A Medida Provisória n. 806/2017 e a Tributação dos Rendimentos Acumulados nos Fundos de Investimento em Participações (FIP)

Provisional Measure No. 806/2017 and the Taxation of Income Accumulated in Participation Investment Funds

Ramon Tomazela Santos

Doutorando e Mestre em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo – USP. Master of Laws (LL.M.) em tributação internacional na Universidade de Viena – WU, Áustria. Membro do Comitê Acadêmico do Curso de Especialização em Direito Tributário Internacional do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT. Professor convidado em cursos de pós-graduação. Advogado em São Paulo. E-mail: ramon.tomazela@marizadvogados.com.br.

Resumo

O presente estudo examina a validade do art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, que criou um fato gerador ficto para cobrar o IRRF sobre os rendimentos acumulados na carteira dos fundos de investimento em participações. O artigo pretende demonstrar que o dispositivo legal em questão violou, a um só tempo, os princípios da anterioridade, da irretroatividade e da capacidade contributiva, bem como o art. 43 do CTN, que exige disponibilidade jurídica ou econômica sobre a renda ou os proventos de qualquer natureza.

Palavras-chave: fundos de investimento, fato gerador ficto, anterioridade, irretroatividade, capacidade contributiva, disponibilidade econômica ou jurídica.

Abstract

The present paper examines the validity of Article 9 of Provisional Measure No. 806/2017, which created a fictitious taxable event to collect the IRRF on the accumulated income in the portfolio of participation investment funds. The paper intends to demonstrate that the legal provision in question has violated at one and the same time the principles of grandfathering, non-retroactivity and ability-to-pay, as well as Article 43 of the CTN, which requires legal or economic availability over the income or gains of any nature.

Keywords: investment funds, fictitious taxable event, grandfathering,
non-retroactivity, taxable capacity, economic or legal availability.

1. Introdução

Como se sabe, a recém-editada Medida Provisória n. 806/2017 introduziu alterações sensíveis na sistemática de tributação dos fundos de investimento em participações (FIP), que podem provocar inquietantes debates a respeito da constitucionalidade e da legalidade de determinadas disposições.

De acordo com a Medida Provisória n. 806/2017, o tratamento tributário aplicável ao FIP dependerá de sua qualificação, ou não, como uma entidade de investimento, segundo as regras estabelecidas pela Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”).

De um lado, o FIP classificado como entidade de investimento segundo os critérios da Instrução CVM n. 579/2016 será tributado pelo Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) à alíquota de 15% nos casos de amortização, resgate, alienação ou liquidação, com base na diferença entre o valor obtido pelo cotista e o custo de aquisição1. Porém, no caso de alienação de qualquer investimento pelo FIP, os recursos obtidos serão considerados como distribuídos aos cotistas, independentemente do reinvestimento de tais valores na própria carteira, a partir do momento em que, cumulativamente, o valor distribuído (ou considerado como tal) superar o capital total integralizado2.

De outro lado, o FIP que não for qualificado como entidade de investimento estará sujeito à incidência do IRRF sobre os rendimentos e ganhos acumulados em sua carteira no dia 2 de janeiro de 2018, independentemente de ato de disponibilização aos cotistas, conforme prevê o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017.

Ocorre que a exigência de IRRF sobre os rendimentos acumulados na carteira do FIP, tal como prevista no art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, suscita uma série de questionamentos jurídico-tributários, seja em virtude da falta de liquidez no fundo de investimento para o recolhimento do IRRF pelo administrador, seja em razão das inúmeras ilegalidades e inconstitucionalidades que afetam essa pretendida tributação ficta.

Neste contexto, o presente estudo pretende examinar justamente a validade do evento ficto de resgate de cotas criado pelo art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, com o objetivo de demonstrar, ao final, que esse dispositivo legal violou, a um só tempo, os princípios da anterioridade, da irretroatividade e da capacidade contributiva, bem como o art. 43 do CTN, que exige a aquisição de disponibilidade jurídica ou econômica sobre a renda ou os proventos de qualquer natureza para fins de incidência do imposto de renda3.

2. A classificação do FIP como entidade de investimento ou não

Antes de adentrar na análise jurídica do tema, é oportuno pontuar, brevemente, os critérios adotados pela Instrução CVM n. 579/2016 para a qualificação, ou não, de determinado FIP como entidade de investimento.

O art. 4º da Instrução CVM n. 579/2016 dispõe que os FIP devem ser classificados como entidades de investimento caso atendam, de forma cumulativa, as seguintes condições:

i) obtenham recursos de um ou mais investidores com o propósito de atribuir o desenvolvimento e a gestão de uma carteira de investimento a um gestor qualificado que deve possuir plena discricionariedade na representação e na tomada de decisão junto às entidades investidas, não sendo obrigado a consultar cotistas para essas decisões e tampouco indicar os cotistas ou partes a eles ligadas como representantes nas entidades investidas4;

ii) se comprometam com os investidores com o objetivo de investir os recursos unicamente com o propósito de retorno através de apreciação do capital investido, renda ou ambos;

iii) substancialmente mensurem e avaliem o desempenho de seus investimentos, para fins de modelo de gestão, com base no valor justo; e

iv) definam nos seus regulamentos estratégias objetivas e claras a serem utilizadas para o desinvestimento, assim como a atribuição do gestor de propor e realizar, dentro do prazo estabelecido na estratégia, o desinvestimento, de forma a maximizar o retorno para os cotistas5.

Segundo o art. 3º da Instrução CVM n. 579/2016, o FIP qualificado como uma entidade de investimento deverá avaliar os investimentos detidos em entidades controladas, coligadas e em empreendimentos controlados em conjunto a valor justo. Por outro lado, caso um FIP não seja qualificado como uma entidade de investimento, os investimentos detidos em controladas, coligadas e em empreendimentos controlados em conjunto deverão ser avaliados pelo método da equivalência patrimonial (“MEP”)6.

3. A Medida Provisória n. 806/2017 e a alteração da sistemática de tributação do FIP

Sabe-se que, por definição, o fundo de investimento é uma união de investidores, constituída sob a forma de condomínio, destinada à aplicação de recursos financeiros em títulos e valores mobiliários, bem como em quaisquer outros ativos disponíveis nos mercados financeiro e de capitais. Nesse sentido, confira-se o teor do art. 3º da Instrução Normativa CVM n. 555/2014, a seguir transcrito:

“Art. 3º O fundo de investimento é uma comunhão de recursos, constituído sob a forma de condomínio, destinado à aplicação em ativos financeiros”.

Sob o ponto de vista do direito privado, o fundo de investimento está submetido ao regime jurídico de condomínio, que resulta de convenção com caráter associativo. Assim, o fundo de investimento não possui personalidade jurídica própria7. Os investidores aportam recursos no fundo de investimento e recebem, em contrapartida, as cotas representativas dos seus direitos patrimoniais. O administrador do fundo de investimento é responsável pela gestão de sua carteira de valores mobiliários, bem como pela condução das atividades relacionadas ao seu funcionamento e à sua manutenção, dentre as quais se destaca a execução de sua política de investimento.

Logo, os fundos de investimento são constituídos sob a forma de condomínio sujeito a regime especial8-9, tendo em vista que o seu patrimônio é considerado um centro de imputação de direitos e obrigações, distinto do patrimônio de seus cotistas10. A carteira de títulos e valores mobiliários é considerada como um patrimônio específico do fundo de investimento, segregado dos seus administradores e investidores, de modo que os cotistas não exercem direito de propriedade diretamente sobre os ativos que a compõem11.

No Brasil, os rendimentos e os ganhos auferidos pelas carteiras dos FIP estão isentos de imposto de renda no âmbito do fundo de investimento. Assim, a incidência do imposto de renda ocorre no nível dos cotistas (pessoas físicas ou pessoas jurídicas), no momento em que os rendimentos são pagos ou creditados pelo FIP aos respectivos investidores, por meio dos seguintes eventos:

amortização das cotas: representa um pagamento uniforme realizado a todos os cotistas do fundo de investimento, sem a redução do número de cotas. Na amortização, o valor de cada cota do fundo de investimento sofre uma desvalorização, em razão do pagamento uniforme realizado a todos os cotistas;

resgate de cotas: consiste na conversão de um determinado número de cotas pelo seu equivalente em dinheiro, conforme o valor de cada cota. O resgate acarreta a redução do número de cotas do fundo de investimento, uma vez que, após a sua conversão em pecúnia e o pagamento para o cotista, a cota convertida é extinta. No caso do FIP, o resgate somente é admitido após o término do seu prazo de duração.

liquidação do FIP: consiste na divisão do patrimônio do FIP entre os cotistas, na proporção de suas cotas, por deliberação da assembleia geral após o término do seu prazo de duração.

Em todos os casos acima, o IRRF incide à alíquota de 15% sobre a diferença positiva entre o valor disponibilizado ao cotista e o custo de aquisição das cotas, nos termos do art. 2º da Lei n. 11.312/2006.

Além dos três eventos de disponibilização mencionados acima, a incidência do imposto de renda também pode ocorrer caso o cotista decida alienar as cotas do FIP no mercado secundário, hipótese em que o ganho de capital passa a ser tributado à alíquota de 15%, como prevê o § 1º do art. 2º da Lei n. 11.312/2006.

O problema surge com a edição do art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, que pretendeu criar um novo evento ficto de resgate compulsório de cotas, a ser realizado pelo administrador no dia 2 de janeiro de 2018, conhecido como “come-cotas”, para alcançar os rendimentos e ganhos acumulados na carteira do FIP. Veja-se:

“Art. 9º Nos termos do art. 2º da Lei nº 11.312, de 2006, os rendimentos e os ganhos auferidos pelos fundos de investimento em participações não qualificados como entidades de investimento que não tenham sido distribuídos aos cotistas até 2 de janeiro de 2018 ficam sujeitos à incidência do Imposto sobre a Renda na fonte à alíquota de quinze por cento e serão considerados pagos ou creditados aos seus cotistas em 2 de janeiro de 2018”.

Ocorre que esse fato gerador ficto de resgate compulsório de cotas, além de violar diversos princípios e regras constitucionais e infraconstitucionais, também é incompatível com o regime jurídico aplicável ao FIP.

De fato, sob o enfoque das regras regulatórias da CVM, o FIP é constituído sob a forma de condomínio fechado, de modo que não se admite o resgate de cotas pelo cotista enquanto não houver o término do prazo de duração do fundo.

O art. 5º da Instrução CVM n. 578/2016, que dispõe sobre a constituição, a administração e o funcionamento dos FIP, prevê expressamente que a sua organização deve ocorrer sob a forma de condomínio fechado. Veja-se:

Art. 5º O FIP, constituído sob a forma de condomínio fechado, é uma comunhão de recursos destinada à aquisição de ações, bônus de subscrição, debêntures simples, outros títulos e valores mobiliários conversíveis ou permutáveis em ações de emissão de companhias, abertas ou fechadas, bem como títulos e valores mobiliários representativos de participação em sociedades limitadas, que deve participar do processo decisório da sociedade investida, com efetiva influência na definição de sua política estratégica e na sua gestão” (destaques do autor).

Adiante, o art. 21 da Instrução CVM n. 578/2016 dispõe que, no caso de investimento em FIP, não haverá resgate de cotas antes da sua liquidação. Veja-se:

“Art. 21. Não é permitido o resgate de cotas do fundo, salvo nas hipóteses de sua liquidação, sendo permitidas a amortização e a distribuição de rendimentos nos termos do previsto no seu regulamento” (destaques do autor).

Em reforço, o art. 4º da Instrução CVM n. 555/2014 confirma que, no caso de fundos fechados, como é o caso do FIP, apenas se admite o resgate ao término do prazo de duração do fundo. Confira-se:

“Art. 4º O fundo pode ser constituído sob a forma de condomínio aberto, em que os cotistas podem solicitar o resgate de suas cotas conforme estabelecido em seu regulamento, ou fechado, em que as cotas somente são resgatadas ao término do prazo de duração do fundo” (destaques do autor).

Ora, se não há a possibilidade de resgate de cotas pelo cotista antes do prazo de encerramento do FIP, como pode o Poder Executivo, por meio de Medida Provisória, criar um fato gerador ficto de resgate compulsório de cotas no dia 2 de janeiro de 2018, apenas para justificar a incidência de IRRF sobre valores que não estão disponíveis aos cotistas?

É neste cenário que se insere o presente estudo, que visa demonstrar a invalidade jurídica da incidência de IRRF à alíquota de 15%, em razão do fato gerador ficto de resgate de cotas criado pelo art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017.

A seguir, passa-se a expor pormenorizadamente as inconstitucionalidades e ilegalidades que maculam a Medida Provisória n. 806/2017.

4. Falta de conversão em lei da Medida Provisória n. 806/2016

Como visto acima, o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 instituiu um fato gerador ficto relativo ao IRRF, que pretende alcançar todos os rendimentos e ganhos acumulados na carteira dos FIP não qualificados como entidades de investimento. Veja-se:

“Art. 9º Nos termos do art. 2º da Lei nº 11.312, de 2006, os rendimentos e os ganhos auferidos pelos fundos de investimento em participações não qualificados como entidades de investimento que não tenham sido distribuídos aos cotistas até 2 de janeiro de 2018 ficam sujeitos à incidência do Imposto sobre a Renda na fonte à alíquota de quinze por cento e serão considerados pagos ou creditados aos seus cotistas em 2 de janeiro de 2018.

Ocorre que o art. 62, § 2º, da Constituição Federal prevê que a Medida Provisória que implique majoração de imposto somente produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada12. Confira-se a redação do texto constitucional:

“Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.

[...]

§ 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada”.

Apesar da clareza do texto constitucional, a controvérsia surge em razão da cláusula de produção de efeitos da Medida Provisória n. 806/2017, que prevê a sua entrada em vigor na data da publicação. Veja-se:

“Art. 12. Esta Medida Provisória entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir de 1º de janeiro de 2018”.

Ocorre que, independentemente da cláusula de vigência, o fato é que o art. 62, § 2º, da Constituição Federal de 1988, reproduzido acima, prescreve claramente que a Medida Provisória que instituir ou majorar impostos somente produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte ao da sua publicação se tiver sido convertida em lei até o último dia daquele exercício em que foi editada.

Ora, no caso em exame, a Medida Provisória n. 806/2017 foi publicada em 30 de outubro de 2017, de modo que a sua conversão em lei deveria ter ocorrido até o dia 31 de dezembro 2017 para que as suas disposições pudessem produzir efeitos a partir de 1º de janeiro de 2018. Assim, como não houve a sua conversão em lei em 2017, é evidente que o enunciado normativo ora examinado não pode ser aplicado em 2018.

A conclusão acima é reforçada pelo art. 150, inciso III, alínea “b”, da Constituição Federal, que, ao consagrar o princípio da anterioridade13, vedou a cobrança do imposto de renda no mesmo exercício em que tenha sido publicada a lei que o instituiu ou aumentou14. Confira-se:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

[...]

III – cobrar tributos:

b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou (destaques do autor).

Como se vê, o princípio da anterioridade veda a cobrança de tributo no mesmo exercício financeiro em que foi publicada a lei que o aumentou. Assim, mesmo que a Medida Provisória n. 806/2017 seja convertida em lei em 2018, a incidência de IRRF ora questionada apenas poderia ocorrer a partir de 1º de janeiro de 2019, isso se não houvesse as demais inconstitucionalidades que serão examinadas adiante.

Para que não sobeje dúvida, cabe esclarecer que a cláusula de vigência prevista no art. 12 da Medida Provisória n. 806/2017, que prevê a sua entrada em vigor na data da publicação, em nada altera o cenário jurídico exposto acima.

Isso porque a vigência da lei tributária consiste na sua validade técnico-formal, que decorre da sua elaboração por órgão competente e da observância dos procedimentos legais para a sua edição. Assim, a vigência da lei apenas confere à regra jurídica o potencial para incidir sobre o suporte fático descrito na hipótese normativa, sem permitir a produção concreta de efeitos em violação ao princípio da anterioridade, que consagra a segurança jurídica, a confiabilidade e a previsibilidade do ordenamento jurídico15. Daí se dizer que o princípio da anterioridade da lei tributária paralisa e suspende a eficácia da norma jurídica, de tal modo que a medida provisória publicada em um determinado exercício fiscal somente poderá surtir efeitos, ou seja, somente será eficaz, no exercício fiscal subsequente16 ao de sua conversão em lei, por força no art. 62, § 2º, da Carta Magna.

Com base em tais considerações, percebe-se que não basta examinar apenas a cláusula de vigência, pois o art. 62, § 2º, da Constituição Federal e o princípio da anterioridade postergam a própria produção de efeitos por parte das regras jurídicas que instituem ou aumentam tributos, restringindo a sua eficácia técnica.

Vale ressaltar que o mesmo entendimento foi acolhido pelo Ministro Ricardo Lewandowski no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (“ADIN”) n. 2.588, na qual a Suprema Corte declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 74 da Medida Provisória n. 2.158-35/2001, que previa a tributação dos lucros acumulados por sociedades controladas e coligadas no exterior em 31 de dezembro de 2002. Veja-se:

“Ressalte-se, ainda, que a referida MP, por não ter sido convertida em lei também não poderia vigorar no exercício financeiro seguinte, ou seja, em 2002. Isso porque, o § 2º do artigo 62 da Carta Magna, incluído pela Emenda Constitucional 32/2001, estabelece que:

‘Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada’.

Em resumo, constato que o art. 74, parágrafo único, da MP 2.158-35/2001, além de invadir matéria reservada à lei complementar, a pretexto de apenas alterar o momento da incidência do tributo, criou, por ficção jurídica, novo fato gerador e, consequentemente, nova definição da hipótese de incidência tributária, o que implica, na prática, a instituição de um novo imposto (destaques do autor).

Superado esse ponto, cabe destacar que a criação de um novo fato gerador ficto, que considera os recursos existentes na carteira do FIP como disponibilizados ao seu cotista, constitui inegável majoração de imposto.

Como visto, o art. 62, § 2º, da Constituição Federal prevê que a “[...] Medida provisória que implique [...] majoração de impostos [...] só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada”. Diante disso, cabe demonstrar que houve majoração de imposto.

O art. 104 do Código Tributário Nacional (“CTN”), recepcionado com eficácia hierárquica de lei complementar e que cumpre o papel de estabelecer normas gerais em matéria tributária, prevê que a definição de nova hipótese de incidência constitui majoração de tributo, como se pode verificar a seguir:

“Art. 104. Entram em vigor no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorra a sua publicação os dispositivos de lei, referentes a impostos sobre o patrimônio ou a renda:

I – que instituem ou majoram tais impostos;

II – que definem novas hipóteses de incidência;

III – que extinguem ou reduzem isenções, salvo se a lei dispuser de maneira mais favorável ao contribuinte, e observado o disposto no artigo 178” (destaques do autor).

À luz texto legal acima, constata-se que o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 configura nítido caso de majoração de tributo, em virtude da criação de um fato gerador ficto para a incidência de IRRF sobre os rendimentos acumulados no FIP.

A Medida Provisória n. 806/2017 criou um novo fato gerador, de natureza ficta, no dia 2 de janeiro de 2018, independentemente de qualquer ato de disponibilização. Trata-se, assim, de verdadeira criação de nova hipótese de incidência, matéria que está inegavelmente sujeita ao art. 62, § 2º, da Constituição Federal.

Observe-se que não se trata de mera antecipação do IRRF que será devido no momento do resgate das cotas do FIP. Quando houver o verdadeiro evento de resgate, o IRRF incidirá na proporção do valor resgatado pelo cotista que superar o custo de aquisição. No momento do resgate, o patrimônio do FIP poderá ser superior ou inferior ao valor existente em 2 de janeiro de 2018 e o cotista efetivamente terá acesso aos recursos resgatados, o que justifica a incidência do IRRF. Por outro lado, na hipótese do art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, pretende-se tributar o valor acumulado na carteira do FIP no dia 2 de janeiro de 2018, sem que haja qualquer disponibilização de recursos financeiros aos cotistas. Quando o cotista finalmente tiver acesso aos recursos financeiros, por ocasião do resgate verdadeiro, o patrimônio do FIP poderá apresentar um valor patrimonial completamente distinto, que poderá ser superior ou inferior ao valor patrimonial existente em 2 de janeiro de 2018. Assim, não se trata de mera fixação do prazo de pagamento do IRRF que seria devido de qualquer maneira, mas, sim, de criação de um novo fato gerador ficto, que ocorrerá em data predeterminada, independentemente de qualquer comportamento do contribuinte. Tanto é assim que, na ausência da Medida Provisória n. 806/2017, os valores relativos ao resgate compulsório necessário para o pagamento do IRRF, ao invés de serem vertidos aos cofres públicos, seriam mantidos no FIP, para a aplicação dos recursos financeiros correspondentes em ativos que integram a sua política de investimento, de modo que o cotista somente iria oferecê-los à tributação no momento do resgate.

Seguindo adiante, cabe mencionar que o art. 104 do CTN não passa de simples explicitação do princípio da anterioridade, que visa preservar a proteção temporal outorgada ao contribuinte17. Assim, é evidente que esse dispositivo deve ser interpretado à luz da Constituição Federal, que adotou o termo “aumento” em seu sentido comum, para alcançar as diferentes formas de aumentar o ônus tributário imposto ao contribuinte.

Com efeito, o art. 62, § 2º, da Constituição Federal veda a cobrança de imposto no exercício financeiro seguinte caso a Medida Provisória não tenha sido convertida em lei até o último dia daquele exercício em que ela foi editada.

A expressão “majoração de impostos”, utilizada pelo art. 62, § 2º, da Constituição Federal, compreende as diferentes formas de majoração da carga tributária, como o aumento de alíquota, o alargamento da base de cálculo, a supressão de isenção, a definição de novas hipóteses de incidência, entre outras.

Não importa a forma utilizada pelo legislador para aumentar o imposto18. O dispositivo legal que elevar o ônus tributário apenas poderá produzir efeitos a partir do exercício seguinte ao de conversão em lei da Medida Provisória, como forma de preservar a segurança jurídica, a confiabilidade e a previsibilidade do ordenamento jurídico.

Em arremate, conclui-se que o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 não pode produzir efeitos em 2018, tendo em vista que houve clara majoração do imposto de renda e que não houve a sua conversão em lei até 31 de dezembro de 2017.

5. Violação ao princípio da irretroatividade da lei tributária

Como visto acima, o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 prevê a incidência do IRRF sobre os valores acumulados na carteira do FIP no período anterior à sua entrada em vigor, em caráter retroativo (i.e., alcançando fatos passados). Para tanto, o Poder Executivo criou uma hipótese de disponibilização ficta dos rendimentos acumulados na carteira do FIP, que serão considerados pagos ou creditados aos respectivos cotistas no dia 2 de janeiro de 2018, sendo o administrador do fundo de investimento responsável pela retenção e recolhimento do IRRF aos cofres públicos.

O princípio da irretroatividade tributária19 está previsto no art. 150, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal de 1988, nos seguintes termos:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...]

III – cobrar tributos:

[...]

a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado”.

Como se pode depreender do texto constitucional, a lei tributária deve atuar de forma prospectiva, alcançando fatos geradores ocorridos no futuro. Daí decorre que a lei nova não pode atingir, no presente, os efeitos dos fatos ocorridos no passado20, em razão da necessidade de preservação dos ideais de previsibilidade, estabilidade, cognoscibilidade, confiabilidade e lealdade21. Assim, a situação de fato ou a situação de direito que constitui o fato gerador do tributo deve ocorrer após o início da vigência da lei que o instituiu ou aumentou22, sob pena de afronta ao princípio da irretroatividade.

O efeito retroativo do art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 surge justamente porque se pretende criar um evento ficto no presente, mas com o propósito de alcançar rendimentos e ganhos auferidos no passado. Ou seja, por meio da criação de um fato gerador ficto no presente, pretende-se capturar fatos passados.

A maior prova de que o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 atua de forma retroativa reside no fato de que essa nova hipótese de incidência alcança contribuintes que praticaram atos e negócios jurídicos antes da sua entrada em vigor, aportando seus recursos financeiros em FIP ao tempo da legislação pretérita e com base nela.

Isso não significa que o contribuinte que investiu sob a égide da lei pretérita possui o direito adquirido de ser tributado em conformidade com as suas disposições23. Na verdade, o que não se pode admitir é que, com a criação de um fato gerador ficto, o Poder Executivo pretenda alcançar rendimentos e ganhos acumulados sob a égide do art. 2º da Lei n. 11.312/2006, época em que a incidência do IRRF à alíquota de 15% apenas ocorreria nos casos de amortização, resgate, alienação ou liquidação.

Assim, como o fato gerador ficto criado pelo art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 independe de qualquer ato ou conduta do contribuinte, é certo que a sua incidência retroativa sobre os rendimentos acumulados na carteira do FIP impede os contribuintes de planejarem a sua vida e controlarem o seu futuro.

Há, assim, um claro comprometimento da capacidade do ser humano de se autodeterminar por meio do exercício da sua liberdade24, tendo em vista que uma incidência tributária ficta ocorrerá sobre rendimentos acumulados no passado. É justamente por isso que o Tribunal Constitucional Federal alemão (Bundesverfassungsgericht) salientou, no julgamento do caso BVerfGE 97, 67, de 3 de dezembro de 1997, que a confiabilidade na ordem jurídica constitui um direito fundamental, que afasta a possibilidade de o Poder Público atribuir consequências jurídicas mais gravosas dos que aquelas que vigiam no momento em que o comportamento juridicamente relevante foi praticado pelo cidadão25.

Ora, no caso em exame, não há comportamento juridicamente relevante praticado pelo contribuinte. Ao revés, o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, por meio de ficção jurídica, pretende tributar todo o estoque de rendimentos acumulados na carteira do FIP, independentemente de qualquer ato de disponibilização.

Vale esclarecer que, a todo rigor, o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 não atinge apenas os efeitos futuros de um negócio jurídico celebrado no passado, como admitiu o Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial n. 1.438.876-SP, no qual se autorizou a incidência da alíquota majorada de IRRF prevista na Lei n. 9.779/1999 sobre os juros decorrentes de contratos de mútuo celebrados antes do início de sua vigência. Na verdade, o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 pretende alcançar rendimentos acumulados no passado, afetando, assim, a segurança jurídica e a proteção da confiança do contribuinte em relação às consequências jurídicas de seu comportamento.

Para que fique claro, é importante relembrar da classificação adotada pelo Supremo Tribunal Federal na ADIN n. 493-0, de 25 de junho de 1997, que graduou o nível de retroatividade das leis de acordo com a sua intensidade:

retroatividade máxima: a nova lei pode atingir fatos jurídicos consumados ou protegidos pela coisa julgada, o que acarreta grave insegurança jurídica;

retroatividade média: a nova lei pode impactar os efeitos pendentes dos atos jurídicos celebrados antes do início de sua vigência. Na retroatividade média, a lei nova alcança até mesmo as prestações pretéritas, desde que ainda pendentes de adimplemento (i.e. direitos exigíveis, mas não adimplidos antes de sua vigência);

retroatividade mínima: a nova lei pode alcançar os efeitos futuros dos negócios jurídicos celebrados no passado. Sob a égide da retroatividade mínima, a lei nova alcança tanto os contratos celebrados após o início de sua vigência quanto as prestações futuras de negócios jurídicos celebrados no passado, mas que ainda produzam efeitos26.

No caso ora examinado, não se está diante de uma retroatividade mínima, mas, sim, de uma retroatividade média, no qual lei nova pretende alcançar até mesmo as prestações pretéritas, desde que ainda pendentes de adimplemento. É o que ocorre ao se pretender cobrar o IRRF, na modalidade de “come-cotas”, sobre os valores acumulados na carteira do fundo de investimento antes da entrada em vigor da Medida Provisória n. 806/2017, cujos montantes ainda não foram disponibilizados aos respectivos cotistas.

Neste ponto, é importante destacar que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (“ADIN”) n. 2588, examinou controvérsia jurídica bastante semelhante a essa provocada pela Medida Provisória n. 806/2017.

De fato, o art. 74, parágrafo único, da Medida Provisória n. 2.158-35/2001, de 24 de agosto de 2001, ao introduzir no sistema tributário brasileiro o regime de tributação automática dos lucros do exterior, criou uma hipótese de disponibilização ficta dos lucros acumulados no balanço de sociedades controladas e coligadas no exterior até 31 de dezembro de 2001, alcançando, assim, resultados apurados antes da sua entrada em vigor. Veja-se:

“Parágrafo único. Os lucros apurados por controlada ou coligada no exterior até 31 de dezembro de 2001 serão considerados disponibilizados em 31 de dezembro de 2002, salvo se ocorrida, antes desta data, qualquer das hipóteses de disponibilização previstas na legislação em vigor”.

Como se vê, a semelhança entre os dois casos é patente: as duas Medidas Provisórias criaram fatos geradores fictos de imposto de renda, que pretendem alcançar rendimentos, ganhos ou lucros acumulados em um investimento (FIP ou participação societária) antes de sua entrada em vigor. Veja-se:

Art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017

Art. 74, parágrafo único, da Medida Provisória n. 2.158-35/2001

“Art. 9º Nos termos do art. 2º da Lei nº 11.312, de 2006, os rendimentos e os ganhos auferidos pelos fundos de investimento em participações não qualificados como entidades de investimento que não tenham sido distribuídos aos cotistas até 2 de janeiro de 2018 ficam sujeitos à incidência do Imposto sobre a Renda na fonte à alíquota de quinze por cento e serão considerados pagos ou creditados aos seus cotistas em 2 de janeiro de 2018” (destaques do autor).

“Parágrafo único. Os lucros apurados por controlada ou coligada no exterior até 31 de dezembro de 2001 serão considerados disponibilizados em 31 de dezembro de 2002, salvo se ocorrida, antes desta data, qualquer das hipóteses de disponibilização previstas na legislação em vigor”.

Como não poderia deixar de ser, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (“ADIN”) n. 2.588, declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 74 da Medida Provisória n. 2.158-35/2001, sob a alegação de violação aos princípios da irretroatividade e da anterioridade, previstos no art. 150, inciso III, alíneas “a” e “b”, da Constituição Federal27. Confira-se o seguinte trecho da ementa do julgado:

“2.3. A inconstitucionalidade do art. 74 par. ún., da MP 2.158-35/2001, de modo que o texto impugnado não pode ser aplicado em relação aos lucros apurados até 31 de dezembro de 2001”.

Por sua importância, convém destacar alguns trechos dos votos proferidos pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal a respeito do tema.

Ministra Ellen Gracie afastou a possibilidade de criação de evento ficto de disponibilização de lucros por medida provisória, em violação ao conceito de disponibilidade econômica e jurídica de renda: “A hipótese de aquisição de disponibilidade criada pela medida provisória, ao que me parece, traduz parcialmente uma ficção legal, que não se coaduna com o entendimento firmado por esta Corte a respeito do que seja aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica de renda” (pagina 13 da ADI n. 2.588-1-MC/DF).

Ministro Marco Aurélio Mello reconheceu que a Medida Provisória n. 2.158-35/2001 pretendeu criar um evento ficto de disponibilização dos lucros, por meio de ficção jurídica: “O fato gerador do imposto sobre a renda, sob pena de não se poder assentar esta última, é a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica, fenômeno sempre concreto e que não pode, à mercê de ficção jurídica extravagante, insuplantável, deturpada, a ponto de se dizer que, onde não há disponibilidade econômica ou jurídica, entenda-se já acontecido o fenômeno, como ocorre enquanto o lucro da coligada ou controlada existente no exterior continua, consoante a legislação de regência, no estrangeiro, no próprio patrimônio da empresa que o apurou, não sendo, consideradas as diversas modalidades admitidas em Direito, transferido à empresa situada no Brasil [...]” (página 131 da ADI n. 2.588-1-MC/DF).

Ministro Marco Aurélio Mello considerou inconstitucional a aplicação retroativa do art. 74, parágrafo único, da Medida Provisória n. 2.158-35/2001: “A medida provisória veio ao mundo jurídico, com o artigo 74 ora em análise, em julho de 2001, dispondo, de forma indeterminada, sobre a observância da cabeça do artigo 74, considerados lucros apurados por empresas sediadas no estrangeiro, coligadas ou controladas por brasileiras até 31 de dezembro de 2001, fixando campo de aplicação retroativa de maneira indeterminada e praticamente sem limite. [...] O que cumpre ter presente é que foram apanhados, para a incidência da norma, lucros relativos a exercícios anteriores, adentrando-se, por via oblíqua, o campo da criação de fato gerador ou, sem exagero, de verdadeiro tributo de modo retroativo, incompatível com a ordem jurídica” (página 142 da ADI n. 2.588-1-MC/DF).

Ministro Ricardo Lewandowski destacou que o art. 74, parágrafo único, da Medida Provisória n. 2.158-35/2001 viola os princípios da irretroatividade e da anterioridade: “[...] o parágrafo único do art. 74 da MP 2.158-35/2001 violou também os princípios dá não retroatividade e o da anterioridade, estampados no art. 150, III, alíneas a e b, da Constituição. [...] Salta à vista, pois, que o mencionado dispositivo, além de criar, de modo indevido, um novo fato gerador do imposto sobre a renda e da contribuição sobre lucro líquido, passou, de forma igualmente vedada, a cobrá-lo retroativamente” (página 165 da ADI n. 2.588-1-MC/DF).

Ministro Cezar Peluso confirmou que o art. 74, parágrafo único, da Medida Provisória n. 2.158-35/2001 é incompatível com o princípio da irretroatividade: “Como já visto, antes da edição da Medida Provisória nº 2158- 35/2001, os lucros auferidos no exterior por empresas controladas/coligadas sujeitavam-se à tributação pelo imposto sobre a renda no momento do efetivo pagamento (Lei 9.532/1997). Logo, não pode a legislação posterior atingi-los sem ofensa ao princípio da anterioridade (sic – leia-se irretroatividade), que é expresso ao vedar a exigência de tributos ‘em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado’ (art. 150, III, ‘a’, da CF/88)” (página 215 da ADI n. 2.588-1-MC/DF).

Outro precedente importante consiste no Recurso Extraordinário n. 172.058, de 30 de junho de 1995, relativo ao Imposto sobre o Lucro Líquido (“ILL”) instituído pelo art. 35 da Lei n. 7.713/1988, por meio do qual se pretendia tributar os acionistas por conta de resultados auferidos pelas sociedades anônimas. Ao examinar o tema, a Corte Suprema entendeu que a mera apuração de lucro pela sociedade anônima, no encerramento do período base, não implicava a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica de renda pelo acionista, como se pode verificar do trecho da ementa abaixo transcrita:

“Imposto de renda – retenção na fonte – acionista. O artigo 35 da Lei n. 7.713/88 é inconstitucional, ao revelar como fato gerador do imposto de renda na modalidade ‘desconto na fonte’, relativamente aos acionistas, a simples apuração, pela sociedade e na data do encerramento do período-base, do lucro líquido, já que o fenômeno não implica qualquer das espécies de disponibilidade versadas no artigo 43 do Código Tributário Nacional, isto diante da Lei nº 6.404/76”.

Assim, para que não houvesse violação ao princípio da irretroatividade, o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 apenas poderia alcançar os “rendimentos produzidos” após a sua entrada em vigor, como, aliás, é a regra geral utilizada pela legislação para tratar dos rendimentos acumulados nas carteiras dos fundos de investimento28.

Em reforço, acrescente-se que o princípio da irretroatividade tributária consagra e realiza diversos valores ínsitos ao Estado Democrático de Direito, com especial destaque para o sobreprincípio da segurança jurídica29-30.

O sobreprincípio da segurança jurídica permeia todo o sistema jurídico brasileiro e a própria ideia de Estado Democrático de Direito31-32. A mais significativa referência à segurança, como um direito e uma garantia fundamental de todo cidadão, consta da Constituição Federal, que, em seu Título II (“Dos Direitos e Garantias Fundamentais”), do Capítulo I (“Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos”), assim dispõe:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte” (destaques do autor).

Além da referência acima, a formulação do sobreprincípio da segurança jurídica decorre de diversos mandamentos insculpidos na Constituição Federal33, bem como nos tratados internacionais de direitos humanos assinados pelo Brasil34.

A segurança jurídica insere-se, portanto, entre os direitos e garantias fundamentais do cidadão35, protegendo-o em suas relações com o Estado e com os demais cidadãos, como um dos pilares que sustentam o sistema constitucional brasileiro36.

No âmbito do direito tributário, o sobreprincípio da segurança jurídica concretiza a clareza e a determinação da lei tributária, ao consagrar valores como a inteligibilidade, a confiabilidade e a previsibilidade.

A inteligibilidade pode ser desmembrada em diversos fatores, que envolvem desde a publicidade da lei por ocasião de sua entrada em vigor até a clareza e a determinação na redação concreta dos enunciados normativos, com a preservação da sua coerência e consistência com o ordenamento jurídico37. Trata-se, assim, de aspecto relacionado à acessibilidade intelectual da lei, também chamada de cognoscibilidade, uma vez que o cidadão deve saber quais critérios jurídicos irão pautar o seu comportamento38. Em última análise, a inteligibilidade está vinculada à capacidade material e intelectual de compreensão do sentido das leis que regem determinada conduta39.

A confiabilidade se revela na estabilidade normativa, que protege não apenas o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada, mas também a permanência das relações jurídicas, como ocorre por meio dos institutos da decadência, da prescrição, da proteção judicial dos direitos subjetivos, da proteção às cláusulas pétreas, entre outros40.

Por fim, a previsibilidade realiza-se mediante a proteção da confiança, a postergação de efeitos normativos de regras jurídicas, a proibição de arbitrariedade, a preservação de regras de transição entre regimes jurídicos, entre outros41. O cidadão deve poder ter confiança na ordem jurídica projetada para o futuro, planejando, orientando e ordenando o seu comportado a partir da expectativa de que as leis – ainda que contenham áreas de indeterminação – serão regularmente aplicadas às situações da vida, sem violação à confiança legítima, às liberdades individuais e à estabilidade das relações jurídicas42.

Na seara tributária, o contribuinte apenas consegue antever os efeitos tributários dos seus atos ou negócios jurídicos se as leis tributárias e os atos normativos forem editados de forma clara e objetiva, preservando a segurança jurídica43.

O sobreprincípio da segurança jurídica pode ir além da proteção conferida pelos princípios da anterioridade e da irretroatividade, a fim de garantir a chamada “calculabilidade normativa”, pois o contribuinte deve ter a possibilidade de prever, com exatidão, quais serão as consequências tributárias futuras dos seus atos44-45. Até porque, os próprios princípios da anterioridade e da irretroatividade devem ser interpretados de acordo com a segurança jurídica, que lhes é axiologicamente sobrejacente46. Logo, ainda que se estivesse diante de um caso de retroatividade imprópria, inautêntica ou falsa, a segurança jurídica poderia ser invocada para tutelar a confiança dos contribuintes no Estado47-48.

Vê-se, portanto, que o sobreprincípio da segurança jurídica exige que o cidadão conheça a norma jurídica e seja previamente informado de suas alterações, para que possa alterar, ou não, o seu comportamento49. De modo mais preciso, a “calculabilidade normativa” requer que os direitos e deveres previstos nas normas jurídicas sejam divulgados antecipadamente, a fim de que os administrados possam definir as suas expectativas de comportamentos e as respectivas consequências50. Daí se afirmar que uma nova regra jurídica não pode atingir um ponto temporal anterior ao início de sua vigência51, pois a segurança jurídica e a proteção da confiança exigem que o contribuinte possa confiar nas consequências jurídicas de seu comportamento juridicamente relevante52.

Aplicando o conceito de “calculabilidade normativa” ao caso concreto53, percebe-se que o cotista, no momento em que investiu no FIP, não tinha como prever a criação de um fato gerador ficto pelo art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017. É com base na “calculabilidade normativa” que o investidor exerceu a sua liberdade individual, vinculando as suas ações presentes às calculáveis consequências esperadas no futuro54.

Dessa forma, como o sobreprincípio da segurança jurídica, examinado sob o enfoque da “calculabilidade normativa”, exige que o contribuinte saiba de antemão as consequências tributárias dos seus investimentos, é certo que o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 não poderia produzir efeitos retroativos, alcançando rendimentos que estavam acumulados na carteira do FIP antes da sua entrada em vigor.

Por todo o exposto, conclui-se que, ainda que não houvesse todas as demais inconstitucionalidade e ilegalidades que maculam o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, a incidência do IRRF pretendida pelo Governo Federal apenas poderia alcançar os rendimentos acumulados na carteira do FIP após o início da sua produção de efeitos.

6. Impossibilidade de criação de fato gerador ficto pelo legislador ordinário

Como se sabe, o único caso de fato gerador presumido previsto no sistema constitucional-tributário brasileiro consta do art. 150, § 7º, da Constituição Federal, que trata do ICMS devido em substituição tributária progressiva, na qual a exigência da exação precede a ocorrência do respectivo fato gerador, assegurando-se ao contribuinte, porém, a restituição do imposto pago caso não se realize o fato gerador presumido55.

É o que prevê o § 7º do art. 150 da Carta Magna, incluído pela Emenda Constitucional n. 3/199356, justamente para afastar os questionamentos à legitimidade da substituição tributária progressiva57. Veja-se:

“§ 7º A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido”.

Como visto acima, o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 introduz um fato gerador ficto porque, por meio de remissão legislativa, o Poder Executivo pretende atribuir, aos rendimentos e ganhos que ainda integram a carteira do FIP, o mesmo tratamento tributário aplicável aos rendimentos e ganhos efetivamente distribuídos aos cotistas, por meio de resgate ou liquidação. A ficção jurídica utilizada pode ser facilmente identificada na parte em que o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 dispõe que os “[...] rendimentos e os ganhos auferidos pelos fundos de investimento em participações [...] serão considerados pagos ou creditados aos seus cotistas em 2 de janeiro de 2018”.

Segundo Luís Eduardo Schoueri, a ficção jurídica é uma técnica legislativa de remissão, que é empregada pelo legislador para equiparar dois institutos jurídicos para determinados propósitos. Assim, embora a base da ficção e a hipótese ficta sejam claramente diversas, o legislador impõe tratamento jurídico equivalente58.

Diversamente, para Maria Rita Ferragut, as ficções jurídicas constituem regras de direito material que criam uma verdade jurídica que contraria a verdade natural ou fenomênica, alterando, assim, a representação da realidade. Dessa forma, apesar da inexistência empírica de determinado fato típico, os seus efeitos jurídicos são considerados ocorridos em virtude da ficção jurídica utilizada pelo legislador59.

A rigor, a ficção jurídica constitui simples forma especial de remissão legislativa, que não pressupõe, necessariamente, uma afronta à “verdade real” ou à “verdade jurídica”60. De qualquer modo, ainda que esse requisito não seja necessário para a caracterização da ficção jurídica, o fato é que o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 criou um evento ficto de pagamento ou crédito de rendimentos do FIP para o cotista, quando na realidade natural ou fenomênica nada existiu. Daí a constatação de que, de uma maneira ou de outra, houve a criação de um fato gerador ficto pelo art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, que pretendeu aplicar aos rendimentos que permanecem na carteira do FIP o mesmo tratamento tributário aplicável aos valores efetivamente resgatados pelos cotistas.

Nesse contexto, Alberto Xavier ressalta que o legislador não pode, ao fixar o momento temporal do fato gerador, utilizar-se de ficção jurídica para considerar ocorrido um evento de disponibilidade econômica ou jurídica da renda que ainda não ocorreu. Veja-se:

“O que a lei não pode sem adentrar no terreno da ficção legal é, a pretexto de fixar o momento temporal do fato gerador, definir que ele já se produziu quando a sua produção ainda não teve início ou pode nunca chegar a verificar-se”61.

Para Florence Haret, o deslocamento do elemento temporal do fato gerador do imposto de renda constitui hipótese de presunção jurídica, pois se pretende substituir a “disponibilidade econômica ou jurídica da renda”, exigida pelo art. 43 do CTN, pela “renda passível de futura disponibilidade”62. Assim, o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 poderia ser qualificado como uma hipótese de presunção jurídica, pois desloca o elemento temporal63 de pagamento ou crédito dos rendimentos que integram a carteira do FIP para o cotista, tornando um possível fato futuro como fato presente. Logo, ao pretender tributar os rendimentos acumulados na carteira do FIP, independentemente de evento de amortização ou resgate, passa-se a tributar com base em presunção.

Em suma, deixando de lado as divergências doutrinárias a respeito da existência de ficção jurídica ou presunção, o que se constata é que o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, em vez de tributar o contribuinte no momento em que aufere a disponibilidade econômica ou jurídica sobre os rendimentos apurados pelo FIP, pretende criar um evento artificial de resgate, destituído de qualquer conteúdo econômico.

Observe-se que o art. 150, § 7º, da Constituição Federal, ao criar o fato gerador presumido do ICMS na substituição tributária, assegura “imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido”.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 593.849, em sede de repercussão geral, entendeu que o contribuinte tem direito à diferença entre o valor do ICMS previamente recolhido sob o fato gerador presumido e aquele realmente devido no momento da venda. A tese do julgamento, fixada para fins de repercussão geral, apresenta a seguinte redação:

“É devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) pago a mais no regime de substituição tributária para a frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida”.

Isso não ocorre com o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, que não assegura restituição do IRRF retido e recolhido pelo administrador do FIP caso o evento de disponibilização dos rendimentos para o cotista nunca venha ocorrer, tendo em vista que o FIP pode apurar resultados negativos em operações futuras.

Além disso, é importante destacar que, no regime de substituição tributária, a hipótese de substituição será uma situação, descrita em abstrato pelo legislador, que deve ser anterior ao fato jurídico tributário e cuja ocorrência indique, com alto grau de probabilidade, a iminência daquele fato64. É o que ocorre com o produto plurifásico que sai do estabelecimento industrial e que, provavelmente, será vendido ao consumidor final.

O mesmo fenômeno não se verifica em relação ao art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, no qual o Poder Executivo elegeu uma data aleatória para a incidência do IRRF sobre o estoque de rendimentos acumulados pelo FIP, sem que haja qualquer grau de probabilidade de efetiva distribuição de tais valores aos cotistas.

Por último, acrescente-se que a substituição tributária do ICMS foi incluída diretamente no Texto Constitucional em razão do conflito com outros mandamentos constitucionais, como a capacidade contributiva e a vedação ao confisco. O poder constituinte, ao consagrar a substituição tributária, privilegiou a praticabilidade65, o poder de fiscalização e o combate à evasão fiscal, que prejudica a livre concorrência no mercado66. Porém, os efeitos deletérios sobre o perfil constitucional do ICMS são inegáveis.

A antecipação do recolhimento do ICMS, antes da ocorrência do fato gerador, viola a capacidade contributiva, em razão da ausência de manifestação de riqueza pelo contribuinte, bem como o princípio da vedação ao confisco, pois, como a venda subsequente somente irá ocorrer no futuro, onera-se o patrimônio do contribuinte. Daí a necessidade de sua previsão expressa no art. 150, § 7º, da Constituição Federal, com a garantia de restituição integral e imediata da quantia eventualmente recolhida a maior.

Ora, a Medida Provisória n. 806/2017 deixou de observar o mesmo critério, criando um fato gerador ficto por meio de ato normativo com força de lei, o que viola a capacidade contributiva, a vedação ao confisco e a própria regra de discriminação de competência tributária, que autoriza a tributação da renda, e não do patrimônio.

7. Transgressão ao princípio da capacidade contributiva

Como se sabe, a capacidade contributiva está consagrada no art. 145, § 1º, da Constituição Federal de 1988, com a seguinte redação:

“§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir objetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte”.

A capacidade contributiva tem o propósito de mensurar a aptidão econômica do contribuinte para colaborar com o Estado mediante o pagamento de tributos67. Assim, a tributação conforme a capacidade contributiva pode ser encarada como verdadeira projeção do postulado da igualdade tributária68, na consecução do ideal de justiça fiscal69.

No direito tributário brasileiro, a capacidade contributiva assume dupla feição, ora como regra, ora como princípio70. De um lado, na qualidade de regra jurídica, a capacidade contributiva impõe ao legislador o dever de, na determinação do fato gerador dos impostos, escolher, para integrar o antecedente normativo, eventos que revelem riqueza passível de sofrer a imposição fiscal71. De outro lado, o princípio da capacidade contributiva apregoa que, na definição da base de cálculo dos tributos, o legislador deve estabelecer critérios de quantificação que se aproximem, o máximo possível, da individualização do fato jurídico tributável72. Vale esclarecer que a dupla feição atribuída à capacidade contributiva não deve causar estranheza, tendo em vista que um único enunciado normativo pode dar ensejo à construção de normas jurídicas com estrutura de regra e de princípio73.

Dessa forma, a regra da capacidade contributiva consiste em um mandamento constitucional dirigido ao legislador para que, no exercício da competência tributária, somente eleja como fato gerador evento que revele capacidade contributiva. Dito de outro modo, o signo presuntivo de riqueza eleito pelo legislador deve ser apto a revelar a capacidade econômica do sujeito passivo de contribuir com os gastos públicos74.

A seu turno, o princípio da capacidade contributiva dirige-se ao dimensionamento da base de cálculo do imposto, a qual deve mensurar, da forma mais precisa possível, o conteúdo econômico do fato gerador. No dimensionamento da base de cálculo, o princípio da capacidade contributiva demanda a investigação das condições econômicas e pessoais do indivíduo, a fim de identificar a riqueza passível de tributação. Assim, para realizar o princípio da capacidade contributiva, a regra tributária deve utilizar, com a maior precisão possível, critérios hábeis à identificação dos contribuintes com maior capacidade econômica para colaborar com as despesas gerais do Estado, sendo que o ônus fiscal infligido ao contribuinte não deve possuir efeito confiscatório75, conduzindo à injusta apropriação do patrimônio ou dos rendimentos do cidadão por parte do Erário76.

A incompatibilidade do art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 com a capacidade contributiva pode ser verificada em dois aspectos fundamentais:

i) violação à regra da capacidade contributiva, pois o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, ao criar o fato gerador ficto, escolheu um evento que não ocorreu na realidade e que, portanto, não revela riqueza passível de sofrer a imposição fiscal;

ii) desrespeito ao princípio da capacidade contributiva, uma vez que art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 prevê que os “rendimentos e os ganhos auferidos pelos fundos de investimento em participações [...] serão considerados pagos ou creditados aos seus cotistas em 2 de janeiro de 2018”, sem que haja efetiva disponibilização.

Neste ponto, é importante frisar, com escólio na lição de Ricardo Mariz de Oliveira, que a capacidade contributiva exige que o tributo a ser recolhido aos cofres públicos seja extraído da própria materialidade econômica a ser tributada77. Assim, os rendimentos acumulados no FIP apenas podem ser submetidos à incidência do imposto de renda pelo cotista no momento da efetiva disponibilização, sob pena de tributação do seu patrimônio78.

Em sentido semelhante, Luís Eduardo Schoueri aponta que o princípio da capacidade contributiva se vincula ao fato gerador do imposto de renda, pois a renda adquirida estará disponível a partir do momento em que o contribuinte puder utilizá-la para o pagamento do imposto, isto é, quando o seu titular puder empregar os recursos para a destinação que lhe aprouver, inclusive o pagamento de imposto79. Em outro estudo, Schoueri acrescenta que o princípio da capacidade contributiva, em sua acepção negativa, impede a tributação de pessoa física ou jurídica que não realizou o fato gerador do imposto80. Na visão do autor, é justamente a capacidade contribuinte que impede o uso de ficções jurídicas e presunções absolutas em matéria tributária, quando a utilização de tais mecanismos acarretar a exigência de tributo sem a ocorrência de fato gerador.

Outra evidência da violação à capacidade contributiva reside no fato de que um FIP investe em títulos e valores mobiliários. Assim, a valorização existente no patrimônio do FIP, muitas vezes, está concentrada em ativos financeiros, de modo que, em tais situações, não há recursos financeiros em caixa para o pagamento de IRRF sobre todo o acréscimo patrimonial latente, que decorre justamente da valorização dos papéis em que o FIP investe. Daí a incidência do IRRF apenas no momento do resgate, no qual há efetiva liquidação do investimento. Com a Medida Provisória n. 806/2017, em razão da ausência de recursos financeiros no FIP, os cotistas poderão ser chamados a aportar recursos financeiros na carteira do fundo de investimento, apenas para que o administrador possa efetuar a retenção do IRRF. Ora, em tais situações, além de não receber os valores investidos no FIP, o cotista ainda terá que aportar novos recursos para que o administrador possa recolher o IRRF. É evidente, portanto, a violação ao princípio da capacidade contributiva.

Mas mesmo que não haja a necessidade de aporte de recursos, ainda assim haverá violação da capacidade contributiva, que exige que os recursos financeiros recolhidos aos cofres públicos sejam extraídos da própria materialidade tributável. É justamente esse aspecto que diferencia a capacidade contributiva da capacidade econômica em geral81. O cotista de um FIP pode ter capacidade econômica em razão da valorização das próprias cotas do fundo de investimento e, ainda assim, não ter capacidade contributiva para pagar o imposto de renda enquanto não houver o resgate de suas cotas. Isso porque, antes do resgate, os ativos financeiros que valorizaram integram o patrimônio especial do fundo de investimento, que não se confunde com o patrimônio dos cotistas e do administrador.

Com base nas considerações acima, é possível que, independentemente do prazo de sua entrada em vigor, o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 jamais poderia tributar, por meio de fato gerador ficto, todo o estoque de rendimentos acumulados na carteira do FIP. Esses valores serão oferecidos à tributação no momento do resgate, amortização, alienação ou liquidação, quando então os valores correspondentes estarão disponíveis para o cotista efetuar o pagamento do imposto de renda.

8. Ofensa aos conceitos de disponibilidade econômica ou jurídica de renda

A par de todas as inconstitucionalidades destacadas acima, o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 viola o art. 43 do CTN, que exige a aquisição do direito à renda (disponibilidade jurídica) ou a integração da renda à esfera de uso e disposição do contribuinte, sem título jurídico (disponibilidade econômica).

Chega a ser desanimador notar que, não muito tempo após a comemoração dos 50 anos do CTN, considerado a mais notável obra legislativa do direito tributário brasileiro, o Poder Executivo venha a editar um ato normativo como a Medida Provisória n. 806/2017, que pretende, em última análise, dissipar a exigência de aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica sobre a renda, para fins de incidência do imposto de renda sobre os valores aplicados em fundos de investimento.

O Anteprojeto de Código Tributário Nacional, elaborado por Rubens Gomes de Sousa em 195382, sob forte influência do Código Tributário Alemão de 1919, do Código Fiscal Mexicano de 1938 e do Código Fiscal da Província de Buenos Aires de 194883, pode ser considerado um monumento da cultura jurídico-tributária brasileira, que deveria ser homenageado pelos seus 50 anos de existência, ao invés de ser presenteado com as inúmeras atrocidades previstas na Medida Provisória n. 806/201784.

O cerne da discussão passa pela análise do art. 43 do CTN, que define o conceito de renda e de proventos de qualquer natureza positivado no sistema tributário brasileiro. Confira-se a redação do dispositivo legal:

“Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:

I – de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;

II – de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior [...]” (destaques do autor).

De início, relembre-se que, embora seja anterior à Constituição Federal, a Lei n. 5.172/1966, que instituiu o CTN, foi recepcionada pela nova ordem constitucional com eficácia hierárquica de lei complementar85, em virtude do exercício da função de definir o fato gerador do imposto de renda, nos termos do art. 146, inciso III, alínea “a”, da Carta Magna.

Daí decorre que as leis ordinárias que disciplinam a incidência do imposto de renda, tal como o art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 em caso de sua efetiva conversão em lei, não podem extravasar os limites prefixados na lei complementar, que delimitou o momento e o campo de incidência do citado tributo.

Ao tratar do fato gerador do imposto de renda, o art. 43 do CTN prevê que a incidência do imposto de renda depende da aquisição de disponibilidade jurídica ou econômica sobre a renda ou sobre os proventos de qualquer natureza86.

A disponibilidade jurídica da renda possui estreita relação com o direito privado, pois a renda ou os proventos de qualquer natureza apenas serão incorporados ao patrimônio do contribuinte no momento em que todos os elementos materiais e objetivos do ato jurídico ou do negócio jurídico estiverem devidamente configurados na realidade social. Assim, a disponibilidade jurídica da renda pressupõe a existência de direito líquido e certo que assegure ao seu titular o direito de exigir o recebimento da renda, em virtude do cumprimento de todas as condições que viabilizam a sua percepção87.

Por outro lado, a disponibilidade econômica da renda corresponde aos acréscimos patrimoniais desprovidos de título jurídico atual ou futuro, que separe o rendimento ou o provento de qualquer natureza do capital ou patrimônio que o produziu. Assim, o conceito de disponibilidade econômica pode alcançar tanto os acréscimos patrimoniais provenientes de atos ilícitos ou não regulados pelo direito88 como os acréscimos patrimoniais que comprovadamente estão na esfera de disponibilidade do contribuinte, por meio da análise dos fatos e das circunstâncias do caso concreto (aproximação econômica), independentemente da forma jurídica89.

O art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, ao criar o fato gerador ficto em 2 de janeiro de 2018, operacionalizou a incidência do IRRF por meio do mecanismo de “come-cotas”, segundo o qual o administrador do FIP deve reduzir a quantidade de cotas do contribuinte, utilizando os recursos correspondentes para reter e recolher o IRRF aos cofres públicos90.

Segundo Estevão Gross Neto, o mecanismo de “come-cotas” é incompatível com o conceito de renda, com a capacidade contributiva e com o art. 43 do CTN, que exige a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica da renda. Na visão do autor, o regime de “come-cotas” acarreta a tributação de rendimentos não realizados pelo cotista91.

Luciana Rosanova Galhardo e Jorge Ney de Figueirêdo Lopes Junior acrescentam que, no caso de fundos de investimento fechados, a disponibilidade jurídica ou econômica da renda apenas surge no momento do efetivo resgate das cotas pelos investidores, por ocasião do término do seu prazo de duração ou de sua efetiva liquidação, o que afasta a possibilidade de aplicação do regime de “come-cotas”92.

Para Nara Cristina Takeda, a sistemática do “come-cotas” não pode ser aplicada quando as próprias regras que regulam o fundo de investimento não admitem o resgate antes do término do seu prazo de duração. Na visão da autora, no caso de fundos de investimento fechado, não há disponibilidade econômica, em virtude da falta de distribuição dos rendimentos aos cotistas, tampouco disponibilidade jurídica, em razão da impossibilidade de solicitação de resgate antes do término do prazo de duração93.

As posições doutrinárias acima, conquanto acertadas em suas conclusões, exigem breves esclarecimentos, para evitar confusões conceituais.

A disponibilidade econômica da renda não deve ser confundida com disponibilidade financeira, que consiste no mero ingresso de recursos financeiros. Não é qualquer recebimento de dinheiro ou bens suscetíveis de avaliação em pecúnia que acarretam a existência de disponibilidade econômica94, assim como a disponibilidade econômica pode ser verificada antes da efetiva posse física dos recursos financeiros95.

Assim, a ausência de disponibilidade econômica a justificar o “come-cotas” deriva do fato de que art. 43 do CTN não se contenta com a mera valorização nominal das cotas do fundo de investimento, uma vez que, ao fazer alusão à “aquisição de disponibilidade econômica”, o texto legal deixa clara a necessidade de uma relação de troca com o mercado, concretizando o “princípio da realização da renda”96. Logo, a mera valorização das cotas não implica a aquisição de disponibilidade econômica pelo cotista97-98, pois, como ensina Alcides Jorge Costa, o aludido imposto deve recair sobre renda passível de ser empregada, aproveitada ou utilizada pelo contribuinte, e não sobre renda virtual e ainda não realizada99.

A disponibilidade jurídica, por sua vez, pressupõe a aquisição de um direito novo, que se incorpora ao patrimônio do contribuinte, sem reserva ou condição100. A existência de disponibilidade jurídica pode ser verificada quando o titular da renda tem a possibilidade de dispor do rendimento de forma independente do capital que o produziu101.

No caso de fundo de investimento fechado, a ausência de disponibilidade jurídica de renda, apta a justificar a aplicação do regime de “come-cotas”, se torna ainda mais evidente do que no caso de fundo de investimento aberto, tendo em vista que não se admite o resgate de cotas enquanto não houver o término do prazo de duração do fundo. É o que prevê o art. 21 da Instrução CVM n. 578/2016, a seguir reproduzido:

“Art. 21. Não é permitido o resgate de cotas do fundo, salvo nas hipóteses de sua liquidação, sendo permitidas a amortização e a distribuição de rendimentos nos termos do previsto no seu regulamento” (destaques do autor).

Ora, se o cotista não pode resgatar as cotas do FIP antes do término do seu prazo de duração, como pode o Fisco exigir o resgate compulsório de cotas, sob o regime de “come-cotas”, para forçar o pagamento de imposto de renda? Obviamente, se o contribuinte não tem acesso aos recursos antes do término do FIP, é evidente que não há disponibilidade econômica ou jurídica sobre os valores em questão102.

De todo modo, é importante esclarecer que também não há disponibilidade jurídica da renda nos investimentos realizados em fundos abertos. Isso porque a mera possibilidade (em abstrato) de realização do resgate não acarreta a aquisição de disponibilidade jurídica sobre o acréscimo patrimonial latente, que ainda não se apresenta como um rendimento segregado do capital que o produziu.

Sobre esse ponto, é oportuno fazer um breve paralelo com a decisão proferida pela Corte Suprema na ADIN n. 2.588, que analisou a constitucionalidade do art. 74 da Medida Provisória n. 2.158-35/2001, no qual se previa a tributação automática, em 31 de dezembro de cada ano-calendário, dos lucros apurados por sociedades controladas e coligadas no exterior, independentemente de qualquer ato de disponibilização.

Após a utilização do sistema da continência para a apuração do voto médio dos ministros, o Supremo Tribunal Federal decidiu que o regime de tributação automática dos lucros do exterior previsto no art. 74 da Medida Provisória n. 2.158-35/2001 seria inconstitucional para as sociedades coligadas, em virtude da ausência de poder de decisão.

Essa posição foi iniciada pela Ministra Ellen Gracie, para quem, na ausência de poder de controle, não haveria disponibilidade econômica ou jurídica, para a pessoa jurídica no Brasil, sobre os lucros auferidos pelas sociedades coligadas no exterior. Isso porque, na ausência de poder de controle, a pessoa jurídica no Brasil não poderia decidir o momento de distribuição dos lucros do exterior para o Brasil.

A posição da Ministra Ellen Gracie estava contida nos votos proferidos pelos Ministros Marco Aurélio Mello, Sepúlveda Pertence, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello, que consideravam o art. 74 da Medida Provisória n. 2.158-35/2001 integralmente inconstitucional, em razão da criação de um novo fato gerador por ficção jurídica, bem como no voto proferido pelo Ministro Joaquim Barbosa, que apenas considerou o dispositivo legal válido nos casos em que a sociedade estrangeira estivesse localizada em paraíso fiscal.

Ora, aplicando o mesmo racional acima ao caso da Medida Provisória n. 806/2017, percebe-se que, na hipótese de fundo de investimento fechado, como é o caso do FIP, o cotista não tem o direito de decidir a respeito do momento do resgate, tendo em vista que esse evento apenas ocorre no final do prazo de duração do FIP. É o que prevê o art. 4º da Instrução CVM n. 555/2014, segundo a qual, no caso de fundos fechados, somente se admite o resgate ao término do prazo de duração do fundo. Confira-se:

“Art. 4º O fundo pode ser constituído sob a forma de condomínio aberto, em que os cotistas podem solicitar o resgate de suas cotas conforme estabelecido em seu regulamento, ou fechado, em que as cotas somente são resgatadas ao término do prazo de duração do fundo (destaques do autor).

Logo, como o cotista não tem o direito de decidir o momento do resgate, é evidente que não há poder de decisão por parte do cotista, para efeito de aquisição da suposta disponibilidade jurídica da renda, fundamentada no poder abstrato de decisão.

A todo rigor, a mera possibilidade de decidir o momento do resgate das cotas, por meio do exercício do direito de decisão, não implica a aquisição de disponibilidade jurídica da renda, pois o poder de decidir em abstrato não se confunde com o seu efetivo exercício em concreto. Assim, a disponibilidade jurídica da renda não significa o mero poder decidir, mas, sim, o exercício de poder de decidir que provoque a aquisição de disponibilidade sobre os rendimentos acumulados na carteira do fundo de investimento103. Tanto isso é verdade que, enquanto não houver efetivo resgate das cotas, os rendimentos continuarão no patrimônio do fundo de investimento, independentemente da possibilidade de exercício do direito de resgate.

De qualquer forma, o fato é que, no caso de fundos de investimento fechados, sequer o direito abstrato de decidir acerca do resgate das cotas existe antes do prazo de liquidação, o que afasta por completo a possibilidade de existência de disponibilidade jurídica sobre os rendimentos mantidos na carteira do FIP.

Dessa forma, considerando que o cotista não tem o direito de efetuar resgates do FIP antes do encerramento do seu prazo de liquidação, é evidente que não há disponibilidade jurídica ou econômica apta a justificar o resgate fictício das cotas em 2 de janeiro 2018, para fins de incidência do IRRF sobre os rendimentos e ganhos acumulados antes da entrada em vigor do art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017.

9. Conclusões

Diante das considerações precedentes, é possível concluir, em breve síntese, que a incidência tributária prevista no art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017 não pode subsistir em razão das seguintes inconstitucionalidades e ilegalidades:

i) falta de conversão em lei da Medida Provisória n. 806/2017 no ano-calendário de 2017, o que impede a produção de efeitos no ano-calendário de 2018, em razão do art. 62, § 2º, da Constituição Federal, bem como do princípio da anterioridade tributária;

ii) violação ao princípio da irretroatividade da lei tributária, em razão da pretensão de tributar, por meio de fato gerador ficto, todo estoque de rendimentos acumulados na carteira do FIP antes da entrada em vigor da Medida Provisória n. 806/2017;

iii) impossibilidade de criação de fato gerador ficto em violação à regra de discriminação de competência e aos demais limites materiais e formais previstos na Constituição Federal104, tendo em vista que o único caso admitido no sistema constitucional-tributário brasileiro está previsto no art. 150, § 7º, da própria Magna Carta, que trata do ICMS devido em substituição tributária progressiva e, ainda assim, com a exigência de restituição do imposto pago caso não se realize o fato gerador presumido105;

iv) transgressão ao princípio da capacidade contributiva, por pretender exigir o recolhimento de imposto de renda sobre valores que não se integraram ao patrimônio do contribuinte;

v) ofensa ao art. 43 do CTN, que exige a aquisição do direito à renda (disponibilidade jurídica) ou a integração da renda à esfera de disponibilidade do contribuinte, sem título jurídico (disponibilidade econômica).

É de esperar, portanto, que o Poder Judiciário afaste a aplicação do art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, sob pena de perpetração de mais um caso de “inconstitucionalidade útil” no sistema tributário brasileiro, por meio do qual o Poder Público edita uma regra jurídica inconstitucional, contando com o fato de que inúmeros contribuintes não irão ingressar com ações judiciais para contestar a nova incidência106.

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1 Art. 2º da Lei n. 11.312/2006.

2 Art. 7º da Medida Provisória n. 806/2017.

3 Embora a Medida Provisória n. 806/2017 não tenha sido convertida em lei dentro do prazo constitucional de 60 dias, prorrogável uma vez por igual período (o prazo expirou em 8 de abril de 2018, após a submissão do artigo para publicação), a discussão exposta permanece válida para as ações judiciais em curso, tendo em vista que os §§ 3º e 11 do art. 62 da Constituição Federal preveem que a medida provisória não convertida em lei é extirpada do ordenamento jurídico, mas seus efeitos permanecem em relação aos atos praticados durante o período de sua vigência, caso o Congresso Nacional não edite um Decreto Legislativo para disciplinar as relações jurídicas decorrentes da medida provisória não aprovada.

4 Art. 6º da Instrução CVM n. 579/2016: “Para os propósitos desta Instrução, considera-se parte ligada ao cotista pessoa com vínculo familiar, afetivo ou qualquer outro tipo de relacionamento, que esteja exposta a sua influência quando da tomada de decisões”.

5 Adicionalmente aos requisitos elencados acima, a Instrução CVM n. 579/2016 estabelece, em seu art. 5º, que deverão ser consideradas pelo administrador do fundo, para concluir se um determinado FIP deve ser classificado como entidade de investimento, ou não, as seguintes características: (a) possuir mais de um investimento, direta ou indiretamente, (b) ter mais de um cotista, direta ou indiretamente, (c) ter cotistas que não influenciam ou não participam da administração das entidades investidas ou não sejam partes ligadas aos administradores dessas entidades; e/ou (d) possuir investimento em entidades nas quais os cotistas não possuíam qualquer relação societária, direta ou indiretamente, previamente ao investimento do fundo.

6 Art. 8º da Instrução CVM n. 579/2016.

7 BARBOSA, Henrique Cunha. Capítulo 5 – usufruto de cotas de fundos de investimento”. In: FREITAS, Bernardo Vianna; e VERSIANI, Fernanda Valle (coord.). Fundos de investimento – aspectos jurídicos, regulamentares e tributários. São Paulo: Quartier Latin, 2015, p. 99-104.

8 Nas palavras de Roberto Quiroga Mosquera: “Os fundos de investimento são uma comunhão de recursos, sem personalidade jurídica, constituídos com o objetivo precípuo de investir no mercado financeiro e de capitais. São também denominados entidades de investimento coletivo. Trata-se de investimento que possui grande atrativo comercial, uma vez que viabiliza a diluição do risco existente, possibilita a redução de custos e simplifica o trâmite das operações” (MOSQUERA, Roberto Quiroga. Prefácio. In: DINIZ, Rodrigo Pará. Fundos de investimento no direito brasileiro – aspectos tributários e questões controvertidas em matéria fiscal. São Paulo: Almedina, 2014, p. 11).

9 Segundo Nelson Eizirik et al.: “[…] os fundos de investimento organizam-se, juridicamente, sob a forma de condomínio, sem personalidade jurídica, constituindo uma comunhão de recursos destinados à aplicação em carteiras compostas pelos mais diversos ativos financeiros, como títulos da dívida pública, ações, debêntures e outros títulos ou contratos existentes no mercado” (EIZIRIK, Nelson et al. Mercado de capitais – regime jurídico. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2011, p. 81).

10 PIRES, Daniela Marin. Os fundos de investimentos em direitos creditórios. São Paulo: Almedina, 2013, p. 53-54.

11 CARDOSO, Daniel Gatschnigg. Imposto sobre a renda auferida em fundos de investimento. São Paulo: MP Editora, 2011, p. 41-44.

12 BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 13. ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 943.

13 A despeito da conhecida distinção entre regras e princípios, o presente estudo utilizará a expressão “princípio da anterioridade”, não apenas porque essa nomenclatura está arraigada na tradição jurídico-tributária, mas também porque o seu conteúdo consagra tanto uma regra quanto um princípio. A regra proíbe a instituição ou majoração de tributos no mesmo exercício social, ao passo que o princípio estabelece o dever de buscar os ideais de previsibilidade, controlabilidade, intelegibilidade e mensurabilidade (cf. ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 153).

14 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 31. ed. São Paulo: Malheiros, 2017, p. 222.

15 Nesse sentido, confira-se a lição de Tércio Sampaio Ferraz Júnior: “A anterioridade proíbe que a norma vigente (publicada num exercício financeiro) possa produzir efeitos (eficácia como condição de incidência) no mesmo exercício financeiro, seja sobre fatos/atos ocorridos, no período, antes de sua vigência, seja sobre aqueles que, ainda no período, venham a ocorrer após a vigência. A partir da vigência, os fatos ocorridos no período são considerados geradores, mas o efeito previsto (possibilidade de ‘cobrar’ o tributo) não os alcança se ocorridos no período. A norma válida, a partir de um certo momento (vigência), configura (tipologicamente) certos fatos como geradores, mas sobre nenhum deles (se ocorridos no mesmo exercício financeiro em que a norma se tomou vigente) há possibilidade de produção de efeitos (eficácia). Se, para eles, não há eficácia, não se preenche a condição de incidência. Tome-se, ademais, o disposto no art. 104 do CTN (‘Entram em vigor no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorre a sua publicação os dispositivos de lei, referentes a impostos sobre o patrimônio e a renda...’). Se entendemos ‘entrar em vigor’ como ‘passar a ter vigência’ (a lei teria sido publicada mas, por força do CTN, a data de início estaria posposta), fica claro que ela só vale para o que vier a acontecer no período seguinte. Se entendemos que ‘vigor’ significa ‘eficácia’, do mesmo modo a possibilidade de produzir efeitos só se dá para eventos a partir do exercício seguinte” (FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Anterioridade e irretroatividade no campo tributário. Revista Dialética de Direito Tributário n. 65. São Paulo: Dialética, 2001, p. 123-131).

16 Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo; e SILVEIRA, Marcela Vergna Barcellos. A reedição de medidas provisórias à luz dos princípios da anterioridade e irretroatividade da lei tributária. Revista Dialética de Direito Tributário n. 49. São Paulo: Dialética, 1999, p. 60. Vale ressaltar que o artigo dos autores foi escrito antes da edição da Emenda Constitucional n. 32/2001.

17 É o que ensina Douglas Yamashita na seguinte passagem: “[O] art. 104 do CTN explicita bem o princípio da anterioridade, delineando seu âmbito de proteção temporal do contribuinte contra (i) a instituição ou majoração de tributos; (ii) a definição de novas hipóteses de incidência; (iii) a extinção ou redução de isenções” (YAMASHITA, Douglas. Direito tributário – uma visão sistemática. São Paulo: Atlas, 2014, p. 80-81).

18 MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional. São Paulo: Atlas, 2004. v. II, p. 1429.

19 Novamente, optou-se pela expressão “princípio da irretroatividade”, tendo em vista que a sua dimensão normativa consagra tanto uma regra quanto um princípio. A regra proíbe a edição de lei instituindo ou majorando tributos em relação a fatos ocorridos no passado, ao passo que o princípio estabelece o dever de buscar os ideais de previsibilidade, estabilidade, cognoscibilidade, confiabilidade e lealdade (cf. ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 142).

20 TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional, financeiro e tributário – valores e princípios constitucionais tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 2015. v. II, p. 513.

21 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 142.

22 TÔRRES, Heleno Taveira. Direito constitucional tributário e segurança jurídica – metódica da segurança jurídica do sistema constitucional tributário. São Paulo: RT, 2011, p. 423-424.

23 Como alerta Misabel Abreu Machado Derzi: “Inexiste, para o futuro, um direito à persistência das leis tributárias, no ponto em que se encontram” (DERZI, Misabel Abreu Machado. Modificações da jurisprudência no direito tributário. São Paulo: Noeses, 2009, p. 391).

24 Andrei Pitten Velloso acertadamente pontua que: [...] a segurança jurídico-tributária é uma condição da liberdade. É um meio necessário para a sua garantia. Sem saber quais são as consequências jurídicas dos seus atos, os cidadãos jamais serão plenamente livres, jamais terão liberdade para autodeterminar-se: o temor da imputação de consequências jurídicas imprevistas atua como um forte limitador da liberdade” (VELLOSO, Andrei Pitten. Constituição tributária interpretada. São Paulo: Atlas, 2007, p. 124).

25 Bundesverfassungsgericht, BVerfGE 97, 6, de 03.12.1997. Sobre o tema, conferir: TIPKE, Klaus; e LANG, Joachim. Direito tributário (Steuerrecht). Tradução de Luiz Dória Furquim. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2008. v. I, p. 248.

26 Segundo Carlos Mário da Silva Velloso: “Nenhuma dessas retroatividades a Constituição brasileira permite. A retroatividade mínima, confundida com aplicação imediata da lei, costuma ser comum na ordem jurídica brasileira, ou costuma ser admitida, em razão dessa confusão que se faz com aplicação imediata da lei, até por ilustres tribunais” (VELLOSO, Carlos Mário da Silva. O princípio da irretroatividade da lei tributária. Revista Trimestral de Direito Público n. 15. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 18). Na mesma linha, conferir: VELLOSO, Andrei Pitten. Constituição tributária interpretada. São Paulo: Atlas, 2007, p. 148.

27 A doutrina também destacava a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 74 da Medida Provisória n. 2.158-35/2001. Por todos, conferir: XAVIER, Alberto. Direito tributário internacional do Brasil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 412-416.

28 Vide art. 20, § 3º, inciso I, art. 34, § 7º, art. 46, § 8º, art. 91, § 6º, inciso I, todos da Instrução Normativa RFB n. 1.585/2015, que consolida as regras de tributação aplicáveis aos rendimentos e ganhos auferidos nos mercados financeiros e de capitais.

29 MANEIRA, Eduardo. O princípio da não-surpresa do contribuinte. Belo Horizonte: Del Rey, 1994, p. 161.

30 Para o propósito do presente estudo, não há a necessidade de entrar no mérito da qualificação da segurança jurídica como um “princípio” ou “sobreprincípio”. Segundo Paulo de Barros Carvalho: “A segurança jurídica é, por excelência, um sobreprincípio. Não temos notícia de que algum ordenamento a contenha como regra explícita. Efetiva-se pela atuação de princípios, tais como o da legalidade, da anterioridade, da igualdade, da irretroatividade, da universalidade da jurisdição e outros mais” (CARVALHO, Paulo de Barros. O sobreprincípio da segurança jurídica e a revogação de normas tributárias. In: COÊLHO, Sacha Calmon Navarro (coord.). Segurança jurídica – irretroatividade das decisões judiciais prejudiciais aos contribuintes. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 50).

31 Para Geraldo Ataliba, o Direito é instrumento de segurança, assegurando a governantes e governados recíprocos direitos e obrigações (ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 184).

32 FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Direito constitucional: liberdade de fumar, privacidade, estado, direitos humanos e outros temas. Barueri: Manole, 2007, p. 153.

33 Como exemplo, vide art. 5º, caput e inciso XXXIII, art. 6º, inciso XXIII, art. 23, inciso XII, art. 103-A, § 1º, dentre muitos outros.

34 ÁVILA, Humberto. Segurança jurídica – entre permanência, mudança e realização no direito tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 203-204.

35 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário – Constituição e Código Tributário Nacional. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 54.

36 MACHADO, Hugo de Brito. A irretroatividade da lei tributária como garantia do contribuinte. In: COÊLHO, Sacha Calmon Navarro (coord.). Segurança jurídica – irretroatividade das decisões judiciais prejudiciais aos contribuintes. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 232-233.

37 YAMASHITA, Douglas. Direito tributário – uma visão sistemática. São Paulo: Atlas, 2014, p. 53.

38 COELHO, Eduardo Junqueira. Segurança jurídica e a proteção da confiança no direito tributário. In: MANEIRA, Eduardo; e TÔRRES, Heleno Taveira (coord.). Direito tributário e a Constituição – homenagem ao Professor Sacha Calmon Navarro Coêlho. São Paulo: Quartier Latin, 2012, p. 231.

39 MENKE, Cassiano. Irretroatividade tributária material – definição, conteúdo e eficácia. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 112-113.

40 YAMASHITA, Douglas. Direito tributário – uma visão sistemática. São Paulo: Atlas, 2014, p. 53.

41 YAMASHITA, Douglas. Direito tributário – uma visão sistemática. São Paulo: Atlas, 2014, p. 54.

42 COELHO, Eduardo Junqueira. Segurança jurídica e a proteção da confiança no direito tributário. In: MANEIRA, Eduardo; e TÔRRES, Heleno Taveira (coord.). Direito tributário e a Constituição – homenagem ao Professor Sacha Calmon Navarro Coêlho. São Paulo: Quartier Latin, 2012, p. 231-232.

43 FREGONESI JUNIOR, Maucir. Sistema tributário nacional – doutrina, prática e reforma. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 50-53.

44 É o que ensina Humberto Ávila na seguinte passagem: “Calculabilidade significa a capacidade de o cidadão antecipar as consequências alternativas atribuíveis pelo Direito a fatos ou atos, comissivos ou omissivos, próprios ou alheios, de modo que a consequência efetivamente aplicada no futuro situe-se dentro daquelas alternativas reduzidas e antecipadas no presente” (ÁVILA, Humberto. Segurança jurídica – entre permanência, mudança e realização no direito tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 587).

45 MENKE, Cassiano. Irretroatividade tributária material – definição, conteúdo e eficácia. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 116-117.

46 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 142.

47 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 348.

48 Para Misabel Abreu Machado Derzi, a distinção entre “retroatividade autêntica” e “retroatividade imprópria”, aceita pelo Tribunal Constitucional Alemão, não deve prosperar no direito constitucional-tributário brasileiro, no qual a proteção do princípio da irretroatividade se faz mais sólida, por imperativo constitucional. Daí a afirmação da autora de que “[...] atingir, por meio da lei nova, as consequências jurídicas derivadas de um fato pretérito a sua vigência, somente porque elas se desenvolvem já no tempo da lei nova, é o mesmo que modificar o próprio fato” (DERZI, Misabel Abreu Machado. Modificações da jurisprudência no direito tributário. São Paulo: Noeses, 2009, p. 444-447).

49 Como adverte Sacha Calmon Navarro Coêlho: “O princípio da não surpresa do contribuinte é de fundo axiológico. É valor nascido da aspiração dos povos de conhecerem com razoável antecedência o teor e o quantum dos tributos a que estariam sujeitos no futuro imediato, de modo a poderem planejar as suas atividades levando em conta os referenciais da lei” (COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 254).

50 LUHMANN, Niklas. Sociologia do direito I. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1983, p. 45-66.

51 Como aponta Cassiano Menke: “O ato retroeficaz impede que o indivíduo possa prever as consequências jurídicas com as quais deve contar. Diante de uma norma retroativa, o futuro se torna imprevisível e incontrolável, impróprio, por conseguinte, para o desenvolvimento do indivíduo como um ser humano livre e digno” (MENKE, Cassiano. Irretroatividade tributária material – definição, conteúdo e eficácia. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 116-117).

52 TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional, financeiro e tributário – valores e princípios constitucionais tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 2015. v. II, p. 513.

53 Note-se que a “calculabilidade normativa”, em sua essência, é ínsita à ideia de direito e justiça, pois, como ensinava Jean-Étienne-Marie Portalis, citado por Vicente Ráo: “o homem [...] seria o mais infeliz dos seres, se não se pudesse julgar seguro nem sequer quanto à sua vida passada” (RÁO, Vicente. O direito e a vida dos direitos. 3. ed. São Paulo: RT, 1991, p. 323).

54 MENKE, Cassiano. Irretroatividade tributária material – definição, conteúdo e eficácia. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 117.

55 Cf. MELO, José Eduardo Soares de. ICMS – teoria e prática. 9. ed. São Paulo: Dialética, 2006, p. 174.

56 Para Roque Antonio Carrazza, a própria Emenda Constitucional n. 3/1993 padece de inconstitucionalidade (cf. CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS. 17. ed. São Paulo: Malheiros, p. 387-415).

57 VELLOSO, Andrei Pitten. Constituição tributária interpretada. São Paulo: Atlas, 2007, p. 203.

58 Segundo Luís Eduardo Schoueri: “As ficções podem ser limitadas ou ilimitadas, conforme o legislador deseje que a equiparação se dê somente para dados fins, ou de modo amplo e irrestrito. Em geral, a ficção é empregada quando se querem equiparar dois institutos jurídicos apenas para determinados propósitos, i.e., a comparação é limitada” (SCHOUERI, Luís Eduardo. Distribuição disfarçada de lucros. São Paulo: Dialética, 1996, p. 106-107).

59 Nas palavras da autora: “As ficções jurídicas são regras de direito material que, propositadamente, criam uma verdade legal contrária à verdade natural, fenomênica. Alteram a representação da realidade ao criar uma ficção jurídica que não lhe corresponde, e produzem efeitos jurídicos prescindindo da existência empírica dos fatos típicos que originalmente ensejariam tais efeitos” (FERRAGUT, Maria Rita. Presunções no direito tributário. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 156).

60 SCHOUERI, Luís Eduardo. Distribuição disfarçada de lucros. São Paulo: Dialética, 1996, p. 100-108.

61 XAVIER, Alberto. Direito tributário internacional do Brasil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 412.

62 Confira-se: “Ao deslocar o instante do auferimento da renda, passa a tributar com base em presunção. Assim, antes mesmo de o contribuinte receber ou saber se receberá esse lucro do exterior, o Fisco o transforma em hipótese de IR, presumido, e passa a tributar. Presume que o sujeito passivo o receberá futuramente e, assim o fazendo, antecipa ou, mais, tributa indevidamente, no caso de inexistência do fato jurídico, sob o argumento de haver possível acréscimo patrimonial. [...]. Logo, antes mesmo de falar em qualquer disponibilidade, a Fazenda tributa substituindo a hipótese ‘renda disponível’ em [...] ‘renda passível de futura disponibilidade’. Onera o contribuinte, pois, em momento em que nem se cogita ainda de auferimento de renda, e muito menos de sua disponibilidade jurídica ou econômica. Não houve acréscimo patrimonial” (HARET, Florence. Teoria e prática das presunções no direito tributário. São Paulo: Noeses, 2010, p. 662).

63 Vale esclarecer que, no caso do IRRF, a disponibilidade econômica ou jurídica acaba por confundir-se com o critério temporal do imposto. Por outro lado, no caso do IRPJ ou do IRPJ, que são mensurados por acréscimos patrimoniais em um período, a disponibilidade econômica ou jurídica será um elemento necessário, mas não suficiente para a ocorrência do fato gerador, que apenas ocorrerá no término do período de apuração (cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Comentários de Luís Eduardo Schoueri. In: OLIVEIRA, Ricardo Mariz de; e COSTA, Sérgio de Freitas (coord.). Diálogos póstumos com Alcides Jorge Costa. São Paulo: IBDT, 2017, p. 238).

64 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 591.

65 Cabe mencionar que, segundo Eduardo Morais da Rocha, a praticabilidade não se apresenta como um princípio jurídico ou como uma simples técnica de tributação. Trata-se, na verdade, de um meio instrumental para alcançar uma meta política de eficiência administrativa, que serve para racionalizar as complexidades existentes no sistema tributário (ROCHA, Eduardo Morais da. Teoria institucional da praticabilidade tributária. São Paulo: Noeses, 2016, p. 420-421).

66 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 593.

67 ZILVETI, Fernando Aurelio. Princípios de direito tributário e a capacidade contributiva. São Paulo: Quartier Latin, 2004, p. 134; COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 86.

68 BRITO, Edvaldo. Direito tributário e Constituição – estudos e pareceres. São Paulo: Atlas, 2016, p. 83.

69 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 356.

70 ROCHA, Paulo Victor Vieira da. Substituição tributária e proporcionalidade: entre capacidade contributiva e praticabilidade. São Paulo: Quartier Latin, 2012, p. 199.

71 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 367-367.

72 Nas palavras de Luís Eduardo Schoueri: “[...] a capacidade contributiva, em sua feição relativa, tem feições de princípio jurídico, i.e., mandamento de otimização: deve o legislador, na medida do possível (ou ao máximo possível), buscar alcançar a capacidade contributiva; a base de cálculo do tributo deve ser medida que atinja, do melhor modo possível, aquela capacidade” (SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 356). No mesmo sentido, conferir: ROCHA, Paulo Victor Vieira da. Substituição tributária e proporcionalidade: entre capacidade contributiva e praticabilidade. São Paulo: Quartier Latin, 2012, p. 199.

73 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 41-42.

74 Como ensina Edvaldo Brito, o legislador deve avaliar a idoneidade abstrata do indivíduo para suportar a carga tributária (BRITO, Edvaldo. Direito tributário e Constituição – estudos e pareceres. São Paulo: Atlas, 2016, p. 83).

75 Como ensina Ricardo Lobo Torres: “A propriedade privada se abre ao poder fiscal na exata extensão da capacidade contributiva do cidadão, e da empresa, além da qual se torna o tributo confiscatório” (TORRES, Ricardo Lobo. Estudos e pareceres de direito tributário. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014, p. 65).

76 FLÁVIO NETO, Luís. Receitas tributáveis e hipóteses de não incidência tributária: IRPJ, CSL, PIS, COFINS e a atividade de intermediação de serviços turísticos. Revista Direito Tributário Atual v. 26. São Paulo: Dialética e IBDT, 2011, p. 276.

77 Nas palavras de Ricardo Mariz de Oliveira: “A capacidade contributiva é inerente a toda e qualquer obrigação tributária, significando que o tributo deve ser subtraído (na parte a ser entregue ao Poder Público) da materialidade econômica sobre a qual se dá a incidência tributária” (OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Regime tributário da compra vantajosa – questões fundamentais. In: MOSQUERA, Roberto Quiroga; e LOPES, Alexsandro Broedel (coord.). Controvérsias jurídico-contábeis (aproximações e distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2013. 4º v., p. 254).

78 Como adverte Leandro Paulsen: “Onde inexiste riqueza, não pode haver tributação. E a riqueza tem de ser real, não apenas aparente” (PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário completo. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 76).

79 SCHOUERI, Luís Eduardo. O mito do lucro real na passagem da disponibilidade jurídica para a disponibilidade econômica. In: MOSQUERA, Roberto Quiroga; e LOPES, Alexsandro Broedel (coord.). Controvérsias jurídico-contábeis (aproximações e distanciamentos). São Paulo: Dialética, 2010, p. 252.

80 Veja-se: “Do ponto de vista negativo, proíbe o princípio da capacidade contributiva a tributação daquele que não incorreu em fato econômico eleito pelo legislador como hipótese da incidência de determinado tributo” (SCHOUERI, Luís Eduardo. Distribuição disfarçada de lucros. São Paulo: Dialética, 1996, p. 127).

81 Eis a clássica lição de Ives Gandra da Silva Martins: “[...] capacidade contributiva e capacidade econômica não se confundem. Capacidade contributiva é a capacidade do contribuinte relacionada com a imposição específica ou global, sendo, portanto, dimensão econômica particular de sua vinculação ao poder tributante, nos termos da lei. Capacidade econômica é a exteriorização da potencialidade econômica de alguém, independentemente de sua vinculação ao referido poder” (MARTINS, Ives Gandra da Silva. Capacidade contributiva. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Capacidade econômica e capacidade contributiva. Caderno de Pesquisas Tributárias v. 14. São Paulo: Resenha Tributária, 1989, p. 34).

82 O esboço inicial de Rubens Gomes de Sousa foi posteriormente lapidado por Gilberto de Ulhôa Canto, Tito Rezende e Carlos Rocha Guimarães, que exerceram uma função revisora (MARTINS, Ives Gandra da Silva. O sistema tributário brasileiro: uma análise crítica. In: SCHOUERI, Luís Eduardo; e BIANCO, João Francisco (coord.). Estudos de direito tributário em homenagem ao Professor Gerd Willi Rothmann. São Paulo: Quartier Latin, 2016, p. 655).

83 TEODOROVICZ, Jeferson. A afirmação histórica da doutrina do direito tributário brasileiro. Tese de Doutorado. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2015, p. 168-171.

84 Além do art. 9º ora examinado, a Medida Provisória n. 806/2017 apresenta as seguintes disposições que violam o art. 43 do CTN: (i) evento ficto e singular de resgate compulsório, em 31 de maio de 2018, para a tributação dos rendimentos acumulados (“estoque”) na carteira dos fundos de investimento fechado (art. 2º); (ii) evento ficto e periódico de resgate compulsório, na modalidade de “come-cotas”, para os fundos de investimentos fechados, no último dia útil dos meses de maio ou de novembro (art. 3º); (iii) incidência de IRRF sobre as operações de cisão, incorporação, fusão ou transformação de fundos de investimento (abertos ou fechados), independentemente de qualquer ato de disponibilização dos recursos para os quotistas (art. 4º); (iv) evento de distribuição ficta de recursos por fundos de investimento em participações (FIP) qualificados como entidades de investimento, no momento da alienação dos seus ativos, independentemente do reinvestimento de tais valores na própria carteira do fundo de investimento (art. 7º).

85 O CTN foi instituído pela Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966, com a designação inicial de “Lei do Sistema Tributário Nacional”. A sua denominação foi alterada para “Código Tributário Nacional” com a edição do Ato Complementar n. 33, de 13 de março de 1967 (cf. MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional. São Paulo: Atlas, 2003. v. I, p. 35).

86 CANTO, Gilberto de Ulhôa; MUNIZ, Ian de Porto Alegre; e SOUZA, Antonio Carlos Garcia de. Imposto sobre a Renda e proventos de qualquer natureza. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). O fato gerador do Imposto sobre a Renda e proventos de qualquer natureza. Caderno de Pesquisas Tributárias v. 11. São Paulo: Resenha Tributária, 1986, p. 05.

87 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do Imposto de Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 299-300; MACHADO, Brandão. Breve exame crítico do art. 43 do CTN. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Estudos sobre o Imposto de Renda (em memória de Henry Tilbery). São Paulo: Resenha Tributária, 1994, p. 115.

88 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Disponibilidade econômica de rendas e proventos, princípio da realização da renda e princípio da capacidade contributiva. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva; e PASIN, João Bosco Coelho (coord.). Direito tributário contemporâneo – estudos em homenagem ao Prof. Luciano da Silva Amaro. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 285.

89 Segundo Luís Eduardo Schoueri: “Penso que o legislador complementar, ao cogitar disponibilidade econômica, permitiu que o legislador ordinário, querendo, adotasse uma aproximação econômica para tributação da renda, dispensando formas jurídicas e investigando quem, de fato, pode dispor dos recursos” (SCHOUERI, Luís Eduardo. Comentários de Luís Eduardo Schoueri. In: OLIVEIRA, Ricardo Mariz de; e COSTA, Sérgio de Freitas (coord.). Diálogos póstumos com Alcides Jorge Costa. São Paulo: IBDT, 2017, p. 239).

90 Veja-se: “Art. 9º Nos termos do art. 2º da Lei nº 11.312, de 2006, os rendimentos e os ganhos auferidos pelos fundos de investimento em participações não qualificados como entidades de investimento que não tenham sido distribuídos aos cotistas até 2 de janeiro de 2018 ficam sujeitos à incidência do Imposto sobre a Renda na fonte à alíquota de quinze por cento e serão considerados pagos ou creditados aos seus cotistas em 2 de janeiro de 2018.

§ 1º Para fins do disposto neste artigo, o administrador do fundo de investimento, na data de retenção do imposto, reduzirá a quantidade de cotas de cada contribuinte em valor correspondente ao do imposto apurado em 2 de janeiro de 2018.

§ 2º O imposto de que trata o § 1º será retido pelo administrador do fundo de investimento na data do fato gerador e recolhido em cota única até o terceiro dia útil subsequente ao decêndio da ocorrência do fato gerador”.

91 Na dicção do autor: “A tributação pelo IRF em momento distinto do resgate, amortização ou alienação das costas, mas em incidências periódicas (come-cota), sempre foi objeto de questionamentos doutrinários, especialmente por representar a tributação de rendimentos (não renda) não realizados pelo cotista. De fato, sua adoção não se harmoniza com o princípio da capacidade contributiva e com o conceito constitucional de renda, já que antes dos eventos de amortização, resgate ou alienação das cotas, nenhum acréscimo patrimonial é disponibilizado ao cotista” (GROSS NETO, Estevão. Fundos de investimento em renda fixa – tributação e aspectos controvertidos. In: MOSQUERA, Roberto Quiroga (coord.). O direito tributário e o mercado financeiro e de capitais. São Paulo: Dialética, 2009, p. 151).

92 Confira-se o entendimento de Luciana Rosanova Galhardo e Jorge Ney de Figueirêdo Lopes Junior “[...] nota-se que nos fundos fechados não deve ocorrer a aplicação do sistema de ‘come-cotas’. Isso porque, antes de ocorrer o efetivo resgate das quotas pelos seus investidores, quando do término do prazo de duração do fundo ou de sua liquidação, não se vislumbra qualquer disponibilidade jurídica ou econômica dessa renda para os investidores do fundo” (GALHARDO, Luciana Rosanova; e LOPES JUNIOR, Jorge Ney de Figueirêdo. Tributação dos fundos de investimento pelo Imposto de Renda. In: MOSQUERA, Roberto Quiroga (coord.). O direito tributário e o mercado financeiro e de capitais. São Paulo: Dialética, 2009, p. 308).

93 Veja-se: “[...] não parece adequado que a sistemática do come-quotas possa ser aplicável aos casos em que as próprias regras de constituição do fundo não permitem resgate anteriormente ao término de seu prazo de duração ou de sua liquidação. [...] Desta forma, nas aplicações em FI’s fechados, é certo que não há disponibilidade econômica, pois os rendimentos do fundo ainda não foram distribuídos. Do mesmo modo, não há de se falar na ocorrência de disponibilidade jurídica, uma vez que, nos fundos de investimento fechado, o investidor continua sendo titular das quotas, mas sem qualquer ganho, visto que nem o resgate pode esse solicitar” (TAKEDA, Nara Cristina. Tributação dos fundos fechados e a aplicabilidade do come-quotas. In: MOSQUERA, Roberto Quiroga (coord.). O direito tributário e o mercado financeiro e de capitais. São Paulo: Dialética, 2009, p. 374-375).

94 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. A incógnita da disponibilidade econômica da renda – novos atropelos da noção de disponibilidade. Revista Direito Tributário Atual v. 38. São Paulo: IBDT, 2017, p. 279.

95 Como adverte Gisele Lemke: “[...] a disponibilidade econômica pode estar presente mesmo sem a detenção material do bem. Podendo-se negociá-lo, tem-se sua disponibilidade econômica” (LEMKE, Gisele. Imposto de Renda – os conceitos de renda e de disponibilidade econômica e jurídica. São Paulo: Dialética, 1998, p. 106).

96 Segundo Victor Borges Polizelli: “De todo o exposto, pode-se afirmar que a expressão aquisição de disponibilidade alude ao princípio da realização” (POLIZELLI, Victor Borges. O princípio da realização da renda – reconhecimento de receitas e despesas para fins do IRPJ. São Paulo: IBDT/Quartier Latin, 2012, p. 189).

97 Como ensinava Rubens Gomes de Sousa: “Enquanto essa mais-valia do capital não seja realizada, isto é, convertida efetivamente em dinheiro pela alienação do título, ela permanece em estado potencial e sua efetividade pode ser desmentida por circunstâncias ulteriores, notadamente pela aparição de prejuízos [...]” (SOUSA, Rubens Gomes de. A evolução do conceito de rendimento tributável. Revista de Direito Público n. 14. São Paulo: RT, 1970, p. 344).

98 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. A incógnita da disponibilidade econômica da renda – novos atropelos da noção de disponibilidade. Revista Direito Tributário Atual v. 38. São Paulo: IBDT, 2017, p. 288.

99 COSTA, Alcides Jorge. Imposto sobre a Renda: a aquisição da disponibilidade jurídica ou econômica como seu fato gerador. Limite de sua incidência. In: OLIVEIRA, Ricardo Mariz de; e COSTA, Sérgio de Freitas (coord.). Diálogos póstumos com Alcides Jorge Costa. São Paulo: IBDT, 2017, p. 233.

100 MACHADO, Brandão. Breve exame crítico do art. 43 do CTN. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Estudos sobre o Imposto de Renda (em memória de Henry Tilbery). São Paulo: Resenha Tributária, 1994, p. 113-114.

101 SOUSA, Rubens Gomes de. A evolução do conceito de rendimento tributável. Revista de Direito Público n. 14. São Paulo: RT, 1970, p. 344.

102 Nesse sentido, confira-se o rendimento de Andrea Nogueira Neves: “[...] sendo o fato gerador do imposto de renda a aquisição da disponibilidade jurídica ou econômica da renda, nos termos do artigo 43 do Código Tributário Nacional, e tendo em vista que os fundos fechados impossibilitam o resgate de suas cotas anteriormente à liquidação do fundo, não há que se falar em situação jurídica definitivamente constituída (i.e., aquisição de disponibilidade jurídica, muito menos econômica), antes da ocorrência do termo pactuado ou da alienação das cotas” (NEVES, Andrea Nogueira. Considerações sobre a tributação dos fundos de investimento fechados. In: MOSQUERA, Roberto Quiroga (coord.). O direito tributário e o mercado financeiro e de capitais. São Paulo: Dialética, 2009, p. 72-73).

103 Nas palavras de Humberto Ávila: “[...] disponibilidade jurídica não significa mero poder de controle, mas exercício de poder de controle que provoque a aquisição de disponibilidade sobre a renda, mesmo que não haja acesso atual e direto a ela” (ÁVILA, Humberto. Indisponibilidade jurídica da renda por poder de decisão ou por reflexo patrimonial. Revista Fórum de Direito Tributário n. 57. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p. 10).

104 Em suma, os principais obstáculos constitucionais à criação de um fato gerador ficto, tal como o previsto no art. 9º da Medida Provisória n. 806/2017, podem ser assim elencados: (i) desnaturação da regra constitucional de discriminação de competência, que autoriza a tributação da renda dos contribuintes; (ii) violação dos princípios constitucionais da anterioridade, da irretroatividade, da capacidade contributiva e da vedação ao confisco; e (iii) ausência de justificação para o uso da presunção, que guarde conexão com o imposto de renda.

105 “§ 7º A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido”.

106 Na definição de Gustavo Miguez de Mello e Gabriel Lacerda Troianelli: “[...] a inconstitucionalidade útil [...] consiste na prática de atos deliberadamente inconstitucionais pelo Poder Público com o objetivo de sanar suas finanças, ante a possibilidade de que poucos – ou mesmo ninguém – insurjam-se contra tais atos” (MELLO, Gustavo Miguez de; e TROIANELLI, Gabriel Lacerda. O princípio da moralidade no direito tributário. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). O princípio da moralidade no direito tributário. São Paulo: CEU/RT, 1998, p. 211-212).