Multas Tributárias Inconstitucionais e o Controle pelo Poder Judiciário

Unconstitutional Tax Penalties and the Control by the Judiciary

Marcílio da Silva Ferreira Filho

Doutorando pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB). Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET). Graduado em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP). Procurador do Estado de Goiás. Advogado. Goiás (GO). E-mail: marciliosff@gmail.com.

Raimundo Nonato Pereira Diniz

Especialista em Direito Público. Procurador do Estado de Goiás. Professor de Direito Constitucional e Administrativo. Goiás (GO). E-mail: dinizmais@gmail.com.

Resumo

Este artigo se propõe a enfrentar uma das principais teses tributárias discutidas em impugnações de contribuintes, indagando acerca da possibilidade ou não de redução de multas tributárias inconstitucionais. O problema envolve uma questão dúplice: de um lado, os contribuintes se valem da argumentação de impossibilidade de se reduzir a multa, em virtude da competência privativa para lançamento e da separação de poderes; de outro lado, a Fazenda Pública argumenta que o controle de constitucionalidade pode ser promovido em relação ao excesso da pena pecuniária. A justificativa do tema se encontra não só na interessante discussão jurídica, mas também pelo impacto que a consequência definida pode resultar em cada caso (exclusão integral ou pagamento parcial). Metodologicamente, o estudo se apropria de conceitos de ciência política e jusfilosóficos acerca do papel do Estado Moderno e Atual e da sua relação com o indivíduo, para centrar o Direito Tributário, especialmente em seu aspecto punitivo, na conformação constitucional do poder sancionador do Estado frente às garantias constitucionais. Ainda, ocupa-se de realizar revisão bibliográfica do estágio atual de discussão do tema, para, enfim, analisar, criticamente, as decisões judiciais paradigmáticas sobre o assunto, especialmente da nossa Corte Constitucional, para, enfim, formular uma posição crítica sobre o objeto de estudo. Tem-se, então, como proposta (plano de trabalho), enfrentar a tese acerca da possibilidade ou não de redução de multas tributárias inconstitucionais pelo Poder Judiciário.

Palavras-chave: tributário, multa tributária, penalidade, inconstitucionalidade, redução, exclusão.

Abstract

This article proposes one of the main tax issues discussed in contestations of taxpayers, asking about the possibility or not of reducing unconstitutional tax penalties. The problem involves a twofold question: on the one hand, taxpayers use the argument that it is impossible to reduce the penalties, by virtue of the private jurisdiction to launch and the separation of powers. On the other hand, the Public Treasury argues that the constitutionality control can be promoted in relation to the excess of the pecuniary penalty. The justification of the topic lies not only in the interesting legal discussion, but also in the impact that the definite consequence can result in each case (full exclusion or partial payment). Methodologically, the study appropriates concepts of political science and jusophilosophical about the role of the Modern and Present State and its relationship with the individual, to focus the Tax Law, especially in its punitive aspect, on the constitutional conformation of the State Sanctioning Power to the Constitutional Guarantees. It is also a matter of carrying out a bibliographical review of the current stage of discussion of the topic, in order to critically analyze the paradigmatic judicial decisions on the subject, especially of our Constitutional Court, in order to formulate a critical position on the object of study. It is then proposed (work plan) to confront the thesis about the possibility or not of reducing unconstitutional tax fines by the Judiciary.

Keywords: tributary, tax penalty, penalty, unconstitutionality, reduction, exclusion.

Introdução

O direito tributário convive com discussões a respeito de teses jurídicas que são constantemente levadas à análise do Poder Judiciário para definição quanto à sua validade ou não. A advocacia privada tributária, por exemplo, é um vasto campo de criação técnica de teses, em que a tributação é analisada com profundidade sob os aspectos de legalidade e de constitucionalidade das normas jurídicas e dos atos administrativos do ente fazendário.

O presente artigo objetiva enfrentar uma dessas teses vigorantes na atualidade: o controle de multas tributárias inconstitucionais pelo Poder Judiciário e suas consequências. A problemática envolve, em síntese, enfrentar as nuances sobre a atuação do Judiciário em face das referidas multas, indagando sobre o caminho adequado a ser trilhado pela decisão judicial, isto é, se o Poder Judiciário deverá afastá-las por completo – eximindo o contribuinte do seu integral pagamento – ou promover a sua redução, excluindo o excesso e mantendo o dever de pagar o valor remanescente compatível com a Constituição.

O tema se justifica pela diversidade de entendimentos doutrinários e jurisprudenciais, com posicionamentos e consequências diversas na solução da controvérsia, acabando por gerar desrespeito ao princípio da igualdade tributária e da segurança jurídica.

Do ponto de vista metodológico, o estudo irá utilizar conceitos de ciência política e jusfilosóficos acerca do papel do Estado contemporâneo focado no Direito Tributário, especialmente em seu aspecto punitivo. Utilizar-se-á, para responder à tese lançada acima, de uma revisão bibliográfica do estágio atual de discussão do tema e das decisões judiciais paradigmáticas sobre o assunto, especialmente da Corte Constitucional brasileira, para, ao fim, formular uma posição crítica sobre o objeto de estudo.

1. Tributação e Punibilidade do Contribuinte Infrator

A tributação é tema que, historicamente, possui grande relevância na formação do direito (aspecto jurídico) ou mesmo na definição política das decisões estatais (aspecto da política tributária). A Revolução Americana e a Revolução Francesa foram exemplos de manifestações históricas marcantes que tiveram, entre os seus motivos incitadores, a discordância quanto à manifestação do poder tributário.

Na Revolução Americana, cita-se a tributação sobre as colônias como um dos elementos dos atos intoleráveis (intolerable acts) que resultaram na manifestação revolucionária, dentre eles a contrariedade ao Stamp Act e aos Townhend Acts, já que os colonos, que eram objeto da tributação, não participavam das decisões do Parlamento de Westminster.

Na Revolução Francesa, no mesmo sentido, via-se a política fiscal como uma das principais discordâncias que resultaram na manifestação e, consequentemente, na queda do regime feudal. Edilson Pereira Nobre Júnior, contextualizando o assunto, explica que:

“Além das iniquidades decorrentes do arcabouço normativo feudal, o campesino francês – noticia George Rudé – suportava ainda uma carga pesada de impostos, dentre os quais: a) o dízimo para a Igreja; b) o taille (imposto direto sobre o ingresso na terra e sobre esta), vingtième (um imposto do vigésimo sobre o ingresso na terra), capitation (imposto per capita sobre o ingresso na terra) e a gabelle (imposto sobre o sal) em favor do Estado; c) o benefício em favor do senhor da propriedade, fosse leigo ou eclesiástico, cuja satisfação envolvia uma série de obrigações, serviços e pagamentos, que iam desde a corvée (trabalho forçado nos caminhos), os cens (renda feudal em dinheiro), o champart (renda em produtos) e os lods et ventes (imposto incidente sobre a transmissão da propriedade não plena); sem contar os pagamentos pelos usos de moinhos, lagares e fornos de pão do senhor.”1

No Brasil, a tributação também se mostra como tema polêmico. Há afirmativas do senso comum de que a carga tributária brasileira é elevada e que não há retorno na prestação de serviços públicos necessários à população. Sem adentrar nesses aspectos críticos de forma aprofundada (v.g., justiça da política tributária), algumas pontuações se fazem necessárias para contextualizar a discussão jurídica pretendida.

A Receita Federal do Brasil, em estudo publicado, relatou em 2015 que a arrecadação tributária equivale a 32,66% do Produto Interno Bruto (PIB), totalizando 1.928,18 bilhões, enquanto que o PIB total é de 5.904,33 bilhões. Além disso, em relação ao ano de 2014 (32,42%), houve aumento da carga tributária, embora o PIB tenha sofrido redução real de 3,8%2. Complementando as informações, relata ainda que a União possui a maior parcela da arrecadação, com 22,3% do PIB, enquanto que os Estados se mantêm com a arrecadação em 8,3% e os Municípios com 2,1%3. Somando-se a tudo isso, o Estado brasileiro ainda se apresenta como um estado em crise para fechamento das contas públicas.

Em que pesem esses números, os registros históricos de políticas filosóficas do Estado – estudado especialmente no âmbito da ciência política – justificam a situação atual do Estado brasileiro. Com o surgimento do Estado de Direito, logo após o Estado absolutista, a forma de intervenção do Estado na vida privada sofreu variações de acordo com a corrente de pensamento filosófico e econômico prevalecente.

De início (logo após a era das revoluções e partindo das teorias contratualistas), o liberalismo prevaleceu – a partir das ideias de Adam Smith – com a filosofia de intervenção mínima do Estado (abstencionismo). A ideologia pregava o papel do Estado exclusivamente para garantia da propriedade e da liberdade individual4.

O socialismo, que veio momentos depois com as exigências sociais de intervenção estatal (v.g., revolução industrial), apresentou proposta inversa, onde o Estado passou a ser intervencionista na vida social e econômica, especialmente de maneira direta na prestação de serviços públicos. Por conseguinte, o aumento da intervenção estatal (vide o programa do New Deal de Roosevelt nos EUA) exigiu a obtenção de maiores recursos, donde sobressai a relevância da arrecadação tributária para cumprimento dos objetivos governamentais.

A viabilidade das políticas estatais interventivas, nesse sentido, passou a depender de uma forte política tributária, que resultou na ampliação do percentual de arrecadação sobre o PIB, tal como verificamos na atualidade. A necessidade de intervir no âmbito econômico e social exige, de outro lado, a obtenção de recursos financeiros suficientes à política projetada.

É bem verdade, que na contemporaneidade – especialmente em decorrência da era de crises fiscais evidenciada a partir da falha no modelo de economia keynesiano – a diminuição da intervenção estatal passou a se tornar pauta de alguns Estados, sem retornar ao modelo liberal tradicional. Prega-se a diminuição do Estado na prestação de serviços públicos diretos, porém mantendo-se a utilização de instrumentos de regulação para minimizar as externalidades negativas do mercado.

Tal perspectiva filosófica vem ganhando força a partir dos estudos voltados ao direito regulatório, havendo quem atribua uma nova nomenclatura a tal modelo, agora intitulado de Estado Regulador ou Estado Subsidiário5. No Brasil, apesar de termos expressamente a autorização constitucional para tal modelo (CRFB/1988, art. 174), a ideia ainda vem se aperfeiçoando, sendo certo que a política estatal ainda não pode ser identificada a partir de um modelo ideológico único.

De qualquer sorte, a política fiscal se configura como um dos instrumentos de viabilização do Estado em todos os setores de sua atuação. Estudá-la e compreendê-la faz parte do contexto do desenvolvimento não só acadêmico, mas também prático-profissional de toda a advocacia e demais operadores do direito.

Alfredo Augusto Becker, nesse sentido, defende que a política fiscal se constitui como uma nova ciência, na medida em que a tributação se exibe como importante instrumento para viabilização de uma política estatal. Segundo ele, pode-se dizer que o Direito Tributário: “é justamente o instrumento fundamental do Estado para poder realizar sua intervenção na economia”. Assim, “a utilização do instrumental jurídico-tributário com esta finalidade fez surgir, nos últimos anos, uma nova Ciência: a política fiscal”6.

Essa política fiscal, por outro lado, se pauta por dois aspectos: a tributação pode ser analisada do ponto de vista da cobrança do tributo em si, onde sobressaem os caracteres tradicionais do tributo (arrecadatório, extrafiscal, parafiscal etc.) ou pode ser observada a partir do ponto de vista da penalidade pelo descumprimento da obrigação tributária acessória ou principal, em que a finalidade última será sempre a punição (em que pese poder ter nascimento da mera mora no adimplemento ou mesmo de uma infração direta à legislação tributária).

Esse breve estudo, como se observa do próprio título, tem por objetivo empreender uma análise quanto ao aspecto da multa tributária, analisando as consequências do controle judicial de constitucionalidade.

2. Multas Tributárias e os Princípios Constitucionais

O Código Tributário Nacional prescreve uma estrutura jurídica que divide a obrigação tributária em principal e acessória, sendo esta consubstanciada em prestações (obrigações de fazer ou não fazer), previstas na legislação tributária (art. 113, § 2º), enquanto que aquela (a principal) corresponde ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária (art. 113, § 1º).

Nesse sentido, a multa tributária diz respeito à “penalidade pecuniária” prevista no CTN, compondo, então, a obrigação tributária principal, seja em decorrência da mora no pagamento do tributo (multa moratória), seja no que concerne ao descumprimento da legislação tributária em geral (multa pecuniária). Em ambas as hipóteses, a finalidade da multa é punir o infrator, objetivando desestimular a prática de atos ilícitos através da sanção.

Assim, na estrutura da Regra-matriz de Incidência Tributária, a penalidade pecuniária é estipulada no consequente da regra para gerar o nascimento da relação jurídica decorrente de sua aplicação, em percentual definido na legislação, o qual varia de acordo com a infração cometida7. Para tanto, é comum nas legislações federal, estadual e municipal, haver percentuais diversos, com tipificações bem definidas para cada espécie, de acordo com a gravidade do ato praticado pelo contribuinte. Em alguns, o percentual representa parcela do valor total do tributo principal, mas em outros chega a ultrapassá-lo (200% ou 300%, exemplificativamente), resultando em uma profunda discussão sobre a constitucionalidade da penalidade pecuniária, em especial daquelas que ultrapassam o valor do principal.

O interessante de se perceber é que, apesar do poder punitivo que a Constituição e o sistema jurídico como um todo conferiu ao Estado, a tendência doutrinária e jurisprudencial é defender que a penalidade não pode advir despida de uma noção de proporcionalidade e de razoabilidade (princípios decorrentes do devido processo legal de natureza substancial)8.

Afinal de contas, a intenção do Fisco, ao penalizar o infrator, não é vê-lo entrar em processo de quebra ou mesmo prejudicar de forma perene a sua atuação no campo econômico. A finalidade última nem poderia assim ser adotada, pois violaria as bases do Estado Democrático de Direito9. Como bem assevera Paulo de Barros Carvalho: “não interessa ao Estado-Administração e à comunidade em geral que uma unidade econômica produtiva venha a desaparecer”10.

É nesse sentido, inclusive, que a Constituição de 1988, em seu art. 150, IV, estabelece como limitação ao poder de tributar a vedação expressa à utilização do “tributo com efeito de confisco”. Na interpretação desse dispositivo, poder-se-ia argumentar que a expressão “tributo” excluiria de sua aplicação a penalidade pecuniária, o que, como veremos a frente, não é tema pacífico na jurisprudência, a despeito da existência de importantes precedentes afirmando a aplicação do princípio da vedação ao confisco às multas tributárias11.

Luís Eduardo Schoueri adiciona um aspecto à questão. Para o autor, a possibilidade de aplicação de penalidades pecuniárias não decorre do poder de punir, mas surge como um mero consectário do poder de tributar, devendo observar todas as garantias que lhe são inerentes:

“[...] se é verdadeiro que é a competência tributária que fundamenta o Direito Tributário Penal, então também se deve concluir que todo o conjunto de garantias que permeiam o relacionamento entre Fisco e contribuinte, na matéria de instituição de tributos, deve aplicar-se às penalidades tributárias.

É bem por isso que diversas sanções, próprias do Direito Penal, não podem ser estendidas ao Direito Tributário Penal. Se é óbvio que não cabe falar em penas restritivas de liberdade, não se pode deixar de apontar que com igual força se devem rechaçar as penas que ultrapassem a capacidade contributiva ou que de algum modo restrinjam o livre exercício da profissão.

A aplicação do princípio da capacidade contributiva reflete-se na proibição do tributo com efeito de confisco.”12

Assim, as alíquotas excessivas são constantemente questionadas perante o Poder Judiciário, seja sob a alegação de violação à proporcionalidade e à razoabilidade; seja por violação ao princípio da vedação ao confisco; seja por defender a violação ao princípio da capacidade contributiva. Como se verá a frente, ainda existe divergência jurisprudencial sobre a aplicação dessas normas jurídicas garantistas às multas tributárias, especialmente no que concerne aos percentuais que se enquadrariam no conceito jurídico indeterminado (o que é ou não é confisco).

Ao definir o percentual incidente para fins de aplicação da multa tributária, o debate tem se renovado sobre outro aspecto: saber qual a atitude que deve ser adotada pelo Poder Judiciário no controle da constitucionalidade relativo à penalidade pecuniária. Deve excluir por inteiro a multa tributária inconstitucional ou reduzi-la ao montante considerado como compatível com a Constituição?

De um lado, o Fisco argumenta a necessidade de observância do princípio da isonomia, da praticabilidade13 e mesmo da justiça fiscal. De outro, os contribuintes argumentam que a redução de alíquotas pelo Poder Judiciário acabaria por atribuir-lhe uma função de legislador positivo, na medida em que criaria uma nova pena pecuniária não prevista em lei, violando o princípio da separação de poderes.

Se, de um lado, alguns contribuintes são beneficiados com a exclusão total da multa e não são punidos pela infração à legislação tributária, tal como se não a houvesse cometido, de outro lado remanescem entendimentos de que a exclusão total causa situação de injustiça e, com isso, exclui-se apenas o excesso. Assim, além de impactar financeiramente na arrecadação tributária e de ensejar um acúmulo de processos com a mesma discussão contenciosa (ante a ausência de pacificidade no posicionamento), a problemática reflete também na relação de igualdade entre o contribuinte em dia com suas obrigações e aquele devedor contumaz ou mesmo infrator específico14.

Em um exemplo prático, para visualizar a questão, podemos imaginar: se um Estado da Federação “X” aplica a penalidade de 200% sobre o valor total do tributo e o Poder Judiciário entende que o percentual máximo admitido pela Constituição é de 100%, deve ele eximir o contribuinte do pagamento total do valor integral da multa ou determinar o seu pagamento no montante correto? Caso exclua a multa, haveria violação à isonomia, beneficiando o infrator em detrimento daqueles que adimpliram o tributo dentro do prazo legal e estimulando-o a prática de novos ilícitos? Por outro lado, caso se admita a redução do percentual para adequação ao admitido pelo Poder Judiciário, estaríamos diante de uma criação de direito, ou seja, a atuação judicial se daria na qualidade de legislador positivo e, portanto, haveria violação ao princípio da segurança jurídica?

Segundo entendemos, os entraves retóricos da figura do “legislador positivo” não devem constituir óbice à redução da multa para adequação ao Texto Constitucional. É que a declaração de inconstitucionalidade, com a exclusão total da penalidade pecuniária, resultaria em uma situação de injustiça fiscal muito maior do que a sua redução, incompatível com os ditames do Estado Democrático de Direito.

A interpretação jurídica e as técnicas de controle de constitucionalidade (inclusive com a possibilidade de interpretação conforme a constituição ou técnicas alternativas de declaração de inconstitucionalidade) demonstram que a adequação do quantum do patamar fixado legalmente ao compatível com a Constituição, de acordo com o entendimento jurisprudencial, é o caminho mais adequado aos preceitos constitucionais, em especial à exigência de isonomia e justiça fiscal.

O formalismo deve ser evitado, privilegiando-se a instrumentalização das formas e o atendimento aos fins das normas jurídicas. A questão, no entanto, não se encontra pacificada do ponto de vista jurisprudencial, sendo afetada por uma instabilidade jurídica decorrente da aplicação de variados entendimentos pelos tribunais pátrios.

Passemos, logo, à análise jurisprudencial da questão.

3. Discussão Jurisprudencial e Questões Polêmicas

A discussão do tema nos tribunais não é recente, mas ainda encontra grande divergência, especialmente por se tratar de tema inserido na limitação aos poderes do Estado (os poderes de tributar e punir), a provocar, sempre, o longo e histórico embate entre o garantismo jurídico15 e o positivismo jurídico.

Essa discussão assume cada vez mais relevo, diante do fortalecimento da construção de um Direito Sancionador ou Direito Punitivo Estatal16, que se alimenta de um núcleo constitucional formado pelos princípios e garantias que, historicamente, já regem, com mais proximidade, as sanções do Direito Penal17. Tem-se, então, a conformação da atividade punitiva do Estado pelo postulado do Devido Processo Legal Substancial18, vinculando-a aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade da limitação/privação decorrente de qualquer ação sancionadora.

No âmbito do STF, encontram-se julgados entendendo pela possibilidade de redução da multa inconstitucional para adequá-la ao percentual compatível com Texto Magno. Sob esse manto da proporcionalidade, em recente decisão proferida no Recurso Extraordinário n. 938.538, sob a relatoria do Ministro Roberto Barroso19, o STF reafirmou a possibilidade de redução da multa a patamares adequados aos princípios constitucionais, contrapondo a jurisprudência de alguns tribunais inferiores, no sentido da inviabilidade de redução da penalidade, em razão da separação dos Poderes20.

A questão, de fato, não era tranquilamente tratada pelos julgadores. No Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, por exemplo, mesmo após a fixação da tese pelo STF, encontram-se várias decisões fundadas no entendimento da impossibilidade de redução da multa, privilegiando, assim, a total exclusão da penalidade21.

Casuisticamente, o STF fixou, no excerto citado, que “o valor da obrigação principal deve funcionar como limitador da norma sancionatória, de modo que a abusividade revela-se nas multas arbitradas acima do montante de 100%”. Ressalvou, todavia, que esse “entendimento não se aplica às multas moratórias, que devem ficar circunscritas ao valor de 20%”. Esses referenciais já haviam sido firmados, entre outros julgados, no RE n. 727.872, também da relatoria do Ministro Barroso22.

Nesse mesmo julgamento, o relator reconheceu a inexistência de marcos definidos acerca do limite constitucional para aplicação da multa tributária, tendo resolvido a questão à luz do histórico de jurisprudência da casa, para dar concretude ao princípio do não confisco, o qual capitulou como um conceito indeterminado23. No caso concreto, prevaleceu o caráter valorativo da decisão que, embora fundada na existência de precedentes daquela Corte, não desfez, ainda, a controvérsia sobre o alcance normativo desse princípio. Tanto é assim que existem outros Recursos Extraordinários com repercussão geral reconhecida, aguardando julgamento24.

No RE n. 736.090/RG, o Ministro Relator Luiz Fux, oportunamente, fez diferenciação entre os casos julgados pelo Ministro Barroso e outros da sua própria relatoria, para justificar que a Corte Constitucional ainda deveria se manifestar sobre os limites admitidos para a multa tributária, quando esta não estivesse, unicamente, consubstanciada em descumprimento formal de uma obrigação acessória ou fosse meramente moratória, a sinalizar, pois, a possibilidade de sanções em patamares superiores ao valor do tributo, diante da gravidade da conduta do infrator25.

Realmente, apesar de existirem decisões mais recentes com os parâmetros indicados pelo Ministro Roberto Barroso, não é difícil encontrar outras nas quais foi expressamente admitida a possibilidade de fixação de multa em percentual superior ao valor do tributo devido26. Na verdade, parece-nos que, a se considerar que a gradação da multa será resultado da gravidade da conduta, como nas orientações mais recentes do Supremo, haverá, ainda, muito espaço para questionamentos acerca dos limites admissíveis para a multa punitiva.

Também nas cortes estaduais, não há uniformidade sobre os percentuais a serem aplicados, nem sobre a diferenciação feita pelo STF, entre as multas meramente moratórias e as punitivas, considerando a maior gravidade destas. Assim, por exemplo, o TJGO já admitiu que a penalidade pelo simples atraso no pagamento estaria sujeita ao limite da integralidade do tributo devido27. Outros percentuais, igualmente diversos, são comumente aplicados pelos Tribunais de Justiça ao controlar a medida da proporcionalidade da multa, especialmente as moratórias28.

Parece-nos, mesmo, que a se admitir que a caracterização do confisco em razão do valor da multa depende dos contornos fáticos da infração praticada, isto é, da análise da dosimetria da pena diante da gravidade da conduta, a análise, pelo STF, da constitucionalidade, no caso concreto, da penalidade aplicada, encontraria óbice no enunciado sumular 279 da Corte29, por representar revolvimento fático da demanda. Assim, aliás, já assentou, noutras oportunidades, o próprio STF, em sede do RE, sob a relatoria do Ministro Marco Aurélio30. Nesse precedente, o relator externou posição pelo não cabimento, em regra, da discussão do tema na via estreita do recurso extraordinário, ressalvados, em sua visão, os casos em que, objetivamente e sem rediscussão fática das peculiaridades ocorrentes, o excesso da sanção tributária restasse evidente31.

É dizer, embora o conteúdo normativo do princípio da vedação ao confisco não tenha sua densidade extraída diretamente do texto, a reclamar interpretação jurisprudencial na sua concretização, a eleição de limites abstratos pelo STF poderia resultar em um mero casuísmo.

Há, nesse sentido, crítica doutrinária à postura adotada pelo STF para resolver demandas desse tipo, pois a carga de discricionariedade da decisão judicial terminaria por substituir a discricionariedade legislativa, no estabelecimento dos percentuais máximos da sanção pecuniária tidos por compatíveis com a Constituição32.

Aliás, o modelo de controle de constitucionalidade brasileiro, já algum tempo, tem se afastado das clássicas decisões declaratórias de nulidade, para dar espaço a interpretações de conformidade da norma infraconstitucional à constituição e às declarações de inconstitucionalidade sem, propriamente, a pronúncia de nulidade, muita das vezes, excedendo o limite normativo do texto33.

Nesse âmbito, desenvolvem-se as chamadas decisões manipuladoras substitutivas34, que suprimem a norma considerada incompatível com os princípios constitucionais para eleger, em seu lugar, uma norma criada pelo próprio julgador. Por óbvio, decisões dessa natureza não prescindem de um conteúdo valorativo ou político-jurídico e, no caso concreto, de um consequencialismo econômico, que mais se aproxima do pragmatismo que da racionalidade da argumentação jurídica. Justamente por isso, as críticas normalmente postas na doutrina se sustentam na falta de legitimidade democrática do Poder Judiciário e na mutabilidade dos critérios, ao sabor da situação político-econômico-social.

Conclusão

Assim sendo, do ponto de vista jurisprudencial, observa-se que, em que pese haver decisões do STF no sentido da possibilidade de redução de multas inconstitucionais pelo Poder Judiciário com o fim de adequá-las aos patamares compatíveis com a Constituição, a matéria ainda não encontrou completa pacificação. Enquanto o STF admite a redução – embora ainda não em precedente vinculativo –, alguns Tribunais inferiores resistem à aplicação da sobredita técnica, limitando-se a excluir por inteiro o encargo fixado a título de multa tributária.

Sem embargo das cabíveis críticas ao casuísmo jurisprudencial que, nos últimos julgados, repetidamente, extravasa mesmo o âmbito normativo de diversos preceitos constitucionais, temos que a relação jurídica entre o Fisco e o contribuinte tende a ganhar em segurança com o estabelecimento de marcos limitativos pelo STF, em concretização dos princípios constitucionais do não confisco, da proporcionalidade e da razoabilidade, especialmente no âmbito das medidas punitivas estatais.

É que as demandas judiciais em busca de uma conformação constitucional dos dispositivos que consagram essas penalidades são recorrentes e têm recebido, como visto, interpretações das mais distintas, causando insegurança jurídica e, por fim, completa quebra da isonomia pretendida pelo texto constitucional, especialmente quando o julgador resolve extirpar, por inteiro, a penalidade, como se a infração não houvesse existido.

Não se olvida, aqui, que a eleição de um patamar fixo represente, normalmente, um maior grau de discricionariedade do julgador. Por outro lado, melhor a existência de limites conhecidos e razoavelmente seguros do que a insegurança jurídica pela falta desses marcos. Ademais, é inevitável que a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade conduza, em maior ou menor medida, a uma decisão com certo grau de discricionariedade.

Assim, respondendo à problemática lançada no início do trabalho (sem a pretensão de dar uma resposta peremptória ao tema), inferiu-se o entendimento de que a possibilidade de redução da multa deve ser reconhecida, na medida em que atende aos preceitos de justiça fiscal e da isonomia tributária. Ainda, compreendemos que aplicação de uma técnica pura de controle de constitucionalidade, com exclusão total da multa, conduziria a uma situação de completa irrelevância jurídica da infração praticada, a enfraquecer a força normativa das obrigações tributárias e do próprio Poder de Tributar, este com igual assento constitucional.

Parece-nos, ademais, ser da essência do controle de proporcionalidade das medidas punitivas apenas reduzir a excesso do preceito secundário ou consequente da norma, mantendo, desse modo, no que compatível com a Constituição, o âmbito de incidência do Poder Sancionador.

Finalmente, é preciso ter em mente que o legislador infraconstitucional tributário deve estar atento à proporcionalidade na aplicação das medidas punitivas não apenas quanto aos seus patamares máximos, pois os sentidos de adequação, necessidade e ponderação permeiam outros aspectos do tipo sancionador. Assim, sob pena de não ser proporcional, a penalidade deve observar a correspondência com a gravidade da conduta, a fim de que não se estabeleça – apenas para respeitar os marcos jurisprudenciais limitativos – multas idênticas por comportamentos com diferentes níveis de violação do dever jurídico, como corriqueiramente se observa nos textos legislativos. Do contrário, a celeuma que, agora, a Corte Constitucional se põe a resolver, permanecerá a ocupar os órgãos jurisdicionais.

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SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

1 NOBRE JUNIOR, Edilson Pereira. Mandado de segurança e direito tributário. In: ELALI, André. Direito tributário. São Paulo: Quartier Latin, 2011, p. 715-751, p. 717.

2 O relatório destaca que o referido aumento “foi concentrado na União (responsável por um aumento de 0,12 pontos percentuais). Apesar das desonerações implantadas nos últimos anos, houve uma recomposição de alíquotas de alguns tributos, como por exemplo, CIDE e PIS/COFINS sobre combustíveis, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) do setor financeiro, IOF sobre operações de crédito de pessoas físicas e redução do percentual do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para Empresas Exportadoras (REINTEGRA). Os tributos incidentes sobre bens e serviços (ICMS, IPI, PIS e COFINS) acompanharam o desempenho da economia, apresentando declínio em termos reais.” (RECEITA FEDERAL DO BRASIL. Carga tributária no Brasil 2015: análise por tributos e bases de incidência. Disponível em: <http://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/receitadata/estudos-e-tributarios-e-aduaneiros/estudos-e-estatisticas/carga-tributaria-no-brasil/ctb-2015.pdf>. Acesso em: 30 nov. 2016)

3 Um dos motivos para manifestação de insatisfação quanto à tributação brasileira diz respeito à proporcionalidade na tributação. Apesar de a capacidade contributiva ser um princípio constitucional, alguns fatos permitem inferir que a política tributária foca muito mais nos tributos indiretos, em que não há proporcionalidade, do que nos tributos diretos. Basta observar que, embora a carga tributária brasileira no geral não seja uma das mais altas em nível internacional, no que se refere à tributação sobre bens e serviços ela chega a atingir o topo do ranking, perdendo apenas para a Hungria (RECEITA FEDERAL DO BRASIL. Carga tributária no Brasil 2015: análise por tributos e bases de incidência. Disponível em: <http://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/receitadata/estudos-e-tributarios-e-aduaneiros/estudos-e-estatisticas/carga-tributaria-no-brasil/ctb-2015.pdf>. Acesso em: 30 nov. 2016).

4 Lenio Luiz Streck e Jose Luis Bolzan de Morais explicam que o absenteísmo revelava um caráter extremamente individualista, o que levava a certos problemas. Para eles: “o projeto liberal teve como consequências: o progresso econômico; a valorização do indivíduo, como centro e ator fundamental do jogo político e econômico; técnicas de poder como poder legal, baseado no direito estatal [...]. Todavia, estas circunstâncias geraram, por outro lado, uma postural ultraindividualista, assentada em um comportamento egoísta; uma concepção individualista e formal da liberdade no qual há o direito, e não o poder de ser livre; e a formação do proletariado em consequência da Revolução Industrial e seus consectários, tais como a urbanização, condições de trabalho, segurança pública, saúde etc.” (STRECK, Lenio Luiz; MORAIS, Jose Luis Bolzan de. Ciência política e teoria do estado. 8. ed. rev. e atual., 2. tir. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014, p. 69-70)

5 ARANHA, Marcio Iorio. Manual de direito regulatório. 2. ed. rev. e ampl. Coleford, UK: Laccademia Publishing, 2014, p. 21-22.

6 Continua o autor: “O Direito Tributário não tem objetivo (imperativo econômico-social) próprio; ou melhor, como todo o Direito Positivo, o Direito Tributário tem natureza instrumental e seu ‘objetivo próprio’ (razão de existir) é ser um instrumento a serviço de uma política.” (BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 6. ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 636 e 638)

7 “Na verdade, o prescritor da norma é, invariavelmente, uma proposição relacional, enlaçando dois ou mais sujeitos de direito em torno de uma conduta regulada como proibida, permitida ou obrigatória. Trata-se de uma relação entre termos determinados, que são necessariamente pessoas: S’ R S’’. Nessa fórmula, S’ é uma pessoa qualquer e S’’ é uma pessoa qualquer, desde que não seja S’. R é o relacional deôntico, aparecendo num dos modais do dever-ser: V, P ou O, que são irredutíveis, mas interdefiníveis, isto é, com o auxílio do conectivo negador (-), é dado definir um pelo outro (Op = -P-p). Interpretando: dizer que uma conduta ‘p’ é obrigatória equivale a afirmar que não é permitido omiti-la.” (CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 55)

8 “O princípio da razoabilidade tem por objetivo verificar a compatibilidade entre os meios empregados e as finalidades almejadas na prática de determinado ato administrativo, no intuito de evitar restrições inadequadas, desnecessárias, arbitrárias ou abusivas aos administrados por parte de Administração Pública. Por sua vez, o princípio da proporcionalidade consistente numa das vertentes do princípio da razoabilidade, tendo em vista que a razoabilidade, entre outros aspectos, requer que haja proporcionalidade entre os meios utilizados pela Administração Pública e as finalidades pretendidas.” (MELO, Fábio Soares de. Processo administrativo tributário: princípios, vícios e efeitos jurídicos. São Paulo: Dialética, 2012, p. 56-57)

9 Como destaca Luciano Amaro: “A cominação de sanções administrativas ou penais para os ilícitos tributários tem (ou deve ter) objetivos comuns: em ambos os casos, visa-se a inibir possíveis infratores, intimidando-os (é a chamada prevenção geral); a par disso, castiga-se o infrator, com vistas a evitar que ele reincida na infração (prevenção especial); as sanções teriam, ainda, uma função educativa, no sentido de formar uma moral fiscal, que contribuísse para evitar a infração da lei tributária.” (AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 465-466)

10 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 628.

11 Leandro Paulsen, por outro lado, entende que o fundamento limitador da multa tributária, que a submete ao princípio da vedação ao confisco, não é o art. 150, IV, da CFRB/1988, mas sim interpretação decorrente do princípio da proporcionalidade das penas e do princípio da vedação do excesso (PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário completo. 5. ed. rev., atual e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 99).

12 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 817.

13 Embora defendendo que não seria um princípio autônomo, reconhece Fábio Soares de Melo que: “Identifica-se moderna corrente doutrinária que defende a existência de um denominado ‘princípio da praticabilidade, o qual se apresenta como um imperativo constitucional implícito, que objetiva, em última análise, tornar o ordenamento jurídico exequível e realizável, com maior eficiência e celeridade, devidamente em conformidade aos parâmetros legais e constitucionais.” (MELO, Fábio Soares de. Processo administrativo tributário: princípios, vícios e efeitos jurídicos. São Paulo: Dialética, 2012, p. 57)

14 Humberto Ávila, analisando profundamente a igualdade tributária, analisa que o Poder Judiciário, no controle do referido princípio, não realiza apenas um juízo negativo na sua atividade, adentrando também em uma função positiva para concretizar o postulado constitucional. Entende o autor que o ato legislativo não é imune ao controle do Poder Judiciário, mesmo quando caracterizado por uma função extrafiscal, e que o julgador deve considerar, entre outras possibilidades, a de “analisar os efeitos prospectivos da lei; considerar alternativas que deveriam ter sido cogitadas pelo Poder Legislativo; excluir medidas de comparação incompatíveis com as finalidades eleitas; anular medidas de comparação compatíveis com finalidades não previstas pela Constituição; concretizar padrões legais; verificar a compatibilidade da diferenciação com os direitos fundamentais dos contribuintes; escolher um dos múltiplos significados compatíveis com o teor literal e o objetivo inequívoco da lei.” (ÁVILA, Humberto. Teoria da igualdade tributária. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 186)

15 “‘[...] a distinção entre aquele que chamarei constitucionalismo argumentativo ou principialista’ e aquele que podemos denominar constitucionalismo normativo ou garantista. A primeira orientação caracteriza-se pela configuração dos direitos fundamentais como valores ou princípios morais estruturalmente diversos das regras, porque dotados de uma normatividade mais fraca, conferida não mais à subsunção, mas à ponderação legislativa e judicial. A segunda Orientação, entretanto, caracteriza-se por uma normatividade forte, de tipo regulativo, isto é, pela tese de que a maior parte dos (ainda que não todos) princípios constitucionais, em especial os direitos fundamentais, comporta-se como regras, uma vez que implica a existência ou impõe a introdução de regras consistentes em proibições de lesão ou obrigações de prestação que são suas respectivas garantias. Para esta segunda caracterização, o constitucionalismo pode ser definido com um sistema jurídico e/ou uma teoria do direito que preveem – para garantia daquilo que vem estipulado constitucionalmente como vinculante e inderrogável – a submissão (inclusive) da legislação às normas relativas à produção não só formais, relativas aos procedimentos (a que e a como), mas também materiais, relativas aos conteúdos da normas produzidas (ao que se deve e ao que se deve decidir), cuja violação gera antinomias, por comissão, ou lacunas, por omissão.” (FERRAJOLI, Luigi. Constitucionalismo principialista e constitucionalismo garantista. Tradução: A. K. Trindade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, p. 18)

16 Como afirma Diogo Figueiredo: “Desde os três últimos decênios do século XX, na doutrina e na jurisprudência europeias, e, mais recentemente, nas que foram desenvolvidas no âmbito comunitário, tem-se difundido o esclarecido entendimento de que as sanções administrativas, tradicionalmente entendidas como circunscritas ao campo de atividade administrativa de polícia, são, em verdade, uma manifestação específica de um ius puniendi genérico do Estado, destinado à tutela de quaisquer valores relevantes da sociedade, transcendendo o âmbito da função de polícia para se estender às demais funções administrativas, incluindo as regulatórias, próprias do ordenamento econômico e do ordenamento social. Deste modo, tornou-se necessário dispensar um tratamento integrado à matéria, inclusive reconhecendo a aplicabilidade limitada de certos princípios da penologia criminal, no exercício de todas demais funções punitivas do Estado, tal como pioneiramente foi proposto pelo jurista espanhol Alejandro Nieto García, em sua obra Derecho Administrativo Sancionador, originalmente publicada em 1993.” (MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. A principiologia no direito administrativo sancionador. Revista Eletrônica de Direito. II – 1, n. 37. Salvador, janeiro/fevereiro/março 2014, ISSN 1981-187X. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com/revista/REDE-37-JAN-2014-FLAVIO-AMARAL-DIOGO-NETO.pdf>. Acesso em: 24 jan. 2016)

17 No julgamento do RE n. 727.872, o Ministro Relator, Roberto Barroso, assim se posicionou sobre o tema, ao apreciar a alegação de confisco da multa moratória fixada: “8. Após a análise da memória jurisprudencial sobre o tema em questão, chamou-me a atenção, em especial, o RE 82.510, Rel. Min. Leitão de Abreu, no qual foi admitida a redução da multa em razão de não haver comprovação de prejuízo para os cofres públicos e porque não ficara comprovado o dolo do contribuinte. 9. Obviamente, não se está aqui a tratar de direito penal, mas de todo modo estamos no âmbito do direito sancionador. Genericamente, sempre que o antecedente de uma norma for um comportamento reprovável e o consequente uma punição, é absolutamente indispensável fazer uma análise do elemento subjetivo da conduta.” (AI n. 727.872 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 28.04.2015, DJe 18.05.2015)

18 “O devido processo legal formal ou procedimental (procedural due processo of law) se satisfaz com a exigência da abertura de regular processo como condição para restrição de direitos. Essa garantia remota à Magna Carta inglesa de 1215 (art. 39) que já se preocupara em exigir um processo como formalidade necessária para imposição de penas. O devido processo legal material ou substantivo (substantive due processo of law), de desenvolvimento mais recente, sobretudo na doutrina e jurisprudência norte-americana, impõe a justiça e razoabilidade das decisões restritivas a direitos. Vale dizer, parte do pressuposto de que não basta a garantia da regular instauração formal do processo para assegurar direitos e liberdades fundamentais, pois vê como indispensável que as decisões a serem tomadas nesse processo primem pelo sentimento de justiça, de equilíbrio, de adequação, necessidade e proporcionalidade em face do que se deseja proteger.” (CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de direito constitucional. 8. ed. Salvador: JusPodivm, 2014, p. 570)

19 “1. A multa punitiva é aplicada em situações nas quais se verifica o descumprimento voluntário da obrigação tributária prevista na legislação pertinente. É a sanção prevista para coibir a burla à atuação da Administração tributária. Nessas circunstâncias, conferindo especial destaque ao caráter pedagógico da sanção, deve ser reconhecida a possibilidade de aplicação da multa em percentuais mais rigorosos, respeitados os princípios constitucionais relativos à matéria. 2. A Corte tem firmado entendimento no sentido de que o valor da obrigação principal deve funcionar como limitador da norma sancionatória, de modo que a abusividade revela-se nas multas arbitradas acima do montante de 100%. Entendimento que não se aplica às multas moratórias, que devem ficar circunscritas ao valor de 20%. Precedentes. 3. Agravo interno a que se nega provimento, com aplicação da multa prevista no art. 557, § 2º, do CPC/1973.” (ARE n. 938.538 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 30.09.2016, DJe 21.10.2016)

20 Já era possível notar essa orientação da Corte Suprema em vários julgados, como, por exemplo, no RE n. 776.277/DF: “Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. Direito tributário. Multa confiscatória. Redução. Percentual inferior ao valor do tributo. Possibilidade. 1. É admissível a redução da multa tributária para mantê-la abaixo do valor do tributo, à luz do princípio do não confisco. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (ARE n. 776.273 AgR, Rel. Min. Edson Fachin, Primeira Turma, julgado em 15.09.2015, DJe 30.09.2015)

21 “[...] 1 – A inconstitucionalidade do artigo 71, inciso III, alínea a, do Código Tributário Estadual, já foi declarada pela Corte Especial deste Tribunal, tendo como parâmetro o princípio da proporcionalidade e do não confisco, de modo que a multa estabelecida nesse dispositivo legal não pode ser aplicada. [...] 3 – Consequentemente, a execução fiscal deve prosseguir em relação ao valor do tributo, eis que a sua exigência não resta afastada, situação que não enseja a extinção do feito executivo, mas tão somente a adequação do valor executado considerando os parâmetros definidos nesse julgamento. [...] Agravo conhecido e parcialmente provido.” (TJGO, Agravo de Instrumento n. 269607-37.2016.8.09.0000, Rel. Des. Alan S. de Sena Conceição, Quinta Câmara Cível, julgado em 15.12.2016, DJe 23.01.2017)

22 “Ementa: Agravo regimental no agravo de instrumento. Tributário. Multa moratória de 30%. Caráter confiscatório reconhecido. Interpretação do princípio do não confisco à luz da espécie de multa. Redução para 20% nos termos da jurisprudência da Corte. 1. É possível realizar uma dosimetria do conteúdo da vedação ao confisco à luz da espécie de multa aplicada no caso concreto. 2. Considerando que as multas moratórias constituem um mero desestímulo ao adimplemento tardio da obrigação tributária, nos termos da jurisprudência da Corte, é razoável a fixação do patamar de 20% do valor da obrigação principal. 3. Agravo regimental parcialmente provido para reduzir a multa ao patamar de 20%.” (AI n. 727.872 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 28.04.2015, DJe 18.05.2015)

23 “Em que pese sua importância, o princípio do não confisco ainda não teve suas linhas demarcatórias objetivamente definidas, de modo que o seu conteúdo vem sendo circunstancialmente construído ao longo do tempo. Permanece sem definição quantitativa a medida que pode ser considerada exacerbada ao ponto de comprometer o patrimônio e a renda, de modo a ultrapassar os limites da capacidade contributiva do contribuinte. [...] 17. A tese de que o acessório não pode se sobrepor ao principal parece ser mais adequada enquanto parâmetro para fixar as balizas de uma multa punitiva, sobretudo se considerado que o montante equivale a própria incidência. Após empreender estudo sobre precedentes mais recentes, observei que a duas Turmas e o Plenário já reconheceram que o patamar de 20% para a multa moratória não seria confiscatório. Este parece-me ser, portanto, o índice ideal. O montante coaduna-se com a ideia de que a impontualidade é uma falta menos grave, aproximando-se, inclusive, do montante que um dia já foi positivado na Constituição. [...] 19. Considerando as peculiaridades do sistema constitucional brasileiro e o delicado embate que se processa entre o poder de tributar e as garantias constitucionais, entendo que o caráter pedagógico da multa é fundamental para incutir no contribuinte o sentimento de que não vale a pena articular uma burla contra a Administração fazendária. E nesse particular, parece-me adequado que um bom parâmetro seja o valor devido a título de obrigação principal. Com base em tais razões, entendo pertinente adotar como limites os montantes de 20% para multa moratória e 100% para multas punitivas.”

24 Conferir: RE n. 736.090 RG, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 29.10.2015, DJe 27.11.2015.

25 “[...] Destaco que a discussão posta nos autos, razoabilidade da multa fiscal qualificada, não se confunde em com aquela travada no RE 640.452, Rel. Min. Roberto Barroso, Tema nº 487, em que se controverte acerca do eventual caráter confiscatório de multa fiscal isolada aplicada em razão do descumprimento de obrigação acessória decorrente de dever instrumental, nem com aquela veiculada no RE 882.461, Rel. Min. Luiz Fux, Tema nº 816, que recai sobre a razoabilidade da multa fiscal moratória. [...] Cabe a esta Corte, portanto, em atenção ao princípio da segurança jurídica e tendo em vista a necessidade de concretização da norma constitucional que veda o confisco na seara tributária, fixar, no regime da repercussão geral, as balizas para a aferição da existência de efeito confiscatório na aplicação de multas fiscais qualificadas.” (RE n. 736.090 RG, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 29.10.2015, DJe 27.11.2015)

26 “[...] 1. A imposição da multa pelo Fisco visa à punição da infração cometida pelo contribuinte, sendo a graduação da penalidade determinada pela gravidade da conduta praticada. Desse modo, afigura-se possível em razão da intensidade da violação, a imposição da multa em valor superior ao da obrigação principal. 2. Na ausência de critérios legais objetivos para fixação da pena de multa, a aplicação desta no patamar máximo deverá necessariamente vir acompanhada dos fundamentos e da motivação que a justifique. 7. Agravo regimental desprovido.” (AI n. 830.300 AgR-segundo, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 06.12.2011, DJe 22.02.2012, Revista Dialética de Direito Tributário, n. 200. São Paulo: Dialética, 2012, p. 167-170)

27 “[...] 9. Adequado o percentual fixado, a título de multa moratória, na lei tributária municipal (30% – art. 158, II, do CTM de Edeia), eis que, para ser considerada desproporcional e, com isso, atrair o caráter confiscatório, a multa deve superar o valor do próprio débito. [...]” (TJGO, Apelação Cível em Proc. de Exec. Fiscal n. 129435-90.2014.8.09.0040, Rel. Des. Zacarias Neves Coelho, Segunda Câmara Cível, julgado em 01.11.2016, DJe 10.11.2016)

28 “Ementa: Apelação cível – embargos a execução – ICMS – alegação de decadência – ausência de pagamento prévio – regulamentação pelo artigo 173, I, CTN – prejudicial afastada – mérito – nulidade da intimação por edital – esgotamento das vias – tentativas frustradas – validade do ato intimatório – multa tributária – aplicação do princípio da vedação do efeito de confisco – multa de 150% – ilegalidade – redução para 10% sobre o tributo – honorários mantidos – recurso parcialmente provido. [...] (TJ-MT. APL 00016644320118120011 MS 0001664-43.2011.8.12.0011 – Relator Des. Divoncir Schreiner Maran, Orgão Julgador 1ª Câmara Cível, Publicação 21/08/2014, Julgamento em 19 de Agosto de 2014).

[...] Multa aplicada com fundamento no art. 9º, I, da Lei nº 6.537/73. A multa visa a estimular o adimplemento das obrigações tributárias, estando de acordo com a lei aplicável, não havendo que se falar em excesso, tampouco em confisco, estando o percentual da multa, fixada em 30%, de acordo com o parâmetro estabelecido pelo STF. Honorários advocatícios. Manutenção. Mantém-se a verba honorária fixada de acordo com o disposto no artigo 20, § 4º, do CPC. Apelação a que se nega seguimento.” (TJRS, Apelação Cível n. 70065399354, Rel. Carlos Eduardo Zietlow Duro, Vigésima Segunda Câmara Cível, julgado em 22.07.2015)

29 STF, Súmula n. 279: “Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário.”

30 Conferir: ARE n. 831.377 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, julgado em 16.12.2014, DJe 06.02.2015.

31 “[...] Cabe, reconhecer, no entanto, que não me parece viável, em sede recursal extraordinária, a verificação, em tese, de ofensa à cláusula inscrita no art. 150, inciso IV, da Constituição, pois tal exame impõe, ordinariamente, a análise de situações concretas fundadas em realidades fáticas cuja constatação escapa ao âmbito do recurso extraordinário.

Tratando-se do exame da aplicabilidade da cláusula vedatória constante do art. 150, inciso IV, da Carta Política, será necessário que se proceda à aferição do caráter confiscatório dos valores exigidos, a ser realizada em função de cada caso concreto ou em face de determinada situação individual ocorrente, eis que são amplos, na esfera de verificação concreta de constitucionalidade, tanto o exame de fatos quanto a produção probatória. [...] revela-se inviável a utilização da presente sede recursal, quando instaurado com o objetivo de constatar-se a ocorrência, em tese, de ofensa à cláusula inscrita no art. 150, IV, da Constituição, Ressalvada, é claro, a hipótese em que emerja, de forma nítida e objetivamente indiscutível, a situação de conflito hierárquico com o postulado constitucional que veda a utilização do tributo com efeito confiscatório. [...]”

32 Enfrentando o tema à luz dos estudos de Lorenzetti e Lênio Streck, Fernando Vieira Luiz tece críticas ao subjetivismo judicial decorrente da discricionariedade excessiva do julgador: “Ao deixar a interpretação baseada no subjetivismo do juiz para a resolução dos ditos casos difíceis, abrem-se espaços à arbitrariedade. Observa-se que, apesar de boas intenções, o texto (constitucional) é violentado, numa sobreinterpretação que ultrapassa os limites semânticos do texto [...].” (LUIZ, Fernando Vieira. Teoria da decisão judicial. Dos paradigmas de Ricardo Lorenzetti à resposta adequada à Constituição de Lênio Streck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013, p. 172)

33 Como afirma Inocêncio Mártires Coelho: “Modernamente, o princípio da interpretação conforme passou a consubstanciar, também, um mandamento de otimização do querer constitucional, ao não significar apenas que entre distintas interpretações de uma mesma norma há de se optar por aquela que a torne compatível com a Constituição, mas também que, entre diversas exegeses igualmente constitucionais, deve-se escolher a que se orienta para a Constituição ou que melhor corresponde às decisões do constituinte.” (MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 142)

34 “Quanto às sentenças substitutivas, assim se consideram aquelas decisões em que a Corte não apenas declara a inconstitucionalidade de um preceito na parte em que expressa certa norma em lugar de outra, substancialmente distinta, que dele deveria constar para que fosse compatível com a Constituição. Atuando dessa forma, a Corte não apenas anula a norma impugnada, como também a substitui por outra, essencialmente diferente, criada pelo próprio tribunal, o que implica a produção heterônoma de atos legislativos ou de um direito judicial, como o denomina Prieto Sanchis, para quem essas normas já nascem enfermas porque desprovidas de fundamento democrático.” (MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 148)