Artigos Selecionados em Sistema de Avaliação Double Blind Peer Review

A Interpretação Econômica no Direito Tributário Brasileiro

Economic Interpretation in Brazilian Tax Law

Daniela Gueiros Dias

Mestranda em Direito Tributário na Universidade de São Paulo e Advogada em São Paulo. E-mail: daniela.dias@fgvmail.br.

Resumo

O presente artigo analisa a compatibilidade da interpretação econômica com o Direito Tributário brasileiro. Para tanto, discute-se três questões distintas. A primeira delas é o conceito de interpretação econômica. Defende-se que a interpretação econômica trata-se, na realidade, de dois fenômenos logicamente distintos, porém complementares. São eles: a interpretação econômica em abstrato e a interpretação econômica em concreto. A segunda questão discutida é a finalidade da interpretação econômica. Argumenta-se que enquanto técnica interpretativa, a interpretação econômica é um processo que leva a um resultado, na maioria das vezes, analógico. Por fim, a terceira questão abordada é o fundamento da interpretação econômica. Defende-se não apenas que esta não encontra fundamento no Direito Tributário brasileiro, como também é com ele incompatível.

Palavras-chave: interpretação econômica, interpretação em abstrato, interpretação em concreto, planejamento tributário.

Abstract

The present article analyzes the compatibility between economic interpretation and Brazilian Tax Law. In order to do so, three distinct questions are discussed. The first one is the concept of economic interpretation. It is argued that economic interpretation is, in fact, two logically distinct and complementary phenomena: the abstract economic interpretation and the concrete economic interpretation. The second question addressed is the purpose of economic interpretation. It is argued that as an interpretation technique, the economic interpretation is a process which leads, most frequently, to an analogical result. Finally, the third question is where economic interpretation finds its support. It is argued not only that it does not have a support in the Brazilian Tax Law, but also that it is incompatible with it.

Keywords: economic interpretation, abstract interpretation, concrete interpretation, tax planning.

Introdução

Cento e quarenta e três bilhões e quatrocentos milhões de reais: este é o valor que, de acordo com o Plano Anual de Fiscalização, a Receita Federal do Brasil espera lançar de ofício no ano de 20171. Estima-se que 20 mil contribuintes serão autuados pelo cometimento de irregularidades fiscais2. Além do valor elevado, – superior ao PIB de alguns países vizinhos, tais como a Bolívia e o Paraguai3 – a situação é ainda mais crítica quando se percebe que as 9.401 pessoas jurídicas alvo de monitoramento não correspondem sequer a 0,01% do total de empresas do país4.

Os números acima são sintomas de uma “luta” entre fisco e contribuinte que, além de ganhar paulatinamente mais forças no Direito Tributário brasileiro, parece exacerbar um “maniqueísmo fiscal”5. De um lado, os fiscos municipais, estaduais e federal valem-se de uma legislação cada vez mais complexa, indeterminada e ambígua para perseguir “o obsessivo objetivo de tão somente arrecadar”6. De outro lado, contribuintes buscam afastar a incidência da norma tributária por meio de planejamentos tributários cada vez mais sofisticados e ousados. Tudo isso com o fim precípuo de reduzir a sua contribuição para o bolo estatal. Fortalecem-se, desse modo, dois lados opostos e com interesses antagônicos. A consequência imediata disto é um cenário de flexibilização, quando não de próprio desrespeito, à legalidade tributária.

Para incrementar a arrecadação, as técnicas utilizadas pela Administração Tributária são inúmeras. Algumas delas encontram respaldo no ordenamento jurídico, embora seja possível perguntar se e em que medida o Direito Tributário de fato incorpora institutos típicos do Direito Privado. Outras, no entanto, não encontram previsão legal ou mesmo constitucional, decorrendo, dentre outros, de meras inovações interpretativas elaboradas pelo fisco ou ainda da importação indiscriminada de testes e conceitos alienígenas. Dentre esses, a suposta eficácia positiva da capacidade contributiva, utilizada como fundamento para o exercício do poder de tributar7, e o teste do propósito negocial8, sem o qual o negócio jurídico praticado pelo contribuinte não poderia produzir efeitos perante a Administração Tributária, são alguns exemplos dos diversos mecanismos dos quais tem se valido o fisco visando ao aumento de sua arrecadação.

Paralelamente, os fundamentos que justificam a aplicação das técnicas exemplificadas acima são os mais variados possíveis. Da justiça fiscal9 à concretização dos objetivos fundamentais da República10, da necessidade de se buscar novas respostas em uma realidade “pós-moderna” marcada pela “hipercomplexidade”11 ao imperativo de tributar aquilo “efetivamente praticado” pelo contribuinte em detrimento da forma adotada12. A lista não é exaustiva, mas já permite apontar para um traço comum à quase totalidade dos argumentos comumente utilizados: o desprezo à obediência de regras previstas no ordenamento para reconstrução da norma tributária a ser aplicada no caso concreto, em nítida dissonância com a legalidade positivada na Constituição (art. 150, I, da CF/1988 c/c o art. 5º, II, da CF/1988).

Em um cenário no qual os fins da tributação são utilizados como justificativa para a própria tributação, os limites do poder de tributar são confundidos com o seu fundamento, e aplicações da norma tributária são responsáveis pela inclusão de novos fatos na hipótese de incidência, o contribuinte procura mecanismos cada vez mais sofisticados para escapar da tributação. Esses mecanismos, não raras vezes, situam-se em zonas de penumbra13, nos termos de H. L. A. Hart, onde a incidência da norma jurídico-tributária não é clara e pode ser, no mínimo, contestada.

Neste quadro caótico, o presente artigo se debruça sobre um tema específico, qual seja, a “interpretação econômica”. O tema é relevante por três razões principais: (i) da ótica do julgador (Judiciário e Tribunais Administrativos), a questão diz respeito aos limites da sua atuação em detrimento do legislador democrático; (ii) do ponto de vista da Administração Tributária, o tema refere-se aos limites do poder de tributar, uma vez que sob o véu disfarçado da interpretação, a Administração Tributária tem expandido as hipóteses de incidência da norma jurídico-tributária, alargando a sua competência tributária; (iii) da perspectiva do contribuinte, o assunto toca diretamente nos seus direitos e garantias fundamentais, já que a interpretação econômica costuma ser utilizada para aumentar a carga tributária e, consequentemente, restringir a propriedade e a liberdade do cidadão.

O tema ganha ainda mais relevância quando se percebe a confusão gerada pelo uso da expressão “interpretação econômica”. Isto porque além de serem inúmeros os termos utilizados para a ela fazer referência14, os sentidos que lhe são atribuídos são os mais diversos possíveis15, do trivial ao absurdo. Destaca-se ademais, a sua utilização retórica nas mãos da Administração Tributária, servindo como uma carta coringa quando as técnicas supramencionadas não são aplicáveis ou não são capazes de produzir resultados econômicos igualmente vantajosos ao fisco.

Desse modo, este artigo pretende contribuir para as discussões de planejamento tributário no Brasil por meio da resposta a três perguntas: (i) o que é a interpretação econômica? (conceito); (ii) para que serve a interpretação econômica? (finalidade); e (iii) por que interpretação econômica? (fundamento).

No item (i), será proposta a adoção de um sentido específico à expressão “interpretação econômica”. O intuito desta primeira parte é reduzir as ambiguidades que o tema gera, possibilitando, simultaneamente, um maior controle, pelos diversos agentes do ordenamento jurídico brasileiro, do uso deste método interpretativo. Defender-se-á que a “interpretação econômica” mais comumente criticada pela doutrina e realizada pela Administração Tributária trata-se, em verdade, de dois fenômenos logicamente distintos: (i.1) da interpretação dos conceitos presentes na legislação tributária de acordo com as suas características econômicas (interpretação econômica em abstrato16) e (i.2) da qualificação do fato praticado pelo contribuinte de acordo com as suas características econômicas (interpretação econômica em concreto17).

Na parte (ii), argumentar-se-á que a interpretação econômica realizada pela Administração Tributária frequentemente gera como resultado18 uma interpretação extensiva ou analógica. Analisar-se-á, especificamente, a relação entre a interpretação econômica e a analogia. Nessa parte, toma-se como base para discussão o Recurso Extraordinário n. 540.829, relativo à não incidência de ICMS sobre a operação de arrendamento mercantil internacional, julgado pelo Supremo Tribunal Federal em 2014. Defender-se-á que a interpretação econômica não só não foi utilizada, mas também que se o tivesse sido, o resultado final do julgamento poderia ter sido sensivelmente diferente.

Por fim, na parte (iii), argumentar-se-á que a interpretação econômica não encontra suporte no ordenamento jurídico-tributário brasileiro.

i) O que é interpretação econômica (ou qual é o conceito de interpretação econômica)

Nesse artigo, entende-se que a interpretação pode ter por objeto dispositivos normativos e fatos. No que diz respeito a dispositivos normativos, interpretar é descrever, adscrever, e criar19 normas. Desse modo, a atribuição de sentido pelo intérprete a um texto legal é uma tarefa não apenas de descrição de significados (interpretação cognitiva20) – o que pressupõe a existência de significados a serem meramente descobertos pelo intérprete – mas também de escolha de um entre os diversos significados possíveis (interpretação decisória21) e, em alguns casos, de própria introdução de significados (interpretação criativa22-23).

No tocante a fatos, não se usa o termo “interpretação” no sentido de averiguar o propósito, as razões ou a intenção de um agente ao praticar o fato24. Interpretação é utilizada, neste caso, no sentido de subsunção de certo ato no campo de aplicação de uma norma25. A questão, portanto, é relativa ao enquadramento de casos concretos na hipótese abstratamente prevista pela norma.

Feitas essas breves considerações, passa-se à conceituação da interpretação econômica em abstrato e em concreto.

i.1) Interpretação econômica em abstrato

Segundo Guastini, a interpretação em abstrato “consiste em identificar o conteúdo de sentido – é dizer, o conteúdo normativo [...] – expresso por, e/ou logicamente implícito em, um texto normativo [...] sem referência a nenhum caso concreto”26. A interpretação econômica em abstrato, portanto, tem por objeto textos normativos e não fatos tributários.

Um exemplo pode auxiliar na compreensão do exposto acima. O art. 155, III, da Constituição Federal de 1988 positiva no ordenamento jurídico brasileiro uma regra que atribui aos Estados e ao Distrito Federal a competência para instituição de imposto sobre a “propriedade de veículos automotores”. Determinar o sentido de “propriedade de veículos automotores” é uma tarefa distinta daquela de identificar João como dono de um Honda Fit e, portanto, como proprietário de um veículo automotor. Enquanto esta última diz respeito à classificação de um caso concreto dentro de uma classe prevista abstratamente em uma norma – uma atividade, portanto, que segue, em termos lógicos, a definição da norma –, a primeira expressa uma relação entre o texto normativo e a norma fruto da interpretação. A interpretação em abstrato consiste em saber a resposta somente à primeira pergunta, qual seja, o sentido de “propriedade de veículo automotor”.

Nesse cenário, a interpretação econômica em abstrato é aquela que privilegia o sentido que melhor traduz as características econômicas do texto normativo. Ainda em relação ao IPVA, tome-se como exemplo o art. 5º da Lei n. 13.296, de 23 de dezembro de 2008, do Estado de São Paulo, no qual se lê que “[c]ontribuinte do imposto é o proprietário do veículo”. Pelo menos duas normas podem ser extraídas desse dispositivo:

– N1: Contribuinte do imposto é aquele a quem o ordenamento jurídico atribui os direitos e obrigações capazes de lhe conferir o status jurídico de proprietário de veículo automotor.

– N2: Contribuinte do imposto é aquele capaz de controlar o veículo automotor, assumindo os riscos e benefícios a ele inerentes.

Ainda que N1 e N2 possam prescrever as mesmas soluções em alguns casos concretos, é possível imaginar diversas hipóteses nas quais as consequências jurídicas determinadas por cada uma delas serão distintas. Imagine-se que um filho, ao completar 18 anos, recebe de seu pai, sem animus donandi, um carro. O pai não só compra o veículo como também o registra no seu próprio nome. Ademais, quem dirige diariamente o automóvel é seu filho, que além de dele se beneficiar, também é quem fica sem o carro quando este precisa de reparos ou quando a mãe lhe pede para usá-lo.

De acordo com N1, o contribuinte do imposto é o pai, pois é ele a quem o ordenamento jurídico conferiu o status de proprietário. O registro do carro em seu nome pode funcionar como um atestado de sua condição.

No entanto, a partir de N2, é possível argumentar que o filho é o contribuinte, uma vez que ele se enquadra na definição econômica de proprietário. Ele não só controla o bem (a mãe pede para usar o carro), como também dele se beneficia e assume os riscos a ele relativos (quando o automóvel precisa de reparos é o filho quem fica sem poder se locomover). Dessa forma, os diferentes sentidos do texto normativo levam a diferentes consequências jurídicas para o mesmo caso concreto.

N1 é uma norma que pode ser reconstruída a partir de uma interpretação sistemática de diversos dispositivos existentes no ordenamento jurídico brasileiro. O art. 1.228 do Código Civil de 2002 estabelece que “o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”. Os parágrafos deste mesmo dispositivo prescrevem uma série de limitações ao direito de propriedade, como por exemplo, a necessidade de o seu exercício atender a finalidades econômicas e sociais. Nesse sentido, é possível dizer que ao proprietário são assegurados diversos direitos, ao mesmo tempo em que lhe são impostas algumas obrigações.

Já o art. 110 do Código Tributário Nacional declara que a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos e conceitos de direito privado para definir ou limitar competências tributárias. Dessa forma, uma vez que o dispositivo da legislação tributária que se refere à expressão “proprietário de veículos automotores” encontra fundamento normativo no art. 155, III, da CF/1988 – o qual atribui aos Estados competência para instituir o IPVA –, pode-se afirmar que este incorpora o sentido de propriedade dado pelo direito privado, pois a Constituição não lhe fez nenhuma rejeição expressa27. Assim, N1 é uma norma resultante da interpretação sistemática de dispositivos da Constituição Federal, do Código Tributário Nacional, do Código Civil e da Lei do Estado de São Paulo.

Ocorre que o intérprete também poderia, valendo-se da interpretação econômica, chegar a N2. Dessa forma, uma interpretação possível é a que define proprietário como aquele capaz de usar ou controlar um ativo28, independentemente de existirem normas jurídicas que lhe confiram direitos e obrigações29. O conceito de proprietário dependeria, segundo essa interpretação, de uma verificação empírica, isto é, de se visualizar, no caso concreto, que o agente controla o bem, assume os seus riscos, beneficia-se com o seu uso e sofre a sua perda.

O exemplo permite identificar diferenças relevantes entre as duas técnicas interpretativas. Enquanto a interpretação sistemática olha para dentro do ordenamento jurídico e busca soluções de acordo com as respostas por ele fornecidas, a interpretação econômica olha para o antecedente da norma tributária, identificando as características econômicas necessárias e suficientes para o desencadeamento da obrigação jurídico-tributária. A interpretação econômica, portanto, preocupa-se preponderantemente com a relação entre o texto jurídico e o fato econômico a que ele supostamente se refere.

Para Schoueri, a interpretação econômica “[aponta], atrás da forma jurídica referida pela lei tributária, para uma circunstância econômica que deve ser vista propriamente como a hipótese tributária”30. Desse modo, pode-se definir a interpretação econômica em abstrato como a interpretação mediante a qual o intérprete reconstrói, a partir das características econômicas, o sentido da norma para a caracterização da hipótese tributária.

Esta definição, embora singela, permite, desde já, a visualização de diversos obstáculos que a interpretação econômica tem a enfrentar. Na parte (iii), será questionado se tal método de interpretação encontra fundamento no ordenamento jurídico brasileiro. Por ora, no entanto, deve-se apontar duas críticas ignoradas por defensores da interpretação econômica em abstrato e que se relacionam diretamente à conceituação feita nos parágrafos anteriores.

A primeira crítica é à ingenuidade daqueles que acreditam no alto grau de determinação alcançado por uma interpretação econômica em abstrato. As teorias econômicas atuais são diversas, divididas em inúmeros ramos e escolas. Quanto aos ramos, podem-se identificar ao menos três: microeconomia, macroeconomia e econometria31. Estes, por sua vez, podem ser estudados, no mínimo, por dois approaches distintos, quais sejam, o ortodoxo (mainstream) e o não ortodoxo32. Ambos, a seu turno, podem ter uma abordagem teórica ou aplicada33. As escolas econômicas são as mais variadas possíveis: keynesianismo, monetarismo, novos clássicos econômicos, escola de Chicago, economia institucional, marxismo, economia comportamental e pós-keynesianismo, apenas para citar algumas34. As teorias econômicas também divergem profundamente. Fala-se em teoria de expectativas racionais, teoria do ciclo real de negócios, teoria da agência, teoria do public choice, dentre outras35.

A definição dos termos utilizados na economia é feita a partir de uma perspectiva específica, dependendo da sua utilidade para cada teoria, escola, approach e ramo da economia que deles se vale. Assim, a interpretação econômica em abstrato, ao afirmar que o texto da norma tributária usa palavras apenas para fazer referência ao seu conteúdo econômico, leva ao entendimento, no mínimo duvidoso, de que o legislador teria se referido a algum conceito econômico específico. Qual conceito seria esse? Como seria determinado? Quem tem competência para determiná-lo? Essas são algumas perguntas ignoradas porque se assume que a interpretação econômica leva a apenas uma resposta, quando, na verdade, a definição de termos a partir de uma perspectiva econômica pode ser feita de diversas maneiras.

A segunda crítica é a de que faltam aos intérpretes jurídicos capacidades epistêmicas para realizarem a interpretação econômica. Em outras palavras, ainda que seja possível afirmar que o texto normativo refere-se a uma circunstância econômica específica, que esta é determinável e que tanto a Administração Tributária quanto os Tribunais Administrativos e o Poder Judiciário têm competência para fazer tal determinação, os indivíduos que atuam nesses órgãos não têm conhecimentos suficientes para trabalhar com a interpretação econômica.

Essa segunda crítica é de uma natureza diversa da primeira. Trata-se de uma questão empírica, pois diz respeito à realidade brasileira e à incapacidade de certas instituições de adotarem determinados métodos interpretativos36. Ainda que a obrigatoriedade da formação em Direito não seja requisito necessário para integração dos quadros da Administração Tributária e dos Tribunais Administrativos, vê-se que há uma tendência de bacharéis em Direito a assumirem esses cargos. A título meramente exemplificativo, apenas 12 (doze) dos 156 (cento e cinquenta e seis) atuais conselheiros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais não são bacharéis em Direito37. Ademais, vê-se que a formação em Economia é característica restrita a 6 (seis) conselheiros38.

Isso não quer dizer, necessariamente, que os indivíduos que ocupam a Administração Tributária e os Tribunais Administrativos não tenham conhecimento suficiente para realizar uma interpretação econômica ou não possam vir a adquiri-lo.

No entanto, analisando novamente a realidade do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, o tempo parece ser um fator relevante. De acordo com o Relatório de Gestão do CARF do ano de 2015, 118.747 processos ainda aguardam julgamento39. No ano de 2015, 6.601 processos foram julgados – devido à operação Zelotes, as sessões de julgamento do CARF foram suspensas –, contra 23.094, no ano de 201440. Assumindo que os números de 2014 repetir-se-ão em 201641, aproximadamente seis processos serão julgados diariamente por cada órgão do CARF42. Nesse cenário, embora não seja impossível, é difícil crer que conselheiros não familiarizados com as diversas teorias econômicas encontrem tempo para estudar adequadamente o texto tributário a partir das características econômicas a que o legislador pretensamente quis referir-se.

Esse quadro repete-se, de alguma forma, no Judiciário brasileiro. Mais uma vez, apenas a título exemplificativo, os ministros do Supremo Tribunal Federal são bacharéis em Direito e a nomeação de seus assessores também demanda a formação jurídica43. O número de processos a serem julgados é enorme e não se restringe a questões tributárias. Entre os anos de 1988 a 2013, foram julgados 1.348.750 processos, dos quais 218.147 eram de Direito Tributário44.

Dessa forma, vê-se que a defesa por uma interpretação econômica abstrata no Direito Tributário desconsidera ao menos duas importantes críticas. A primeira ao assumir a possibilidade de mera identificação das características econômicas do texto jurídico, como se essas fossem preexistentes à atividade interpretativa. A segunda ao pressupor a capacidade do intérprete de identificar essas características, ainda que ele não tenha qualquer treinamento em ciências econômicas.

i.2) Interpretação econômica em concreto

Riccardo Guastini afirma que a interpretação em concreto “consiste em subsumir um caso concreto no campo de aplicação de uma norma previamente identificada em abstrato”45. Portanto, a interpretação econômica em concreto tem por objeto fatos tributários, lidando com a subsunção do caso concreto à hipótese abstratamente prevista na norma.

Para facilitar a compreensão do exposto acima, tome-se novamente como exemplo a lei do Estado de São Paulo que determina quem é o contribuinte do IPVA. Assume-se, agora, que a partir da interpretação econômica em abstrato, o intérprete já atribuiu ao texto o sentido N2. Falta-lhe, portanto, identificar os casos que se subsomem a esta norma. Um motorista particular contratado por uma mãe para transportar seus filhos no carro da família é contribuinte do IPVA? E um funcionário de uma empresa que fornece automóveis aos seus empregados para sua comodidade e transporte?

Para responder a essas perguntas o intérprete deve analisar se em cada um desses casos se fazem presentes os elementos necessários e suficientes (art. 114 do CTN) para a incidência da norma tributária. Exemplificativamente, poder-se-ia fazer o seguinte raciocínio:

Texto: Contribuinte do imposto é o proprietário do veículo.

N2. Contribuinte do imposto é aquele capaz de controlar o veículo automotor, assumindo os riscos e benefícios a ele inerentes.

a) Motorista

O motorista não é capaz de controlar o uso do veículo automotor. O que é feito com o veículo, os horários nos quais o carro estará em circulação, quem pode utilizar o automóvel, dentre outras questões, não são determinadas pelo motorista. Igualmente, os riscos relativos à manutenção do veículo, a eventuais defeitos e aos custos decorrentes de acidentes não são por ele suportados. Por fim, o automóvel é utilizado em proveito das crianças, e não em razão das necessidades do motorista. Dessa forma, nenhum dos elementos necessários e suficientes para a incidência da norma tributária se faz presente na situação do motorista. Logo, este não pode ser tido como um dos contribuintes do imposto.

b) Funcionário

O funcionário é capaz de controlar o uso do veículo automotor. Ele determina quando irá usar o veículo e quem, além de si, poderá utilizá-lo. Ele também assume os riscos que lhe são relativos, uma vez que em caso de manutenção, defeito e acidente, é o próprio funcionário que ficará privado do bem. Por fim, é ele quem se beneficia do carro, valendo-se deste para a sua comodidade e transporte. Desse modo, os elementos necessários e suficientes para a incidência da norma tributária estão satisfeitos nessa situação concreta. Logo, o funcionário pode ser tido como um dos contribuintes do imposto.

Os dois exemplos acima são interessantes porque permitem visualizar quais são os elementos a serem identificados pelo intérprete para classificar cada caso dentro da previsão abstrata da norma. Mais evidente, no entanto, é o fato de que a interpretação econômica em concreto segue logicamente a interpretação econômica em abstrato46. Em outras palavras, somente após a reconstrução do sentido da norma a partir das características econômicas expressas no texto jurídico, é possível ao intérprete verificar a manifestação dessas mesmas características no caso concreto.

Com base no até aqui exposto, pode-se definir a interpretação econômica em concreto como a qualificação, a partir da identificação das características econômicas, do fato praticado pelo contribuinte. Embora pareça trivial, essa definição revela possíveis dificuldades a serem enfrentadas pela interpretação econômica em concreto.

A primeira dificuldade diz respeito à possibilidade de mera identificação, pelo intérprete, das características econômicas do fato praticado pelo contribuinte, como se este sempre fosse composto de elementos econômicos típicos e/ou óbvios. Ainda que em algumas situações o contribuinte pratique atos e realize negócios jurídicos cujas características econômicas são facilmente determináveis – os exemplos utilizados acima parecem ser relativamente simples a ponto de gerarem pouca controvérsia –, em outros casos a identificação precisa do fato com o seu respectivo conteúdo econômico pode ser, no mínimo, problemática.

Para exemplificar, imagine uma família na qual a mãe e o pai compartilham um carro. Sempre antes de usar o veículo para levar os filhos à escola, a mãe pergunta ao pai se este precisará do automóvel no seu trabalho. Quando o avô necessita usar o carro, a mãe não pode simplesmente emprestá-lo, pois depende da concordância do seu marido. No entanto, quando o carro precisa de reparos ou revisão, tanto a mãe quanto o pai arcam com os custos. Da mesma forma, os dois se beneficiam do bem. Seria correto dizer que a situação da mãe se enquadra em N2? Ela assume os riscos inerentes ao uso do veículo automotor e dele se beneficia, mas não é perfeitamente claro se ela tem a capacidade de controlar a utilização do automóvel.

Problemas de qualificação como o exposto acima não são peculiares da interpretação econômica em concreto. A grande questão é que eles costumam ser ignorados por defensores desse método interpretativo, talvez devido à crença de que conceitos econômicos são mais precisos do que conceitos jurídicos, o que não necessariamente é verdadeiro.

A segunda dificuldade é o estabelecimento de uma relação adequada entre a interpretação econômica em concreto e as teorias da prova no Direito Tributário. O tema é extremamente complexo. Primeiramente, é possível perguntar o que deve ser provado, ou seja, qual é o objeto da prova. Se a norma tributária preocupa-se com as características econômicas, se o intérprete deve qualificar o fato a partir de seus elementos econômicos e, mais do que isso, se a subsunção depende da correspondência entre as características econômicas abstratamente previstas e os elementos econômicos do caso concreto, então se pode argumentar que o que deverá ser provado não é a realização de um ato ou negócio jurídico pelo contribuinte, mas sim os próprios elementos econômicos supostamente presentes no fato por ele praticado. Qual seria a prova hábil para exercer essa função? Elementos econômicos poderiam ser provados a partir de seus efeitos? Quantos elementos econômicos diferentes seriam necessários para afirmar que o fato praticado pelo contribuinte revestir-se-ia de características econômicas suficientemente diversas para não ser enquadrado no conceito econômico previsto na norma?

Os dilemas são ainda maiores quando se olha para as dúvidas relativas ao standard e ao ônus de prova a serem adotados. De acordo com Luís Fernando Schuartz, “a conclusão quanto à prova jurídica de um fato é algo que, necessariamente, implica a tomada de decisões não triviais”47 relativamente ao standard e ao ônus de prova. Em relação ao standard, qual seria o conceito de verdade a ser utilizado? O standard utilizado para provar atos e negócios jurídicos seria idêntico àquele para provar elementos econômicos? Quanto ao ônus de prova, pode-se argumentar que ele recairia sobre a autoridade administrativa, uma vez que, nos termos do art. 142 do CTN, é ela a competente para constituir o crédito tributário por meio do lançamento. Mas uma vez feita a autuação, inverter-se-ia o ônus da prova? Seria o contribuinte capaz de provar a ausência de elementos econômicos?

Mais uma vez, os obstáculos a serem enfrentados por defensores de uma teoria econômica em concreto parecem ser de tal monta a ponto de indicarem que a empreitada talvez devesse ser abandonada.

Visto o que é a interpretação econômica, a próxima pergunta é para que ela serve. Contudo, antes de avançar, pertinente se faz um último comentário. A definição apresentada aqui, distinguindo entre interpretação econômica em abstrato e concreto, teve o fim precípuo de apontar que o sucesso da interpretação econômica depende das respostas às diversas críticas que podem ser tecidas a cada uma de suas etapas. Trata-se, nesse sentido, de uma separação para fins analíticos, já que o intérprete utiliza ambas concomitantemente.

ii) Para que serve a interpretação econômica (ou qual é a finalidade da interpretação econômica).

Como tratado brevemente na introdução deste artigo, o termo “interpretação” é ambíguo. Essa parte do trabalho preocupa-se com uma ambiguidade específica, qual seja, aquela que confunde a atividade ou o processo interpretativo com o seu resultado48. Desse modo, será defendido que a interpretação econômica é “enquanto atividade [...] um processo mental”49 cujo resultado pode variar, dentre outros, entre uma interpretação corretora, seja ela extensiva ou restritiva50, e a introdução de uma norma implícita por analogia ou equidade.

Uma importante premissa a nortear o argumento que será desenvolvido é a de que o intérprete não é totalmente livre em sua atividade. Com efeito, conceder-lhe a capacidade de desconsiderar o texto jurídico implicaria a aceitação de que as palavras usadas pelo legislador constituinte ou infraconstituinte têm pouca ou nenhuma relevância, de tal sorte que tudo pode significar qualquer coisa. Faz-se necessário admitir, portanto, que ainda que os textos sejam equívocos, padecendo de problemas de ambiguidade, complexidade, implicação e defectibilidade51, eles constrangem a atividade interpretativa, estabelecendo limites mínimos a serem observados pelo intérprete52.

A interpretação econômica é uma técnica interpretativa53 que fornece critérios para sustentar o resultado interpretativo escolhido pelo intérprete. De acordo com o exposto na parte (i), a primeira etapa da interpretação econômica consiste na reconstrução do sentido da norma a partir das características econômicas do texto jurídico. Assim, se o dispositivo normativo refere-se a propriedade, o intérprete deve procurar quais são os elementos econômicos necessários e suficientes à sua conceituação. Na etapa seguinte, o intérprete verifica nos fatos se estes elementos se repetem, atraindo, portanto, a incidência normativa. Dois resultados são, então, possíveis: a incidência e a não incidência da norma tributária. No primeiro caso, possivelmente se estará diante de uma interpretação extensiva ou analógica, enquanto que no segundo provavelmente se dirá que o resultado obtido é uma interpretação restritiva.

Um exemplo pode esclarecer os conceitos expostos até aqui. No Recurso Extraordinário n. 540.829/SP, o Supremo Tribunal Federal teve que se posicionar quanto à incidência do ICMS sobre a importação de bens sob o amparo de contrato de arrendamento mercantil internacional. Por maioria, vencidos os ministros Gilmar Mendes e Teori Zavascki, o Tribunal negou provimento ao recurso, reconhecendo a impossibilidade da cobrança54.

Prevaleceu o entendimento de que não incidiria o ICMS na operação de arrendamento mercantil internacional porque não haveria a transferência de titularidade do bem. Nesse sentido, o ministro Marco Aurélio ressaltou que, segundo a jurisprudência do Tribunal, seria necessária uma “circulação qualificada” a partir de uma compra e venda55. Assim, para a maioria do STF, a circulação jurídica do bem, entendida como a transferência dos direitos de propriedade, constituiria um elemento essencial, sem o qual não poderia haver a cobrança do imposto.

Diversas técnicas interpretativas foram utilizadas pelos ministros para chegar a este entendimento. Interpretação linguística, apelando a um suposto significado literal56 dos termos utilizados na Constituição57; interpretação sistemática58, visando à compreensão do texto a partir da sua relação com outras normas do ordenamento jurídico59; interpretação a partir das consequências, preocupada com os efeitos que a decisão poderia gerar no mundo real60, dentre outros. Houve, no entanto, uma rejeição expressa, pelo ministro Luiz Fux, da interpretação econômica.

Com efeito, a interpretação econômica, se aplicada neste caso, poderia ter levado a um resultado sensivelmente diferente daquele a que chegou o STF. Para corroborar essa afirmativa, imagine-se um ministro fictício que, com base na interpretação econômica, tenta resolver a controvérsia apresentada ao Tribunal.

O primeiro passo do ministro, dado que ele não pode desconsiderar o texto da Constituição, é procurar quais dispositivos são relevantes para a solução do caso concreto. Nesse sentido, ele identifica dois dispositivos principais: o primeiro é aquele que confere ao Estado a competência tributária para instituição do “imposto sobre as operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior” (art. 155, II, da CF/1988). O segundo é aquele que também determina a incidência do ICMS sobre “a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço” (art. 155, § 2º, IX, “a”, da CF/1988).

Dessa forma, o ministro identifica, desde já, a existência de alguns casos claros, nos quais a incidência do ICMS parece incontroversa. Dentre esses, vê a hipótese da compra de um carro importado por um contribuinte não habitual do ICMS. No entanto, como a questão que lhe foi posta diz respeito à atividade de arrendamento mercantil internacional, ele busca a solução por meio de uma interpretação econômica. O ministro poderia adotar o seguinte raciocínio.61

Dispositivos

Art. 155, II, da CF/1988.

Art. 155, § 2º, IX, “a”, da CF/1988.

Se A K

Se há compra de um carro importado ICMS importação.

A tem a característica econômica X.

 

 

 

(N1) Se característica econômica X K

B tem a característica econômica X.

 

 

 

Se B K

Compra de um carro importado transfere o ativo (“recurso controlado pela entidade como resultado de eventos passados e do qual se espera que fluam futuros benefícios econômicos para a entidade”61).

(N1) Se transferência de ativo ICMS importação.

Arrendamento mercantil é transferência de ativo (o bem passa a ser controlado pela entidade como resultado da celebração de um contrato e dele se esperam benefícios econômicos).

Se arrendamento mercantil ICMS importação.

Dado que o ministro fictício tem dúvidas quanto à melhor interpretação do texto e não pode, ao mesmo tempo, dele fugir, o primeiro passo é buscar um caso claro de incidência normativa para guiar o seu processo interpretativo. Uma vez identificado o caso da compra de um automóvel importado como supostamente compreendido no núcleo da norma, o ministro parte para uma etapa subsequente, que consiste na identificação de suas características econômicas. O ministro reconhece a transferência de ativo como a principal característica da operação de compra e venda e, por meio de um processo indutivo, reconstrói o sentido da norma de tal modo que essa poderia assim ser expressa: “se há transferência de ativo, então incide ICMS importação”. O ministro retorna, então, ao caso emblemático e verifica se nele se faz presente esse elemento econômico. Ao analisar o arrendamento mercantil internacional, vê que este também tem como uma de suas características a transferência de ativo. Assim, conclui pela incidência do ICMS sobre o arrendamento mercantil internacional.

Como se pode perceber, a norma reconstruída pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n. 540.829/SP, é a que prescreve a incidência do ICMS na importação de bens e mercadorias do exterior desde que haja uma operação de compra e venda. Entretanto, a partir da interpretação econômica, a exigência da operação de compra e venda é entendida não como uma obrigatoriedade para a incidência da norma, mas antes como uma referência à necessidade de haver a transferência de ativo para que o ICMS possa ser devido.

Nesse cenário, vê-se que o texto, apesar de servir como ponto de partida, não constrange a atuação do intérprete. Há a criação de uma nova norma, antes inexistente no ordenamento jurídico, permitindo a tributação do fato supostamente idêntico, em termos econômicos, àquele previsto no antecedente da norma tributária preexistente.

Quando se percebe que a interpretação econômica com frequência levará a um resultado analógico, várias questões surgem. O tema fica ainda mais complexo conforme a quantidade de elementos econômicos necessários à definição da hipótese de incidência.

N1: Se A K

A tem as características econômicas X e Y.

N1’: Se características econômicas X e Y K.

O intérprete reconstrói, a partir das características econômicas, o sentido da norma para a caracterização da hipótese tributária.

B tem as características econômicas X e Y.

Se B K

Interpretação econômica diz que B deve ser tributado.

C tem a características econômicas X, Y e Z.

Se C K

Interpretação econômica diz que C deve ser tributado (os elementos necessários e suficientes – X e Y – se fazem presentes).

D tem as características econômicas X e Z.

Se D K

Interpretação econômica diz que D não deve ser tributado (os elementos necessários e suficientes – X e Y – não se fazem presentes).

F tem as características econômicas X, Y, Z, M, N, O.

Se F ?

A tributação é, no mínimo, duvidosa. F parece ter elementos econômicos suficientemente diferentes de A para justificar a não incidência. No entanto, os elementos supostamente necessários e suficientes se fazem presente.

G tem a característica econômica X.

Se G K

Interpretação econômica diz que G não dever ser tributado (os elementos necessários e suficientes – X e Y – não se fazem presentes).

Além dos casos hipotéticos acima, outros poderiam ser adicionados. No entanto, os exemplos permitem visualizar com maior nitidez o processo da interpretação econômica como tendente à produção de um resultado analógico. Isso ocorre porque a reconstrução do sentido da norma se dá por meio da identificação das características econômicas a que o texto supostamente faz referência, desconsiderando, na maior parte das vezes, os limites por ele impostos. Assim, uma vez que não se tratam de fatos previamente compreendidos na esfera de incidência da norma, o que se tem, na realidade, é a criação de uma nova norma tributária impositiva por meio da analogia – o fato B é suficientemente parecido com o fato A, já que ambos têm as características econômicas X e Y, razão pela qual B também deve ser tributado, e.g.

Uma vez esclarecido o que é a interpretação econômica e para que ela serve, a última questão a ser respondida é a relativa ao seu fundamento, isto é, se ela encontra ou não suporte no ordenamento jurídico tributário brasileiro.

iii) Por que interpretação econômica (ou qual é o fundamento para a interpretação econômica)

Já dizia Alfredo Augusto Becker que “as leis tributárias são regras jurídicas com estrutura lógica e atuação dinâmica idênticas às das demais e, portanto, interpretam-se como qualquer outra lei”62. De fato, não há nenhuma peculiaridade na estrutura formal de uma norma jurídico-tributária capaz de a diferenciar das outras existentes no ordenamento. A estrutura de todas é a mesma: um enunciado condicional formado por um antecedente e um consequente63 (se ocorrer o evento x, então dever-ser consequência jurídica y). No entanto, defensores da interpretação econômica no Direito Tributário brasileiro procuram justificar a utilização dessa técnica interpretativa com base em dois fundamentos principais.

O primeiro fundamento alegado para sustentar a interpretação econômica guarda estreita relação com o fim da norma tributária. A noção do Direito como instrumento para a realização de fins socialmente desejáveis64, quando transportada para a seara tributária65, implicaria a tese de que este ramo teria por fim precípuo a arrecadação, objetivando a consecução de finalidades constitucionalmente relevantes. Dessa forma, a interpretação econômica seria a técnica a ser utilizada para assegurar a maximização da riqueza, uma vez que levaria à tributação não só dos casos compreendidos na literalidade do dispositivo normativo, mas também daqueles que se revestissem de todas as características econômicas a que este supostamente fizesse referência.

O principal equívoco desse fundamento é logo percebido. Se é verdade que diversas normas tributárias têm por fim precípuo a arrecadação, isso não é necessariamente verdadeiro para todas elas. Com efeito, também é nítido o caráter instrumental do Direito Tributário para a indução do comportamento dos indivíduos66-67, de tal sorte que nesses casos não faria sentido a adoção de uma interpretação que servisse apenas para maximizar a arrecadação. Soma-se a esta crítica o fato de que uma interpretação fundada exclusivamente no incremento arrecadatório seria capaz de justificar, em última instância, qualquer imposição. A consequência seria o “progressivo alargamento da obrigação tributária”68.

O segundo fundamento comumente utilizado para sustentar a interpretação econômica no Direito Tributário reside no reconhecimento da relação das normas desse ramo com fenômenos de fundo econômico. Uma vez que os pressupostos de fato da norma tributária relacionar-se-iam a acontecimentos e condições econômicos69, já que “índices de riqueza ou de capacidade contributiva é que são objeto de tributação”70, daí decorreria que “os fundamentos econômicos da lei tributária vincula[riam] e condiciona[riam] os efeitos jurídicos”71.

Uma crítica possível a esse fundamento é aquela que reconhece que “a mera menção a determinadas palavras já coloca limites semânticos mínimos que não podem ser ultrapassados”72. Dessa forma, ao interpretar o texto normativo como mero ponto de partida para o desenvolvimento de uma interpretação focada no conceito econômico a que ele faz referência, os limites semanticamente impostos são simplesmente ignorados pelo intérprete.

Uma defesa menos extrema do fundamento acima reconheceria que a lei tributária poderia se referir tanto a situações econômicas quanto a situações civis, sendo imprescindível, para se determinar a técnica interpretativa, a análise do contexto no qual a norma estaria inserida73. Nesse sentido, a interpretação econômica seria privilegiada quando notado que o legislador quis se referir a um conteúdo econômico, de modo que o termo empregado na lei exteriorizaria apenas a “circunstância de que situações econômicas geralmente surgem em determinadas formas jurídicas”74.

Esse fundamento pode esbarrar em algumas dificuldades práticas, na medida em que, diante do caso concreto, pode ser difícil determinar, com um relativo grau de certeza, se o legislador quis fazer referência a um conceito econômico em detrimento da adoção de um conceito de direito privado.

Como se pode notar, os dois fundamentos supramencionados são genéricos e, além das críticas já endereçadas, pode-se tecer ainda outra: ambos desconsideram os limites impostos pelo ordenamento jurídico-tributário brasileiro. Assim, será argumentado nos parágrafos seguintes que um olhar sistemático do ordenamento pátrio leva à conclusão de que a interpretação econômica que resulta no aumento ou imposição de carga impositiva é vedada na seara tributária.

O primeiro fundamento para corroborar com a tese de que a interpretação econômica é vedada no Direito Tributário brasileiro é a rejeição do art. 74 do anteprojeto do CTN encaminhado ao Congresso Nacional75. O artigo procurou introduzir no Direito Tributário brasileiro a autorização ao uso da interpretação econômica, em termos semelhantes à definição proposta na parte (i) do presente trabalho. No entanto, o dispositivo não foi aprovado para a versão final do Código Tributário Nacional, o que permite concluir que o legislador rejeitou expressamente a adoção da interpretação econômica como técnica interpretativa legítima no Direito Tributário brasileiro.

Um segundo fundamento é pautado nas regras e princípios componentes do ordenamento jurídico brasileiro. Nesse sentido, da legalidade, prevista genericamente no art. 5º, II, da CF/1988 e, especificamente na seara tributária, no art. 150, I, da CF/1988, extrai-se a ideia de que a liberdade do contribuinte só pode ser restringida por meio de lei em sentido formal. Dessa forma, para a incidência da norma tributária impositiva, é necessária a existência de uma lei abstrata e genérica, criada a partir do procedimento legislativo democrático.

A interpretação econômica viola a legalidade por três razões principais. Primeiramente porque exige do contribuinte tributo não previsto em lei, uma vez que essa técnica serve para expandir a hipótese de incidência normativa – incluindo fatos economicamente equivalentes àquele ao qual a norma faz referência – e para criar uma nova norma antes não prevista no ordenamento jurídico – o raciocínio analógico introduz uma nova norma para assegurar que fatos iguais, em termos econômicos, serão tributados da mesma forma.

Em segundo lugar, a interpretação econômica viola a legalidade porque atribui ao intérprete a competência para instituição de norma reservada à lei elaborada pelo Poder Legislativo. Com efeito, sob o véu da interpretação, há verdadeira inovação no ordenamento jurídico, já que um fato não alcançado pela norma impositiva passa a ser tributado com base na identificação das suas características econômicas.

A terceira razão pela qual a interpretação econômica viola a legalidade é a seguinte. Dois atributos essenciais da lei são a generalidade e a abstração. Quando, por via interpretativa, amplia-se o antecedente da norma tributária ou se cria uma nova norma para que o fato economicamente equivalente possa também ser objeto da tributação, há uma flexibilização desses dois atributos. Isso porque o intérprete já sabe quais serão os casos alcançados pela norma e, mais importante, ele já sabe quais serão os contribuintes que se verão afetados pela introdução dessa nova norma.

A interpretação econômica também viola a segurança jurídica, pois afeta os ideais de cognoscibilidade, de calculabilidade e de confiabilidade76. Em relação à cognoscibilidade, é necessário que o contribuinte “tenha acesso material e intelectual ao conceito normativo”77, de tal sorte que esse tenha um núcleo mínimo de significação do qual o intérprete não possa se afastar. A interpretação econômica, ao se preocupar exclusivamente com os elementos econômicos, extrapola os limites impostos pelo texto normativo e, consequentemente, desconsidera que se o legislador escolheu certas palavras, preferiu essas e não outras, de modo que elas significam alguma coisa e não podem significar qualquer coisa.

A interpretação econômica também afeta o ideal de calculabilidade, pois impacta negativamente na capacidade do contribuinte de prever as consequências jurídicas dos atos e negócios jurídicos por ele praticados. Isso se dá porque somente posteriormente à prática do ato pelo contribuinte ocorre a criação da norma tributária impositiva, por meio de uma técnica interpretativa. Dessa forma, o contribuinte não sabe, antes de praticar o fato, se este é ou não uma hipótese de incidência da norma. Aqui também vale destacar que o contribuinte tem a sua dignidade violada (art. 1º, III, da CF/1988) pois é incapaz de se determinar livremente (ele não sabe hoje quais serão as consequências de suas escolhas amanhã) e é tratado como mero meio para obtenção de um fim, qual seja, o incremento da arrecadação estatal.

Por fim, a interpretação econômica afeta o ideal de confiabilidade porque o contribuinte que escolheu praticar um ato sabendo que ele não seria objeto de tributação vê-se surpreendido posteriormente com a sua inclusão, por meio da interpretação econômica, na hipótese de uma norma preexistente ou recém-criada.

Além desses fundamentos, pode-se, finalmente, sustentar, com base no art. 5º da Constituição Federal, que a liberdade e a propriedade constituem direitos e garantias fundamentais do contribuinte. Se nem o legislador constituinte derivado tem competência para restringir esses direitos (art. 60, § 4º, IV, da CF/1988), tanto menos deveria ter o intérprete que se vale da interpretação econômica.

Conclusão

Este artigo pretendeu contribuir para as discussões relativas à interpretação econômica no Direito Tributário por meio da resposta a três questões distintas: (i) o que é interpretação econômica?; (ii) para que serve interpretação econômica?; e (iii) por que interpretação econômica?

A resposta a cada uma dessas perguntas pode ser formulada nos seguintes termos:

i) É possível distinguir duas etapas lógicas na interpretação econômica, quais sejam, a interpretação em abstrato e a interpretação em concreto.

i.1) A interpretação econômica em abstrato consiste na interpretação mediante a qual o intérprete reconstrói, a partir das características econômicas, o sentido da norma para a caracterização da hipótese tributária.

i.2) A interpretação econômica em concreto consiste na qualificação, a partir da identificação das características econômicas, do fato praticado pelo contribuinte.

ii) A interpretação econômica é uma técnica interpretativa que fornece critérios para sustentar o resultado interpretativo escolhido pelo intérprete, seja ele uma interpretação corretora (extensiva ou restritiva) ou a introdução de uma norma implícita por analogia ou equidade.

iii) A vedação à interpretação econômica no Direito Tributário brasileiro encontra fundamento constitucional, dentre outros, nas noções de legalidade, segurança jurídica, dignidade da pessoa humana, propriedade e liberdade.

Referências

ADAMY, Pedro. Instrumentalização do direito tributário. In: ÁVILA, Humberto (org.). Fundamentos do direito tributário. São Paulo: Marcial Pons, 2012.

ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2014.

_____. Função da ciência do direito tributário: do formalismo epistemológico ao estruturalismo argumentativo. Revista Direito Tributário Atual vol. 29. São Paulo: Dialética e IBDT, 2013.

_____. Série Cadernos do CEJ vol. 30. Seminário Teoria da Decisão Judicial: 23, 24 e 25 de abril de 2014, Brasília-DF/Conselho da Justiça Federal. Centro de Estudos Judiciários. Coordenação Científica Ricardo Villas Bôas Cueva. Brasília: CJF, 2014.

_____. Planejamento tributário. Revista de Direito Tributário vol. 98, 2006.

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. São Paulo: Saraiva, 1963.

BOZZA, Fábio Piovesan. Planejamento tributário e autonomia privada. Série Doutrina Tributária vol. XV. São Paulo: Quartier Latin, 2015.

BRASIL. Receita Federal. Relatório de gestão do exercício de 2015. Disponível em: <http://idg.carf.fazenda.gov.br/acesso-a-informacao/relatorio-de-gestao/relatorio-de-gestao-do-exercicio-de-2015-do-carf-versao-final.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2016.

_____. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 540.829/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, Rel. p/ Acórdão Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. em 11.09.2014, DJe 18.11.2014.

CHIRELSTEIN, Marvin A. Learned hand’s contribution to the law of tax avoidance. Faculty Scholarship Series. Paper 4554. Yale Law School Legal Scholarship Repository, 1968. Disponível em: <http://digitalcommons.law.yale.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=5558&context=fss_papers>. Acesso em: 6 jun. 2016.

FGV Direito Rio. Supremo em Números. A carga de trabalho do STF. Disponível em: <http://www.fgv.br/supremoemnumeros/visualizacoes/cfilter-stf/index.html>. Acesso em: 9 dez. 2015.

GRECO, Marco Aurélio. Planejamento tributário. 3. ed. São Paulo: Dialética, 2011.

_____. Solidariedade social e tributação. In: GRECO, Marco Aurélio; e GODÓI, Marciano Seabra de (org.). Solidariedade social e tributação. 1. ed. São Paulo: Dialética, 2005.

GUASTINI, Riccardo. Interpretar y argumentar. Traduccíon de Silvina Álvarez Medina. Madrid: Centro de Estudos Políticos y Constitucionales, 2014.

HART, H. L. A. The concept of law. 2. ed. Clarendon Law Series. New York: Oxford University Press Inc., 1994.

HAUSMAN, Daniel M. Philosophy of economics. The Stanford Encyclopedia of Philosophy, 2013. Disponível em: <http://plato.stanford.edu/archives/win2013/entries/economics/>. Acesso em: 20 jun. 2016.

HODGSON, Geoffrey M. “The economics of property rights” is about neither property nor rights. Disponível em: <http://web.law.columbia.edu/sites/default/files/microsites/law-economicsstudies/20141104_ec_prop_rights_about_neither.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2015.

LAPORTA, Francisco J. El imperio de la ley: una visión actual. Madrid: Trotta Editorial, 2007.

MACCORMICK, Neil. Rhetoric and the rule of law. A theory of legal reasoning. New York: Oxford University Press Inc., 2005.

NABAIS, José Casalta. Solidariedade social, cidadania e direito fiscal. In: GRECO, Marco Aurélio; e GODÓI, Marciano Seabra de (org.). Solidariedade social e tributação. 1. ed. São Paulo: Dialética, 2005.

NOGUEIRA, Johnson Barbosa. A interpretação econômica no direito tributário. São Paulo: Resenha Tributária, 1982.

NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Da interpretação e da aplicação das leis tributárias. 2. ed. São Paulo: RT, 1968.

PATTERSON, Dennis. Meaning, mind and law (collected essays in law). Farnham: Ashgate, 2008.

RECEITA FEDERAL DO BRASIL. Plano anual da fiscalização da Receita Federal do Brasil para 2016 e resultados de 2015. Disponível em: <http://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/resultados/fiscalizacao/arquivos-e-imagens/plano-
anual-fiscalizacao-2016-e-resultados-2015.pdf>. Acesso em: 17 jun. 2016.

RIBEIRO, Ricardo Lodi. A disparidade de armas na relação entre o fisco e os contribuintes. Revista Consultor Jurídico [on-line], 4 de março de 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-mar-04/ricardo-lodi-disparidade-armas-entre-fisco-contribuintes>. Acesso em: 17 jun. 2016.

SANCILIO. Clarifying (or is it codifying?) the “notably abstruse”: step transactions, economic substance, and the tax code. Columbia Law Review vol. 113, n. 1, 2013.

SANTI, Eurico Marcos Diniz de. Fisco e contribuintes estão alienados na névoa do sistema. Revista Consultor Jurídico [on-line], 20 de março de 2014. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-mar-20/eurico-santi-fisco-contribuintes-alienados-nevoa-sistema>. Acesso em: 17 jun. 2016.

SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

SCHUARTZ, Luís Fernando. Interdisciplinariedade e adjudicação: caminhos e descaminhos da ciência no direito. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/2174?show= full>. Acesso em: 30 nov. 2015.

TAMANAHA, Brian. Law as a means to an end. Threat to the rule of law. Cambridge: Cambridge University Press, 2006.

THE WORLD BANK. World development indicators. Disponível em: <http://data.worldbank.org/data-catalog/GDP-ranking-table>. Acesso em: 17 jun. 2016.

TIPKE, Klaus; e LANG, Joachim. Direito tributário. 18. ed. Tradução de Luiz Dória Furquim. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2008. vol. I.

UNITED NATIONS ECONOMIC COMMISSION FOR EUROPE STATISTICAL DIVISION, United Nations. Draft Chapter 2. Economic ownership and changes in ownership goods, non-financial assets, financial assets and liabilities – prepared by Central Statistical Office of Ireland. Meeting of Group of Experts on National Accounts. Interim meeting on Global Production, 12th session. Geneva, 2013. Disponível em: <https://www.unece.org/fileadmin/DAM/stats/documents/ece/ces/ge.20/2013/Working_Paper_2.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2016.

VERMEULE, Adrian. Judging under uncertainty: an institutional theory of legal interpretation. Massachussetts: Harvard University Press, 2006.

1 RECEITA FEDERAL. Plano Anual da Fiscalização da Receita Federal do Brasil para 2017 e Resultados de 2016. Disponível em: <http://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/resultados/fiscalizacao/arquivos-e-imagens/plano-anual-de-fiscalizacao-2017-e-resultados-2016.pdf>. Acesso em: 30 out. 2017.

2 Idem.

3 THE WORLD BANK. World development indicators. Disponível em: <http://data.worldbank.org/data-catalog/GDP-ranking-table>. Acesso em: 17 jun. 2016.

4 RECEITA FEDERAL DO BRASIL. Op. cit., p. 25.

5 SANTI, Eurico Marcos Diniz de. Fisco e contribuintes estão alienados na névoa do sistema. Revista Consultor Jurídico [on-line], 20 de março de 2014. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-mar-20/eurico-santi-fisco-contribuintes-alienados-nevoa-sistema>. Acesso em: 17 jun. 2016.

6 Idem.

7 GRECO, Marco Aurélio. Planejamento tributário. 3. ed. São Paulo: Dialética, 2011, p. 341-346.

8 O teste parece ter sido importado dos Estados Unidos, onde diversas decisões judiciais (dentre elas, destacam-se Gregory v. Helvering, Knetsch v. United States, Frank Lyon Co. v. United States) serviram para o estabelecimento de testes que buscam averiguar se o negócio jurídico praticado pelo contribuinte foi realizado com algum fim que não exclusivamente a redução da sua carga tributária. Para uma descrição da evolução do tema no direito estado-unidense, ver SANCILIO. Clarifying (or is it codifying?) the “notably abstruse”: step transactions, economic substance, and the tax code. Columbia Law Review vol. 113, n. 1, 2013, p. 138-180.

9 NABAIS, José Casalta. Solidariedade social, cidadania e direito fiscal. In: GRECO, Marco Aurélio; e GODÓI, Marciano Seabra de (org.). Solidariedade social e tributação. 1. ed. São Paulo: Dialética, 2005, p. 128.

10 GRECO, Marco Aurélio. Solidariedade social e tributação. In: GRECO, Marco Aurélio; e GODÓI, Marciano Seabra de (org.). Solidariedade social e tributação. 1. ed. São Paulo: Dialética, 2005, p. 171.

11 RIBEIRO, Ricardo Lodi. A disparidade de armas na relação entre o fisco e os contribuintes. Revista Consultor Jurídico [on-line], 4 de março de 2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-mar-04/ricardo-lodi-disparidade-armas-entre-fisco-contribuintes>. Acesso em: 17 jun. 2016.

12 CHIRELSTEIN, Marvin A. Learned hand’s contribution to the law of tax avoidance. Faculty Scholarship Series. Paper 4554. Yale Law School Legal Scholarship Repository, 1968. Disponível em: <http://digitalcommons.law.yale.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=5558&context=fss_papers>. Acesso em: 6 jun. 2016, p. 440.

13 HART, H. L. A. The concept of law. 2. ed. Clarendon Law Series. New York: Oxford University Press Inc., 1994, p. 123.

14 Segundo Fábio Piovesan Bozza, consideração econômica, critério econômico, ponto de vista econômico, interpretação funcional e interpretação em função do resultado seriam algumas das expressões também utilizadas para fazer referência à interpretação econômica (BOZZA, Fábio Piovesan. Planejamento tributário e autonomia privada. Série Doutrina Tributária vol. XV. São Paulo: Quartier Latin, 2015, p. 79).

15 NOGUEIRA, Johnson Barbosa. A interpretação econômica no direito tributário. São Paulo: Resenha Tributária, 1982, p. 18-25.

16 Dentre as ambiguidades que afetam o vocábulo “interpretar”, Guastini aponta que o termo é utilizado para fazer referência ora à atribuição de significado a um texto normativo, ora à qualificação jurídica de um caso concreto. No primeiro caso, estar-se-ia diante da interpretação em abstrato, ao passo que no segundo, poder-se-ia falar em interpretação em concreto, orientada a fatos (GUASTINI, Riccardo. Interpretar y argumentar. Traduccíon de Silvina Álvarez Medina. Madrid: Centro de Estudos Políticos y Constitucionales, 2014, p. 33).

17 Idem.

18 Dentre as ambiguidades que afetam o vocábulo “interpretar”, Guastini aponta que algumas vezes o termo é usado como sinônimo de atividade ou processo, e em outras como produto de uma atividade (GUASTINI, Riccardo. Interpretar y argumentar. Traduccíon de Silvina Álvarez Medina. Madrid: Centro de Estudos Políticos y Constitucionales, 2014, p. 31).

19 ÁVILA, Humberto. Série Cadernos do CEJ vol. 30. Seminário Teoria da Decisão Judicial: 23, 24 e 25 de abril de 2014, Brasília-DF/Conselho da Justiça Federal. Centro de Estudos Judiciários. Coordenação Científica Ricardo Villas Bôas Cueva. Brasília: CJF, 2014, p. 72.

20 GUASTINI, Riccardo. Interpretar y argumentar. Traduccíon de Silvina Álvarez Medina. Madrid: Centro de Estudos Políticos y Constitucionales, 2014, p. 45.

21 GUASTINI, Riccardo. Interpretar y argumentar. Traduccíon de Silvina Álvarez Medina. Madrid: Centro de Estudos Políticos y Constitucionales, 2014, p. 45.

22 ÁVILA, Humberto. Função da ciência do direito tributário: do formalismo epistemológico ao estruturalismo argumentativo. Revista Direito Tributário Atual vol. 29. São Paulo: Dialética e IBDT, 2013, p. 184.

23 Para Guastini, uma das ambiguidades do vocábulo “interpretar” reside na não distinção entre interpretação em sentido estrito (atribuição de significado a um texto) e construção jurídica (criação de lacunas axiológicas e elaboração de normas supostamente implícitas no ordenamento, por exemplo) (GUASTINI, Riccardo. Interpretar y argumentar. Traduccíon de Silvina Álvarez Medina. Madrid: Centro de Estudos Políticos y Constitucionales, 2014, p. 49).

24 Em espanhol: “consiste en identificar el contenido de sentido – es decir, el contenido normativo [...] – expresado por, y/o lógicamente implícito en, un texto normativo [...] sin referencia a ningún caso concreto” (GUASTINI, Riccardo. Interpretar y argumentar. Traduccíon de Silvina Álvarez Medina. Madrid: Centro de Estudos Políticos y Constitucionales, 2014, p. 23).

25 Ibidem, p. 33.

26 Idem.

27 ÁVILA, Humberto. Planejamento tributário. Revista de Direito Tributário vol. 98, 2006, p. 79.

28 UNITED NATIONS ECONOMIC COMMISSION FOR EUROPE STATISTICAL DIVISION, United Nations. Draft Chapter 2. Economic ownership and changes in ownership goods, non-financial assets, financial assets and liabilities – prepared by Central Statistical Office of Ireland. Meeting of Group of Experts on National Accounts. Interim meeting on Global Production, 12th session. Geneva, 2013. Disponível em: <https://www.unece.org/fileadmin/DAM/stats/documents/ece/ces/ge.20/2013/ Working_Paper_2.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2016.

29 Para uma crítica dessa definição, ver HODGSON, Geoffrey M. “The economics of property rights” is about neither property nor rights. Disponível em: <http://web.law.columbia.edu/sites/default/files/microsites/law-economics-studies/20141104_ec_prop_rights_about_neither.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2015.

30 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 731.

31 HAUSMAN, Daniel M. Philosophy of economics. The Stanford Encyclopedia of Philosophy, 2013. Disponível em: <http://plato.stanford.edu/archives/win2013/entries/economics/>. Acesso em: 20 jun. 2016.

32 Idem.

33 Idem.

34 Idem.

35 Idem.

36 VERMEULE, Adrian. Judging under uncertainty: an institutional theory of legal interpretation. Massachussetts: Harvard University Press, 2006, p. 15.

37 Informações extraídas do sítio do CARF. Disponível em: <http://idg.carf.fazenda.gov.br/acesso-a-informacao/servidores/curriculo-de-conselheiros>. Acesso em: 20 jun. 2016.

38 Informações extraídas do sítio do CARF. Disponível em: <http://idg.carf.fazenda.gov.br/acesso-a-informacao/servidores/curriculo-de-conselheiros>. Acesso em: 20 jun. 2016.

39 BRASIL. Receita Federal. Relatório de gestão do exercício de 2015. Disponível em: <http://idg.carf.fazenda.gov.br/acesso-a-informacao/relatorio-de-gestao/relatorio-de-gestao-do-exercicio-de-2015-do-carf-versao-final.pdf>, p. 33. Acesso em: 20 jun. 2016.

40 BRASIL. Receita Federal. Relatório de gestão do exercício de 2015. Disponível em: <http://idg.carf.fazenda.gov.br/acesso-a-informacao/relatorio-de-gestao/relatorio-de-gestao-do-exercicio-de-2015-do-carf-versao-final.pdf>, p. 28. Acesso em: 20 jun. 2016.

41 Dificilmente os números serão os mesmos. Dentre as mudanças realizadas no CARF, destaca-se a redução do número de conselheiros, o que pode influenciar no número total de processos julgados anualmente.

42 O cálculo é aproximado, desconsidera os julgamentos em lote e a existência de feriados.

43 De acordo com o art. 91 do Regulamento da Secretaria do Supremo Tribunal Federal de outubro de 2014 é necessário o bacharelado em Direito para a ocupação do cargo de assessor de Ministro do STF. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/ARQUIVO/NORMA/REGULAMENTODASECRETARIA-C-2003.PDF>. Acesso em: 20 jun. 2016.

44 Dados coletados do programa interativo A carga de trabalho do STF, desenvolvido pelo Supremo em Números, FGV Direito Rio. Disponível em: <http://www.fgv.br/supremoemnumeros/visualizacoes/cfilter-stf/index.html>. Acesso em: 9 dez. 2015.

45 Em espanhol: “la interpretación en concreto (orientada a los hechos), [...] consiste en subsumir un caso concreto en el campo de aplicación de una norma previamente identificada en abstracto” (GUASTINI, Riccardo. Interpretar y argumentar. Traduccíon de Silvina Álvarez Medina. Madrid: Centro de Estudos Políticos y Constitucionales, 2014, p. 33).

46 Segundo Guastini, “aunque las dos cosas sean probablemente indistinguibles en el proceso psicológico de interpretación [...], son dos actividades intelectuales lógicamente distintas” (GUASTINI, Riccardo. Interpretar y argumentar. Traduccíon de Silvina Álvarez Medina. Madrid: Centro de Estudos Políticos y Constitucionales, 2014, p. 33).

47 SCHUARTZ, Luís Fernando. Interdisciplinariedade e adjudicação: caminhos e descaminhos da ciência no direito. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/2174?show
= full>, p. 7-8. Acesso em: 30 nov. 2015.

48 GUASTINI, Riccardo. Interpretar y argumentar. Traduccíon de Silvina Álvarez Medina. Madrid: Centro de Estudos Políticos y Constitucionales, 2014, p. 31.

49 Ibidem, p. 32.

50 Ibidem, p. 112.

51 ÁVILA, Humberto. Função da ciência do direito tributário: do formalismo epistemológico ao estruturalismo argumentativo. Revista Direito Tributário Atual vol. 29. São Paulo: Dialética e IBDT, 2013, p. 190-191.

52 LAPORTA, Francisco J. El imperio de la ley: una visión actual. Madrid: Trotta Editorial, 2007, p. 188.

53 GUASTINI, Riccardo. Interpretar y argumentar. Traduccíon de Silvina Álvarez Medina. Madrid: Centro de Estudos Políticos y Constitucionales, 2014, p. 106.

54 Em 30 de setembro de 2015, por unanimidade, o Senado Federal aprovou a proposta de Emenda à Constituição n. 107. Segundo sua ementa, a PEC “[a]ltera a alínea ‘a’ do inciso IX do § 2º do art. 155 da Constituição Federal, para dispor que incide o Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação na entrada de bem proveniente do exterior, ainda que a importação seja relativa à operação de arrendamento mercantil com ou sem possibilidade de transferência ulterior de propriedade”. Em outubro do mesmo ano, a PEC foi remetida à Câmara dos Deputados, onde aguarda apreciação.

55 Ibidem, p. 62.

56 MACCORMICK, Neil. Rhetoric and the rule of law. A theory of legal reasoning. New York: Oxford University Press Inc., 2005, p. 125.

57 O Ministro Marco Aurélio afirmou que a referência ao termo “bem” foi feita para alcançar os contribuintes não habituais de ICMS, e.g.

58 MACCORMICK, Neil. Rhetoric and the rule of law. A theory of legal reasoning. New York: Oxford University Press Inc., 2005, p. 127.

59 O Ministro Luiz Fux defendeu que a Constituição Federal haveria delegado à lei complementar o estabelecimento de normas gerais em matéria tributária e esta haveria determinado que a Constituição não poderia alterar os conceitos de direito privado, razão pela qual a circulação de mercadoria “pressupõe, evidentemente, uma compra e venda”, e.g.

60 O Ministro Gilmar Mendes afirmou que a não incidência do ICMS levaria a um resultado indesejável no qual a importação seria menos onerosa que a aquisição interna, e.g.

61 Item 4.4 do CPC 00 (R1) – Estrutura conceitual para elaboração e divulgação de relatório contábil e financeiro.

62 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. São Paulo: Saraiva, 1963, p. 100.

63 LAPORTA, Francisco J. El imperio de la ley: una visión actual. Madrid: Trotta Editorial, 2007, p. 88.

64 TAMANAHA, Brian. Law as a means to an end. Threat to the rule of law. Cambridge: Cambridge University Press, 2006, p. 66.

65 O próprio Becker reconhece que “o Direito Tributário como todo o direito positivo, tem natureza instrumental” (BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. São Paulo: Saraiva, 1963, p. 102).

66 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 733.

67 Sobre o caráter instrumental do Direito Tributário, ver ADAMY, Pedro. Instrumentalização do direito tributário. In: ÁVILA, Humberto (org.). Fundamentos do direito tributário. São Paulo: Marcial Pons, 2012, p. 303.

68 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 740.

69 TIPKE, Klaus; e LANG, Joachim. Direito tributário. 18. ed. Tradução de Luiz Dória Furquim. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2008. vol. I, p. 321.

70 NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Da interpretação e da aplicação das leis tributárias. 2. ed. São Paulo: RT, 1968, p. 43.

71 Ibidem, p. 44.

72 ÁVILA, Humberto. Planejamento tributário. Revista de Direito Tributário vol. 98, 2006, p. 79.

73 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 731.

74 Ibidem, p. 730.

75 “Art. 74. A interpretação da legislação tributária visará sua aplicação não só aos atos, fatos ou situações jurídicas nela nominalmente referidos, como também àqueles que produzam ou sejam suscetíveis de produzir resultados equivalentes. Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica: I – Às taxas; II – Aos impostos cujo fato gerador seja a celebração de negócio, a prática de ato, ou a expedição de instrumento, formalmente caracterizados na conformidade do direito aplicável segundo a sua natureza própria”.

76 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 305-306.

77 Ibidem, p. 264-265.