A Eficácia do Conceito de “Beneficiário Efetivo” como Instrumento de Prevenção da Evasão Fiscal nas Convenções Internacionais para evitar a Bitributação

Vinicius Feliciano Tersi

Mestrando em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo.

Resumo

O objetivo deste estudo é tratar da evolução doutrinária e jurisprudencial do conceito de “beneficiário efetivo”, adotado nos artigos sobre dividendos, juros e royalties das convenções para evitar a bitributação, como medida para evitar o mau uso dessas convenções em operações de evasão fiscal internacional. Será tratado o surgimento da expressão, sua adoção pela Convenção Modelo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e sua difusão com diferentes significados na legislação interna de vários Estados, inclusive do Brasil. O estudo conclui que o conceito de “beneficiário efetivo” é útil para tratar de determinadas situações de aplicação das convenções, mas não como medida geral para coibir práticas de evasão fiscal. Cabe, entretanto, à OCDE esclarecer a relação entre o conceito e abordagens interpretativas em bases econômicas ou de substância sobre a forma.

Palavras-chave: beneficiário efetivo, convenções de bitributação, OCDE, dividendos, juros, royalties.

Abstract

This paper aims to deal with the evolution of the literature and jurisprudence on the “beneficial ownership” concept, adopted in the dividends, interests and royalties provisions of double taxation agreements, as a measure to avoid the foul use of those agreements for international tax avoidance. The origin of the expression “beneficial ownership”, its introduction in the Model Convention of the Organization for the Economic Cooperation and Development (OECD) and its widespread diffusion with different meanings in the domestic tax legislation of various countries, including Brazil, will be analyzed. The paper concludes that the “beneficial ownership” concept is useful in order to deal with some situations for the enforcement of the agreements, but not as a general measure to inhibiting tax avoidance practices. It is necessary, though, that the OECD clarify the relation between the beneficial ownership concept and the economic and substance-over-form interpretative approaches.

Keywords: beneficial ownership, double taxation agreements, OECD, dividends, interests, royalties.

Introdução

O presente estudo se destina a tratar da evolução doutrinária e jurisprudencial do conceito de “beneficiário efetivo”. Esse conceito é adotado nos artigos sobre dividendos, juros e royalties das convenções para evitar a bitributação, como medida para evitar o mau uso dessas convenções em operações de evasão, elisão ou elusão fiscal internacional.

Este estudo tratará das operações ocorridas por meio de treaty shopping, aceita como premissa a definição de que o treaty shopping ocorre quando alguém, através da interposição de uma pessoa, obtém a proteção de uma convenção de bitributação, de outro modo indevida, com o único e exclusivo intuito de obter vantagens fiscais. Dessa forma, o treaty shopping pressupõe uma estrutura envolvendo três ou mais pessoas e/ou entidades que, associadas, obtêm a vantagem fiscal mencionada.

Será tratado o surgimento da expressão “beneficiário efetivo”, sua adoção pela Convenção Modelo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e sua difusão com diferentes significados na legislação interna de vários Estados, inclusive do Brasil. Também será analisada a experiência internacional de alguns países, comparada com o conceito defendido pela OCDE.

O objetivo é poder apontar até que ponto o conceito de “beneficiário efetivo” é útil para tratar de situações de aplicação das convenções, e até que ponto deve ser combinado com abordagens interpretativas mais recentes, de cunho econômico ou de essência sobre a forma. Essas abordagens, além do uso do conceito de beneficiário efetivo como norma geral antiabusiva por alguns países, tem tornado a interpretação bastante contraditória em algumas situações, de forma a não ser claro até que ponto uma estrutura é legítima.

O texto buscará identificar os pontos em que a interpretação da OCDE carece de profundidade. A partir do estudo da interpretação do conceito por diversas jurisdições e sua comparação com a disciplina da OCDE, pretende-se saber em que medida os esclarecimentos da OCDE sobre a interpretação do conceito, ainda em fase de discussão de propostas, merecem ser expandidos.

1. O Conceito de Beneficiário Efetivo para a OCDE

1.1. Origem e introdução na Convenção Modelo da OCDE de 1977

O conceito de “beneficiário efetivo” não tem origem no Direito Tributário Internacional, mas na legislação inglesa sobre trusts. A “propriedade legal” (legal ownership) dos bens atribuídos a um trust pertenceria ao trustee, mas este mantém essa propriedade em benefício do fundador do trust (settlor) ou de outros beneficiários. Esses seriam os beneficiários efetivos, com os “benefícios da propriedade” (beneficial ownership) dos bens atribuídos ao trust.1

Não foi esse aspecto de direito privado, entretanto, que motivou a inserção da expressão “beneficiário efetivo” nas convenções internacionais de bitributação. O fato teria decorrido da legislação tributária doméstica do Reino Unido dos anos 1960. Essa legislação previa que, quando um trustee residente no Reino Unido recebesse de fonte estrangeira um rendimento devido a um não residente, o trustee não seria tributado. O trustee era um contribuinte do Reino Unido, sujeito à tributação de seus próprios rendimentos, mas, na posição de intermediário recebedor de rendimento em favor de terceiro, era justificável que o trustee não fosse tributável. Temeu-se que essa permissão da legislação doméstica ao trustee criasse uma brecha na aplicação das convenções internacionais, em que o trustee, agindo como intermediário, buscasse os benefícios da convenção com base em sua titularidade jurídica ao rendimento.2

Kees van Raad comenta outro dispositivo da mesma legislação inglesa. Por essa legislação, o residente no Reino Unido, agindo como fiduciário (agente ou mandatário - agente or nominee) de terceiro (pessoa residente ou não no Reino Unido), seria tributado no Reino Unido pelo rendimento a ser repassado ao terceiro, como se esse rendimento fosse de fonte local (e não estrangeira). No contexto da Convenção Modelo da OCDE de 1963, esse intermediário seria um residente no Reino Unido, e o Estado da Fonte aplicaria a convenção com o Reino Unido mesmo que o terceiro fosse residente em outro Estado.3

Ambos os casos, portanto, tratam da situação de intermediários que poderiam se beneficiar de convenções celebradas pelo Reino Unido agindo em favor de terceiros não residentes. A expressão “beneficiário efetivo” foi inicialmente introduzida no protocolo de 1966 à convenção de bitributação de 1945 entre os Estados Unidos e o Reino Unido, a pedido dos ingleses, para os artigos referentes a dividendos, juros e royalties. A expressão seria utilizada novamente na convenção de 1967 entre o Reino Unido e os Países Baixos, para as mesmas situações. Dessa forma, visava-se a que os benefícios dessas convenções fossem aplicados à relação jurídica entre o pagador do rendimento e o principal ou mandante, e não na relação jurídica com o intermediário.4

No ano seguinte, 1968, o tema recebeu a atenção da OCDE, dentro das discussões sobre as modificações à Convenção Modelo de 1963. A preocupação dos membros da organização foi a possível extensão dos efeitos das convenções a agentes ou mandatários somente por conta de sua titulação jurídica ao rendimento. Isso era especialmente preocupante por conta de alguns artigos do Modelo serem aplicados a quem fossem pagos os rendimentos, situação desses intermediários.5

A delegação do Reino Unido havia proposto inicialmente (novembro de 1968) que se considerasse beneficiário da convenção quem estivesse “sujeito à tributação” (subject to tax), mas posteriormente (junho de 1969) a proposta foi abandonada, sob o argumento de que contrariaria o espírito da Convenção Modelo.6 Foram então propostas duas alternativas, a segunda delas dizendo que os benefícios dos artigos de dividendos, juros e royalties se restringissem aos “beneficiários efetivos” (beneficial owners). Essa segunda proposta foi aceita em fevereiro de 1970 e incluída na Convenção Modelo de 1977, e os Comentários à Convenção Modelo de 1977 também trataram da questão do intermediário expressamente.7 Cabe destacar que o termo foi incluído nos artigos sobre dividendos, juros e royalties (artigos 10, 11 e 12), mas não nos artigos sobre ganhos de capital (artigo 13) e sobre outros rendimentos (artigo 21). Isso ocorre porque, nesses dois últimos artigos, não se menciona a aplicação do benefício mediante pagamento do rendimento, como nos demais.8

Kees van Raad9 observou a ironia de que outra alteração à Convenção Modelo de 1977, não relacionada, teria resolvido o problema da legislação inglesa sem a necessidade de um conceito de beneficiário efetivo. Uma sentença introduzida no artigo 4º, parágrafo 1, da Convenção Modelo disse que o termo “residente de um Estado Contratante” não incluiria uma pessoa sujeita à tributação (liable to tax) apenas quanto ao rendimento de fontes naquele Estado ou de capital ali situado.

O que fica claro do estudo desse histórico é o propósito original dos autores da Convenção Modelo da OCDE de 1977 de esclarecer que intermediários com algum tipo de direito de propriedade não seriam reconhecidos como os beneficiários (recipients) da renda para fins de determinar a alíquota de retenção aplicável, mas sim a situação dos terceiros a que representassem.10

Collier menciona críticas de que o maior problema do conceito de beneficiário efetivo, decorrente desse momento, foi não identificar quem seria o beneficiário, nem os critérios para identificá-lo, mas apenas dizer quem o beneficiário não seria. O autor entende, porém, ser compreensível a omissão, dado o fato de que o escopo da expressão naquele momento era apenas excluir os agentes e mandatários do contexto da convenção.11

1.2. Evolução do conceito nas interpretações da OCDE

1.2.1. O Relatório de 1986 sobre conduit companies

No Relatório da OCDE sobre empresas-veículo (conduit companies), o tema do beneficiário efetivo foi revisitado sob a perspectiva do uso impróprio das convenções de bitributação. O relatório considerou “impróprio” que uma pessoa agisse por meio de uma entidade legal criada basicamente com o objetivo de aproveitar os benefícios de uma convenção de bitributação que de outra forma estariam indisponíveis. Foi no contexto de solucionar esse problema de treaty shopping que o conceito de beneficiário efetivo foi novamente tratado.12

O relatório ampliou o escopo inicial do conceito na forma como tratado no Comentário ao artigo 10 da Convenção Modelo de 1977. Ali se entendeu que o conceito de beneficiário efetivo não seria aplicável apenas à situação do agente ou mandatário, mas também a outros casos em que uma pessoa contrata ou contrai obrigações de forma a manter uma função similar à de um agente ou mandatário. Uma empresa-veículo, nesse sentido, não seria considerada um beneficiário efetivo se, mesmo proprietária formal de determinados bens, tivesse poderes limitados que lhe dessem o papel de mera fiduciária ou administradora agindo em favor de terceiros interessados, provavelmente os sócios ou acionistas da empresa-veículo.13

O relatório assumiu, entretanto, que o fato de uma companhia ter como única função a de manter ativos ou direitos (como é o caso de uma holding) seria insuficiente por si só para esse fim, somente um indício para qualificá-la como intermediária. Seria necessário, nesse sentido, procurar também informações sobre os sócios ou acionistas da companhia, a relação da companhia com seus sócios e demais interessados e, principalmente, o processo de tomada de decisões da companhia.14

Assim, o relatório concluiu que a Convenção Modelo de 1977 era vulnerável ao uso de empresas-veículo, e o teste do beneficiário efetivo era uma resposta insuficiente a esse fenômeno. O relatório faz menção a considerar outras abordagens, mas não parece tentar interpretar o conceito de beneficiário efetivo de forma a servir como regra ampla para evitar o treaty shopping.15

1.2.2. Os trabalhos dos anos 1990: a alteração de 1995 à Convenção Modelo e aos Comentários e o Relatório de 1999 sobre partnerships

Foi alterada, em 1995, a redação da Convenção Modelo, visando a garantir o direito do sócio ou acionista destinatário do pagamento de dividendos aos benefícios da convenção mesmo se recebesse o valor por meio de um agente ou mandatário. Nesse sentido, a redação foi alterada do original (if the recipient is the beneficial owner of the dividends) para outra redação mais explícita (if the beneficial owner of the dividends is a resident). O Comentário à Convenção Modelo foi também alterado de acordo, e sua redação reformada não foi controversa.16

Por sua vez, o Relatório sobre a aplicação da Convenção Modelo às partnerships,17 de 1999, trata de uma hipótese em que os membros de uma partnership seriam os beneficiários efetivos dos rendimentos atribuídos à entidade. Ali é sugerido um teste para identificar o beneficiário efetivo de convenção com a legislação do Estado em que a partnership for estabelecida, mas não há maior esclarecimento sobre como o teste deveria ser realizado ou quais critérios deveriam ser observados ao fazê-lo.18

1.2.3. As alterações de 2003 ao Comentário à Convenção Modelo da OCDE

O Comentário à Convenção Modelo da OCDE recebeu alterações em 2003 referentes ao conceito de beneficiário efetivo, com consequências substanciais. Foi introduzido um comentário aos artigos 10, 11 e 12 no sentido de que o termo “beneficiário efetivo” não deveria ser usado em um sentido técnico estreito, mas deveria ser compreendido em seu contexto e à luz do objeto e propósito da convenção, inclusive para evitar a bitributação e prevenir a evasão fiscal.19

A alteração ao Comentário, entretanto, foi além, para incorporar o conceito de beneficiário efetivo anteriormente apresentado pelo relatório de 1986 sobre empresas-veículo. De acordo com Collier, pode ser argumentado que esta emenda ao Comentário à Convenção Modelo tenha tornado mais latente a incerteza sobre o sentido do conceito de beneficiário efetivo:20

“Where an item of income is received by a resident of a Contracting State acting in the capacity of agent or nominee it would be inconsistent with the object and purpose of the Convention for the State of source to grant relief or exemption merely on account of the status of the immediate recipient of the income as a resident of the other Contracting State. The immediate recipient of the income in this situation qualifies as a resident but no potential double taxation arises as a consequence of that status since the recipient is not treated as the owner of the income for tax purposes in the State of residence. It would be equally inconsistent with the object and purpose of the Convention for the State of source to grant relief or exemption where a resident of a Contracting State, otherwise than through an agency or nominee relationship, simply acts as a conduit for another person who in fact receives the benefit of the income concerned. For these reasons, the [Conduit Companies Report] concludes that a conduit company cannot normally be regarded as the beneficial owner if, though the formal owner, it has, as a practical matter, very narrow powers which render it, in relation to the income concerned, a mere fiduciary or administrator acting on account of the interested parties (paragraph 12.1).” (Redação do original, destaques nossos)21

Os Comentários passaram a dispor, como se pode perceber, que a interpretação deveria ir além da relação formal de agência ou mandato e incluir conceitos mais subjetivos, como os destacados na citação (“pessoa que de fato recebe o benefício da renda em questão” ou “de maneira prática”, em tradução livre). De acordo com Collier,22 os termos “benefício” (benefit) e “de forma prática” poderiam ser interpretados em termos econômicos em vez de jurídicos, uma inovação em relação ao sentido original do Comentário. O Comentário tampouco oferece critérios para determinar o que deve ser entendido como benefício e que elementos “práticos” devam ser levados em consideração.

Por outro lado, alguns termos jurídicos foram preservados. As referências aos “poderes muito limitados (...) em relação ao rendimento em questão” (tradução livre) parecem denotar uma perspectiva jurídica. Assim, entende Collier,23 apesar da maior subjetividade e incerteza quanto ao teste do beneficiário efetivo, criar um padrão materialmente diferente do anterior não parece ter sido a intenção da OCDE. A referência aos agentes e mandatários sempre teria sido feita como um exemplo de intermediário, de forma a, funcional e legalmente, outras circunstâncias correspondentes a esses exemplos serem abrangidas.

Pelo entendimento de Collier,24 uma mudança para uma perspectiva econômica teria feito mais sentido se uma explicação mais delongada de um teste econômico fosse apresentada. Fosse essa a via escolhida, a referência aos agentes e mandatários seria inadequada para o escopo mais largo de um teste econômico. Ademais, teria sido contraditório adotar o entendimento do relatório de 1986 sobre empresas-veículo como um teste econômico, pois o próprio relatório concluiu que o conceito de beneficiário efetivo não seria uma resposta adequada aos problemas de empresas-veículo.

1.2.4. O trabalho da OCDE sobre veículos de investimento coletivo

O Relatório de 2010 sobre veículos de investimento coletivo, como fundos de investimento, discutiu se esses veículos, quando detidos amplamente (isto é, quando um investidor detiver uma grande participação no veículo), deveria ser considerado beneficiário efetivo da renda de seus investimentos. As conclusões do relatório foram de que, satisfeita a qualificação como “pessoa” e “residente” dentro da convenção e da legislação local, o veículo de investimento coletivo seria o beneficiário efetivo caso os administradores do veículo tenham poderes discricionários para investir os ativos do veículo em favor dos investidores. O raciocínio utilizado foi o de que o investidor não deve ter direito sobre ativos específicos do veículo, nem a renda de um ativo específico deve ser atribuída a um investidor em particular.25

O aspecto surpreendente dessa conclusão, na visão de Collier,26 é sua ênfase na situação dos ativos do veículo de investimento coletivo. A redação da Convenção Modelo de 1977 e das alterações de 2003 tratam dos poderes do intermediário em relação ao rendimento analisado. Assim, seria de se cogitar que a situação do rendimento, e não dos ativos, nas mãos dos administradores deveria ter sido o foco da discussão. Isso é especialmente verdadeiro em relação às obrigações de remeter rendimentos aos investidores do veículo.

Mudanças no Comentário com relação aos veículos de investimento coletivo foram incluídas na atualização da Convenção Modelo de 2010. Não há grandes mudanças no Comentário aos artigos 10, 11 e 12. No Comentário ao artigo 1º, entretanto, foi inserida menção à variedade de entidades utilizadas como veículos de investimento coletivo, levando à conclusão de que os Estados devem esclarecer como a convenção bilateral se aplica a esses veículos.27

A respeito do tema do beneficiário efetivo, a nova redação do Comentário repete o Relatório de 2010: se o administrador do veículo de investimento coletivo tiver poderes discricionários de administração sobre os recursos do veículo, o veículo será o beneficiário efetivo, mesmo se determinado investidor tiver uma grande participação. O próprio Comentário, porém, admite que o raciocínio trata de uma disciplina geral, e sua aplicação a um veículo de investimento coletivo específico pode não ser clara. Isso enfraquece a própria posição do Comentário. A decisão é relegada aos próprios Estados, na negociação bilateral, o que não garante uma solução geral, enfraquece a defesa de uma interpretação autônoma da convenção e possibilita o uso de convenções diferentes para treaty shopping.28

Esses elementos, portanto, fazem com que, na visão de Collier,29 o Relatório de 2010 não seja realmente elucidativo a respeito do conceito de beneficiário efetivo. Isso é ainda mais relevante dado que o raciocínio adotado para os veículos de investimento coletivo não corresponde à mesma lógica que pautou a interpretação da OCDE sobre os artigos 10, 11 e 12 até então. Houve, em suma, aumento da insegurança jurídica a respeito da aplicação desses dispositivos da Convenção Modelo.

1.2.5. Os esclarecimentos de 2011 sobre o conceito de beneficiário efetivo

Um esclarecimento da OCDE sobre o conceito de beneficiário efetivo, com vistas de atualizar o Comentário à Convenção Modelo, foi anunciado desde o final de 2008, e trabalhos sobre o tópico foram desenvolvidos pelo Grupo de Trabalho 1 do Comitê de Assuntos Fiscais da organização.30 Houve, até o momento, dois relatórios preliminares, em abril de 2011 e outubro de 2012,31 os quais apresentaram quatro principais mudanças ao Comentário aos artigos 10, 11 e 12 da Convenção Modelo:

a) ênfase adicional em explicar o propósito original do termo “beneficiário efetivo” e sua interpretação face à legislação interna (parágrafo 12.1);

b) descrição do conceito de beneficiário efetivo (parágrafo 12.4);

c) interação do teste do beneficiário efetivo com outras medidas antielisivas (parágrafo 12.5);

d) esclarecimento do escopo do conceito nas convenções de bitributação (parágrafo 12.6).

Com relação ao propósito original do termo “beneficiário efetivo”, seria expresso que este foi introduzido para resolver dificuldades na aplicação dos artigos 10, 11 e 12 da Convenção Modelo ao pagamento de rendimento a um residente. Pretende-se também explicar que o termo carece de significado preciso na legislação interna de vários países, não devendo ser tomado, portanto, no sentido técnico de qualquer legislação doméstica.

Quer-se acrescentar ainda, como exemplo, a previsão de que o trustee (ou o trust, se considerado o contribuinte) pode ser o beneficiário efetivo do dividendo recebido mesmo que o Direito privado local não o qualifique como beneficiário efetivo.32 Dito de outra forma por Collier,33 a OCDE pretende explicitar que o termo “beneficiário efetivo” deveria ser interpretado como pertencente ao contexto da convenção na forma do artigo 3º, parágrafo 2º, da Convenção Modelo, afastando-se o conceito de Direito interno em favor da orientação do Comentário da OCDE.

A primeira versão continha, ainda, um trecho em que se dizia que a legislação doméstica não deveria ser totalmente desconsiderada caso estivesse coerente com a orientação geral do Comentário da OCDE. Esse trecho foi objeto de crítica nas discussões públicas, como contraditório com o restante do tema sobre a aplicação das convenções ou ser possível brecha para que houvesse uma alternativa entre adotar a interpretação autônoma ou a interpretação com base no Direito interno. Por esse motivo, o trecho foi eliminado.34

A respeito do conceito de “beneficiário efetivo”, o Comentário manteria a noção anterior de que uma empresa-veículo não seria o beneficiário efetivo se tiver “poderes muito limitados” sobre o rendimento. A primeira versão do relatório previu que os intermediários não têm o direito completo (full right) de uso e fruição do rendimento, enquanto o beneficiário efetivo não está restrito por qualquer obrigação contratual ou legal de “repassar o pagamento” do rendimento (passing on income). Na segunda versão, aceitou-se que o termo “direito completo” criaria problemas para a qualificação dos trusts como beneficiários efetivos, e a expressão foi abandonada em favor de redação mais simples. Foi expresso apenas que os intermediários têm seu uso e fruição do rendimento restringidos por obrigações legais e contratuais de “repassar o pagamento”, sem referência a um “direito completo”.35

A segunda versão acrescentou, ainda, esclarecimento sobre o que se entende por “obrigações legais e contratuais”. Essas seriam, para análise do beneficiário efetivo, apenas as diretamente relacionadas ao pagamento. Obrigações não relacionadas ao pagamento, mesmo que efetivamente o rendimento seja utilizado para adimpli-las, não desqualificariam o contribuinte como beneficiário efetivo. Exemplos apresentados disso são as obrigações que o recebedor possa ter como devedor ou parte de transações financeiras, ou típicas obrigações dos planos de pensão ou dos veículos de investimento coletivo de repassar os rendimentos a seus beneficiários.36

Reconhecer o beneficiário efetivo seria normalmente possível mediante análise da documentação, mas o Comentário admite que “fatos e circunstâncias” possam mostrar, “em substância”, que o recebedor está restrito pelas obrigações mencionadas. Weterings, comentando a primeira versão, entende que isso permitiria uma abordagem de substância sobre a forma do conceito de beneficiário efetivo,37 mas de fato nenhuma versão da proposta menciona essa possibilidade.

Para dividendos, a primeira versão também enfatizava que o teste se aplica sobre o rendimento, e não sobre o bem ou direito do qual o rendimento deriva. A segunda versão, para contemplar a situação de legislações em que essa segregação é impossível, preferiu apenas mencionar que o artigo 10 se refere ao beneficiário efetivo do dividendo, e não das ações, as quais podem ter titulares diferentes.38

Quanto à interação do teste de beneficiário efetivo com outras medidas antiabusivas, ser o beneficiário efetivo, na visão da OCDE, não excluiria o afastamento da convenção de bitributação por outros meios. A proposta admite, inclusive, que normas gerais antiabusivas ou abordagens com base em substância sobre a forma ou de substância econômica sejam utilizadas para detectar práticas de treaty shopping. O teste de beneficiário efetivo, portanto, não restringiria a adoção de outras normas ou abordagens.39

As alterações, entretanto, não dizem se o contrário seria verdadeiro, ou seja, se o teste do beneficiário efetivo pode ser usado como uma forma de cláusula geral antiabusiva pelas autoridades fiscais.40 Essa preocupação, apesar de relatada na segunda versão da proposta de alteração, não foi aceita pelo Grupo de Trabalho, sob o entendimento de que um beneficiário efetivo não poderia estar imune à aplicação de outras normas antiabuso. Por isso, a redação da proposta não foi alterada nesse aspecto.41 No mais, a proposta diz que o conceito ainda pode ser invocado como norma antiabusiva em casos limitados, nos quais o recebedor tenha obrigação de repassar o dividendo a outrem, mas o teste do beneficiário efetivo, na visão da proposta, não lida com outros casos de treaty shopping.42

Weterings43 aduz que a redação poderia gerar problemas de interpretação na comparação com outro dispositivo, introduzido no Comentário em 2003 (parágrafo 9.5 do Comentário ao artigo 1º). Esse dispositivo diz que os benefícios de uma convenção não devem ser estendidos ao interessado quando o propósito principal de determinadas transações ou operações for assegurar tratamento fiscal mais favorável em circunstâncias contrárias ao objeto e propósito das disposições relevantes. Esse dispositivo é chamado por Weterings44 de princípio orientador (guiding principle).

Seria concebível, para Weterings,45 a interpretação de que uma entidade interposta passe no teste do beneficiário efetivo, mas mesmo assim o Estado da Fonte considere que a situação não satisfaz o princípio orientador, negando o benefício da convenção. Como o princípio orientador não tem um teste, tornar-se-ia possível que um dispositivo específico da convenção permita o benefício, mas este seja negado por uma regra mais geral.

Weterings46 entende, entretanto, que a previsão na proposta de que o conceito de beneficiário efetivo cobre apenas algumas situações de treaty shopping denotaria que o princípio orientador se aplica a outros elementos do fato analisado. Isso afastaria o risco de que múltiplas disposições antiabuso sejam aplicadas sobre a mesma situação.

Por fim, a proposta acrescenta informação de que o conceito de “beneficiário efetivo” utilizado na aplicação do benefício das convenções não deve ser confundido com o conceito de “beneficiário efetivo” utilizado para na busca do último controlador de ativos e entidades, como é o caso da legislação de lavagem de dinheiro. Essa referência não esclarece o conceito de “beneficiário efetivo” para fins tributários, mas é útil por demonstrar que a aplicação da convenção trata da situação de um contribuinte específico, e não para identificar quem, além do contribuinte, seria o real detentor dos bens ou direitos.47

1.3. Conclusões

O termo “beneficiário efetivo” foi incluído na Convenção Modelo da OCDE para esclarecer quem seria o destinatário dos benefícios negociados nos casos em que o conceito de residente, definido no artigo 3º, seria insuficiente. Essa é a situação dos artigos 10, 11 e 12 (sobre dividendos, juros e royalties, respectivamente), por ser disposto o benefício em função do pagamento do rendimento a determinada pessoa. Havia, nesse contexto, a dúvida a respeito da posição dos intermediários (agentes ou mandatários), quando recebessem o pagamento em favor de um terceiro (principal ou mandante).

A ligação entre o conceito de beneficiário efetivo e a qualificação do contribuinte como “pessoa residente” para fins de aplicação da convenção permite conceber o conceito de beneficiário efetivo como algo implícito em todos os dispositivos da Convenção Modelo. Nesses termos, como defende Rothmann, seria desnecessária previsão expressa do termo nas convenções internacionais de bitributação.48

Houve, por esse motivo, a preocupação de estabelecer um conceito negativo de beneficiário efetivo. Como o propósito original da utilização da expressão foi apenas negar os benefícios da convenção aos intermediários, esse se mostrou um conceito suficiente para as situações práticas previstas pela norma.

A partir de 1986, a OCDE passou a reconhecer situações de interposição de empresas-veículo. Constituídas para permitir operações específicas de treaty shop­ping, entendeu-se por bem negar-lhes os benefícios das convenções pelo alargamento do conceito de beneficiário efetivo. Para tanto, situações envolvendo empresas-veículo tornaram-se análogas à condição do intermediário, justificando-se a extensão do conceito de beneficiário efetivo para essas situações.

Nesse novo contexto, não mais bastou o uso de um conceito negativo para obtenção de segurança jurídica. Tornou-se necessário o uso de algum método de analogia para equiparar uma pessoa ou entidade à condição de um intermediário, o que exigia um conceito positivo de beneficiário efetivo.

A carência de um conceito positivo de beneficiário efetivo tornou-se um item de atenção após a incorporação desses entendimentos da OCDE no próprio Comentário à Convenção Modelo, em 2003. Observou-se nesse período uma mudança qualitativa nas práticas das autoridades fiscais de diferentes países, procurando preencher a lacuna gerada pela indefinição do conceito de beneficiário efetivo na Convenção Modelo da OCDE.

O fato motivou uma mudança de rumo por parte da OCDE, vista nas propostas de alteração do Comentário à Convenção Modelo. Pelo que se pode perceber, a postura da OCDE tem evoluído na direção da adoção das seguintes premissas:

a) interpretação autônoma do conceito de beneficiário efetivo, conforme a redação e o contexto de cada convenção, em detrimento da interpretação conforme a legislação doméstica do Estado da Fonte;

b) utilização do conceito de beneficiário efetivo como teste para determinar se uma pessoa não é o beneficiário efetivo e, por isso, não tem direito aos benefícios de uma convenção específica, e não para descobrir quem seria o beneficiário final do rendimento analisado;

c) definição de quem não seja o beneficiário efetivo como quem tem o uso e fruição do rendimento analisado restringido por obrigações legais ou contratuais de repassar o pagamento da renda a terceiro;

d) restrição das obrigações legais ou contratuais apenas àquelas diretamente relacionadas com o pagamento do rendimento, e não a obrigações típicas da entidade recebedora do rendimento ou obrigações concomitantes com o pagamento, mas indiretamente relacionadas;

e) não concorrência do uso do conceito de beneficiário efetivo com normas gerais antiabusivas ou abordagens de prevenção ao treaty shopping por meio de substância sobre a forma ou noções econômicas de fluxos de pagamentos.

O entendimento acima, atualmente defendido nas discussões do Comitê de Assuntos Fiscais da OCDE apresenta uma lacuna importante. A proposta de alteração do Comentário à Convenção Modelo reconhece que o conceito de beneficiário efetivo não seria a panaceia para tratar de todos os conflitos de treaty shop­ping. Não foi apresentada, porém, posição clara no sentido de saber se o conceito de beneficiário efetivo deve ser interpretado sob uma perspectiva econômica ou de substância sobre a forma, ou se essas perspectivas devam ser recusadas.

Essa omissão permite, em certa medida, florescerem diferentes noções sobre a aplicação do conceito de beneficiário efetivo. O propósito do próximo capítulo é justamente identificar, pela comparação da experiência de alguns países, como as autoridades fiscais e os órgãos julgadores tratam o conceito de beneficiário efetivo. Essas experiências demonstram que a omissão apontada dá considerável liberdade de ação para interpretação do conceito, inclusive em termos contrários às premissas da OCDE.

2. O Conceito de Beneficiário Efetivo à Luz da Doutrina e da Jurisprudência Internacional

2.1. O conceito de beneficiário efetivo sob as visões jurídica, econômica e de substância sobre a forma

Collier49 argumenta que as discussões da OCDE até 2010, tomadas isoladamente, não explicam totalmente a preocupação com o conceito de beneficiário efetivo. Afinal, mesmo que o sentido do conceito não seja claro, a motivação para o emprego da expressão “beneficiário efetivo” e seu propósito nas convenções de bitributação sempre foi determinado. Seria difícil perceber, a partir desse cenário, por que o conceito se tornou problemático.

O problema do conceito de beneficiário efetivo deriva, basicamente, da prática das autoridades fiscais e judiciais de países diferentes. As autuações das autoridades fiscais sobre a aplicabilidade das convenções, principalmente para holdings, têm se intensificado recentemente, e os casos judiciais já decididos não apresentam respostas uniformes às questões mais relevantes para a determinação do beneficiário efetivo.50

Mais importante, Collier51 nota uma mudança substancial na abordagem das autoridades fiscais de diversos países nos dez anos entre 2001 e 2011 (ou seja, antes e depois da alteração da redação do Comentário em 2003), com uma predileção por fundamentações mais econômicas do que jurídicas das autuações. As autuações por parte das autoridades fiscais fora de um conceito propriamente jurídico do termo “beneficiário efetivo” tendem a assumir uma de duas abordagens:52

a) Testes de substância econômica: um dos tipos de autuação questiona a substância física do investidor direto (instalações físicas, número de empregados, entre outros critérios). O Fisco procura, nesse caso, defender que a estrutura física do investidor direto é incompatível com suas atividades. Isso é especialmente sensível para a desconsideração de empresas holding, já que essas, a rigor, não precisam manter qualquer estrutura para cumprir sua função de manter participação societária em outra entidade.

b) Testes de posição econômica do investidor direto: outro tipo de autuação busca identificar se o benefício econômico do fluxo de pagamento de um rendimento “atravessa” o investidor direto para um terceiro. Isso pode ocorrer se o investidor direto tiver o direito ao rendimento e, ao mesmo tempo, uma obrigação de entrega de valor similar a um terceiro. Um exemplo é se o investidor direto tiver direito a receber juros de um empréstimo e a obrigação de pagar os juros de outro empréstimo a terceiro, em valor equivalente. Outro exemplo é o recebimento de um dividendo de uma ação pago em seguida a um terceiro dentro de um contrato de swap ou derivativo.

Acrescente-se a essas visões a propriamente jurídica, de que o conceito de beneficiário efetivo deve ser analisado em função dos direitos e deveres jurídicos inerentes na relação entre a fonte e o beneficiário direto. Assim, por exemplo, uma obrigação jurídica de uma holding intermediária repassar automaticamente a maior parte dos dividendos recebidos a sua controladora seria indício de haver outro beneficiário efetivo, mas a ausência dessa previsão, mesmo na presença de controle, poderia satisfazer o teste de beneficiário efetivo.

2.2. Posição das autoridades fiscais de diferentes países e jurisprudência relevante

2.2.1. Reino Unido e o Caso Indofood

No Reino Unido não há uma definição legal de “beneficiário efetivo”, mas há decisões judiciais a respeito. A orientação das autoridades fiscais foi construída a partir do precedente do Caso Indofood, de que beneficiário efetivo seria quem detém o único e ilimitado direito de usar, fruir e dispor do bem ou rendimento em questão.53 De forma geral, os recebedores de renda que, em termos práticos, passam o rendimento adiante não são os beneficiários efetivos do rendimento. É feita distinção, ademais, entre o beneficiário efetivo do bem ou direito e o beneficiário efetivo do rendimento correspondente, numa abordagem ao mesmo tempo econômica e jurídica.54

O Caso Indofood, julgado em 2006 pela Court of Appeals, é um caso de Direito privado. A Indofood, uma companhia indonésia operacional, pretendia emitir títulos de dívida para financiar suas atividades. Para reduzir a tributação dos juros na Indonésia, foi constituída uma subsidiária nas Ilhas Maurício. A subsidiária emitiria os títulos e repassaria o valor como empréstimo à Indofood. A Indofood era garantidora de todas as obrigações da subsidiária.55

A estrutura permitiria a utilização da convenção entre a Indonésia e as Ilhas Maurício, reduzindo a retenção de imposto pela Indonésia de 20% para 10%, enquanto as Ilhas Maurício não tributariam na fonte os juros pagos pela subsidiária da Indofood a seus credores. A Indonésia, entretanto, denunciou a convenção após tomar conhecimento da operação, o que exigiu uma reorganização da operação.56

O Banco JP Morgan era intermediário entre a Indofood e os detentores dos títulos emitidos. Para evitar que a denúncia resultasse no exercício do direito da Indofood de liquidar o contrato antecipadamente, na forma do Direito inglês, o JP Morgan propôs em juízo a interposição de uma nova entidade entre a Indofood e sua subsidiária nas Ilhas Maurício, estabelecida nos Países Baixos, para contornar a maior retenção na fonte na Indonésia.57

A Indofood arguiu em juízo que a nova entidade não seria considerada como beneficiária efetiva dos rendimentos pelas autoridades fiscais indonésias, o que evitaria a aplicação da convenção entre a Indonésia e os Países Baixos.58

A turma julgadora considerou que o termo “beneficiário efetivo” tem um significado de Direito Internacional que não se confunde com a legislação doméstica de cada um dos Estados Contratantes. Isso afastaria a aplicação do conceito de beneficiário efetivo previsto na legislação inglesa para se julgar a questão.59

O conceito de beneficiário efetivo, nesse contexto, seria incompatível com o do proprietário formal sem privilégio total (full privilege) do benefício direto do rendimento. No caso concreto, nem a entidade holandesa, nem a entidade das Ilhas Maurício seriam beneficiárias efetivas, pois teriam deveres contratuais de repassarem imediatamente quaisquer rendimentos recebidos da matriz na Indonésia. Também se considerou que a limitação da retenção na fonte não seria obtida se o empréstimo fosse alocado diretamente à Indofood, e que permitir o benefício seria contraditório com o objeto e propósito das convenções.60

Um ponto interessante de observar é que a decisão considerou haver um conceito autônomo internacional de beneficiário efetivo, e não apenas um conceito restrito aos Estados Contratantes de uma convenção específica.61

Weterings62 entende que a decisão denota uma abordagem econômica do conceito de beneficiário efetivo, embora Collier,63 mencionado anteriormente, diga ser uma abordagem econômica e jurídica ao mesmo tempo.

2.2.2. Canadá e os Casos Prévost Car e Velcro

A legislação tributária do Canadá, segundo Collier64, não estabelece normas expressas sobre o significado da expressão “beneficiário efetivo”, embora o termo seja utilizado frequentemente. Em um dos precedentes judiciais relevantes, o Caso Prévost Car (a ser analisado em item próprio), o Fisco canadense defendeu uma interpretação baseada em fluxos econômicos em vez de uma visão jurídica da propriedade dos rendimentos. Também buscou dizer que a holding intermediária teria pouca substância. O Caso Velcro, envolvendo questão semelhante de royalties de licença e sublicença dos mesmos direitos, seguiu a mesma direção.

No Caso Prévost Car, julgado pela Canadian Tax Court e confirmado pela Corte Federal de Apelação, uma holding holandesa recebia dividendos de uma subsidiária canadense. A holding holandesa, por sua vez, era detida por sócios localizados na Suécia e no Reino Unido. A retenção na fonte na convenção com a Holanda (5%) é menor que as retenções previstas nas convenções com o Reino Unido (10%) e com a Suécia (15%).65

A holding holandesa tinha substância suficiente para ser considerada residente nos Países Baixos para fins tributários, mas estava obrigada, por acordo de acionistas, a repassar 80% dos seus lucros aos acionistas. Seu único ativo era a participação na subsidiária canadense, e os diretores da holding também administravam a subsidiária no Canadá.66

Os julgadores aceitaram o parecer de especialistas no Direito holandês e, baseados nesses pareceres, entenderam que, na Holanda, a holding holandesa seria a beneficiária efetiva por essa legislação tanto para fins tributários como societários. Além disso, o acordo de acionistas seria desconsiderado para fins tributários na Holanda, de forma a não ser reconhecida a obrigação de pagar 80% dos lucros aos acionistas. Nesse sentido, a holding seria considerada a beneficiária efetiva para fins de aplicação da convenção, e saber quem acima na estrutura seria o detentor final dos rendimentos seria irrelevante.67

No Caso Velcro, também julgado pela Canadian Tax Court, uma companhia no Canadá pagava royalties para outra empresa do grupo econômico, localizada na Holanda. Essa empresa transferiu sua sede posteriormente para as Antilhas Holandesas. Houve, pela empresa recebedora dos royalties, a constituição de uma subsidiária na Holanda, para quem os royalties passaram a ser pagos.68

Essa subsidiária holandesa tinha a obrigação de repassar os royalties recebidos em sua conta bancária para sua controladora direta nas Antilhas Holandesas. O repasse, porém, ocorria 30 dias após o recebimento dos recursos. Com isso, os royalties que caíam na conta bancária eram investidos e se misturavam com outras movimentações financeiras.69

O Fisco canadense defendeu que o Caso Prévost Car seria um precedente para afirmar que a subsidiária holandesa não seria o beneficiário efetivo dos royalties, dada a obrigação contratual de repasse. A Corte, entretanto, discordou, entendendo que a subsidiária reteve discricionariedade para usar os recursos até a data de repasse, no que seria beneficiária efetiva.70

Para Weterings,71 a corte canadense apresentou um entendimento de maior ênfase no controle jurídico sobre o rendimento. Assim, embora a decisão ressalte a importância da interpretação autônoma, a solução final estaria em contradição com a primeira versão da proposta de relatório da OCDE, pois a subsidiária holandesa não teria direito completo (full right) ao rendimento.

Cabe notar que esse entendimento de Weterings faz sentido caso se assuma, como esse autor assume, que a OCDE admitiu interpretações do tipo substância sobre a forma para o teste do beneficiário efetivo. Como a segunda versão dos esclarecimentos permite afirmar, interessa um teste negativo, baseado em saber se há uma obrigação legal ou contratual relacionada diretamente ao pagamento.

Nos dois casos, a corte canadense procurou verificar se a obrigação existente era diretamente ligada ao pagamento, e decidiu negativamente com base na interpretação da legislação societária do Estado de Residência (Caso Prévost Car) e da disponibilidade do rendimento até a data do pagamento (Caso Velcro). Não há no nosso entender, portanto, a contradição vista por Weterings entre a solução desses casos e a posição atualmente desenvolvida pela OCDE a respeito do tema.

2.2.3. Estados Unidos e o Caso Aiken

Os Estados Unidos defendem uma interpretação do termo “beneficiário efetivo” bastante diferente da linha seguida pela OCDE. A diferença principal é no sentido de admitir a interpretação conforme o entendimento do Estado da Fonte, em vez da interpretação autônoma da convenção. Isso corresponde, na prática, a permitir ao Estado da Fonte a aplicação de regras antiabusivas domésticas a situações de aplicação da convenção, seja de substância sobre a forma, seja por outra abordagem. O conceito de beneficiário efetivo seria o canal para permitir esse tipo de interpretação. Ryynänen72 aponta, entretanto, que essa linha defendida pelos Estados Unidos na OCDE não tem sido aceita.

Uma explicação técnica à Convenção Modelo dos Estados Unidos de 2006 recepciona essa interpretação. Essa diz que o termo “beneficiário efetivo” não está definido na Convenção Modelo e, portanto, deve ser utilizada a definição do Direito interno do Estado da Fonte do rendimento. Para os propósitos do artigo 10, o beneficiário efetivo do dividendo seria a pessoa a quem o rendimento seja atribuído pela legislação do Estado da Fonte.73

Com relação à jurisprudência, o Caso Aiken é um precedente antigo, julgado em 1971.74 Naquele caso, todas as operações foram realizadas entre empresas do mesmo grupo econômico. Um empréstimo foi concedido de uma empresa do Equador a outra nos Estados Unidos, contra a entrega de notas promissórias. Essas notas promissórias foram então transferidas a uma empresa de Honduras. A empresa de Honduras passou, então, a ser ao mesmo tempo credora da empresa nos Estados Unidos e devedora da empresa no Equador, nos mesmos valores e taxas de juros.

O pagamento dos juros à empresa em Honduras era, à época dos fatos, isenta de retenção na fonte nos Estados Unidos, com base na convenção de bitributação entre os dois países. O pagamento direto à empresa no Equador não teria esse benefício. Uma análise das demonstrações financeiras da empresa de Honduras permitiu confirmar que os ativos da empresa correspondiam somente a aplicações financeiras ou direitos de crédito, e os passivos a valores devidos para a empresa do Equador, sem outras atividades relevantes.75

O órgão administrativo (United States Tax Court) não menciona o conceito de “beneficiário efetivo”, mas diz claramente que a expressão “recebidos por” (received by) exigia que os valores fossem recebidos pela empresa de Honduras como seu próprio rendimento para aplicação da convenção, com “completo domínio e controle sobre os fundos”, e não com a obrigação de repasse. A empresa de Honduras foi, assim, considerada uma empresa-veículo, atuando como mero agente pagador do rendimento em favor da empresa no Equador, e não foi reconhecido propósito econômico para a operação.76

Vale notar que, atualmente, os Estados Unidos não confiam somente na aplicação do conceito de beneficiário efetivo como medida para prevenir o treaty shop­ping. O desenvolvimento de medidas antiabusivas específicas nos acordos, como as cláusulas de limitação de benefícios (LOB, na sigla em inglês), têm se substituído à aplicação do conceito. Também medidas de Direito interno, como regulamentações contra o uso de empresas-veículo e novas regras de substância econômica, têm sido utilizadas. Isso tem reduzido os conflitos de aplicação do conceito de beneficiário efetivo porque esse passou a ser uma entre várias medidas domésticas e convencionais para fazer frente ao fenômeno do treaty shopping.77

2.2.4. Países Baixos

Os Países Baixos mantêm legislação doméstica específica sobre o conceito de beneficiário efetivo, de uma perspectiva econômica. A legislação estabelece que o recebedor dos dividendos não é considerado beneficiário efetivo quando, em conjunção com os dividendos recebidos, tenha dado uma contraprestação como parte de uma série de transações estruturadas, de forma que os dividendos recebidos, ao menos em parte, tenham beneficiado outra pessoa que teria sido sujeita a uma maior retenção na fonte, e essa pessoa tenha direta ou indiretamente mantido posição igual ou semelhante nos instrumentos patrimoniais subjacentes (dividend stripping). Uma transação estruturada pode também incluir operações reguladas em bolsa.78

Essa abordagem reduziu consideravelmente, desde a introdução dessa legislação em 2001, a emissão de derivativos financeiros usados, no entender das autoridades fiscais, como forma de realocar os dividendos de ações negociadas em bolsa e assim reduzir sua tributação. Segundo Collier,79 está claro que a legislação doméstica dos Países Baixos deve continuar a se desenvolver nos termos dessa lógica do conceito de beneficiário efetivo.

Apesar dessa orientação, os Países Baixos interpretam o conceito de beneficiário efetivo nas convenções de forma autônoma, dispensando a previsão do Direito interno como regra geral. A legislação interna só é aplicável quando não estiver clara a intenção dos Estados Contratantes. É interessante mencionar que os Países Baixos mantêm reserva ao Comentário da OCDE no sentido de que normas antiabusivas domésticas podem conflitar com as disposições das convenções. A teoria da fraude à lei, adotada pela Suprema Corte em situações específicas de evasão fiscal, seria uma dessas situações, pois, preenchidos os requisitos da lei interna, cria uma ficção jurídica para redefinir os fatos e a qualificação fiscal dos rendimentos, enquanto as convenções apenas permitem ou negam os direitos nelas previstos.80

2.2.5. França e o Caso Royal Bank of Scotland

A respeito da França, há autores que argumentam que o teste do beneficiário efetivo se confunde com a aplicação da teoria do abuso de direito. A França, segundo Aka,81 adota o entendimento de que o conceito de beneficiário efetivo é aplicável ainda que não esteja expressamente previsto nas convenções. É compreendido, pelo Conselho de Estado francês, que o conceito de beneficiário efetivo é parte da abordagem mais ampla da fraude à lei no Direito Tributário.

Essa situação pode ser observada no Caso Royal Bank of Scotland. Nesse caso, o Banco, residente no Reino Unido, celebrou algumas operações com uma empresa dos Estados Unidos, controladora de uma subsidiária integral francesa. A empresa dos Estados Unidos vendeu ao banco o usufruto temporário de ações preferenciais da sua subsidiária na França.82

O preço de compra dos direitos de usufruto seria pago de volta pela empresa dos Estados Unidos dentro de até três anos, pelo pagamento de dividendos da subsidiária. A controladora americana era garantidora da subsidiária francesa. Se a subsidiária não pagasse o dividendo, a empresa americana se obrigaria a pagar valor equivalente. A controladora também pagaria valor adicional se o banco não conseguisse redução do imposto francês sobre o pagamento dos dividendos. Com isso, chegou-se à conclusão de que o banco não tinha riscos nessa operação.83

O pagamento dos dividendos da França para o Reino Unido estaria sujeito, em princípio, aos benefícios da convenção entre esses dois países. Isso permitiria pedir restituição do imposto devido na França, alegando que o Banco seria beneficiário efetivo do rendimento, o que não ocorreria se o dividendo fosse pago diretamente à controladora americana.84

A decisão do Conselho de Estado francês entendeu que o único propósito da operação era obter o benefício da convenção entre França e Reino Unido, e a operação foi requalificada como um empréstimo. O Banco, por conta desse entendimento, não foi considerado beneficiário efetivo do pagamento dos dividendos85. Essa decisão pareceu dar ao teste do beneficiário efetivo o tratamento de uma abordagem econômica da operação.

2.2.6. Suíça e os Casos Holding ApS e A A/S

Quanto à Suíça, as autoridades fiscais, segundo Collier,86 atualmente questionam a existência do beneficiário efetivo em operações domésticas. Parte-se da premissa de que se o recebedor direto de uma renda sujeita à retenção na fonte na Suíça tiver uma obrigação de passar adiante o rendimento (ou um montante equivalente), o recebedor direto não deve ser considerado o beneficiário efetivo para fins de tributação na Suíça.

O principal objeto de autuação com esse raciocínio é a situação dos traders baseados na Suíça que mantenham posições em títulos e valores mobiliários suíços, cujos rendimentos estariam sujeitos à retenção na fonte, ao mesmo tempo em que fazem hedge de suas posições por uma combinação de contratos de opções de compra e venda ou futuros. Se o recebedor fez hedge do rendimento desses títulos, não é este o beneficiário efetivo para fins de aplicação das convenções, de forma que qualquer restituição da retenção na fonte a maior que a convenção seria indevida.87

No contexto internacional, houve o mesmo questionamento, dado que as convenções de bitributação reduzem o percentual de retenção na fonte. Nem todas as convenções contêm disposições com a expressão “beneficiário efetivo”, mas as autoridades fiscais suíças têm usado o mesmo raciocínio para todas as convenções celebradas pela Suíça. Não está ainda totalmente claro, entretanto, qual é o escopo do teste econômico aplicado pelas autoridades fiscais, o que tem levado à insegurança jurídica do setor financeiro.88

No Caso Holding ApS, de 2005, uma companhia dinamarquesa teria sido interposta para aproveitar os benefícios da convenção Suíça-Dinamarca, e a Corte Federal Suíça aplicou sua doutrina sobre abuso de direito para negar a restituição do imposto retido na fonte.89

A Holding ApS, constituída na Dinamarca, era uma subsidiária integral de outra companhia incorporada em Guernsey, por sua vez uma subsidiária integral de outra companhia nas Bermudas. A Holding ApS investiu em uma companhia suíça, a qual pagou um dividendo substancial à holding dinamarquesa, sujeito a 35% de retenção na fonte pelo Direito suíço. A convenção Suíça-Dinamarca atribuía a tributação dos dividendos ao Estado da Residência, de forma a ser possível a restituição do imposto retido.90

A Corte Federal da Suíça negou o pedido de restituição sob o entendimento de que a empresa dinamarquesa seria a beneficiária efetiva do dividendo, mas teria sido interposta de forma abusiva, somente para obter os benefícios da convenção de bitributação com a Dinamarca. Esse abuso poderia ocorrer se a companhia interposta não desempenhasse qualquer atividade econômica real ou um negócio empresarial ativo. A Holding ApS não tinha administradores ou empregados, e pagava o dividendo diretamente a sua controladora em Guernsey.91

O Tribunal Administrativo Federal da Suíça julgou ainda o Caso A A/S, em 2012, no qual um banco dinamarquês fez operações de swap com clientes nos Estados Unidos e na União Europeia. O banco protegeu-se do risco dessas operações de swap (hedge) mediante a compra de ações de uma empresa suíça. A Convenção Dinamarca-Suíça não previa retenção na fonte na distribuição dos dividendos, e esse fato foi levado em consideração no desenho da operação.92

A decisão final considerou a compra das ações juridicamente independente das operações de swap, pois o banco dinamarquês não teria obrigação de repassar os dividendos aos seus clientes. Nesses termos, o banco dinamarquês seria beneficiário efetivo do rendimento.93

2.2.7. China e a Circular 601

A legislação chinesa tem adotado uma postura formalista a respeito do conceito de beneficiário efetivo nas convenções de bitributação celebradas pela China. A Circular 601/2009, da Administração Tributária do Estado, prevê que uma entidade não será considerada como beneficiário efetivo se considerada uma “empresa-veículo”, descrita como uma entidade criada para evasão ou redução da carga tributária ou para transferir ou acumular lucros. Não parece ser admitido pela Circular 601, segundo Collier94 que uma empresa-veículo possa ter outro objetivo senão a evasão fiscal, e isso necessariamente significaria a falta de substância. A Circular 601 apresenta fatores específicos para o teste de beneficiário efetivo. Qualquer um dos elementos abaixo, se presente, resulta em o contribuinte não ser o beneficiário efetivo do rendimento:95

a) O contribuinte está obrigado a distribuir a maior parte do rendimento (mais de 60%) nos 12 meses após o recebimento;

b) O contribuinte mantém atividades empresariais mínimas ou inexistentes, senão a propriedade dos bens e direitos que geraram o rendimento;

c) O contribuinte, uma entidade com personalidade jurídica, tem ativos, escala de operações e número de empregados desproporcionais à sua renda;

d) O contribuinte tem controle e direitos de tomada de decisão mínimos ou inexistentes, e não assume quaisquer riscos;

e) O contribuinte não tem renda tributável; ou

f) No caso de rendimentos de juros, há um contrato de empréstimo ou de depósito entre o contribuinte e terceiro, cujos termos (montante emprestado, taxa de juros, datas de assinatura) são similares ou próximos o bastante do contrato de empréstimo do qual decorrem os juros recebidos; e

g) No caso de rendimentos de royalties, há uma licença ou contrato de transferência entre o contribuinte e um terceiro, cujos termos são similares aos termos nos quais os royalties são recebidos.

O contribuinte que pede os benefícios da convenção deve ser capaz de providenciar às autoridades fiscais chinesas documentação (a Circular 601/2009 não explica qual documentação seria) que suporte sua alegação de ser o beneficiário efetivo do rendimento, e que não se encontra em nenhuma das situações acima.96

A decisão sobre o preenchimento dos requisitos, entretanto, foi delegada a oficiais locais. Segundo Collier,97 essa experiência tem sido negativa em razão do despreparo das autoridades locais para tratar de convenções de bitributação, além da incerteza quanto à documentação.

2.2.8. Coreia do Sul e o Caso Lone Star

A Coreia do Sul, segundo Collier,98 não apresenta definição de beneficiário efetivo em suas convenções de bitributação, mas aplica o conceito como uma ampla cláusula de prevenção do treaty shopping. A abordagem inicial das autoridades fiscais coreanas questionou o uso de fundos de private equity na Coreia e, posteriormente, de holdings de grupos multinacionais.

No Caso Lone Star, julgado pela Suprema Corte da Coreia do Sul, os benefícios de uma convenção foram negados com base na substância sobre a forma. O Lone Star era um fundo de investimentos baseado nas Bahamas, constituído na forma societária de limited partnership. Esse fundo, em vez de investir diretamente no mercado coreano, utilizou uma holding na Bélgica (Star Holdings, a qual adotava a mesma forma societária). A convenção entre a Coreia do Sul e a Bélgica estabelece 0% de retenção na fonte no ganho de capital da venda de ações.99

Entendeu-se que os investidores do fundo nas Bahamas, por meio da holding na Bélgica, foram os beneficiários efetivos do ganho de capital na venda de ações de uma companhia imobiliária coreana. Isso porque a holding na Bélgica não seria o beneficiário efetivo, mas uma interposta pessoa, sem atividades empresariais na Bélgica. O fundo nas Bahamas, por sua vez, foi tratado como se tivesse personalidade jurídica própria.100

O raciocínio das autuações foca na substância física das entidades investidoras na Coreia que clamam o benefício das convenções. Também há ênfase na documentação e no número de empregados, tipo de escritório etc. Em uma das autuações, não se considerou que uma holding com seu próprio escritório e pequeno número de empregados tivesse substância suficiente para satisfazer o requisito. As autoridades fiscais também tenderiam a considerar o propósito negocial de qualquer holding, como essa capta recursos (capital próprio ou dívidas) e como esses recursos são financiados, a fim de determinar se a holding funciona como veículo para o repasse de recursos.101

2.2.9. Índia e o Caso Ardex

A Índia não apresenta legislação específica sobre o conceito de beneficiário efetivo, tendo toda sua experiência evoluído a partir da jurisprudência, a qual tende a não prestigiar raciocínios de substância sobre a forma.102 No Caso Ardex, julgado pela autoridade administrativa da Índia, tratou de ganhos de capital em sentido bastante diferente do Caso Lone Star. Em 1998, foi formada uma entidade nas Ilhas Maurício chamada Ardex, com participação numa empresa indiana. Uma nova holding no Reino Unido adquiriu controle da Ardex em 2001. Mais investimentos foram feitos posteriormente na Ardex para ampliar a participação societária na empresa indiana. Numa reestruturação societária posterior, cerca de 10 anos depois do ocorrido, a Ardex transferiria sua participação na empresa indiana para uma subsidiária alemã por valor de mercado, realizando um ganho de capital considerável.103

Invocando o benefício da convenção entre a Índia e as Ilhas Maurício, a Ardex requereu à autoridade fiscal indiana uma decisão no sentido de que não estaria obrigada a reter na Índia o imposto sobre o ganho de capital, pois apenas o Estado da Residência estaria autorizado a tributar o rendimento. O Fisco indiano negou o pedido, alegando que a Ardex, sediada nas Ilhas Maurício, era uma subsidiária integral da holding no Reino Unido, e nessa situação era no Reino Unido que todas as decisões seriam tomadas. Por sua vez, a convenção entre a Índia e o Reino Unido permitia a tributação pelo Estado da Fonte.104

O órgão administrativo julgador decidiu que, como a participação na companhia indiana havia sido adquirida 10 anos antes da transferência proposta, não se poderia dizer que se tratava de esquema para evitar a tributação. Decidindo em favor da Ardex, o acórdão sustentou que a constituição da entidade nas Ilhas Maurício pode ter sido realizada para aproveitar os benefícios da convenção de bitributação, mas o fato em si seria insuficiente para caracterizar treaty shopping.105

2.3. Legislação brasileira

A legislação brasileira utiliza o termo “beneficiário efetivo” apenas duas vezes. O artigo 26, parágrafo 4º, da Lei 9.430/1996, sobre preços de transferência, após alteração da Lei 11.727, dispôs que seria considerado país ou dependência com tributação favorecida “aquele cuja legislação não permita o acesso a informações relativas à composição societária de pessoas jurídicas, à sua titularidade ou à identificação do beneficiário efetivo de rendimentos atribuídos a não residentes”. Nada no dispositivo ou na regulamentação define, entretanto, como determinar o beneficiário efetivo.106

Nesse contexto, o conceito de beneficiário efetivo parece muito mais se referir ao beneficiário final do rendimento, e não para a própria pessoa jurídica recebedora do pagamento. Isso se aproxima mais do conceito de beneficiário efetivo adotado pela legislação de lavagem de dinheiro do que pelo conceito defendido pela OCDE, tratado no capítulo anterior. Aqui não se discute a aplicação das convenções para evitar a bitributação, apenas a necessidade de aplicação da legislação de preços de transferência.

A outra situação em que o termo é empregado é na legislação específica de dedutibilidade de gastos em geral em operações com residentes em países com tributação favorecida ou sob regime fiscal privilegiado. O artigo 26 da Lei 12.249107 condiciona a dedutibilidade dos gastos de tais operações ao preenchimento de alguns requisitos cumulativos. O primeiro requisito é a identificação do “efetivo beneficiário da entidade no exterior, destinatário dessas importâncias”. A própria Lei 12.249/2010 define o que se entende por “efetivo beneficiário” nesse dispositivo. Segundo o mesmo dispositivo legal, são dois os elementos caracterizadores do beneficiário efetivo:

a) ser pessoa física ou jurídica não constituída com o único ou principal objetivo de economia tributária;

b) auferir o valor por sua própria conta e não como agente, administrador fiduciário ou mandatário por conta de terceiro.

A regulamentação desse tema, apresentada na Instrução Normativa SRF 1.154,108 repete a redação da lei, mas acrescenta que o beneficiário efetivo pode ser uma entidade de investimento coletivo (conceito que inclui expressamente os fundos de investimento). Vale notar que, para as entidades de investimento coletivo, a regulamentação parece aceitá-las como beneficiários efetivos sem a necessidade de argumentar a liberdade dos administradores na gestão dos ativos dessas entidades, uma atividade mais permissiva que a da OCDE.

É possível entender, com exceção da posição sobre as entidades de investimento coletivo, que o conceito de beneficiário efetivo da Lei 12.249/2010 se aproxima um pouco mais do conceito defendido atualmente pela OCDE. O dispositivo adota uma definição por exclusão (ou seja, não se aplica ao intermediário por conta de terceiro), o que é um dos traços principais desse instituto.

O ponto de dúvida é saber até que ponto o “único ou principal objetivo de economia tributária” permitiria a caracterização do beneficiário efetivo. Como os esclarecimentos da OCDE são omissos quanto à abordagem permitida, um posicionamento menos objetivo, por uma abordagem de substância sobre a forma ou substrato econômico da operação, se torna possível.

No âmbito internacional, o termo “beneficiário efetivo” é utilizado em todas as convenções celebradas pelo Brasil após 1979, posteriormente à introdução do conceito na Convenção Modelo da OCDE. O termo está ausente, portanto, das convenções celebradas com Argentina, Áustria, Dinamarca, Espanha, França, Japão, Luxemburgo e Suécia. O termo também está ausente na convenção com a Bélgica, mas foi incluído, para o artigo sobre dividendos, pela convenção adicional de 2007.

Rothmann109 ainda aponta o uso da expressão no artigo 28 (Disposições Diversas) da convenção assinada em 2003 entre o Brasil e o México. O dispositivo concede o direito de negar os benefícios da convenção em hipóteses de abuso do objeto e fim da convenção. Ali são apresentadas algumas situações em que a convenção poderia gerar um tratamento desigual entre contribuintes diferentes, beneficiários efetivos residentes no mesmo Estado Contratante, apenas em função da aplicação da convenção.

2.4. Conclusões

A posição das autoridades fiscais de vários países mudou ao longo do tempo, de forma a tentar interpretar o conceito de “beneficiário efetivo” como uma cláusula geral para prevenir práticas de treaty shopping, ainda mais porque a maior parte dos países, à exceção dos Estados Unidos, não adotou cláusulas de limitation of benefits. Os países que adotam o conceito de beneficiário efetivo como cláusula geral, têm apresentado abordagens mais econômicas ou em termos de substância sobre a forma. Essa abordagem não pode ser facilmente reconciliada com o posicionamento da OCDE, e pode-se perceber que a própria OCDE retrocedeu em suas posições para desincentivar essa nova postura, mas não de uma forma assertiva.110

A experiência internacional sobre a aplicação do conceito de beneficiário efetivo apresenta entendimentos bastante diferentes daqueles defendidos pela OCDE. Em comparação às premissas da OCDE desenvolvidas no capítulo anterior, pode-se realizar a classificação da tabela abaixo:

Tabela 1. Comparação entre premissas da OCDE sobre o conceito de beneficiário efetivo e a prática dos Estados analisados

Premissa da OCDE sobre o conceito

Estados em conformidade

Estados com outro posicionamento

Interpretação autônoma, em desfavor da legislação interna

Reino Unido, Canadá, Países Baixos

Estados Unidos, França, China, Coreia do Sul

Utilização do conceito como teste negativo

Reino Unido, Canadá, Estados Unidos, Países Baixos, Índia

Suíça, Coreia do Sul

Definição do conceito em função de obrigações de repasse da renda

Reino Unido, Canadá, Estados Unidos, Países Baixos, Suíça

China, Coreia do Sul

Obrigações de repasse apenas diretamente atreladas ao rendimento

Reino Unido, Canadá, Estados Unidos, Suíça

China, Coreia do Sul

Distinção entre o conceito e normas gerais antiabusivas

Reino Unido, Canadá, Estados Unidos, Países Baixos, Índia

França, Suíça, China, Coreia do Sul

Fonte: elaborado pelo autor (2014).

A tabela acima apresenta apenas as posições identificadas dentro das fontes e precedentes analisados. Quando havia dúvida ou falta de informação, o nome do Estado foi omitido.

Como a OCDE não apresenta um posicionamento claro a respeito da utilização de abordagens econômicas ou de substância sobre a forma na interpretação do conceito de beneficiário efetivo, a tabela acima não apresenta essa informação. É possível, entretanto, classificar os países analisados da seguinte forma:

a) Países com abordagem jurídica do conceito de beneficiário efetivo: Canadá e Índia. O Reino Unido foi apontado como Estado que combina uma abordagem parcialmente jurídica e parcialmente econômica na interpretação do conceito. Por abordagem jurídica, entendeu-se aquela em que a titularidade dos direitos ao rendimento tiveram papel preponderante na interpretação.

b) Países com abordagem econômica do conceito de beneficiário efetivo: Estados Unidos, Países Baixos, França e Suíça. Compreendeu-se como “abordagem econômica” aquela em que o fluxo de pagamentos foi o fator mais relevante para a interpretação. Vale notar que os Países Baixos, no contexto internacional, dispensam a abordagem econômica da legislação interna em favor da interpretação autônoma da convenção, o que o coloca como país em total conformidade com a linha da OCDE.

c) Países com abordagem de substância sobre a forma para o conceito de beneficiário efetivo: China e Coreia do Sul. Foi entendido como “substância sobre a forma” as linhas interpretativas que deram maior relevo à capacidade operacional da pessoa jurídica praticar os atos que lhe foram atribuídos. O aspecto jurídico e o fluxo de pagamentos são relegados ao segundo plano, às vezes como indício da capacidade operacional. Esses foram os países que apresentaram maior distanciamento das orientações da OCDE.

Com relação ao Brasil, a legislação ainda é muito incipiente, e não encontramos casos da jurisprudência que tenham discutido a aplicação das convenções celebradas pelo Brasil por um teste de beneficiário efetivo. A legislação, tal como apresentada, sugere uma abordagem em conformidade com a linha defendida pela OCDE.

Há, entretanto, o requisito de não ser a pessoa jurídica criada com o único ou principal propósito de obtenção de economia tributária, um conceito vago. A vagueza desse requisito abre espaço para o uso do conceito de beneficiário efetivo como uma norma geral antiabusiva, o que está em desacordo com a posição da OCDE. Não há, entretanto, evidências suficientes de que o conceito seria interpretado desse modo pelas autoridades brasileiras.

A incerteza jurídica da situação internacional, segundo Collier,111 prejudica o funcionamento das próprias convenções, pois essas passam a não funcionar como deveriam em diversas situações, como aquelas envolvendo holdings, veículos de investimento, investimentos de portfólio com uso de hedge, entre outras. O impacto dessa situação sobre o apreçamento dos instrumentos financeiros já teria sido reconhecido pela OCDE. A generalização de uma interpretação puramente econômica, na visão de Collier, relegaria a inexigibilidade de todo o setor corporativo aos benefícios das convenções, pois, cedo ou tarde, todos os fluxos de rendimentos são redistribuídos de uma ou outra forma dentro de um grupo econômico. Seria incerto saber quais testes de natureza econômica seriam considerados aceitáveis ou inaceitáveis.

Embora a posição de Collier pareça exagerada, é mais realista perceber que a insegurança jurídica e a falta de harmonização das posições dos Estados sobre a interpretação do conceito de beneficiário efetivo cria brechas para a realização de práticas de evasão fiscal que a introdução do conceito de beneficiário efetivo na Convenção Modelo da OCDE justamente procurava coibir.

Comentários Finais

Originado para um propósito extremamente limitado, o conceito de beneficiário efetivo teve seu escopo alargado por recomendação da OCDE. A adoção dessa recomendação pelos Estados, entretanto, escapou ao controle da organização, expandindo-se com significados muito variados.

A reação recente da OCDE tem sido a de buscar delimitar melhor o conceito de beneficiário efetivo para evitar o uso excessivo da expressão para negar os benefícios das convenções. Parece ser consenso, dentro da OCDE, que o conceito é mais um pressuposto de interpretação do conceito de residência do que uma norma geral antiabusiva.

Isso não impede que o conceito elucide algumas situações de treaty shopping que, de outra forma, seriam atingidas por normas antiabuso. O ponto principal da OCDE parece ser o de que o uso de normas antiabusivas, ou de uma abordagem econômica ou de substância sobre a forma, não se confundem com o conceito de beneficiário efetivo nem se anulam. Todos podem ser utilizados na análise da mesma convenção.

O que parece não ter sido esclarecido definitivamente pela OCDE é se o próprio conceito de beneficiário efetivo é permeável a interpretações de cunho econômico ou de substância sobre a forma. Essa indefinição é verificada na comparação da experiência de diversos ordenamentos jurídicos, levando a soluções bastante diferentes a problemas comuns. Um posicionamento mais firme da OCDE sobre esse ponto poderia contribuir para uma melhor evolução da matéria.

1 CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e. Conceito de beneficiário efetivo nas convenções internacionais contra a bitributação. Dissertação sob orientação do Professor Doutor Gerd Willi Rothmann. São Paulo: USP, 2012, p. 208, disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2133/tde-18022013-115923/pt-br.php, acesso em 1º.6.2014; MEYER, Stefanus Philippus. The meaning of ‘beneficial ownership’ and the use thereof for tax treaty shopping and tax avoidance. Dissertação sob orientação do Professor G. Meiring. Pretoria: University of Pretoria, Faculty of Economic and Management Sciences, setembro de 2010, pp. 9-10, disponível em http://upetd.up.ac.za/thesis/available/etd-07262011-131907/ unrestricted/dissertation.pdf, acesso em 31.5.2014.

2 JONES, John Avery; VANN, Richard; e WHEELER, Joanna. OECD discussion draft “clarification of the meaning of ‘beneficial owner’ in the OECD model tax convention”: response by John Avery Jones, Richard Vann and Joanna Wheeler, 2011, p. 3, disponível em http://www.oecd.org/tax/treaties/48420432.pdf, acesso em 31.5.2014.

3 VAN RAAD, Kees. Beneficial ownership under tax treaties. Apresentação no V Congresso Brasileiro de Direito Tributário Internacional. São Paulo: IBDT, 3 e 4 de outubro de 2013, p. 4, disponível em http://www.ibdt.com.br/material/arquivos/Congressos/2013/Kees%20van %20Raad.pdf, acesso em 1º.6.2014.

4 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 686, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

5 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 686, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

6 JONES, John Avery; VANN, Richard; e WHEELER, Joanna. OECD discussion draft “clarification of the meaning of ‘beneficial owner’ in the OECD model tax convention”: response by John Avery Jones, Richard Vann and Joanna Wheeler, 2011, p. 2, disponível em http://www.oecd.org/tax/treaties/48420432.pdf, acesso em 31.5.2014.

7 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, pp. 686-687, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

8 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 687, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

9 VAN RAAD, Kees. Report on beneficial ownership under the OECD model convention and commentaries. Haia, 27 de setembro de 2011, p. 5, disponível em http://www.ibdt.com.br/material/arquivos/Atas/jfb_20111020093958.pdf, acesso em 31.5.2014.

10 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 687, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

11 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 687, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

12 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 688, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

13 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 688, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

14 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 688, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

15 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 688, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

16 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, pp. 688-689, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

17 Para fins deste trabalho, as partnerships são entidades jurídicas despersonalizadas ou de responsabilidade ilimitada, tratadas em algumas jurisdições como entidades transparentes, de forma a que os lucros da atividade fluam diretamente para os sócios ou acionistas. No Direito Brasileiro, seria a situação do consórcio de sociedades dos arts. 278 e 279 da Lei 6.404/1976 (transparente pela legislação brasileira) e da sociedade em conta de participação, da sociedade comandita, da sociedade em nome coletivo e outras com responsabilidade ilimitada de um ou mais sócios (entes não transparentes na legislação brasileira).

18 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 689, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

19 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 689, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

20 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 690, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014. OECD. OECD model tax convention on income and on capital, disponível em http://www.keepeek.com/Digital-Asset-Management/oecd/taxation/model-tax-convention-on-income-and-on-capital-2010_9789264175181-en#page458, p. 458, acesso em 10.6.2014.

21 Tradução livre: “Quando um item de renda for recebido por um residente de um Estado Contratante agindo na capacidade de agente ou mandatário, seria inconsistente com o objeto e propósito da Convenção que o Estado da Fonte concedesse alívio ou isenção meramente por conta de o recebedor imediato da renda manter o status de residente do outro Estado Contratante. O recebedor imediato da renda, nesta situação, se qualifica como residente, mas nenhuma dupla tributação surge como consequência desse status, pois o recebedor não é tratado como proprietário da renda para fins tributários no Estado da Residência. Seria igualmente inconsistente com o objeto e propósito da Convenção que o Estado da Fonte concedesse alívio ou isenção quando o residente de um Estado Contratante, em uma posição jurídica diferente da posição de agente ou mandatário, simplesmente age como um veículo para repasse da renda a outra pessoa que de fato recebe o benefício da renda considerada. Por essas razões, o [Relatório das Empresas Veículo] conclui que uma empresa veículo não pode ser normalmente considerada como o beneficiário efetivo se, mesmo sendo o proprietário formal, tenha, de maneira prática, poderes muito limitados que a tornam, em relação à renda considerada, um mero fiduciário ou administrador agindo por conta das partes interessadas (parágrafo 12.1).” (Destaques nossos)

22 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 690, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

23 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 690, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

24 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, pp. 690-691, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

25 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 691, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

26 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 691, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

27 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, pp. 691-692, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

28 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 692, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

29 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 692, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

30 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 699, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

31 OECD. “Clarification of the meaning of ‘beneficial owner’ in the OECD model tax convention”. Discussion Draft, 29 de abril de 2011 a 15 de julho de 2011, disponível em http://www.oecd.org/tax/treaties/47643872.pdf, acesso em 6.6.2014. OECD model tax convention: revised proposals concerning the meaning of “beneficial owner” in articles 10, 11 and 12, 19 de outubro a 15 de dezembro de 2012, disponível em http://www.oecd.org/ctp/treaties/Beneficialownership.pdf, acesso em 6.6.2014.

32 OECD. OECD model tax convention: revised proposals concerning the meaning of “beneficial owner” in articles 10, 11 and 12, 19 de outubro a 15 de dezembro de 2012, p. 3, disponível em http://www.oecd.org/ctp/treaties/Beneficialownership.pdf, acesso em 6.6.2014.

33 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, pp. 700-701, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

34 OECD. OECD model tax convention: revised proposals concerning the meaning of “beneficial owner” in articles 10, 11 and 12, 19 de outubro a 15 de dezembro de 2012, p. 3, disponível em http://www.oecd.org/ctp/treaties/Beneficialownership.pdf, acesso em 6.6.2014. WETERINGS, Mark. Beneficial ownership: an evaluation of the concept of beneficial ownership in light of Dutch conduit companies, dissertação sob orientação da Professora Sonja Dusarduijn. Tilburgo: Tilburg University, agosto de 2012, p. 23, disponível em http://arno.uvt.nl/show.cgi?fid=127941, acesso em 31.5.2014.

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36 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 701, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014. OECD. OECD model tax convention: revised proposals concerning the meaning of “beneficial owner” in articles 10, 11 and 12, 19 de outubro a 15 de dezembro de 2012, pp. 5-10, disponível em http://www.oecd.org/ctp/treaties/Beneficialownership.pdf, acesso em 6.6.2014.

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38 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 701, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014. OECD. OECD model tax convention: revised proposals concerning the meaning of “beneficial owner” in articles 10, 11 and 12, 19 de outubro a 15 de dezembro de 2012, pp. 5-10, disponível em http://www.oecd.org/ctp/treaties/Beneficialownership.pdf, acesso em 6.6.2014.

39 OECD. OECD model tax convention: revised proposals concerning the meaning of “beneficial owner” in articles 10, 11 and 12, 19 de outubro a 15 de dezembro de 2012, pp. 10-11, disponível em http://www.oecd.org/ctp/treaties/Beneficialownership.pdf, acesso em 6.6.2014.

40 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, pp. 702-703, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

41 OECD. OECD model tax convention: revised proposals concerning the meaning of “beneficial owner” in articles 10, 11 and 12, 19 de outubro a 15 de dezembro de 2012, p. 11, disponível em http://www.oecd.org/ctp/treaties/Beneficialownership.pdf, acesso em 6.6.2014.

42 OECD. OECD model tax convention: revised proposals concerning the meaning of “beneficial owner” in articles 10, 11 and 12, 19 de outubro a 15 de dezembro de 2012, p. 10, disponível em http://www.oecd.org/ctp/treaties/Beneficialownership.pdf, acesso em 6.6.2014.

43 WETERINGS, Mark. Beneficial ownership: an evaluation of the concept of beneficial ownership in light of Dutch conduit companies, dissertação sob orientação da Professora Sonja Dusarduijn. Tilburgo: Tilburg University, agosto de 2012, p. 27, disponível em http://arno.uvt.nl/show.cgi?fid=127941, acesso em 31.5.2014.

44 WETERINGS, Mark. Beneficial ownership: an evaluation of the concept of beneficial ownership in light of Dutch conduit companies, dissertação sob orientação da Professora Sonja Dusarduijn. Tilburgo: Tilburg University, agosto de 2012, p. 27, disponível em http://arno.uvt.nl/show.cgi?fid=127941, acesso em 31.5.2014.

45 WETERINGS, Mark. Beneficial ownership: an evaluation of the concept of beneficial ownership in light of Dutch conduit companies, dissertação sob orientação da Professora Sonja Dusarduijn. Tilburgo: Tilburg University, agosto de 2012, p. 28, disponível em http://arno.uvt.nl/show.cgi?fid=127941, acesso em 31.5.2014.

46 WETERINGS, Mark. Beneficial ownership: an evaluation of the concept of beneficial ownership in light of Dutch conduit companies, dissertação sob orientação da Professora Sonja Dusarduijn. Tilburgo: Tilburg University, agosto de 2012, p. 29, disponível em http://arno.uvt.nl/show.cgi?fid=127941, acesso em 31.5.2014.

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48 ROTHMANN, Gerd Willi. O conceito de beneficiário efetivo nas convenções contra a bitributação internacional. Apresentação no V Congresso Brasileiro de Direito Tributário Internacional. São Paulo: IBDT, 3 e 4 de outubro de 2013, pp. 7-8, disponível em http://www.ibdt.com.br/material/arquivos/Congressos/2013/gerd%20willi.pdf, acesso em 1º.6.2014.

49 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, pp. 692-693, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

50 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 693, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014. JONES, John Avery; VANN, Richard; e WHEELER, Joanna. OECD discussion draft “clarification of the meaning of ‘beneficial owner’ in the OECD model tax convention”: response by John Avery Jones, Richard Vann and Joanna Wheeler, 2011, p. 3, disponível em http://www.oecd.org/tax/treaties/48420432.pdf, acesso em 31.5.2014.

51 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 698, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

52 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 698, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

53 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, p. 694, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014. Her Majesty Revenue and Customs (HMRC). INTM332060 - double taxation applications and claims: Indofood: impact on particular cases, disponível em http://www.hmrc.gov.uk/manuals/intmanual/intm332060.htm, acesso em 4.6.2014.

54 COLLIER, Richard. “Clarity, opacity and beneficial ownership”. British Tax Review v. 6. Londres: Sweet & Maxwell, 2011, pp. 695-696, disponível em http://uscib.org/docs/BTR_Issue_ Beneficial%20Ownership_Collier.pdf, acesso em 31.5.2014.

55 WETERINGS, Mark. Beneficial ownership: an evaluation of the concept of beneficial ownership in light of Dutch conduit companies, dissertação sob orientação da Professora Sonja Dusarduijn. Tilburgo: Tilburg University, agosto de 2012, pp. 45-47, disponível em http://arno.uvt.nl/show.cgi?fid=127941, acesso em 31.5.2014.

56 WETERINGS, Mark. Beneficial ownership: an evaluation of the concept of beneficial ownership in light of Dutch conduit companies, dissertação sob orientação da Professora Sonja Dusarduijn. Tilburgo: Tilburg University, agosto de 2012, pp. 45-47, disponível em http://arno.uvt.nl/show.cgi?fid=127941, acesso em 31.5.2014.

57 WETERINGS, Mark. Beneficial ownership: an evaluation of the concept of beneficial ownership in light of Dutch conduit companies, dissertação sob orientação da Professora Sonja Dusarduijn. Tilburgo: Tilburg University, agosto de 2012, pp. 45-47, disponível em http://arno.uvt.nl/show.cgi?fid=127941, acesso em 31.5.2014.

58 WETERINGS, Mark. Beneficial ownership: an evaluation of the concept of beneficial ownership in light of Dutch conduit companies, dissertação sob orientação da Professora Sonja Dusarduijn. Tilburgo: Tilburg University, agosto de 2012, pp. 45-47, disponível em http://arno.uvt.nl/show.cgi?fid=127941, acesso em 31.5.2014.

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60 WETERINGS, Mark. Beneficial ownership: an evaluation of the concept of beneficial ownership in light of Dutch conduit companies, dissertação sob orientação da Professora Sonja Dusarduijn. Tilburgo: Tilburg University, agosto de 2012, pp. 45-47, disponível em http://arno.uvt.nl/show.cgi?fid=127941, acesso em 31.5.2014.

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