O Princípio Constitucional da Cooperação Tributária Introduzido pela Emenda n. 132/2023

The Constitutional Principle of Tax Cooperation Introduced by Amendment n. 132/2023

Marivaldo Andrade dos Santos

Doutorando e Mestre em Direito Tributário pela PUC-SP. Procurador Federal da Advocacia-Geral da União (AGU) em Brasília. E-mail: marivaldo.santos@agu.gov.br.

Recebido em: 5-3-2024 – Aprovado em: 2-4-2024

https://doi.org/10.46801/2595-6280.56.24.2024.2501

Resumo

O presente estudo tem por finalidade discutir a maneira como o fisco e o contribuinte interagem em um sistema tributário caracterizado preponderantemente por uma relação de subordinação e não por uma relação de cooperação mútua. A discussão sobre os diversos planos cooperativos, com destaque para a sistemática processual administrativa, é reveladora da necessidade de correlacionar a nova perspectiva da cooperação processual, introduzida pelo Código de Processo Civil, com o modelo tradicional do processo administrativo fiscal. Para além da própria relação processual, ganha relevância a análise da problemática da cooperação tributária e os limites da responsabilização e da sanção punitiva imputadas ao contribuinte.

Palavras-chave: cooperação tributária, interesse jurídico do fisco e contribuinte, sistema cooperativo legal.

Abstract

The purpose of this study is to discuss the way in which the tax authorities and the taxpayer interact in a tax system characterized predominantly by a relationship of subordination and not by a relationship of mutual cooperation. The discussion on the various cooperative plans, with emphasis on the administrative procedural systematics, reveals the need to correlate the new perspective of procedural cooperation, introduced by the Code of Civil Procedure, with the traditional model of the fiscal administrative procedure. In addition to the procedural relationship itself, the analysis of the issue of tax cooperation and the limits of liability and punitive sanctions imposed on the taxpayer gains relevance.

Keywords: tax cooperation, legal interest of the tax authorities and taxpayers, legal cooperative system.

Introdução

A dinâmica da relação jurídica tributária tem se construído com base em um vínculo marcadamente desequilibrado entre aquele que detém um direito de crédito e aquele que possui o dever de arcar com o ônus tributário. A visão da existência de uma assimetria natural que coloca o sujeito ativo em uma posição de superioridade em detrimento da posição de inferioridade do sujeito passivo não fica reservada apenas a um passado distante. Ainda hoje, essa naturalização do status privilegiado do ente titular do crédito tributário tem sido objeto de avaliações e limitações no âmbito do Poder Judiciário, em relação a diversos fenômenos jurídicos, seja no que toca à produção primária da norma jurídica tributária, seja no que toca à atividade de regulamentação da lei em sentido formal.

Nessas duas situações, tem-se verificado, em diversas oportunidades, que há um excesso na afetação do poder atribuído ao Estado fiscal, tanto no que diz respeito à abusividade da sobrecarga tributária, quanto no que diz respeito à abusividade da atividade de regulamentação. Essa situação tem gerado uma evidente crise na relação entre o credor público e o contribuinte. A judicialização das demandas tributárias representa a face mais expressiva desse conflito. Não resta dúvida de que as temáticas que concorrem para esse fenômeno são variadas e multifatoriais. Não se pode limitar a análise das disfunções da relação jurídica tributária somente à superposição (imoderada) do sujeito ativo em relação ao sujeito passivo.

É diante desse contexto – e a partir desse recorte metodológico – que se formula o presente estudo cujo objetivo principal é discutir não só a existência ou a inexistência de um sistema colaborativo de algumas normas tributárias, mas também a necessidade de implementação de uma estrutura que permita uma maior participação do contribuinte, com a finalidade de atenuar e minorar a proeminência da atividade fiscal em desfavor da atividade contributiva.

A discussão revela-se não só atual como também oportuna diante da superveniência da Emenda Constitucional n. 132, de 20 de dezembro de 2023, que, ao incluir o § 3º no art. 145 da Constituição Federal, determinou que o Sistema Tributário Nacional deve observar, entre outros, o princípio da cooperação tributária1.

1. O sistema de cooperação tributária como estrutura relacional entre o fisco e o contribuinte: dimensão subjetiva e dimensão objetiva

A constitucionalização da cooperação tributária, como um dos princípios que passa a figurar explicitamente no rol das diretrizes do Sistema Tributário Nacional, a partir do advento da Emenda Constitucional n. 132/2023, constitui uma indicação clara do legislador de que as regras, as normas e os postulados tributários devem ser interpretados e aplicados em consonância com uma visão colaborativa. O novo § 3º do art. 145 da Constituição Federal, ao consagrar o princípio da cooperação tributária, demonstra que é necessário abandonar práticas isoladas, para dar lugar a condutas integradas e participativas dos sujeitos tributários.

A interação entre o Estado e o contribuinte se faz por meio de um vínculo proveniente da relação obrigacional nascida com a concretização no mundo fenomênico de uma hipótese legalmente prevista. Com a materialização da previsão legal, o Estado passa a figurar como o titular de um possível crédito tributário em face do sujeito passivo. Essa relação de cunho marcadamente obrigacional pressupõe a participação do suposto credor e também do suposto devedor. Como ensina Ataliba2, o Estado é o ente “a quem a lei atribui a exigibilidade do tributo” e o sujeito passivo “é a pessoa que fica na contingência legal de ter o comportamento objeto da obrigação, em detrimento do próprio patrimônio e em favor do sujeito ativo”3.

O posicionamento de cada sujeito em polos diversos não traduz, no entanto, uma ideia de atividade e de passividade, no sentido de superioridade ou domínio total do Estado e de inferioridade ou sujeição do contribuinte. O surgimento da obrigação tributária representa um fato em potencial, uma possibilidade jurídica, ou melhor, uma probabilidade da realização do crédito. Nas palavras de Carvalho4, “o fato jurídico tributário será tomado como um enunciado protocolar, denotativo, posto na posição sintática de antecedente de uma norma individual e concreta, emitido, portanto, com função prescritiva, num determinado ponto do processo de positivação do direito”.

O nascimento da obrigação de cunho tributário, a partir desse fato jurídico tributário, coloca o Estado na posição de legítimo titular de uma expectativa de um crédito. Isso, contudo, não tem o condão de neutralizar as forças do devedor, no sentido de ter que se submeter ou ter que se resignar com a imposição nos termos que lhe impõe o Poder Estatal.

A ocorrência fática da hipótese legal tributária consubstancia-se no surgimento de um direito de crédito em favor ou em benefício do Estado, mas não retira do contribuinte a possibilidade de refutar as bases que serviram de suporte para a eventual cobrança da suposta dívida.

Tendo como base uma perspectiva mais moderna da tributação, pode-se considerar que a posição privilegiada que assume o credor estatal não constitui uma forma de desprestigiar, por completo, os interesses do contribuinte. No caso específico, a Constituição Federal institui diretrizes fundamentais destinadas a limitar o poder de tributar do Estado, por meio de princípios expressos e de princípios implícitos. A partir do pressuposto de que “o sistema tributário movimenta-se sob complexa aparelhagem de freios e amortecedores, que limitam os excessos acaso detrimentosos à economia e à preservação do regime e dos direitos individuais”, Baleeiro5 enfatiza, na sequência, que “a defesa do sistema tributário e do próprio regime político do país processa-se por um conjunto de limitações ao poder ativo de tributar”6.

Essas limitações ao poder de tributar objeto de estudo atento por Aliomar Baleeiro são representadas por valores essenciais que têm por objetivo impor um condicionamento na atuação do Estado, para que a defesa dos interesses ou dos supostos interesses estatais não se sobreponha desmedidamente aos interesses dos contribuintes.

Atualmente, a tributação levada a efeito pelo Estado somente revela-se compatível com as diretrizes constitucionais se observar as bases do Estado Democrático de Direito e, respectivamente, os princípios tributários da legalidade, da igualdade, da irretroatividade, do não confisco, sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, conforme previsão contida no art. 150 da Constituição Federal. Como acentua Derzi7, as limitações do poder de tributar “são princípios, direitos e garantias fundamentais, que se interpenetram em profusão, enfeixando-se no Estado Democrático de Direito”.

O Estado, portanto, revela-se detentor de um direito de crédito e o cidadão revela-se também detentor de direitos subjetivos perante a dívida que, em tese, possui em relação à Fazenda Pública. A relação tributária não constitui, portanto, um vínculo caracterizado pela superioridade do Estado e pela inferioridade do contribuinte.

Daí se dizer que a superveniência da ocorrência fática da hipótese legal descrita como motivadora da obrigação tributária exige uma participação tanto do Estado quanto do contribuinte. Por não haver uma relação de sujeição, o sujeito ativo tem o dever de lealdade em todos os momentos, ou seja, do momento inicial da formação da obrigação tributária, passando pela exigibilidade do crédito, até a respectiva satisfação da dívida.

E esse dever de colaboração não se limita à prática de atos oficiais a cargo dos órgãos ou dos agentes estatais. O contribuinte também possui o dever de colaborar a partir do momento em que se tem a ocorrência concreta da hipótese tributária legal. É preciso atentar para o fato de que a formação da obrigação e da respectiva exigibilidade é orientada por um sistema de cooperação a envolver tanto o sujeito ativo quanto o sujeito passivo.

A partir dos ensinamentos de Becker8, particularmente, no que tange ao incentivo para se adotar uma “atitude mental jurídica tributária”, voltada a “dissecar e reexaminar, sistematicamente, todos os conceitos e princípios de Direito Tributário”9, tem-se até aqui as diretrizes essenciais para se sintetizar aquilo que se pode denominar de sistema de cooperação tributária. Trata-se de instituto essencial situado em diversas normas fiscais, mas que acaba por confundir, tantas vezes, o verdadeiro papel a ser desempenhado pelo colaborador estatal e pelo colaborador contribuinte. Essa confusão decorre do fato de ainda perdurar a ideia de que o titular do crédito tributário pode valer-se do princípio da supremacia do interesse público como forma de impor e exigir certas condutas ao contribuinte.

É preciso atentar para o que ensina Bandeira de Mello10, para quem o princípio da supremacia do interesse público apenas possui “a extensão e compostura que a ordem jurídica lhe houver atribuído na Constituição e nas leis com ela consoantes. Donde, jamais caberá invocá-los abstratamente, com prescindência do perfil constitucional que lhe haja sido irrogado”.

Assim, o sistema de colaboração tributária, como de resto todo o sistema tributário, deve pautar-se em diretrizes voltadas a respeitar o Estado Democrático de Direito e os seus respectivos consectários, notadamente, o devido processo legal em sua feição material e em sua feição processual. Não se podem sobrepujar, pois, as forças do Estado em detrimento do cidadão, isso porque como adverte Coêlho11, “os poderes da Administração tributária são extensos e tentaculares. Coloca a sociedade à sua disposição. É dizer, o sujeito ativo da obrigação tributária, além de credor, é o senhor da investigação do seu direito de crédito, até mesmo em relação a terceiros, ornado de poderes punitivos”.

A cooperação tributária, vista sob a perspectiva do sujeito passivo, por isso mesmo, não pode ser encarada como um sistema de submissão do contribuinte às prerrogativas conferidas ao poder estatal. A colaboração – mesmo diante da existência de assimetrias inerentes à própria estrutura do Estado fiscal – tem na confiabilidade e na reciprocidade os principais bens jurídicos de proteção12, que implicam, necessariamente, a observância do princípio da boa-fé. Para Carrazza13 a boa-fé impera no direito tributário e “é a base de todas as relações intersubjetivas. Exige que cada um guarde fidelidade à palavra dada e não frustre nem abuse da confiança do outro”.

Cooperar, nesse caso, deve ser entendido como o meio pelo qual o poder fiscal e o contribuinte atuam, em conjunto, com a finalidade de apurar a obrigação tributária e o respectivo crédito tributário, mediante a observância das diretrizes constitucionais. Naturalmente que a cooperação tributária não constitui uma maneira de desconsiderar as posições antagônicas em que se encontram tais sujeitos, de tal sorte que a colaboração tributária não se presta a “desconhecer” a realidade objetiva da defesa dos interesses do fisco e dos interesses do contribuinte.

Por via de consequência, há necessidade de se distinguir em duas dimensões o sistema de cooperação tributária: a dimensão subjetiva e a dimensão objetiva.

A dimensão subjetiva da cooperação tributária – a dimensão subjetiva da cooperação tributária seria uma forma de colaboração, caracterizada pela espontaneidade e pela voluntariedade, em que os sujeitos da relação tributária atuariam por meio de preferências ou de opções compatíveis com a predileção ou com a respectiva conveniência. Diante dessas características, o ônus das consequências legais da utilização da cooperação tributária seria suportado integralmente pelo sujeito, no caso de deixar de observar normas desprovidas de efeitos cogentes.

Naturalmente que é vedada à Administração Pública valer-se da dimensão subjetiva da cooperação tributária, em atenção ao princípio do impulso oficial ou do princípio da oficialidade previsto no inciso XII do art. 2º da Lei n. 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. Essa vedação encontra previsão mais específica em relação à Administração Tributária, pois o procedimento fiscal – como determina o art. 7º do Decreto n. 70.235, de 6 de março de 1972, que dispõe sobre o processo administrativo fiscal – tem início com (i) “o primeiro ato de ofício, escrito, praticado por servidor competente”; com (ii) “a apreensão de mercadorias, documentos ou livros” e com (iii) “o começo de despacho aduaneiro de mercadoria importada”.

A Administração Tributária encontra-se, portanto, desprovida de atuar com base puramente em critérios pessoais do agente público segundo suas predileções, convicções ou suas conveniências. Sob essa perspectiva, não haveria espaço para escolhas e opções de cunho individual, não sendo condizente com as atividades típicas da Administração Fiscal a aplicação dos critérios específicos da dimensão subjetiva da cooperação tributária.

Por outro lado, a cooperação tributária em sua dimensão subjetiva ajusta-se muito mais aos interesses do contribuinte, já que, em determinadas situações, poderá ele realizar um juízo de conveniência, ao julgar, tendo por parâmetro o caso concreto, se a prática ou não de determinado ato poderá atender ou deixar de atender aos seus interesses. A avaliação sobre o proveito, sobre a vantagem, sobre a adequação e sobre o momento poderá influenciar na decisão do contribuinte em cooperar com a Administração Tributária. Por esse viés subjetivo da cooperação, como a ação ou a omissão não configura transgressão à norma tributária dotada de força imperativa, o contribuinte poderá abster-se de realizar o ato, pois o ônus da decisão será suportado por ele mesmo.

A dimensão objetiva da cooperação tributária – a dimensão objetiva da cooperação tributária corresponderia ao dever de participação obrigatória dos sujeitos da relação tributária, não havendo, pois, a possibilidade de facultar-se a prática de determinado ato. Nesse caso, a legislação tributária preceitua e estabelece, objetivamente, as determinações e as exigências para a realização da cooperação tributária sem deixar margem para atuações voluntárias quer da Administração Tributária quer do contribuinte.

A não observância das regras e das normas impostas à cooperação tributária em sua dimensão objetiva resulta em um ônus a ser suportado pelo agente da Administração Tributária ou pelo contribuinte, já que se trata de descumprimento de preceitos de cunho obrigatório e não facultativo.

Nesse caso, a inobservância das regras que determinam a necessidade de cooperação poderá implicar severas consequências no plano da responsabilização tanto em relação aos agentes públicos da Administração Tributária, quanto em relação aos contribuintes e demais sujeitos que de alguma forma encontram-se com ele vinculado.

Por isso mesmo, a feição objetiva da cooperação tributária possui um caráter cogente, não cabendo aos sujeitos da relação tributária absterem-se de atuar diante da convocação ou da determinação legal, tendo em vista que a inação ou a ação em desconformidade com os ditames normativos representa uma transgressão não tolerada pelo sistema de deveres e de obrigações que regem as atuações dos agentes públicos e do próprio contribuinte.

Há casos, todavia, em que a Administração tributária atua de maneira compartilhada com o sujeito passivo, valendo-se de critérios próprios da dimensão objetiva com uma certa medida de subjetividade. Esse compartilhamento de atividades ocorre naquelas situações em que a Administração Tributária utiliza-se de determinados meios coercitivos antecipatórios que têm por finalidade assegurar a efetividade da garantia do crédito tributário. Nesse caso, tem-se o exemplo da possibilidade de o fisco atender aos interesses do sujeito passivo e permitir a substituição dos bens e direitos objeto do procedimento de arrolamento, conforme previsão contida no § 12 do art. 64 da Lei n. 9.532, de 10 de dezembro de 1997.

A despeito da natureza invasiva dessa medida, que visa a atender aos interesses da Administração Tributária, verifica-se que existe a previsão da cooperação tributária, ao se permitir que o sujeito passivo possa substituir os bens e os direitos arrolados por outros. Nesse caso, há uma autorização legal que permite a conjugação de esforços a fim de que os interesses antagônicos sejam harmonizados, no sentido de que os interesses fazendários não se sobreponham de maneira irrestrita aos interesses dos contribuintes.

O fato é que, sob uma perspectiva objetiva, a desobediência das regras previstas no sistema de cooperação por parte dos agentes públicos ou por parte dos contribuintes pode configurar a responsabilizações de diversas ordens, a depender do tipo e da gravidade dos atos comissivos ou omissivos.

Feita essa abordagem geral, tem-se que a verificação dos traços característicos da dimensão subjetiva e da dimensão objetiva da cooperação tributária tem especial relevância para o objeto do presente estudo no ponto que se relaciona às ações e às omissões do contribuinte, tanto no que tange aos aspectos processuais da cooperação, quanto no que tange à prática de atos comissivos ou omissivos que importam em sanções impostas pela Administração Tributária em razão das supostas desobediências do sujeito passivo em cooperar com o Fisco. São, portanto, a perspectiva processual e a perspectiva material que se prestam a delinear o presente estudo acerca do sistema de cooperação tributária.

2. O aspecto processual do sistema de cooperação tributária

2.1. A cooperação como fator de celeridade, justiça e efetividade processual

A Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015, que dispõe sobre o Código de Processo Civil – CPC, entre outras grandes inovações, traz a previsão do dever de cooperação de todos aqueles que atuam no processo. O art. 6º do CPC estabelece que “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”. Hoje, esse art. 6º do CPC deve ser interpretado e aplicado, no campo fiscal, em conformidade com o princípio da cooperação tributária previsto no § 3º do art. 145 da Constituição Federal a partir da edição da Emenda Constitucional n. 132/2023.

Ao passar a prever expressamente que os sujeitos do processo (e não somente as partes) têm o dever de cooperação mútua, o CPC traz a indicação de que a busca pela resolução das demandas submetidas ao Estado constitui um ônus que transcende os limites dos interesses particulares. A finalidade da previsão legal consiste, em um primeiro momento, em impor aos sujeitos do processo o dever de colaboração e de assistência recíproca em virtude da necessidade de resolução célere da controvérsia, para se fazer cumprir o princípio constitucional da duração razoável do processo previsto no inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição Federal.

Além disso, o art. 6º do CPC estabelece que o dever de cooperação mútua tem por finalidade específica proporcionar a obtenção de justiça e de efetividade da decisão de mérito proferida no processo.

Tomando por base a distinção que fora apontada acima, tem-se nesse art. 6º do CPC, uma descrição da dimensão objetiva do sistema de cooperação, haja vista que não se faculta aos sujeitos do processo a possibilidade de cooperar. Na verdade, o art. 6º do CPC impõe a eles o dever de agir de maneira cooperativa, para que essa cooperação resulte em um processo célere, a fim de que a decisão que dele resulte seja a expressão de justiça e de efetividade. Desta feita, ao estabelecer o dever de cooperar como uma das atribuições específicas dos sujeitos que atuam no processo, o CPC alçou a cooperação como um dos valores fundamentais e determinantes para auxiliar na resolução de três grandes questões da crise processual: a morosidade, a justiça e a efetividade.

Valendo-se dessa moderna perspectiva da cooperação processual, pode-se considerar que os sujeitos que atuam, especificamente, com base no sistema de cooperação tributária, têm o dever de colaboração para que a relação processual tributária (tanto na esfera administrativa, quanto na esfera judicial) seja solucionada de maneira célere, com vistas à promoção da justiça e da efetividade das demandas fiscais.

2.2. O sistema de cooperação tributária prevista no Decreto n. 70.235/1972

A cooperação no sistema tributária possui uma relevância destacada durante a fase de constituição do crédito tributário, por ser esse o momento durante o qual o sujeito ativo (por meio da Administração Tributária) e o sujeito passivo atuam com a finalidade de demonstrar a existência da obrigação imputada ou com a finalidade de comprovar a inexistência dessa obrigação. Embora não seja um instituto exclusivo do processo (como se verá logo mais), a cooperação tributária tem um forte conteúdo processual, porque representa a atuação recíproca dos agentes que atuam para a confirmação ou para a refutação do ônus tributário.

No âmbito federal, o Decreto n. 70.235, de 6 de março de 1972, que dispõe sobre o processo administrativo fiscal, possui um catálogo expressivo de situações que configuram exemplos que integram o sistema de cooperação tributária.

O Decreto n. 70.235/1972 prevê que – com o início do processo, mediante os atos praticados pelos servidores competentes – o sujeito passivo pode utilizar-se do direto de impugnar os termos do auto de infração, lavrado em seu desfavor; ou ainda impugnar os termos da notificação de lançamento, no prazo de 30 (trinta) dias (inciso V do art. 10 e art. 15), momento a partir do qual se instaura a fase litigiosa do procedimento fiscal (art. 14).

Se o sujeito passivo entender não ser o caso de cumprir a exigência decorrente da obrigação tributária ou da penalidade isolada (multa isolada), ou seja, se o sujeito passivo entender não ser o caso de oferecer a impugnação da notificação de lançamento ou do auto de infração, a Fazenda Pública apresentará a declaração da revelia. Em seguida, proceder-se-á à cobrança amigável do crédito que, se não for pago durante o prazo de 30 (trinta) dias pelo devedor, será encaminhado para a promoção da respectiva cobrança executiva, nos termos do art. 21 do Decreto n. 70.235/197214.

Nesse caso, o Decreto n. 70.235/1972 instituiu expressamente a cooperação tributária em sua dimensão subjetiva, haja vista que traz a possibilidade de o devedor remisso avaliar a hipótese de pagamento do crédito, antes do direcionamento dos autos para a execução fiscal. Ao se colocar à disposição do sujeito passivo a possibilidade de cooperar com a solução negociada e administrativa do conflito, esse dispositivo da norma antecipa-se à judicialização da demanda e permite que o interessado avalie os impactos dos elevados custos derivados da execução fiscal.

Mesmo admitindo hipóteses de cooperação tributária (como essa), no âmbito do processo administrativo fiscal, o próprio Decreto n. 70.235/1972 considera, em seu art. 43, que a decisão definitiva contrária ao sujeito passivo será cumprida no prazo para cobrança amigável fixado no art. 21 (mencionado acima), devendo ocorrer, no caso de descumprimento, o encaminhamento do feito para se promover a execução fiscal.

O disposto nesse art. 43 do Decreto n. 70.235/197215 merece ser objeto de críticas, porque não se compatibiliza com a concepção moderna de como deve ser entendido o sistema de cooperação tributária. Isso quer significar que, durante o prazo para a cobrança amigável, a Administração Tributária tem (ou teria) de abster-se do emprego dos meios coercitivos indiretos em desproveito do sujeito passivo. A cobrança da decisão definitiva a que faz menção o dispositivo deve (ou deveria) sofrer um temperamento para não restar configurada uma situação contraditória por parte do fisco.

É certo que o Superior Tribunal de Justiça – STJ já entendeu, no REsp n. 1.399.591/CE, DJe de 15 de outubro de 2013, que “o prazo de trinta dias para a cobrança amigável previsto no art. 21 do Decreto n. 70.235/1972 não suspende a exigibilidade do crédito tributário e, por conseguinte, não impede o curso do prazo prescricional”.

De fato, o lapso temporal de 30 dias colocado à disposição do fisco para a realização da cobrança amigável não tem o condão de suspender a exigibilidade do crédito, até porque, como visto, esse prazo começa a correr após a ausência de impugnação do sujeito passivo, ou seja, após a declaração da sua revelia.

Acontece que a exigibilidade do crédito, durante o transcurso do prazo de 30 dias de que cuida o citado art. 21 do Decreto n. 70.235/1972, deve se compatibilizar com o pressuposto normativo de que esse momento se refere a uma tentativa de cooperação tributária de extinção do crédito mediante o pagamento amigável por parte do devedor, ainda que essa norma não estabeleça, expressamente, a possibilidade de concessões ou benefícios fiscais relativos à redução do respectivo crédito tributário.

O fundamental, portanto, é compreender que o objetivo da regra contida no art. 21 do Decreto n. 70.235/1972 é permitir uma cobrança administrativa amigável e não uma cobrança administrativa forçada do valor da dívida tributária propriamente dita ou do valor correspondente da multa isolada, de modo que essa exigibilidade merece ser harmonizada com a ideia moderna de cooperação processual, voltada para a realização da celeridade, da justiça e da efetividade, como visto.

Também constitui um elemento importante do sistema de cooperação tributária a maneira como o contribuinte procede à indicação do domicílio tributário, no âmbito do processo administrativo fiscal.

O art. 23 do Decreto n. 70.235/197216 prevê 4 (quatro) modalidades de intimação: (i) pessoal do sujeito passivo, mandatário ou preposto; (ii) postal com prova de recebimento do sujeito passivo; (iii) eletrônica com prova de recebimento do sujeito passivo ou (iv) edital.

Para efeito do presente estudo, o dado relevante a ser destacado é que o endereço postal e o endereço eletrônico (se houver consentimento expresso) fornecidos pelo sujeito passivo serão considerados o seu domicílio tributário para fins de intimação, conforme prevê o § 4º desse mesmo art. 23 do Decreto n. 70.235/1972, já transcrito.

Nesse caso, a cooperação tributária reside na própria indicação correta do domicílio tributário por parte do sujeito passivo. Aliás, cabe ao contribuinte não só indicar adequadamente o domicílio tributário, mas também mantê-lo atualizado, como forma de dar efetividade à cientificação oficial e ainda como forma de evitar a intimação por meio da publicação de edital.

O STJ tem decido (AgInt no AREsp n. 1.686.708/RJ, DJe de 09.12.202117) que não existe uma ordem de preferência para a intimação do sujeito passivo, devendo somente haver a comprovação da realização do ato no domicílio fiscal eleito pelo contribuinte e que, no âmbito do processo administrativo fiscal, a citação por edital é legal nos casos em que a realização por carta revela-se infrutífera.

A efetividade representa, como visto, um dos elementos fundamentais da cooperação processual. No caso específico – ao deixar de indicar corretamente o domicílio tributário ou ao deixar de atualizá-lo – o contribuinte frusta a efetividade da comunicação, impondo a implementação da intimação ficta, que, como se sabe, possui uma baixa exequibilidade na comunicação processual.

É preciso reconhecer, todavia, que o fornecimento adequado ou a atualização do domicílio tributário encontram-se no âmbito da dimensão subjetiva da cooperação tributária, porque, se bem vista a situação, essa decisão decorre de elementos próprios da voluntariedade e da conveniência, na medida em que a repercussão desse ato será suportada exclusivamente pelo sujeito passivo.

Finalmente, importante destacar que talvez a consulta prevista no Decreto n. 70.235/1972 seja o instituto que expresse com mais exatidão o sentido da cooperação tributária, na esfera do processo administrativo fiscal. Segundo o art. 46 dessa norma, “o sujeito passivo poderá formular consulta sobre dispositivos da legislação tributária aplicáveis a fato determinado”.

Embora a legislação seja construída com base em uma linguagem técnica que, por isso mesmo, constitui a própria singularização e o próprio ser da ciência jurídica, não está ela (a legislação) imune ou destituída da possibilidade de gerar incertezas ou confusões, dado que mesmo dotada de tecnicidade a norma contém elementos que provocam imprecisões, ambiguidades e incertezas18.

O objetivo fundamental da instauração do processo de consulta é justamente permitir que a Administração Tributária proceda à indicação do sentido mais adequado a respeito das dúvidas presentes nos dispositivos da legislação tributária a que se sujeita o fato determinado, como forma de retirar o sujeito passivo do estado de indefinição, permitindo a subsunção adequada da situação requerida pelo caso concreto aos dispositivos da legislação tributária.

Tem-se, com isso, que o processo de consulta permite que o contribuinte saia do estado de hesitação e de indecisão, para um estado de segurança jurídica, tendo em vista que, com a resolução da consulta, a atuação do contribuinte restará baseada em parâmetros interpretativos da própria Administração Tributária, situação que gera as salvaguardas necessárias para a proteção e para a preservação dos interesses do sujeito passivo.

O processo de consulta representa, pois, uma maneira de evitar que o contribuinte efetue o procedimento de extinção do seu crédito tributário ou o cumprimento da sua obrigação tributária, a depender da situação, de maneira inadequada, seja com o pagamento do crédito de maneira indevida, seja com o recolhimento do débito fiscal a menor ou a maior.

A questão relevante a ser destacada é que o processo de consulta, instituído pelo Decreto n. 70.235/1972, contém uma imensa impropriedade, ao não possuir o condão de sustar a exigibilidade do crédito até que a dúvida do contribuinte seja sanada de maneira terminativa. Essa inadequação faz com que a formalização da consulta deixe de caracterizar-se como um exemplo paradigmático de cooperação tributária.

O art. 49 do Decreto n. 70.235/1972 preceitua, em síntese, que “a consulta não suspende o prazo para recolhimento de tributo”. É certo o STJ possui jurisprudência sedimentada no sentido de que o procedimento de consulta fiscal não constitui caso de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, por não se incluir no rol taxativo de hipóteses previstas no art. 151 do Código Tributário Nacional – CTN19.

A questão que aqui se coloca transcende o posicionamento da Corte Superior que parece adequada quanto à impossibilidade de a consulta prevista no Decreto n. 70.235/1972 constituir um meio idôneo para suspender a exigibilidade do crédito tributário, tanto em razão da taxatividade do citado art. 151 do CTN, quanto em razão da natureza ordinária e não complementar do Decreto n. 70.235/1972.

O que parece importante discutir é que em um sistema de cooperação tributária moderna, pautado na busca da celeridade, da justiça e da efetividade, o processo de consulta deveria (e deve) ser um instrumento voltado à operacionalização da exigência do crédito mediante um elevado grau de segurança jurídica, no sentido que lhe empresta Tôrres20, para quem em um Estado Democrático de Direito o princípio da segurança jurídica possui a função de “garantia de certeza jurídica, estabilidade sistêmica e confiança legítima, tanto para proteção da previsibilidade da legalidade quanto para a concretização dos direitos fundamentais”.

Naturalmente que isso não quer significar que o processo de consulta administrativa seja destituído de critérios ou de condições. Não é isso. A ponderação que se coloca encontra-se na seara da compatibilidade entre a permissão da instauração da consulta e a exigibilidade imediata do suposto direito de crédito, ainda no curso do processo. Há aí valores que se confrontam: a efetividade do crédito público e a segurança jurídica como um direito fundamental do contribuinte. O Decreto n. 70.235/1972 despreza a segurança jurídica e privilegia a efetividade do crédito. Nesse ponto, a norma ignora o sistema de cooperação tributária.

Em suma, embora dotado de importância, o processo de consulta merece ser modernizado com vistas a atender a critérios mais atualizados do sistema de cooperação tributária, notadamente, critérios que observem tanto os interesses da Fazenda Pública, quanto os interesses dos contribuintes. E assim parece ser, porque a determinação clara dos entendimentos acerca do sentido da legislação tributária tem o efeito de beneficiar o fisco e o sujeito passivo. A resolução dos termos da consulta, ao expressar um meio relevante de cooperação tributária, representa (ou deveria representar) uma forma de conferir a segurança jurídica necessária à exigibilidade do crédito tributário.

3. O sistema de cooperação tributária: delegação das atribuições e responsabilização do contribuinte

3.1. A delegabilidade das atribuições do fisco e o sistema de cooperação tributária

O sistema de cooperação tributária não se situa apenas nas relações processuais. Embora o tema hoje encontre uma regência específica no art. 6º do CPC, como um dever específico de cooperar a que estão subordinados todos os sujeitos do processo, a participação dos agentes públicos e, notadamente, dos contribuintes constitui uma atividade imprescindível para se operacionalizar, racionalizar e efetivar a constituição, a execução e a arrecadação dos tributos.

A discussão em torno do sistema de cooperação tributária insere-se, em grande medida, na identificação das congruências e das incongruências decorrentes do regime de delegação das atividades desenvolvidas pela Administração Tributária para a própria esfera do contribuinte. A cooperação tributária, por isso mesmo, não deve ser compreendida como um sistema qualificado de delegabilidade dos encargos que, originalmente, deveriam ser imputados à Administração Tributária. Sabe-se que existem necessidades prementes de se tornarem certas atividades fiscais mais eficientes, situação que impõe sejam transferidos para o sujeito passivo a prática de alguns atos típicos dos agentes públicos.

Isso pode ser demonstrado se se realizar o cotejamento entre a definição do lançamento tributário e as modalidades de lançamento previstas no CTN. Para efeito do presente estudo, basta dizer sucintamente que compete privativamente à autoridade competente constituir o crédito tributário por meio do lançamento, nos termos da parte inicial do art. 142 do CTN. Visto em sua literalidade, esse dispositivo conforma-se com a definição de um dos tipos de lançamento, no caso o lançamento de ofício, a ser efetuado pela autoridade administrativa competente nas hipóteses elencadas no art. 149 do CTN.

Por outro lado, no denominado lançamento por homologação21, o contribuinte realiza uma atividade de cooperação tributária, diante do dever de antecipar o pagamento do valor devido sem o prévio exame da autoridade administrativa, nos termos do art. 150. A colaboração integrada cuja ocorrência dá-se com o próprio nascimento de determinadas obrigações tributárias encontra nessa modalidade de lançamento a expressão por excelência da distribuição de responsabilidade a envolver o sujeito ativo e o sujeito passivo. Embora não se trate efetivamente de participação dotada de espontaneidade e voluntariedade, o lançamento sujeito à homologação representa a forma pela qual o contribuinte exerce uma atividade de colaboração imprescindível.

Já no lançamento por declaração, o próprio art. 147 do CTN preceitua que o lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro que deve ser prestada à autoridade administrativa. Daí dizer Machado22 que o lançamento por declaração é uma atividade da autoridade fiscal “com a colaboração do sujeito passivo da obrigação tributária que lhe presta informações quanto à matéria de fato, e se completa com a notificação feita ao contribuinte, determinando o prazo de que este dispõe para o pagamento do valor estabelecido”.

Adverte ainda Machado23 que o próprio contribuinte pode participar na feitura lançamento, “entretanto, mesmo nos casos em que o contribuinte pratica todos os atos materiais de determinação do crédito tributário o lançamento é sempre uma atividade privativa da autoridade administrativa”.

Não é o objetivo do presente trabalho realizar uma avaliação das particularidades e das eventuais inconsistências das definições legais das modalidades de lançamento, mas valer-se desse instituto para fixar a premissa de que a cooperação constituiu uma das bases do sistema tributário, mesmo diante de atividades reservadas privativamente aos agentes fiscais, como é o caso do lançamento.

Não se pode confundir, portanto, um sistema de cooperação com um sistema de delegação. A cooperação pressupõe que os agentes atuem com a finalidade de atingir um objetivo comum mediante a utilização de auxílios recíprocos. A delegação possui um sentido mais técnico, com significação própria em alguns diplomas legais específicos24. O traço comum, no ato de delegar, reside no fato de a atribuição transferida ser repassada sem o comprometimento da afetação das competências legais originais. O sistema de cooperação tributária, portanto, não corresponde a um regime de delegação de competência.

Em suma, o estabelecimento dessa diferenciação é extremamente importante, porque na cooperação tributária há uma assunção própria da responsabilidade. Não há delegabilidade das atribuições ou das competências primárias. Inexiste no sistema de colaboração tributária a hipótese de transmissibilidade da competência original, mas uma atividade de integração participativa em benefício de um objetivo determinado, mesmo que os interesses sejam diversos.

3.2. A cooperação tributária e a responsabilização do contribuinte: as sanções pecuniárias

O sistema de cooperação tributária, ou melhor, a tentativa de dar efetividade a um sistema de cooperação tributária apresenta situações tormentosas, justamente porque, muitas vezes, não se consegue a realização da confluência de interesses, notadamente, naqueles casos em que a colaboração dá lugar à imposição e à sobreposição de interesse.

Como visto, a cooperação tributária tem por pressuposto uma interação colaborativa envolvendo a Administração Tributária e o contribuinte, mediante a utilização de meios tanto objetivos quanto de meios subjetivos. Se por um lado, a cooperação objetivamente considerada encontra o seu traço característico na obrigatoriedade; por outro lado, a cooperação subjetivamente analisada encontra a sua marca típica na facultatividade. A compreensão do tema a partir dessas duas dimensões revela-se importante também no que diz respeito às consequências da participação cooperativa realizada de maneira inadequada ou indevida.

A inadequação da conduta na cooperação tributária, resultado do descumprimento de normas legais, importa na responsabilização do agente que, no caso do contribuinte, consubstancia-se em imposição de sanções; de modo que dada a infração à norma cooperativa, haverá uma correspondente medida de caráter sancionatória. Nas palavras de Amaro25, “a infração enseja a aplicação de remédios legais, que ora buscam repor a situação querida pelo direito (mediante execução coercitiva da obrigação descumprida), ora reparar o dano causado ao direito alheio, infligindo um castigo ao infrator”.

A legislação tributária possui uma série de punições destinadas a atingir as condutas dos contribuintes que atuam de maneira abusiva ou agem de má-fé. Para efeito do presente estudo, destacam-se as denominadas multas de lançamento de ofício ou multas imputadas em razão de um lançamento de ofício que configuram um tipo de sanção pecuniária que objetiva responsabilizar os contribuintes que agiram em desacordo com as regras da cooperação tributária, em razão (i) da falta de pagamento ou recolhimento ou (ii) da falta de declaração ou de declaração inexata dos impostos ou das contribuições, como prevê, por exemplo, o art. 44 da Lei n. 9.430, de 27 de dezembro de 199626.

Pode ser citada ainda a multa isolada imposta no lançamento de ofício, em razão da não homologação da compensação quando é comprovada a falsidade da declaração apresentada pelo sujeito passivo, na forma da previsão constante no art. 18 da Lei n. 10.833, de 29 de dezembro de 200327.

Nesses dois exemplos, as medidas punitivas não são desprovidas de justificativas razoáveis, pois que fundadas na quebra de confiança da cooperação tributária, diante da ausência de cumprimento das obrigações tributárias segundo os preceitos legais.

Acontece que há situações em que o legislador considera dispensável a existência de elementos concretos, como a falta de pagamento ou a comprovação de falsidade da declaração, por exemplo, para justificar a possibilidade de imputação da multa.

Alguns mecanismos legais voltados a sancionar os contribuintes que almejam compensar seus créditos tributários ilustram muito bem essa situação. O caput do art. 74 da Lei n. 9.430/199628 prevê, em síntese, que o sujeito passivo que apurar crédito passível de restituição ou de ressarcimento poderá realizar a compensação de débitos próprios em relação a quaisquer tributos federais.

Nesse caso, realizada a apuração de crédito, o sujeito passivo detém o direito subjetivo à restituição ou ao ressarcimento pela via da compensação. Esse procedimento constitui um exemplo nítido do sistema de cooperação tributária, por caracterizar-se como uma forma de realização de esforços comuns voltados a proceder a um encontro de contas entre os prováveis débitos e os supostos créditos.

Acontece que na tentativa de coibir o suposto abuso de direito ou a suposta má-fé do contribuinte são instituídas verdadeiras anomalias no sistema de cooperação tributária. Ainda que já revogado, vale lembrar o que dispunha o § 15 do art. 74 da Lei n. 9.430, de 27 de dezembro de 1996, introduzido pela Lei n. 12.249, de 11 de junho de 201029. Esse dispositivo previa a possibilidade de aplicação de multa isolada de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor do crédito objeto de pedido de ressarcimento indeferido ou indevido. Nesse caso, o legislador considerou que haveria justa causa para imputação de medidas sancionatórias em razão da ocorrência do simples indeferimento ou do simples julgamento indevido do pedido de ressarcimento. Esse dispositivo perdeu a sua vigência com a superveniência da Lei n. 13.137, de 19 de junho de 2015.

Essa previsão, mesmo já não integrando o arcabouço normativo, carece de ser objeto de estudo, como forma de registrar e de demonstrar a existência de anormalidades acentuadas no sistema de cooperação tributária. Nesse caso, havia um desvio injustificado no dispositivo, na medida em que a imputação de sanção com base simplesmente no indeferimento ou no julgamento indevido do pedido de ressarcimento afigurava-se exagerada, porque não havia uma correlação direta entre o dano experimentado pela Administração Tributária e a multa pecuniária imputada.

Curiosamente, essa mesma Lei n. 12.249/2010 fez incluir o § 17 no art. 74 da mesma Lei n. 9.430/1996, determinando que a multa isolada prevista no § 15 do mesmo art. 74 (a que se fez menção acima) deveria ser aplicada sobre o valor do crédito objeto de declaração de compensação não homologada, salvo no caso de falsidade da declaração apresentada pelo sujeito passivo.

Posteriormente, com a revogação do § 15 do art. 74 da Lei n. 9.430/1996, a redação do § 17 do art. 74 da mesma Lei n. 9.430/1996 foi objeto de aperfeiçoamento, pela Lei n. 13.097, de 19 de janeiro de 201530, que passou a prever o seguinte: será aplicada multa isolada de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor do débito objeto de declaração de compensação não homologada, salvo no caso de falsidade da declaração apresentada pelo sujeito passivo.

A importância e a dimensão do alcance da matéria ensejaram a afetação da discussão perante o Supremo Tribunal Federal – STF, que reconheceu a Repercussão Geral sintetizada no Tema 736, a fim de verificar a constitucionalidade da multa prevista no § 15 do art. 74 (então vigente) e no § 17 do art. 74 da Lei n. 9.430/1996, para os casos de indeferimento dos pedidos de ressarcimento (na primeira situação) e de não homologação das declarações de compensação de créditos perante a Receita Federal (na segunda situação).

Em 20 de março de 2023, ao concluir o julgamento do mérito de Tema 736 com a repercussão geral admitida, no RE n. 796.939, o STF, por unanimidade, reconheceu a inconstitucionalidade tanto do revogado § 15 do art. 74 da Lei n. 9.430/1996, quanto do § 17 do art. 74 da Lei n. 9.430/1996, tendo fixado a tese seguinte: “É inconstitucional a multa isolada prevista em lei para incidir diante da mera negativa de homologação de compensação tributária por não consistir em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária”.

O Ministro Relator Edson Fachin na íntegra do seu voto baseou-se, em primeiro lugar, na ideia de que “emerge nítida falta de correlação entre a multa tributária e o pedido administrativo de compensação tributária, ainda que não homologado pela Administração Tributária, uma vez que este se traduz em legítimo exercício do direito de petição do contribuinte”.

Considerou ainda o Ministro Relator Edson Fachin que o “pedido de compensação tributária não se compatibiliza com a função teleológica repressora das multas tributárias, porquanto a automaticidade da sanção, sem quaisquer considerações de índole subjetiva acerca do animus do agente, representaria, ao fim e ao cabo, imputar ilicitude ao próprio exercício de um direito subjetivo público com guarida constitucional”.

Além dos próprios fundamentos que levaram o STF a declarar a inconstitucionalidade do § 15 do art. 74 da Lei n. 9.430/1996 (revogado) e do § 17 do art. 74 da Lei n. 9.430/1996, pode-se ponderar ainda que o fato gerador da multa isolada, nesse último caso, corresponde tão somente ao indeferimento da homologação da compensação. A imputação dessa sanção em razão simplesmente da não homologação do pedido de compensação representa uma forma desmedida de penalizar o exercício do direito subjetivo de cooperação do contribuinte.

O ponto central que se quer destacar, ao se trazer essa controvérsia julgada pelo STF, é que, ao apresentar-se como detentor do direito, o sujeito passivo submete a sua pretensão à avaliação da Administração Tributária, para que verifique se sua solicitação encontra amparo, ou seja, para que confirme a existência de crédito a ser compensado. Ao valer-se desse mecanismo de participação, a reação do Estado não pode pautar-se em aspectos reveladores de desconfiança e abusividade, sem que exista a presença de elementos volitivos mínimos configuradores de atos ilícitos por parte do agente.

Com isso, o sistema de cooperação tributária foi exposto a uma profunda violação, diante da ocorrência da previsão paradoxal contida no caput do art. 74 e no seu respectivo § 17, ambos da citada Lei n. 9.430/1996. Se no primeiro caso, como visto, o dispositivo principal (caput do art. 74 da Lei n. 9.430/1996) traz a autorização expressa para o contribuinte apresentar a sua apuração do crédito com vistas à realização da compensação; no segundo caso, o dispositivo secundário (§ 17 do art. 74 do Lei n. 9.430/1996) ostenta uma previsão de cunho verdadeiramente inibitório, porque apresenta uma forma de intimidar o contribuinte, com base na suposição e na inferência de que o simples indeferimento da homologação constitui um desvalor ou um ilícito capaz de caracterizar a ocorrência do fato gerador da imposição da sanção.

O julgamento desse caso pelo STF (RE n. 796.939) se presta a exemplificar que o sistema cooperativo deve ser concebido para incentivar a participação dos sujeitos, a fim de que a integração dos esforços permita a implementação e/ou o aperfeiçoamento do sistema tributário. A criação de mecanismos legais de contenção da participação contribuinte – como aquele previsto no § 15 e no § 17 do art. 74 da Lei n. 9.430/1996 – fragiliza a crença na confiança mútua que deve nortear a relação jurídica entre o Estado e o contribuinte.

Em síntese, os métodos e os modelos legais destinados a reprimirem as condutas indevidas do contribuinte não devem pautar-se em presunções de ilicitude, por se revelarem uma forma de coibir tanto a espontaneidade quanto a voluntariedade do sistema de cooperação tributária.

4. Conclusão

O vínculo que atrai a atuação do contribuinte e do poder tributante responsável pela instituição, fiscalização, apuração e execução do crédito tributário ainda se consubstancia como uma relação jurídica marcada pela posição de superioridade estatal em detrimento do cidadão. Essa realidade encontra, no catálogo de prerrogativas públicas, a pretensa justificava no posicionamento do ente público em uma esfera privilegiada. A dita superioridade do interesse público sobre o interesse privado espraia-se também nos círculos jurídicos do direito tributário, contrastando com as diretrizes norteadoras do Estado Democrático de Direito. É por essa razão que ainda prospera a ideia de que a diversidade de interesses (públicos e privados) implica a inviabilidade de se desenvolver e de se manter uma relação menos antagônica entre as partes.

É diante desse cenário de adversidade permanente que se insere o tema sobre a necessidade de se estimular a discussão sobre o sistema de cooperação tributária, que se volta, em um primeiro momento, a indicar alguns aspectos relevantes acerca das maneiras de colaboração existentes e ainda demonstrar que muitas das disposições legais colaborativas revelam-se mecanismos que acentuam a sobreposição do poder tributante.

É certo que a existência de um sistema tributário baseado apenas na justaposição de interesses evidencia-se uma tentativa ociosa de agregar o que a própria natureza da relação jurídica entre o Estado e o contribuinte se encarrega de separar. Em um Estado constitucional com vocação democrática, as limitações ao poder de tributar constituem cláusulas protetivas do cidadão.

Por isso mesmo, poder-se-á dizer, em síntese conclusiva, que as premissas para o aperfeiçoamento dos meios de cooperação tributária já existentes, bem como a base para a criação e o desenvolvimento de um tipo de sistema tributário assumidamente colaborativo reside na elaboração de medidas não só voltadas a reduzir as abusividades a que ainda de submente a sujeição passiva tributária (a exemplo do § 15 e do § 17 do art. 74 da Lei n. 9.430/1996 declarados inconstitucionais pelo STF), como também voltadas a potencializar a participação e a interação do contribuinte na formação e exigibilidade do crédito tributário.

Enfim, a ausência de um espírito cooperativo resulta em uma posição perene de conflituosidade e, por via de consequência, uma situação constante de prejuízos para ambos os lados. Por isso mesmo, tem-se como indispensável a realização de intensas reflexões e profundos estudos sobre o verdadeiro dilema da vocação do Estado fiscal: manter um sistema de litígio contínuo ou construir um sistema perene de cooperação tributária. A Emenda n. 132/2023, ao alçar a cooperação tributária a uma posição de princípio constitucional, indicou claramente a opção por esse último caminho.

Referências

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TÔRRES, Heleno Taveira. Direito constitucional tributário e segurança jurídica. 2. ed. São Paulo: RT, 2012.

1 “Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:

[...]

§ 3º O Sistema Tributário Nacional deve observar os princípios da simplicidade, da transparência, da justiça tributária, da cooperação e da defesa do meio ambiente. (Incluído pela Emenda Constitucional n. 132, de 2023)”

2 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 83.

3 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 86.

4 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 154.

5 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 8. ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 2.

6 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 8. ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 2.

7 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 8. ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 3.

8 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 7. ed. São Paulo: Noeses, 2018, p. 16.

9 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 7. ed. São Paulo: Noeses, 2018, p. 44.

10 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 94.

11 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 781-782.

12 Vale trazer à baila a concepção de bem jurídica de Humberto Ávila, para quem “os bens jurídicos são situações, estados ou propriedades essenciais à promoção dos princípios jurídicos” (ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 143).

13 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2021, p. 367.

14 “Art. 21. Não sendo cumprida nem impugnada a exigência, a autoridade preparadora declarará a revelia, permanecendo o processo no órgão preparador, pelo prazo de trinta dias, para cobrança amigável. (Redação dada pela Lei n. 8.748, de 1993)

§ 3º Esgotado o prazo de cobrança amigável sem que tenha sido pago o crédito tributário, o órgão preparador declarará o sujeito passivo devedor remisso e encaminhará o processo à autoridade competente para promover a cobrança executiva.”

15 “Art. 43. A decisão definitiva contrária ao sujeito passivo será cumprida no prazo para cobrança amigável fixado no artigo 21, aplicando-se, no caso de descumprimento, o disposto no § 3º do mesmo artigo.”

16 “Art. 23. Far-se-á a intimação:

I – pessoal, pelo autor do procedimento ou por agente do órgão preparador, na repartição ou fora dela, provada com a assinatura do sujeito passivo, seu mandatário ou preposto, ou, no caso de recusa, com declaração escrita de quem o intimar;

II – por via postal, telegráfica ou por qualquer outro meio ou via, com prova de recebimento no domicílio tributário eleito pelo sujeito passivo;

III – por meio eletrônico, com prova de recebimento, mediante:

a) envio ao domicílio tributário do sujeito passivo; ou

b) registro em meio magnético ou equivalente utilizado pelo sujeito passivo.

[...]

§ 4o Para fins de intimação, considera-se domicílio tributário do sujeito passivo:

I – o endereço postal por ele fornecido, para fins cadastrais, à administração tributária; e

II – o endereço eletrônico a ele atribuído pela administração tributária, desde que autorizado pelo sujeito passivo.

§ 5o O endereço eletrônico de que trata este artigo somente será implementado com expresso consentimento do sujeito passivo, e a administração tributária informar-lhe-á as normas e condições de sua utilização e manutenção.”

17 “Tributário. Processual civil. Processo administrativo fiscal. Ordem de preferência. Intimação postal. Domicílio fiscal eleito pelo contribuinte. Legalidade. Notificação por edital. Tentativa frustrada da realizada por carta.

1. Inexiste ordem de preferência para a intimação regular do sujeito passivo, podendo ocorrer pessoalmente ou via postal, sendo necessária apenas a comprovação de que a correspondência foi entregue no domicílio fiscal eleito pelo contribuinte. Precedentes.

2. O entendimento do STJ é no sentido de que, no âmbito do processo administrativo fiscal, a citação por edital é legal nos casos em que a realizada anteriormente por carta for infrutífera.

3. Agravo interno não provido.” (AgInt no AREsp n. 1.686.708/RJ, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 06.12.2021, DJe 09.12.2021)

No mesmo sentido: AgInt no REsp n. 1.660.549/SC, DJe 24.04.2020; AgInt nos EDcl no AREsp n. 820.445/MG, DJe 02.08.2019; AgInt no REsp n. 1.597.492/SP, DJe 18.12.2017; REsp n. 1.561.153/RS, DJe 24.11.2015; AgRg no REsp n. 1.406.529/PR, DJe 06.08.2014.

18 O tema relativo ao dinamismo e a plurissignificação da linguagem jurídica encontra-se magistralmente desenvolvido por Carlos Maximiliano (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense).

19 “Processual civil e tributário. Crédito tributário. Suspensão. Art. 151 do CTN. Rol taxativo. Consulta. Não inclusão. Multa. Responsabilidade. Prequestionamento. Ausência.

1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o art. 151 do CTN prevê um rol taxativo ao apresentar as hipóteses em que há a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, no qual não está incluso o procedimento de consulta fiscal.

2. [...]

3. [...]

4. Agravo interno improvido.” (AgInt no AgInt no AREsp n. 1.281.008/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 13.03.2023, DJe 15.03.2023)

No mesmo sentido: REsp n. 1.646.725/CE, DJe 27.04.2017; AgRg no AgRg no REsp n. 747.383/SC, DJ 24.08.2006.

20 TÔRRES, Heleno Taveira. Direito constitucional tributário e segurança jurídica. 2. ed. São Paulo: RT, 2012, p. 132.

21 Diante da especificidade do presente estudo não é o caso de traçar uma abordagem sobre as críticas acerca da impropriedade técnica da opção legislativa pelo termo “lançamento por homologação”, na linha desenvolvida, por exemplo, por Luciano Amaro (AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 393-399).

22 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 41. ed. São Paulo: Malheiros, 2020, p. 182.

23 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 41. ed. São Paulo: Malheiros, 2020, p. 182.

24 O termo possui sentido próprio na Lei n. 9.784/1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal; e na Lei n. 8.987/1995, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos.

25 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 462.

26 “Art. 44. Nos casos de lançamento de ofício, serão aplicadas as seguintes multas:

I – de 75% (setenta e cinco por cento) sobre a totalidade ou diferença de imposto ou contribuição nos casos de falta de pagamento ou recolhimento, de falta de declaração e nos de declaração inexata; (Vide Lei n. 10.892, de 2004) (Redação dada pela Lei n. 11.488, de 2007)

II – de 50% (cinquenta por cento), exigida isoladamente, sobre o valor do pagamento mensal:

[...]”

27 “Art. 18. O lançamento de ofício de que trata o art. 90 da Medida Provisória no 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, limitar-se-á à imposição de multa isolada em razão de não homologação da compensação quando se comprove falsidade da declaração apresentada pelo sujeito passivo. (Redação dada pela Lei n. 11.488, de 2007)”

28 “Art. 74. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão.”

29 “Art. 74 [...] § 15. Será aplicada multa isolada de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor do crédito objeto de pedido de ressarcimento indeferido ou indevido. (Incluído pela Lei n. 12.249, de 2010) (Revogado pela Lei n. 13.137, de 2015)”

30 “Art. 74 [...] § 17. Será aplicada multa isolada de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor do débito objeto de declaração de compensação não homologada, salvo no caso de falsidade da declaração apresentada pelo sujeito passivo. (Redação dada pela Lei n. 13.097, de 2015)”