, que não se confunde com o de “locação de coisas” no Código Civil.

Vê-se que a distribuição da competência tributária, complementada pelo art. 146 da Constituição Federal, especificada pelo art. 110 do Código Tributário Nacional, é um grande limite à instituição de ficções tributárias104.

Desse modo, exemplificativamente, uma ficção jurídica na base de cálculo pode ser inconstitucional, como no caso de não se amoldar ao critério material da hipótese normativa. Afinal, a base de cálculo confirma, infirma ou afirma o verdadeiro critério material da hipótese tributária105. Haveria um “alargamento da regra-matriz de incidência tributária”, inconstitucional por falta de fundamento de validade na Carta Maior106.

Entendemos, desse modo, que as ficções tributárias serão válidas no direito tributário pátrio se contrapostas à Estrita Legalidade Tributária, se observados os seguintes requisitos:

a) que sejam previstas em lei (o que pode parecer redundante, mas, como já anotado no presente trabalho, Vieira nos recorda que muitas vezes é necessário ressaltar o óbvio)107;

b) na compostura da norma jurídica de incidência tributária, a ficção não crie impertinência entre o consequente e o antecedente normativo, ou, se lei ordinária, entre sua previsão e a norma geral em matéria tributária, em face da tipicidade cerrada;

c) do mesmo modo, não lesione a detida distribuição de competência tributária levada a efeito na Carta Maior.

São grandes os obstáculos, dessarte, para a utilização das ficções jurídicas no Direito Tributário brasileiro, diante da baliza maior da Estrita Legalidade. Mas não é algo impossível108.

Feita nossa incipiente desmistificação, convém observar que as ficções jurídicas que não observam os requisitos acima elencados se afastam da “realidade jurídica” imposta por normas de superior hierarquia, notadamente a Constituição Federal. Ainda que a intenção do legislador nos seja inalcançável e se perca no ato de enunciação da norma geral e abstrata, quer-nos parecer que o móvel latente é o de que se pareça com lícita ficção jurídica, o que é alheio ao direito.

Tomando à mão uma metáfora, já que tanto se falou dos diversos usos da linguagem, tais ilícitas figuras se aproximam bastante das mentiras. Eis que, ao fim, desvelam-se as mentiras jurídicas, encontradas no cotejo entre a previsão legal e a realidade sistêmica, dizendo que é algo que não o é juridicamente.

6. Conclusão

No presente arrazoado, após fixar-se uma noção sobre a importância do estudo da linguagem, também no Direito, procurou-se apontar conceitos gerais sobre as ficções, as presunções, as mentiras e os mitos, passando-se então à verificação do papel de suprema relevância que, no Direito Tributário, possui a Legalidade, que se diz ser estrita, resvalando na tipicidade tributária.

Com a fixação de tais conceitos, passou-se à análise das presunções e ficções jurídicas, procurando-se desmistificar seus conceitos, para tanto apontando as diferentes visões de diversos autores. Inicialmente, excluiu-se do objeto de análise as presunções hominis, que se encontram em normas jurídicas individuais e concretas, e verificou-se a completa diferença entre as presunções relativas e as absolutas, posto que estas equivalem às ficções jurídicas.

Assentou-se que as presunções relativas se encontram em normas processuais, que distribuem o ônus probatório de forma a garantir a comprovação indireta de um fato jurídico, enquanto a existência de ficções jurídicas é verificada no cotejo entre elementos de duas normas jurídicas gerais e abstratas de grau hierárquico diverso, pela desconsideração, pela de menor grau hierárquico, de conceito jurídico fixado pela de maior nível.

Passando-se à análise das ficções jurídicas e presunções relativas no Direito Tributário em face da Estrita Legalidade, assentou-se, quanto a estas, a inexistência de vedação, desde que observada a garantia da ampla defesa e do contraditório. Já quanto às ficções, verificou-se que as normas constitucionais, complementadas pelas normas gerais em direito tributário, com análise específica do art. 110 do CTN, são uma grande limitação à sua utilização nesta seara do direito, pela tipicidade cerrada e pela distribuição da competência tributária.

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1 Nesse sentido, veja-se: CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 245.

2 EPSTEIN, Isaac. O signo. 7. ed. São Paulo: Ática, 2001, p. 6.

3 JAKOBSON, Roman. Linguística e comunicação. Trad. Izidoro Blikstein e José P. Paes. São Paulo: Cultrix, 2003, p. 122-129.

4 EPSTEIN, Isaac. Op. cit., p. 44.

5 Idem, p. 40.

6 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 18. ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 2.

7 ROBLES, Gregorio. O direito como texto: quatro estudos fundamentais de teoria comunicacional do Direito. Barueri: Manole, 2005, p. 21.

8 CARVALHO, Cristiano. Ficções jurídicas no direito tributário. São Paulo: Noeses, 2008, p. 69.

9 MICHAELIS, Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/busca?r=0&f=0&t=0&palavra=fic%C3%A7%C3%A3o>. Acesso em: 28 set. 2016.

10 CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 88-89.

11 Idem.

12 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 4. ed. São Paulo: Noeses, 2007, p. 538.

13 MICHAELIS, Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/busca?r=0&f=0&t=0&palavra=mito>. Acesso em: 28 set. 2016.

14 CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 70.

15 MICHAELIS, Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/busca?r=0&f=0&t=0&palavra=mito>. Acesso em: 28 set. 2016.

16 VIEIRA, José Roberto. Medidas provisórias em matéria tributária: as catilinárias brasileiras. Tese (Doutorado em Direito). São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1999, p. 43-45.

17 Idem, p. 100-103; UCKMAR, Victor. Princípios comuns de direito constitucional tributário. 2. ed. Trad. Marco Aurélio Greco. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 21.

18 VIEIRA, José Roberto. Medidas provisórias em matéria tributária: as catilinárias brasileiras. Op. cit., p. 47-48.

19 VIEIRA, José Roberto. Fundamentos republicano-democráticos da legalidade tributária: óbvios ululantes e não ululantes. In: FOLMANN, Melissa (coord.). Tributação e direitos fundamentais. Curitiba: Juruá, 2006, p. 199; CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 265.

20 Sobre a plurivocidade do termo “princípio” em Direito, veja-se, de forma exemplificativa: CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. Op. cit., p. 151; CARVALHO, Paulo de Barros. O princípio da segurança jurídica em matéria tributária. Revista de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, n. 61, [199-], p. 75; VIEIRA, José Roberto. Bocage e o terrorismo constitucional das medidas provisórias tributárias: a emenda pior que o soneto. In: FERRAZ, Roberto (coord.). Princípios e limites da tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 685-687.

21 VIEIRA, José Roberto. Medidas provisórias tributárias e segurança jurídica: a insólita opção estatal pelo “viver perigosamente”. II Congresso do IBET. Direito tributário e segurança jurídica. BARRETO, Aires Fernandino e outros. São Paulo: Noeses, 2005, p. 324; VIEIRA, José Roberto. Princípios constitucionais e Estado de Direito. Revista de Direito Tributário. São Paulo: RT, n. 54, ano 14, out./dez. 1990, p. 99.

22 Nesse sentido, vide: CARRAZZA, Roque Antonio. Op. cit., p. 230; VIEIRA, José Roberto. Fundamentos republicano-democráticos da legalidade tributária: óbvios ululantes e não ululantes. Op. cit., p. 199; PACHECO, Angela Maria da Motta. Ficções tributárias: identificação e controle. São Paulo: Noeses, 2008, p. 222.

23 VIEIRA, José Roberto. Fundamentos republicano-democráticos da legalidade tributária: óbvios ululantes e não ululantes. Op. cit., p. 198.

24 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. Op. cit., p. 8-10.

25 Pode-se definir norma jurídica como as “significações construídas a partir dos textos positivados e estruturadas consoante a forma lógica dos juízos condicionais, compostos pela associação de duas ou mais proposições prescritivas” (CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 2. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 22).

26 CARRAZZA, Roque Antonio. Op. cit., p. 335.

27 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. Op. cit., p. 33-35.

28 DERZI, Misabel Abreu Machado. Direito tributário, direito penal e tipo. 2. ed. atual e rev. São Paulo: RT, 2007, p. 127-128; CARRAZZA, Roque Antonio. Op. cit., p. 244; PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 233; FERRAGUT, Maria Rita. Presunções no direito tributário. São Paulo: Dialética, 2001, p. 92.

29 CARRAZZA, Roque Antonio. Op. cit., p. 245.

30 DERZI, Misabel Abreu Machado. Direito tributário, direito penal e tipo. Op. cit., p. 65-66.

31 CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 270-271.

32 Sobre a importância do estudo da norma jurídica realizada por Paulo de Barros Carvalho, veja-se: VIEIRA, José Roberto. A regra-matriz de incidência do IPI: texto e contexto. Curitiba: Juruá, 1993, p. 55; VIEIRA, José Roberto. Imposto sobre produtos industrializados: uma águia garciamarquiana entre os tributos. In: SANTI, Eurico Marcos Diniz de; ZILVETI, Fernando Aurelio; MOSQUERA, Roberto Quiroga (coords.). Tributação das empresas: curso de especialização. São Paulo: Quartier Latin, 2006, p. 173-175. Já especificamente sobre a extrema utilidade da concepção da Regra-Matriz de Incidência Tributária, veja-se, exemplificativamente: FOLLONI, André Parmo. Tributação sobre o comércio exterior. São Paulo: Dialética, 2005, p. 29-30.

33 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. Op. cit., p. 252-254.

34 Nesse sentido, vide, exemplificativamente: CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: fundamentos jurídicos da incidência. Op. cit., p. 10; PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 251.

35 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. Op. cit., p. 146.

36 GONÇALVES, José Artur Lima. Imposto sobre a Renda: pressupostos constitucionais. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 155.

37 FERRAGUT, Maria Rita. Op. cit., p. 63-64; CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 211.

38 FERRAGUT, Maria Rita. Op. cit., p. 65-66; CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 211.

39 CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 210.

40 CARRAZZA, Roque Antonio. Op. cit., p. 425.

41 CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 211.

42 PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 261.

43 Idem, p. 259.

44 Nesse sentido, veja-se: QUEIROZ, Luís Cesar Souza de. Sujeição passiva tributária. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 239; FERRAGUT, Maria Rita. Op. cit., p. 66-67.

45 CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 214.

46 GONÇALVES, José Artur Lima. Op. cit., p. 152.

47 FERRAGUT, Maria Rita. Op. cit., p. 73.

48 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de direito privado. Parte Geral. Tomo III. 3. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1970, p. 447.

49 BECKER, Alfredo Augusto. Op. cit., p. 539.

50 Idem, p. 540.

51 BECKER, Alfredo Augusto. Op. cit., p. 540.

52 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Op. cit., p. 448.

53 CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 213.

54 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. Op. cit., p. 115.

55 Interessante tratativa sobre o tema se dá na obra: PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 105.

56 Por exemplo, a presunção de conhecimento da lei por todos, o estupro presumido das menores de 14 anos, o horário de verão etc.

57 Ainda que devamos ressaltar que, como bem aduz José Roberto Vieira, muitas vezes se faz necessário insistir no óbvio (VIEIRA, José Roberto. Fundamentos republicano-democráticos da legalidade tributária: óbvios ululantes e não ululantes. Op. cit., p. 189).

58 BECKER, Alfredo Augusto. Op. cit., p. 548-549; FERRAGUT, Maria Rita. Op. cit., p. 64.

59 Nesse sentido, veja-se: FERRAGUT, Maria Rita. Op. cit., p. 64-65; PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 267; QUEIROZ, Luís Cesar Souza de. Op. cit., p. 239-240.

60 FERRAGUT, Maria Rita. Op. cit., p. 65.

61 PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 267.

62 Idem, p. 253.

63 Apud PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 253.

64 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. Op. cit., p. 4-6, passim.

65 BECKER, Alfredo Augusto. Op. cit., p. 549.

66 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. Op. cit., p. 113-114, passim.

67 PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 256.

68 PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 273.

69 Idem, p. 299.

70 Ibidem.

71 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. Op. cit., p. 17.

72 CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 223 e 242-248.

73 Idem, p. 244.

74 “Quando esta estipulação, em vez de inovar totalmente, (...) escolhe um dos usos comuns, aperfeiçoando-o, (...) então falamos em redefinição. (...) As estipulações e as redefinições não podem ser julgadas pelo critério da verdade, mas sim pelo da sua funcionalidade, o que depende, obviamente, dos objetivos de quem define. (...)” (FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1994, p. 34-36).

75 Como se parte, no presente trabalho, da premissa da ilimitude do Poder Constituinte Originário, este poderia, sem qualquer óbice, criar normas jurídicas que “presumissem” de forma absoluta fatos que nunca ocorreriam no mundo fenomênico, ou, em outras palavras, teria total liberdade para criar ficções jurídicas, salvo o que não é alcançável pela regulação da conduta humana.

76 Sobre tal conclusão quanto às pessoas físicas e jurídicas, veja-se: PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 107 e 143-144.

77 PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 299; CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 245.

78 Em sentido contrário, vide exemplificativamente: PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 254.

79 Também em sentido contrário, considerando a situação exemplo de ficção jurídica, vide: PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 254.

80 “Tomada em relação ao direito positivo, a Ciência do Direito é uma sobrelinguagem ou linguagem de sobrenível. Está acima da linguagem do direito positivo, pois discorre sobre ela, transmitindo notícias de sua compostura como sistema empírico” (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. Op. cit., p. 3).

81 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. Op. cit., p. 1-2; GONÇALVES, José Artur Lima. Op. cit., p. 155-156.

82 BECKER, Alfredo Augusto. Op. cit., p. 535.

83 DERZI, Misabel Abreu Machado. Direito tributário, direito penal e tipo. Op. cit., p. 139.

84 Idem, p. 140.

85 CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 247.

86 FERRAGUT, Maria Rita. Op. cit., p. 93.

88 Em sentido contrário, veja-se exemplificativamente: PONTES, Helenilson Cunha. Omissão de receitas e depósitos bancários: o sentido normativo do art. 42 da Lei 9.430/96. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, n. 146, nov. 2007, p. 85-89; FERRAGUT, Maria Rita. Op. cit., p. 130.

89 PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 265.

90 CARRAZZA, Roque Antonio. Op. cit., p. 423 e 427.

91 PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 269-270.

92 Idem, p. 273.

93 CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 247 e 250.

94 DERZI, Misabel Abreu Machado. Direito tributário, direito penal e tipo. Op. cit., p. 326.

95 QUEIROZ, Luís Cesar Souza de. Op. cit., p. 245.

96 GONÇALVES, José Artur Lima. Op. cit., p. 156.

97 CARDOSO, Alessandro Mendes. A responsabilidade do substituto tributário e os limites à praticidade. Revista Tributária e de Finanças Públicas. São Paulo: RT, n. 68, ano 14, 2006, p. 159.

98 FERRAGUT, Maria Rita. Op. cit., p. 88.

99 GONÇALVES, José Artur Lima. Op. cit., p. 156-157; PACHECO, Angela Maria da Motta. Op. cit., p. 390; CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 282-283; DERZI, Misabel Abreu Machado. Direito tributário, direito penal e tipo. Op. cit., p. 344-350; QUEIROZ, Luís Cesar Souza de. Op. cit., p. 235-264, passim; CARDOSO, Alessandro Mendes. Op. cit., passim.

100 CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 266-267.

101 CR/1988: “Art. 146. Cabe à lei complementar: (...)

III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes (...).”

102 CTN: “Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.”

103 O Código Civil revogado tratava da “locação de serviços” nos arts. 1.216 a 1.236, e de “locação de coisas” nos arts. 1.188 a 1.199.

104 Cristiano Carvalho considera referido dispositivo do CTN como uma metarregra antificção. Cf. CARVALHO, Cristiano. Op. cit., p. 277.

105 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. Op. cit., p. 344-347, passim.

106 FERRAGUT, Maria Rita. Op. cit., p. 88.

107 VIEIRA, José Roberto. Fundamentos republicano-democráticos da legalidade tributária: óbvios ululantes e não ululantes. Op. cit., p. 189.

108 Ainda que a ficção seja coerente com a Legalidade Tributária, há que se alertar para sua possível invalidade, em face de outros princípios constitucionais. Nesse sentido, veja-se: FERRAGUT, Maria Rita. Op. cit., p. 88.