O Valor Tributável Mínimo (VTM) no IPI e o Conceito de “Praça” na sua Apuração
The Minimum Taxable Amount (MTA) in the IPI and the Concept of “Market Square” in its Calculation
Carlos Augusto Daniel Neto
Doutor em Direito Tributário (USP). Mestre em Direito Tributário (PUC-SP). Especialista em Direito Tributário (IBET/SP). Conselheiro Titular da 3ª Seção de Julgamento do CARF. Professor do Curso de Especialização do IBDT. Advogado Licenciado. São Paulo/SP. E-mail: carlosdanielneto@usp.br.
Diego Diniz Ribeiro
Mestre em Direito Tributário (PUC-SP). Especialista em Direito Tributário (IBET). Conselheiro Titular da 3ª Seção de Julgamento do CARF. Professor Titular de processo civil da Faculdade de Direito do Instituto Municipal de Ensino de Bebedouro (IMESB). Advogado Licenciado. Ribeirão Preto/SP. E-mail: dinizribeiro@yahoo.com.br.
Resumo
O presente trabalho tem por escopo analisar a específica regra antielisiva existente no âmbito do IPI e que estabelece um valor tributável mínimo para fins de apuração do imposto na hipótese de operações empresariais realizadas entre empresas interdependentes. De forma mais precisa, este artigo visa delimitar a extensão semântica dos signos “praça do remetente” e “mercado atacadista” estampados no art. 195 do Decreto n. 7.212/2010 (Regulamento do IPI – RIPI). Ademais, também é objetivo deste trabalho analisar os precedentes judicativos a respeito da matéria, especialmente aqueles veiculados pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF, especialmente frente a recentes decisões contrárias ao entendimento consolidado.
Palavras-chave: direito tributário, elisão fiscal, valor tributável mínimo, praça, mercado atacadista, IPI.
Abstract
The purpose of this paper is to analyze the scope of a specific anti-avoidance tax rule in IPI which establishes a minimum taxable amount for tax purposes in the case of business transactions between interdependent companies. More precisely, this article intends to delimit the semantic extension of the signs “market square of the sender” and “wholesale market” printed in article 195 of Decree n. 7.212 / 2010 (IPI Regulation). In addition, it is also the objective of this study to analyze the judicative precedents on the matter, especially those sent by the Administrative Council of Tax Appeals – CARF, especially against recent decisions contrary to the consolidated understanding.
Keywords: tax law, tax avoidance, minimum taxable amount, market square, wholesale market, IPI.
1. Introdução
A atividade tributária do Estado é marcada por diversas tensões internas, praticamente impossíveis de serem completamente eliminadas, que recebem tratamento normativo próprio em cada ordenamento positivo, de acordo com as opções políticas e escolhas constitucionais de cada nação.
Por exemplo, têm-se tensões relacionadas à mensuração do tributo, como o contraste entre a igualdade geral e a particular, na distribuição do ônus fiscal, ou entre a capacidade contributiva e a praticabilidade na sua apuração, ou mesmo de ordem estrutural, envolvendo a opção pela tributação direta da renda ou do consumo, e muitas outras.
Entre elas, todavia, se destaca especificamente aquela existente entre o dever de contribuir com o Erário na medida da capacidade econômica intrínseca aos seus atos e negócios jurídicos e a liberdade do contribuinte de planejar suas operações levando em conta descrições abstratas das hipóteses de incidência tributárias, com a finalidade de evitá-las de forma elisiva.
Por um lado, compreende-se que a capacidade econômica1 precisa ser compreendida como critério de justiça no tributo, enquanto reflexo desse princípio como garantia do contribuinte, mas também compreendido em sua conexão com outros valores superiores da ordem constitucional, como solidariedade2 e igualdade de tratamento, para a realização da justiça através do tributo3.
Pelo outro lado, reconhece-se que mesmo diante do papel do tributo como “preço da liberdade”, a legalidade seria condição sine qua non para a incidência tributária, estabelecida pelo ordenamento constitucional em seu art. 5º, inciso II, da CF/1988, aqui de forma genérica, bem como em razão do prescrito no art. 150, I, da Magna Lex, que especialmente se refere ao âmbito tributário. Trata-se, pois, de garantia do contribuinte de que será tributado de acordo com aquilo que foi consentido por meio de um sistema de representação política4, consolidando-se sobre a solidariedade social em razão da assunção de um modelo formal, com ênfase na segurança jurídica, na estrutura do sistema tributário brasileiro5.
Frise-se que se encontram alheias a tal discussão as chamadas “opções fiscais”6, tampouco se cogita aqui das práticas ilícitas como sonegação ou fraude fiscal, que visam descumprir normas cogentes para evitar o pagamento do tributo devido7.
O âmbito no qual essa tensão é relevante é aquele dos chamados “planejamentos tributários” ou da “elisão fiscal”, por intermédio dos quais o contribuinte procura explorar lacunas do ordenamento, problemas na redação da legislação, conflitos normativos etc., com o objetivo de reduzir a quantidade de tributo a ser pago. Se o contribuinte não vai contra a lei, doutro giro também procura não pagar o mesmo tributo que alguém deveria pagar se realizasse determinada operação de outra forma, andando em uma corda bamba que oscila entre a proteção da legalidade tributária e o alcance da solidariedade social na tributação.
Neste trabalho, assume-se como premissa a natureza formal do sistema tributário brasileiro, em razão de diversos elementos estruturais – como a distribuição das competências tributárias –, e também normativos – como a determinação da legalidade estrita como garantia do contribuinte.
Essas e outras peculiaridades das diretrizes tributárias constitucionais na CF/1988 permitem reconhecer na legalidade e na segurança jurídica uma tendência conceitual prevalecente no sistema constitucional tributário, rejeitando estruturas flexíveis e graduáveis como os tipos, ou reconhecendo nas garantias tributárias condições do exercício da liberdade pelo contribuinte8. Como pontuado por Heleno Tôrres, a legalidade e a constitucionalização das regras tributárias são as formas mais eloquentes de compromisso do Estado com a segurança jurídica9.
Diante disso, pode o Estado, buscando reduzir os espaços de planejamento do contribuinte, atuar principalmente de duas formas: em sede de aplicação do tributo ou legislativamente, mediante a criação de regras antielisivas10.
No processo aplicativo, a fiscalização pode se utilizar de técnicas de interpretação das leis, qualificação dos fatos jurídicos e a analogia, com a finalidade de situar os negócios elisivos no alcance da hipótese de incidência tributária. Nesse contexto se colocam, por exemplo, a interpretação econômica, a análise de propósito negocial, a tese da prevalência da substância sobre a forma, a requalificação de atos e negócios etc.
Legislativamente, podem ser criadas regras tributárias antielisivas dotadas de diversos conteúdos distintos, desde estabelecer presunções legais, até atribuir poderes à fiscalização para requalificar negócios ou desconsiderar formas jurídicas etc., as medidas podem ser as mais variadas possíveis, a depender do tipo de situação que visa atingir11.
O presente artigo visa analisar a técnica antielisiva, utilizada no âmbito do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), do Valor Tributável Mínimo (VTM), delineado no art. 195 do Decreto n. 7.212/2010 (Regulamento do IPI – RIPI), com fundamento no art. 15 da Lei n. 4.502/1964, tendo em vista especificamente o conceito de “praça” utilizado como delimitação espacial para a determinação do parâmetro do valor tributável.
Pretende-se, com isso, demonstrar a necessidade de respeito aos conceitos jurídicos de “praça” e “mercado atacadista”, hauridos do Direito Comercial, sob pena de se inovar ilegalmente em matéria de apuração do VTM.
O tema escolhido e a ênfase adotada se justificam em razão da crescente quantidade de casos que têm sido submetidos a julgamento no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, tendo recebido tratamentos diversos pelas turmas julgadoras daquele órgão, contribuindo para a insegurança do contribuinte a respeito da matéria.
2. Cláusulas antielisivas gerais e específicas
Como afirma Ricardo Mariz de Oliveira, as normas antielisivas12 são aquelas que visam estabelecer limites ao planejamento tributário, consolidando uma dissociação entre a validade prática de atos e negócios perante as regras de Direito Privado da validade em relação às regras de Direito Tributário13 – é dizer, mesmo diante de um negócio formalmente hígido de acordo com as regras do Direito Civil, é possível uma regra antielisiva que determine certo tratamento tributário específico àquela materialidade econômica abarcada pelos contornos de juridicidade.
Tratam-se, pois, de regras voltadas ao fechamento de espaços de liberdade do contribuinte existentes nas dobras da legislação (loopholes), como pontuado precisamente por Campos e Andrade:
“Contudo, é este espaço de liberdade que o legislador tenta contrariar, à falta de regulamentação típica técnica, por normas gerais. O princípio geral da liberdade choca em matéria de Direito fiscal com um (pretendido) princípio geral de submissão às necessidades financeiras do Estado, de carácter não jurídico, mas político – tutelado pela norma geral antielisão”14.
Essas normas – ou cláusulas – antielisivas podem ser de dois tipos distintos, conforme o grau de detalhe com o qual é feito seu pressuposto de aplicação: (a) cláusulas gerais, dotadas de pressuposto aberto e previstas para serem aplicadas em um número indefinido de casos; e (b) cláusulas específicas, voltadas a tutelar os negócios e as situações bastante particulares. Falam-se, também, em um tipo híbrido, as cláusulas setoriais, que são dotadas de alguma generalidade, mas se direcionam a um âmbito delimitado de contribuintes e de operações, estando mais próximas do modelo específico15.
As regras gerais antielisivas têm origem no ordenamento alemão16, não sendo direcionadas a certos contribuintes ou situações específicas – pelo contrário, normalmente atribuem à Administração Fiscal o poder de classificar como elisiva determinadas condutas e impor o pagamento do tributo elidido17.
Elas têm como peculiaridade, em seu mister de atribuição de poderes ao Fisco, a utilização de pressupostos genéricos e conceitos indeterminados, sendo formuladas de maneira ampla de modo a abarcar a maior quantidade possível de casos concretos, e evitar que o contribuinte encontre caminhos de burlá-la18 – são dotadas, pois, de uma elasticidade que lhes permite atingir ilícitos atípicos como abuso de formas, abuso de direito e outros que, por sua estrutura, não podem ser delimitados de forma específica.
Por outro lado, têm-se as cláusulas antielisivas específicas ou ad hoc, que apresentam uma estrutura normativa baseada em um pressuposto fático rígido, detalhado e taxativo19. Elas são utilizadas sempre posteriormente à constatação, pela fiscalização de um campo aberto à elisão, através da alteração do direito positivo visando fechar aquela lacuna específica20, a exemplo do que foi feito com as regras de preços de transferência e o regime de CFC (“Controlled Foreign Corporation”).
Elas atuam, usualmente, por meio do estabelecimento de ficções e presunções relativas aos elementos da regra matriz tributária, seja quanto aos caracteres do fato gerador, seja quanto àqueles da relação jurídica tributária, a depender da técnica normativa utilizada pelo legislador. Em razão disso, o legislador deve ser excepcionalmente cuidadoso na sua elaboração, visto que a regra deverá ser interpretada sempre de forma restrita, de modo a não ter a sua sistemática ampliada, diferentemente do alcance amplo das regras antielisivas gerais, que procuram abarcar todos os contribuintes.
Parece-nos, pois, que as cláusulas específicas, por dependerem de presunções e ficções nos elementos essenciais da norma tributária, são dotadas de uma excepcionalidade que lhe imprime um grau elevado de restrição na sua interpretação e aplicação às situações concretas, estando próximas da sua literalidade.
É nesse sentido, inclusive, que Novoa afirma poderem essas cláusulas, diferentemente das gerais, ser utilizadas pelo próprio contribuinte como norma de cobertura para conseguir alguma vantagem fiscal ou como fundamento para um planejamento tributário distinto daquele que a técnica buscou coibir – sem que a fiscalização possa estendê-la a esses novos casos21.
Portanto, antes de enfrentar propriamente a forma como a técnica do VTM foi estruturada no âmbito do Direito Tributário brasileiro, é preciso deixar claras as razões pela qual se entende aqui que as cláusulas antielisivas específicas estão sujeitas a uma interpretação restritiva quanto ao seu conteúdo.
3. O IPI e o Valor Tributável Mínimo
O Código Tributário Nacional determina, em seu art. 46, que o IPI tem por hipótese de incidência o desembaraço aduaneiro de produtos importados, a saída do produto de estabelecimentos industriais (ou equiparados) ou a arrematação deles, quando levados a leilão, e seu art. 47 determina expressamente a base de cálculo, nos seguintes termos:
“Art. 47. A base de cálculo do imposto é:
I – no caso do inciso I do artigo anterior, o preço normal, como definido no inciso II do artigo 20, acrescido do montante:
a) do imposto sobre a importação;
b) das taxas exigidas para entrada do produto no País;
c) dos encargos cambiais efetivamente pagos pelo importador ou dele exigíveis;
II – no caso do inciso II do artigo anterior:
a) o valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria;
b) na falta do valor a que se refere a alínea anterior, o preço corrente da mercadoria, ou sua similar, no mercado atacadista da praça do remetente;
III – no caso do inciso III do artigo anterior, o preço da arrematação” (destaques nossos).
Como se vê, o inciso II do art. 47 traz as possibilidades de base de cálculo do IPI cobrado pela saída do produto de estabelecimento industrial ou equiparado, determinando-o como o valor da operação ou, na ausência deste, no preço usual do produto no mercado atacadista da praça do remetente. Especificando o conceito de “valor da operação”, o art. 190, § 1º, do RIPI/2010 determina que ele compreenda o preço do produto, acrescido do valor do frete e das demais despesas acessórias cobradas, pelo contribuinte, do destinatário.
Diante desse contexto normativo, era comum que empresas industriais criassem estabelecimentos atacadistas para dar saída aos seus produtos industrializados com um baixo valor de operação e estabelecendo o preço adequado apenas na venda ao varejo, com a finalidade de erodir a base tributável do IPI.
Para combater esse “planejamento”, criou-se inicialmente a noção de firmas interdependentes, que são configuradas no art. 612 do RIPI/2010 nas seguintes circunstâncias: (a) quando uma tenha participação de quinze por cento ou mais do capital social, seja diretamente, seja através de sócios ou acionistas e parentes até segundo grau; (b) ambas possuírem uma mesma pessoa na função de diretor ou sócio-gerente; (c) quando uma tiver vendido ou consignado à outra, no ano anterior, mais de vinte por cento – no caso de distribuição com exclusividade em um território – ou mais de cinquenta por cento – nos demais casos – do volume das vendas dos produtos tributados; (d) quando uma delas for a única adquirente dos produtos industrializados ou importados pela outra; ou (e) quando uma vender à outra, mediante contrato de participação ou ajuste semelhante, produto tributado que tenha fabricado ou importado.
Em se tratando de produto destinado à firma interdependente, nos termos do art. 612 do RIPI/2010, o art. 195, I, do mesmo regulamento é expresso em determinar a observância de um valor tributável mínimo:
“Art. 195. O valor tributável não poderá ser inferior:
I – ao preço corrente no mercado atacadista da praça do remetente quando o produto for destinado a outro estabelecimento do próprio remetente ou a estabelecimento de firma com a qual mantenha relação de interdependência”.
Tal dispositivo tem o condão de estabelecer uma base de cálculo ficta para as operações tributadas pelo IPI ocorridas entre firmas interdependentes, restando claro que o legislador quis evitar que essas empresas criassem estruturas com o fito de artificialmente esvaziar a base de cálculo do IPI nas operações promovidas pela indústria para inflá-la na operação com a empresa comercial atacadista.
Trata-se, pois, de uma regra específica antielisiva muito semelhante àquela utilizada no âmbito dos preços de transferência.
Nessa hipótese específica de VTM que se está analisando, há a possibilidade de a base de cálculo ficta ser apurada com base em duas metodologias distintas e excludentes entre si, estabelecidas pelo art. 196 do RIPI/2010: (a) caso exista mercado atacadista na praça do remetente, o VTM será apurado com base no preço corrente no mercado pelo cálculo da média ponderada de preços das empresas atacadistas da referida localidade; e (b) na hipótese de inexistir mercado atacadista na praça do remetente, o VTM será apurado como base em uma cesta de elementos objetivamente traçados pelo legislador, quais sejam, custos de produção, outras despesas e margem de lucro normal.
A delimitação de um dos dois métodos possíveis de apuração do VTM perpassa, portanto, em precisar qual o conteúdo semântico da expressão “praça do remetente” para então identificar se, naquela praça, há ou não um mercado atacadista, de modo a permitir a apuração do VTM com base em uma comparação mercadológica (preço médio das empresas da localidade do remetente) ou com base em ficção jurídica (levando em consideração como elementos mínimos os custos de produção, as despesas e a margem de lucro ordinária naquele tipo de operação).
Os pontos centrais da discussão, portanto, dizem respeito à interpretação e ao alcance das expressões “praça do remetente” e “mercado atacadista”.
4. O conteúdo semântico-jurídico das expressões “mercado atacadista” e “praça do remetente”
A expressão “praça” sofre de um duplo problema semântico dentro do Direito: por um lado, não possui definição positivada, e por outro é dotada de uma ambiguidade mesmo dentro de suas acepções técnicas. Todavia, para fins da legislação do IPI, se verifica que ela quer significar uma localidade, ou seja, um local determinado onde se realizam operações empresariais, vez que se encontra atrelada às práticas mercantis e à existência de um mercado atacadista.
Trata-se, pois, de um espaço delimitado geograficamente, dentro do território nacional.
Historicamente, entretanto, se verifica que a expressão sempre foi atrelada aos limites territoriais do Município, como nos assentos dos usos e costumes feitos pelas Juntas Comerciais que se referem, por exemplo, aos “comerciantes da praça de Santos”22.
Outro elemento que contribuiu para determinar a delimitação do conceito de “praça” ao âmbito municipal está relacionado ao tratamento dado a duas figuras auxiliares do comerciante – o vendedor viajante e o pracista: enquanto o primeiro realiza viagens para promover as vendas do comerciante, visitar clientes etc., o segundo visita a clientela da própria cidade onde se encontra o estabelecimento comercial ao qual se vincula. É o que relata Rubens Requião:
“Os autores Coudy e Despierres formularam uma diferença lógica e prática de cada um deles, escrevendo que as denominações de viajantes e pracistas exprimem variações de uma atividade cujo fundo permanece idêntico: o pracista visita a clientela da cidade onde se encontra a casa que o emprega e dela recebe cada dia as ordens; o viajante se desloca numa região às vezes extensa para visitar a clientela”23.
Um terceiro argumento que reforça essa delimitação ao âmbito municipal decorre da antiga lei do cheque (Decreto n. 2.591/1912), que em seu art. 4º prescrevia: “O cheque deve ser apresentado dentro de cinco dias, quando passado na praça onde tem de ser pago, e de oito dias, quando em outra praça”.
Referido dispositivo estabelecia prazos diferentes para a apresentação do cheque emitido a depender da referida ordem de pagamento ser da mesma “praça” ou de “praça” distinta da instituição bancária na qual seria apresentado24. Na legislação atual (art. 33 da Lei n. 7.357/1985) fala-se em “lugar onde houver de ser pago”, sem que se perca, todavia, a referência espacial quanto ao local da emissão e o local em que situada a agência bancária responsável pelo cumprimento da ordem25.
Em ambas as hipóteses restam claras as referências, ainda que implícitas, a um Município, tanto que, ao emitir o cheque, o emitente deve indicar em campo próprio a cidade de emissão da cártula.
Ademais, o próprio art. 197 do RIPI/2010, inserido na mesmíssima Seção II em que se encontram os analisados arts. 195 e 196, ao estabelecer os procedimentos para o arbitramento da base de cálculo do IPI, assim prescreve:
“Art. 197. [...]
§ 1º Salvo se for apurado o valor real da operação, nos casos em que este deva ser considerado, o arbitramento tomará por base, sempre que possível, o preço médio do produto no mercado do domicílio do contribuinte, ou, na sua falta, nos principais mercados nacionais, no trimestre civil mais próximo ao da ocorrência do fato gerador”.
Como se vê, o dispositivo traça uma ligação direta entre o conceito de “praça” e o de “domicílio do contribuinte”, atrelando-os à delimitação geográfica da verificação do preço no mercado atacadista e, ao mesmo tempo, traz um eloquente contraste com a expressão “principais mercados nacionais”, por reconhecer que a praça não corresponde à totalidade do território do país, haja vista a possibilidade de existirem vários “mercados nacionais”.
Ao empregar o termo domicílio, fica claro que o legislador está se referindo ao limite geográfico de um município, exatamente como se depreende do disposto no art. 70 do Código Civil26, e cogitar que o art. 197 do RIPI/2010 teria usado o termo domicílio em um sentido diferente do signo “praça”, empregado no art. 195 do mesmo Regulamento, implicaria a existência de uma legislação patológica, dotada de uma esquizofrenia ou bipolaridade, já que tal assertiva equivaleria a admitir a existência de artigos presentes em uma mesma lei, em uma mesma seção e tratando de um único tema (arbitramento da base de cálculo do IPI), porém com conteúdos semânticos distintos.
No mesmo sentido é o Parecer Normativo CST n. 44/1981, que enfrentava precisamente a questão da extensão da expressão “preço corrente no mercado atacadista da praça do remetente”, que entendeu pela utilização de “praça” no sentido de “cidade”:
“5. A norma superveniente determina, pois, ser ‘o preço corrente do mercado atacadista da praça do remetente [...] a base mínima para o valor tributável nas hipóteses que menciona.
6. Registram os Dicionários da Língua Portuguesa que mercado, convencionalmente, significa a referência feita em relação à compra e venda de determinados produtos.
6.1. Isto significando, por certo, que numa mesma cidade, ou praça comercial, o mercado atacadista de determinado produto, como um todo, deve ser considerado relativamente ao universo das vendas que se realizam naquela mesma localidade, e não somente em relação àquelas vendas efetuadas por um só estabelecimento, de forma isolada” (destaque nosso).
A Coordenação do Sistema de Tributação, no ano seguinte, exarou o Ato Declaratório Normativo CST n. 05/1982 que, mantendo a coerência com o parecer anterior, determinou que “deverão ser consideradas as vendas efetuadas pelos remetentes e pelos interdependentes do remetente, no atacado, na mesma localidade, excluídos os valores de frete e IPI”, envolvendo no cálculo do VTM os valores praticados tanto pelo remetente quanto pelas suas firmas interdependentes que estejam na mesma praça.
Posteriormente, a Coordenação-Geral de Tributação (COSIT) expediu a Solução de Consulta Interna COSIT n. 8/2012, enfrentando o caso específico em que existe apenas um único estabelecimento distribuidor e ele tem relação de interdependência com o estabelecimento industrial, oportunidade em que concluiu que “se o mercado atacadista de determinado produto, como um todo, possui um único vendedor, é inevitável que o valor tributável mínimo seja determinado a partir das vendas por este efetuadas”, e arrematou:
“9.2. Assim, o valor tributável mínimo aplicável às saídas de determinado produto do estabelecimento industrial que o fabrique, e que tenha na sua praça um único distribuidor, dele interdependente, corresponderá aos próprios preços praticados por esse distribuidor único nas vendas que efetue, por atacado, do citado produto”.
O problema semântico, portanto, passou a existir a partir da citada solução de consulta, haja vista que em muitos casos inexistia mercado atacadista no município em que se situava o estabelecimento industrial, impossibilitando a apuração do VTM pela regra do art. 195, I, do RIPI/2010, mas sim pelo cálculo do custo de fabricação, na forma prevista no art. 196, parágrafo único27.
Diante dessas situações, a Receita Federal do Brasil passou a adotar um conceito de “praça” extremamente amplo, com o objetivo de abarcar o distribuidor que se situe em outros municípios para fins de configuração de um mercado atacadista e consequente aplicação do preço de venda como VTM na apuração do IPI devido pelo estabelecimento industrial.
Um dos argumentos utilizados foi o conceito de praça no Direito Administrativo, mais especificamente no campo de contratos públicos, com a menção no art. 22, § 6º, da Lei n. 8.666/199328, para sustentar que se em determinado Município ou região metropolitana não existir a quantidade mínima de interessados em participar do certame licitatório na modalidade “convite”, o órgão responsável pela licitação pode enviar convites para interessados localizados em outras cidades, e que portanto todas essas cidades configurariam uma única praça.
Fundamentam também no entendimento adotado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) no Acórdão n. 1.971/2004, que definiu a abrangência de todo o Estado de Sergipe como praça para fins de convite de interessados na participação de uma licitação. Além disso, o próprio TCU publicou obra na qual consignou:
“Deve a estimativa ser elaborada com base nos preços colhidos em empresas do ramo pertinente ao objeto licitado, correntes no mercado onde será realizada a licitação, que pode ser local, regional ou nacional. [...] Abrangência da modalidade escolhida define, em princípio, a praça ou o mercado a ser pesquisado, que poderá ser municipal, estadual, nacional ou internacional”29.
Buscam, assim, utilizar o conceito manejado dentro de um campo específico do Direito, cuja orientação principiológica dá embasamento ao conteúdo semântico excepcional dessa área.
Ora, no âmbito dos contratos públicos uma das finalidades preponderantes é a busca da proposta mais vantajosa para a administração30, e é justamente para evitar a possibilidade de que um único interessado em determinada localidade imponha um ônus financeiro elevado para a prestação de determinado serviço ou fornecimento de bens que se faz essa interpretação extensiva do conceito de praça. Em outros termos, a necessidade de evitar esse monopólio de um único interessado é que justifica o alargamento do conceito de praça dentro desse microssistema normativo específico – contexto esse que impede que o conceito seja transladado para outros ramos que não compartilhem das mesmas finalidades.
Em última análise, esta posição aqui debatida pretende dar uma interpretação ampliativa à regra específica antielisiva – o que já foi demonstrado anteriormente se tratar de um equívoco – através da adoção de um conceito de praça gestado dentro do campo das licitações e fortemente influenciado pelas finalidades daquele ramo. O equívoco é patente.
Mais ainda, tal interpretação também incorre em ofensa ao art. 109 do CTN31 ao pretender importar o conceito de “praça” do Direito Licitatório, e não aquele utilizado no Direito Privado, marcadamente no Direito Comercial.
Outro argumento usualmente utilizado pela fiscalização para a motivação dos autos de infração consiste na confusão entre mercado e praça.
Logo, cabe esclarecer que o termo mercado comporta diferentes abordagens, o que pode redundar em diferentes resultados semânticos, a depender da análise ser feita sob uma perspectiva econômica, social, jurídica etc., e mesmo limitando este escopo, ainda sim é possível identificar diferentes espécies de mercados (permanente e temporário; relevante e irrelevante; dentre outras classificações).
A fiscalização leva em consideração o aspecto geográfico como elemento classificatório dos mercados, o que também pode gerar em diferentes subclassificações (mercados nacionais, regionais, locais etc.). Atrela-se, pois, a ideia de praça à de mercado, o qual, por sua vez, estaria geograficamente circunscrito ao conceito mais abrangente do que simplesmente a municipalidade.
A partir daí, o Fisco pode concluir que, apesar de situadas em cidades distintas, a empresa industrial e a distribuidora compunham um único mercado porque situadas em uma mesma “praça” (aqui empregado no sentido já criticado). Entretanto, um óbice de natureza conceitual deve ser posto.
Sob uma perspectiva jurídica, ainda que de forma singela, mercado pode ser conceituado como o conjunto de operações empresariais relacionadas a determinados bens ou serviços em um determinado limite geográfico. E está exatamente aí o problema a ser aqui resolvido: as limitações geográficas para a definição do conceito de praça são as mesmas para conformação de um conceito de mercado? A resposta para tal questionamento é uma só: não.
A limitação geográfica para fins de definição de mercado é dinâmica, na medida em que varia de acordo com o tipo de produto comercializado, bem como com os tipos de operações comerciais praticadas. Quando se fala, por exemplo, em um “mercado” de padarias, é possível, a depender do contexto, restringi-lo a um bairro (v.g., o bairro do Sumaré, na cidade de São Paulo) ou a uma região (a região oeste, também na capital paulista).
Já quando se fala, por exemplo, no mercado calçadista, é possível ampliar sensivelmente esta extensão territorial, o que pode redundar em delimitação por Estado ou até mesmo por Região do Brasil (Sul, Sudeste, Norte etc.). O que se percebe, portanto, é que esta delimitação geográfica do conceito de mercado é dinâmica ou fluida, assim como é a economia, área do saber que fortemente influencia a delimitação semântica deste signo.
Por sua vez, a delimitação geográfica que influi na conformação do conceito de praça é estática, uma vez que, como visto, o signo praça é, por diferentes legislações, atrelado à ideia domicílio, isto é, de cidade. Ora, quando se pensa em domicílio fiscal, por exemplo, o que se afigura é um lugar precisamente delimitado, de modo que o contribuinte possa ser fácil e eficazmente encontrado para fins de comunicação com a Receita Federal do Brasil.
Portanto, não há que se confundir os conceitos de praça e mercado, na aplicação e apuração do VTM.
Como já foi dito anteriormente, o fechamento das lacunas técnicas resultantes do manejo de regras antielisivas específicas não pode se dar por meio de artifícios interpretativos, mas sim através de modificações legislativas (diferentemente das normas antielisivas gerais, que permitem esse fechamento através de técnicas interpretativas, como foi dito anteriormente) – e nisso dois pontos devem ser frisados.
Em primeiro lugar, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei n. 1.559/2015, atualmente aguardando a designação de relator na Comissão de Constituição e Justiça, cujo teor é o seguinte:
“Art. 1º Esta Lei tem por objetivo, para os fins previstos na Lei nº 4.502 de 30 de novembro de 1.964, definir ‘praça’ como a cidade onde está situado o remetente das mercadorias.
Art. 2º O artigo 15 da Lei nº 4.502 de 30 de novembro de 1.964, passa a vigorar acrescido do seguinte parágrafo único:
“Art. 15 [...]
Parágrafo único. O termo praça, tratado neste artigo, se refere à cidade onde está situada a remetente.”
Essa lei tem como objetivo afastar de vez qualquer tentativa de adoção de um conceito “expansivo” de praça, definindo-a como a cidade na qual o remetente está estabelecido, na linha defendida neste trabalho. A nosso ver, em nada inova no ordenamento, vindo somente a declarar algo que já está consolidado nas dobras da legislação vigente e na dogmática jurídica.
Outro ponto que merece menção é o Decreto n. 8.393/2015, que revogou o Decreto n. 1.217/1994, com a finalidade de incluir diversos produtos inseridos nas posições 3303 a 3307 da Tabela do IPI no Anexo III da Lei n. 7.798/1989, com fulcro no art. 8º dessa lei32.
A Lei n. 7.798/1989 estabelece um regime de equiparação dos atacadistas a estabelecimento industrial em seu art. 7º, III, abrangendo em seu alcance firmas interdependentes que poderiam se aproveitar da falha de redação da cláusula antielisiva do VTM33. Esse dispositivo foi objeto de precisos comentários pelo Conselheiro Leonardo Branco, em voto vencedor no Acórdão CARF n. 3401-003.873, que aduziu:
“Assim, ao se equiparar o atacadista a estabelecimento industrial (quando vier a adquirir, e.g., produtos cosméticos de indústria ou equiparado que fizer parte do mesmo grupo empresarial), na qualidade de novel contribuinte do IPI, promove-se substanciosa alteração da lógica tributária da operação, no sentido de se criar regra específica antielisiva por meio de alteração na TIPI que tem como efeito a expansão do aspecto pessoal do imposto para pessoas que antes não se sujeitavam a tal materialidade. Aquele contribuinte que organizar os seus negócios de modo a dividi-los entre industrial e atacadista, poderá continuar a fazê-lo sem se sujeitar a uma tributação maior, pois o distribuidor passará a se creditar do valor de IPI sobre os produtos entrados em seu estabelecimento por meio de compensação em conta gráfica”.
A leitura é precisa e enfatiza o aspecto – nunca suficientemente frisado – de que regras antielisivas específicas devem ser interpretadas restritivamente e que, em caso de falha, sua correção deve se dar legislativamente, e não por intermédio de “teses” da fiscalização tributária.
Como afirma Humberto Ávila, cabe ao legislador, no manejo das cláusulas antielisivas específicas, modificar a legislação para adaptá-la às novidades que surgem no mercado, às novas operações e estratégias elisivas, e não franquear ao intérprete o poder de simplesmente estender a hipótese tributária para novas situações não previstas ou desconsiderar operações legalmente realizadas34, através da alteração semântica de expressões utilizadas na norma.
Portanto, parece-nos fora de dúvida que o conceito de “praça” e de “mercado atacadista” para fins do estabelecimento de VTM nas saídas de produtos entre firmas interdependentes deve ser aquele construído no âmbito do Direito Comercial, restrito à municipalidade em que se insere o estabelecimento remetente.
Entretanto, apesar das diversas razões apresentadas, a questão não tem tido acolhida unânime no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), como será demonstrado abaixo.
5. O VTM e sua apuração na jurisprudência do CARF
Desde os primeiros momentos em que a Receita Federal pretendeu utilizar um conceito de “praça” com amplitude geográfica superior à do Município para alcançar os preços praticados por um atacadista interdependente situado em outro local, o Conselho de Contribuintes e, posteriormente, o CARF foram extremamente rigorosos em manter o conceito advindo do Direito Privado.
Veja-se, por exemplo, o Acórdão n. 204-02.707, relatado pela Conselheira Nayra Bastos Manatta e julgado pela 4ª Câmara do antigo 2º Conselho de Contribuintes, que foi assim ementado:
“IPI. Remessas para interdependentes. Valor tributável mínimo. No caso de saídas para empresas interdependentes o valor tributável mínimo a ser considerado como base de cálculo do imposto é o preço corrente no mercado atacadista da praça comercial do remetente, ou, caso não seja possível assim se proceder por inexistir vendas do produto na mesma praça da remetente, o valor mínimo tributável deve ser calculado considerando o custo de fabricação do produto, acrescido dos custos financeiros e dos de venda, administração e publicidade, bem assim do seu lucro normal e das demais parcelas que devam ser adicionadas ao preço da operação. As vendas realizadas pela empresa adquirente do produto, localizada em outra praça, não se prestam para cálculo do valor mínimo tributável, se consideradas isoladamente. Recurso de Ofício negado”35.
Neste acórdão, deixou-se absolutamente claro que no caso de atacadista fora do âmbito municipal, o VTM deveria ser calculado considerando o custo de fabricação do produto, acrescido dos custos financeiros e dos de venda, administração e publicidade, bem assim do seu lucro normal e das demais parcelas que devam ser adicionadas ao preço da operação, como determina o art. 196, parágrafo único, II, do RIPI/201036.
No mesmo sentido, também, o Acórdão CARF n. 3403-002.28537, de relatoria do Conselheiro Antonio Carlos Atulim, foi exemplar no trato da matéria, contando apenas com a divergência do Conselheiro Alexandre Kern – um dos poucos até então a sustentar naquele órgão, por escrito, a posição da Receita Federal38.
Até 2016, localizou-se apenas um acórdão que manteve a autuação para que o preço praticado pelo atacadista fosse utilizado para o cálculo do VTM, o Acórdão CARF n. 3201-001.20439. Entretanto, nesse caso a peculiaridade existente no caso era que ambos, remetente e atacadista, estavam situados dentro de um mesmo Município, configurando um mercado atacadista, no entender da turma, apesar da ausência de outros estabelecimentos distribuidores.
Todavia, a partir de 2017, algumas decisões foram proferidas entendendo pela aplicação da Solução de Consulta Interna COSIT n. 08/2012 e pela extensão do conceito de “praça” para abranger a localidade onde está o estabelecimento atacadista, mesmo que em Município distinto do remetente.
Nos Acórdãos CARF n. 3401-003.955 e n. 3401-003.95440, de relatoria do Conselheiro Leonardo Branco, julgados em agosto de 2017, o Conselheiro Fenelon Moscoso – redator do voto vencedor –, consignou que no caso de monopólio de distribuição de determinado produto, o VTM será calculado com base no preço de venda do atacadista, independentemente do local onde ele esteja – aduzindo em seu voto que o conceito de “praça” seria inócuo à discussão e não prejudicaria a aplicação da SCI COSIT n. 8/2012.
Data maxima venia, não concordamos com esse entendimento. Em primeiro lugar, os arts. 195 e 196 do RIPI/2010 não estabelecem regra específica de cálculo de VTM para casos em que haja monopólio de distribuição, o que afasta qualquer fundamento no Direito Positivo para o tratamento específico dado pela SCI COSIT n. 8/201241; e em segundo lugar, a própria solução de consulta traz implícita, em suas dobras, um conceito de “praça” com capacidade de alcançar qualquer localidade em que esteja o estabelecimento atacadista que goze de distribuição exclusiva dos produtos, visto que o respeito do conceito jurídico-mercantil de praça implicaria a necessidade de se aplicar a regra subsidiária do art. 196, parágrafo único, II, do RIPI/2010.
No Acórdão CARF n. 3301-004.12642, julgado em outubro de 2017 e relatado pela Conselheira Semiramis Duro, a turma entendeu, por unanimidade, que a indústria situada no Estado do Espírito Santo e a distribuidora localizada em São Paulo compunham uma única praça comercial, para fins de aplicação da regra de apuração do VTM, aplicando expressamente a SCI COSIT n. 8/2012 ao caso.
Em sentido contrário, e alinhado à jurisprudência histórica do CARF, cabe mencionar o Acórdão n. 3402-004.341, cujo julgamento foi realizado em agosto de 2017, cujo voto vencedor foi redigido pelo Conselheiro Diego Diniz Ribeiro. Reproduzimos abaixo a eloquente ementa do julgado, que bem esclarece as razões de decidir:
“IPI. Valor tributável mínimo. Norma antielisiva específica.
O valor tributável mínimo – VTM é típica norma antielisiva específica para operações com produtos industrializados e tem por objetivo evitar uma manipulação artificial da base de cálculo do tributo quando da realização de operações entre empresas interdependentes.
A delimitação de um dos dois métodos possíveis de apuração do VTM implica precisar qual o conteúdo semântico da expressão ‘praça do remetente’ para então identificar se, naquela praça, há ou não um mercado atacadista, de modo a permitir a apuração do VTM com base em uma comparação mercadológica (preço médio das empresas da localidade do remetente) ou com base em ficção jurídica (levando em consideração como elementos mínimos os custos de produção, as despesas e a margem de lucro ordinária naquele tipo de operação).
IPI. Valor tributável mínimo. Conceito de ‘praça do remetente’ e de ‘mercado atacadista’.
O fato da lei não promover a delimitação semântica de determinado signo na esfera jurídico-tributária não redunda em negar a existência, para tal signo, de um conteúdo jurídico próprio, sob pena do princípio da legalidade em matéria tributária ser esvaziado de conteúdo. Assim, o preenchimento semântico de um signo jurídico em matéria tributária deve socorrer-se da própria lei. Nesse sentido, os inúmeros dispositivos legais que empregam o termo ‘praça’ o fazem no sentido de domicílio, i.e., limitando-se ao recorte geográfico de um Município, nos termos do art. 70 do Código Civil. Logo, a regra antielisiva a ser aqui convocada é aquela prescrita no art. 196, parágrafo único, inciso II do RIPI/2010. Precedentes administrativos e judiciais neste sentido.
Ademais, estender o conceito de praça ao de região metropolitana, além de não ter sustentação legal nem econômica, implicaria ainda em tornar a regra do art. 195, inciso I do RIPI/2010 um sem sentido jurídico, já que a tornaria redundante”43.
Nesse mesmo sentido, cabe menção ao Acórdão CARF n. 3401-003.87344, julgado em julho de 2017, com erudito voto vencedor redigido pelo Conselheiro Leonardo Branco.
O presente panorama de decisões recentes sobre a matéria demonstra que a questão não está mais pacificada como outrora esteve, e ainda está pendente de um pronunciamento específico da Câmara Superior de Recursos Fiscais sobre o tema – visto que outros acórdãos sobre VTM não trataram da questão do alcance do conceito de “praça”.
6. Conclusões
À guisa de síntese conclusiva do que foi exposto, pode-se afirmar que a técnica do valor tributável mínimo utilizado para a apuração do IPI nas saídas entre partes interdependentes é uma técnica construída por meio de uma regra específica antielisiva, e por isso está sujeita a uma interpretação restritiva de seu conteúdo.
Ao mencionar no art. 195, I, do RIPI/2010 que o VTM será o preço corrente no mercado atacadista da praça do remetente, os termos “praça” e “mercado atacadista” devem ser tratados em seus sentidos técnicos, hauridos da seara jurídico-mercantil.
Por um lado, o termo “praça” designa localidade restrita ao âmbito municipal, não podendo abranger âmbitos mais largos pelo simples fato de em outra região existir um atacadista que goze de exclusividade na distribuição dos produtos. Da mesma forma, o “mercado atacadista” somente existirá na praça em que se situa este atacadista, não se estendendo nacionalmente para abranger o local do estabelecimento remetente.
A SCI COSIT n. 8/2012 procurou dar às saídas de produtos para estabelecimentos com monopólio no atacado um tratamento jurídico que não encontra respaldo na legislação, e que, portanto, se mostra arbitrário e ilegal.
Por fim, a jurisprudência do CARF, que era pacífica quanto à aplicação do conceito restrito de “praça”, vem oscilando a partir do ano de 2017, com posicionamentos também pela aplicação da SCI COSIT n. 8/2012, o que poderá ensejar um pronunciamento da CSRF futuramente, em razão da interposição de recurso especial, frente à divergência de entendimentos existente.
Desse modo, o tema merece ser revisitado e novamente discutido, como forma de consolidação dogmática da matéria, refinamento dos argumentos e robustecimento das posições críticas adotadas, buscando evitar uma surpresa para o contribuinte com a proliferação de pronunciamentos em sentido contrário àquele que fora consolidado há anos.
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1 Trata-se de princípio reconhecido expressamente pela Constituição Federal de 1988, em seu art. 145, § 1º: “Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, [...]”.
2 Nesse sentido, Marco Aurélio Greco reconhece que a solidariedade influencia o debate tributário em três momentos distintos: (a) no momento da justificação da exigência tributária, isto é, das razões que justificam a disposição do patrimônio do contribuinte ao Estado; (b) no plano dos critérios de congruência da legislação tributária, identificando eventuais distorções internas no tratamento de certas materialidades; e (c) como critério de interpretação das normas tributárias (cf. GRECO, Marco Aurélio. Solidariedade social e tributação. In: GRECO, Marco Aurélio; e GODOI, Marciano Seabra de (coord.). Solidariedade social e tributação. São Paulo: Dialética, 2005, p. 168-169).
3 OLLERO, Gabriel Casado. El principio de capacidade y el control constitucional de la imposión indirecta (II). El contenido constitucional de la capacidad económica. Civitas – Revista Española de Derecho Financiero 34, abril/junho de 1982, p. 191.
4 Como pontua Luís Eduardo Schoueri, “o relaxamento que se faz no princípio da legalidade, quando o Legislativo deixa ao Executivo a prerrogativa de fixar os casos de isenção, mais que a segurança jurídica, afeta a própria liberdade do contribuinte.” (SCHOUERI, Luís Eduardo. Tributação e liberdade. In: FRANÇA, Vladimir da Rocha et ali (org.). Novas tendências do direito constitucional. Curitiba: Juruá, 2011, p. 497)
5 Nesse sentido, cf. ÁVILA, Humberto. Planejamento tributário. Revista de Direito Tributário v. 98. São Paulo, 2006, p. 78-83.
6 A opção fiscal é um direito concedido ao contribuinte, pela legislação tributária, de escolher qual o regime jurídico ao qual estará sujeito, em relação a determinados tributos, e que vincula tanto o optante quanto a Administração. Nesse sentido, veja-se AGOSTINI, Eric. Les options fiscales. Paris: LGDJ, 1983, p. 8.
7 SCHOUERI, Luís Eduardo. Planejamento tributário e garantias dos contribuintes: entre a norma geral antielisão portuguesa e seus paralelos brasileiros. In: ALMEIDA, Daniel Freire e; GOMES, Fabio Luiz; e CATARINO, João Ricardo (org.). Garantias dos contribuintes no sistema tributário – homenagem a Diogo Leite de Campos. São Paulo: Saraiva, 2012. v. 1, p. 372-373.
8 Por todos, veja-se DERZI, Misabel Abreu Machado. A desconsideração dos atos e negócios jurídicos dissimulatórios, segundo a LC 104/2001. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). O planejamento tributário e a Lei Complementar 104. São Paulo: Dialética, 2001, p. 205-232 (224-225); SCHOUERI, Luís Eduardo. Tributação e liberdade. In: FRANÇA, Vladimir da Rocha et ali (org.). Novas tendências do direito constitucional. Curitiba: Juruá, 2011, p. 471-501 (495); e XAVIER, Alberto. Os princípios da legalidade e da tipicidade da tributação. São Paulo: RT, 1978, passim.
9 TÔRRES, Heleno Taveira. Direito constitucional tributário e segurança jurídica. São Paulo: RT, 2011, p. 18.
10 Cf. NOVOA, César García. La cláusula antielusiva en la nueva ley general tributaria. Madrid: Marcial Pons, 2004, p. 208-275.
11 Pense-se, por exemplo, nas regras de thin cap, o regime de preços de transferência e outras técnicas que visam combater a elisão fiscal.
12 Define-as García Novoa como “estructuras normativas cuyo presupuesto de hecho aparece formulado con mayor o menor grado de amplitud, y al cual se ligan unas consecuencias jurídicas, que, en suma, consistirán en la asignación a la Administración de unas potestades consistentes em desconocer el acto o negocio realizado com ánimo elusorio o a aplicar el régimen jurídico-fiscal que se há tratado de eludir” (NOVOA, César García. La cláusula antielusiva en la nueva ley general tributaria, p. 259).
13 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Norma geral antielusão. Revista Direito Tributário Atual v. 25. São Paulo: Dialética e IBDT, 2011, p. 132 e 136.
14 CAMPOS, Diogo Leite de; e ANDRADE, João Costa. Autonomia contratual e direito tributário (a norma geral anti-elisão). Coimbra: Almedina, 2008, p. 58.
15 NOVOA, César García. La cláusula antielusiva en la nueva ley general tributaria, p. 259.
16 O modelo alemão de cláusula antielisiva se desenvolveu no Código Tributário de 1919, especificamente em seus arts. 4º e 5º, que estabeleciam a consideração econômica das hipóteses tributárias, além do instituto da simulação e do abuso de formas jurídicas para combater as tentativas de planejamento tributário (SCHOUERI, Luís Eduardo. Planejamento tributário e garantias dos contribuintes: entre a norma geral antielisão portuguesa e seus paralelos brasileiros, p. 373-378).
17 TESAURO, Francesco. Instituições do direito tributário. Tradução de Fernando Zilveti e Laura Ferreira. São Paulo: IBDT, 2017, p. 251.
18 NOVOA, César García. La cláusula antielusiva en la nueva ley general tributaria, p. 264.
19 PISTONE, Pasquale. Abuso del diritto ed elusione fiscale. Padova: CEDAM, 1995, p. 20-21.
20 BARRETO, Paulo Ayres. Planejamento tributário – limites normativos. São Paulo: Noeses, 2016, p. 234.
21 NOVOA, César García. La cláusula antielusiva en la nueva ley general tributaria, p. 272.
22 MENDONÇA, J. X. Carvalho de. Tratado de direito commercial brasileiro. 3. ed. Livro III, Parte I. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1938. v. V, p. 107-109.
23 REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 1989. v. I, p. 152.
24 Nesse sentido, Fábio Ulhôa Coelho pontua: “a definição de uma ou outra categoria de cheque é feita pela comparação entre o município que consta como local de emissão e o da agência pagadora. Se coincidentes, o cheque é considerado ‘da mesma praça’; caso contrário, de ‘praças diferentes’.” (COELHO, Fábio Ulhôa. Direito comercial. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 440)
25 Essa conexão entre o conceito de “praça” e o Município é reconhecida inclusive no âmbito do Superior Tribunal de Justiça: “4. O cheque é ordem de pagamento à vista, sendo de 6 (seis) meses o lapso prescricional para a execução após o prazo de apresentação, que é de 30 (trinta) dias a contar da emissão, se da mesma praça, ou de 60 (sessenta) dias, também a contar da emissão, se consta no título como sacado em praça diversa, isto é, em município distinto daquele em que se situa a agência pagadora. [...]” (STJ, REsp n. 1.190.037/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, DJe 27.09.2011).
26 “Art. 70. O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo definitivo”.
27 “Art. 196. Para efeito de aplicação do disposto nos incisos I e II do art. 195, será considerada a média ponderada dos preços de cada produto, em vigor no mês precedente ao da saída do estabelecimento remetente, ou, na sua falta, a correspondente ao mês imediatamente anterior àquele.
Parágrafo único. Inexistindo o preço corrente no mercado atacadista, para aplicação do disposto neste artigo, tomar-se-á por base de cálculo:
I – no caso de produto importado, o valor que serviu de base ao Imposto de Importação, acrescido desse tributo e demais elementos componentes do custo do produto, inclusive a margem de lucro normal; e
II – no caso de produto nacional, o custo de fabricação, acrescido dos custos financeiros e dos de venda, administração e publicidade, bem como do seu lucro normal e das demais parcelas que devam ser adicionadas ao preço da operação, ainda que os produtos hajam sido recebidos de outro estabelecimento da mesma firma que os tenha industrializado”.
28 “§ 6º Na hipótese do § 3º deste artigo, existindo na praça mais de 3 (três) possíveis interessados, a cada novo convite, realizado para objeto idêntico ou assemelhado, é obrigatório o convite a, no mínimo, mais um interessado, enquanto existirem cadastrados não convidados nas últimas licitações”.
29 BRASIL. Licitações e contratos: orientações e jurisprudência do TCU. 4. ed. Brasília: TCU, 2010, p. 86-87.
30 Lei n. 8.666/1993, art. 3º: “A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos”.
31 “Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários”.
32 “Art. 8º Para fins do disposto no artigo anterior, fica o Poder Executivo autorizado a excluir produto ou grupo de produtos cuja permanência se torne irrelevante para arrecadação do imposto, ou a incluir outros cuja alíquota seja igual ou superior a quinze por cento”.
33 “Art. 7º Equiparam-se a estabelecimento industrial os estabelecimentos atacadistas que adquirirem os produtos relacionados no Anexo III, de estabelecimentos industriais ou dos seguintes estabelecimentos equiparados a industrial: [...]
III – estabelecimentos comerciais de produtos cuja industrialização haja sido realizada por outro estabelecimento da mesma firma ou de terceiros, mediante a remessa, por eles efetuadas, de matérias-primas, produtos intermediários, embalagens, recipientes, moldes, matrizes ou modelos; e
§ 1º O disposto neste artigo aplica-se nas hipóteses em que adquirente e remetente sejam empresas interdependentes, controladoras, controladas ou coligadas (Lei n. 6.404, art. 243, §§ 1º e 2º) ou interligadas (Decreto-Lei nº 1.950, art. 10, § 2º)”.
34 ÁVILA, Humberto. Planejamento tributário, p. 83.
35 Acórdão n. 204.02707, Rel. Nayra Bastos Manatta, j. 15.08.2007.
36 “Art. 196. Para efeito de aplicação do disposto nos incisos I e II do art. 195, será considerada a média ponderada dos preços de cada produto, em vigor no mês precedente ao da saída do estabelecimento remetente, ou, na sua falta, a correspondente ao mês imediatamente anterior àquele.
Parágrafo único. Inexistindo o preço corrente no mercado atacadista, para aplicação do disposto neste artigo, tomar-se-á por base de cálculo: [...]
II – no caso de produto nacional, o custo de fabricação, acrescido dos custos financeiros e dos de venda, administração e publicidade, bem como do seu lucro normal e das demais parcelas que devam ser adicionadas ao preço da operação, ainda que os produtos hajam sido recebidos de outro estabelecimento da mesma firma que os tenha industrializado”.
37 Outras decisões que podem ser mencionadas são o Acórdão CARF n. 20218.215, de relatoria da Conselheira Maria Tereza Martinez López, e o Acórdão CARF n. 340100.768, relatado por Dalton César Miranda.
38 “Valor tributável mínimo. Empresas interdependentes.
Inexistindo mercado atacadista na cidade em que está localizado o estabelecimento remetente, o valor tributável mínimo do IPI a ser observado nas vendas para empresa interdependente deve ser apurado com base na regra do art. 196, parágrafo único, II, do RIPI/2010, considerando-se apenas e tão somente os custos de fabricação e demais despesas incorridas pelo remetente dos produtos” (Acórdão CARF n. 3403-002.285, Rel. Antonio Carlos Atulim, j. 26.06.2013).
39 Acórdão CARF n. 3201-001.204, Rel. Luciano Lopes de Almeida, j. 25.02.2013.
40 Ambas foram igualmente ementadas:
“Operações com interdependente.
A relação de interdependência com comerciante atacadista exclusivo enseja a observância pelo sujeito passivo do valor tributável mínimo previsto no Regulamento do IPI.
Composição do mercado atacadista.
Provada a participação do estabelecimento interdependente no mercado atacadista da praça do remetente, seus preços devem servir de parâmetro para a definição do valor tributável mínimo, previsto no art. 136, inciso I, do RIPI/2002 e art. 195, inciso, I, do RIPI/2010”.
41 O próprio ato normativo reconhece esta situação ao aduzir: “Observa-se que o dispositivo legal acima não faz qualquer referência ao número mínimo de ofertantes que devem atuar no mercado para que este seja caracterizado como um ‘mercado atacadista’. Tampouco faz qualquer distinção entre mercados monopolizados, oligopolizados, livre concorrência ou monopsônio”.
42 “Operações com interdependente. Valor tributável mínimo. Comprovada nos autos a relação de interdependência, nos termos do art. 42 da Lei nº 4.502, há de ser observado o valor tributável mínimo, previsto no regulamento do IPI. O valor tributável mínimo não poderá ser inferior ao preço corrente no mercado atacadista da praça do remetente quando o produto for destinado a estabelecimento distribuidor interdependente do estabelecimento industrial fabricante.
Valor tributável mínimo. Apuração. Vendas para empresas não interdependentes. O valor tributável mínimo deve ser apurado, com base na média ponderada mensal dos preços de cada produto, praticados pelo industrial quando das vendas aos clientes não interdependentes.
Composição do mercado atacadista. Valor tributável mínimo. Apuração. Vendas para interdependentes. O valor tributável mínimo aplicável às saídas de determinado produto do estabelecimento industrial, e que tenha na sua praça um único estabelecimento distribuidor, dele interdependente, corresponderá aos próprios preços praticados por esse distribuidor único nas vendas por atacado do citado produto. Recurso Voluntário negado” (Acórdão CARF n. 3301-004.126, Rel. Semiramis de Oliveira, j. 25.10.2017).
43 Acórdão CARF n. 3402-004.341, Rel. Waldir Navarro Bezerra, j. 29.08.2017.
44 Acórdão CARF n. 3401-003.873, Rel. Augusto Fiel, j. 18.10.2017.