Aspectos Teóricos e Práticos acerca da Inclusão das Despesas com Capatazia na Base de Cálculo do Imposto de Importação
Theoretical and Pratical Aspects about the Inclusion of Capatazia Expenses in the Calculation Basis of Import Tax
Pedro Jacob Rodrigues
Mestrando em Direito Constitucional e Processual Tributário (PUC/SP). Especialista em Direito Tributário (IBDT). Advogado em São Paulo. E-mail: rodriguespedrojacob@gmail.com.
Recebido em: 18-02-2018
Aprovado em: 10-05-2019
Resumo
Este artigo tem por objetivo analisar a legalidade da inclusão das despesas com capatazia na base de cálculo do Imposto de Importação, determinada por Instrução Normativa da Secretaria da Receita Federal. Far-se-á uma análise sob a ótica do Princípio da Legalidade em matéria tributária; da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça; e do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio. O final do trabalho será dedicado a questões relacionadas à identificação das despesas com capatazia e ao procedimento para cálculo do valor a ser restituído.
Palavras-chave: ilegalidade, despesas com capatazia, imposto de importação.
Abstract
The purpose of this article is to analyze the legality of the inclusion of capatazia expenses in the calculation basis of the Import Tax, determined by a Normative Instruction of the Federal Revenue. The analysis will be made from the point of view of the Principle of Legality; from the case law of the Superior Court of Justice; and from the General Agreement on Tariffs and Trade. The end of the work will be devoted to issues related to the identification of the capatazia expenses and to the procedure to calculate the amount to be refunded.
Keywords: illegality, capatazia expenses, import tax.
1. Introdução
O presente artigo tem por escopo analisar a questão da inclusão das despesas com capatazia na base de cálculo do Imposto de Importação tendo em vista que o art. 4º, § 3º, da Instrução Normativa n. 327/2003 da Secretaria da Receita Federal dispõe que tais despesas compõem o valor aduaneiro, e este é a base de cálculo do referido imposto.
Para tanto far-se-á uma breve análise do Princípio da Legalidade, a fim de verificar o conteúdo da reserva legal e avaliar se o conceito de valor aduaneiro (base de cálculo do Imposto de Importação) pode ser determinado por meio de Instrução Normativa da Secretaria da Receita Federal do Brasil.
Em seguida explicaremos como se deu o surgimento da questão da inclusão das despesas com capatazia na base de cálculo do Imposto de Importação, exporemos o nosso entendimento a partir da doutrina utilizada no trabalho; indicaremos as leis e os decretos fundamentais para resolução da questão, incluindo o Acordo de Valoração Aduaneira; e demonstraremos o posicionamento jurisprudencial acerca da temática.
Por fim, trataremos das questões relacionadas à identificação das despesas com capatazia a partir dos relatórios que podem ser extraídos do Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX) e ao procedimento para cálculo do valor a ser restituído.
2. Uma palavra sobre o princípio da legalidade
O § 3º do art. 4º da Instrução Normativa n. 327/2003, da Secretaria da Receita Federal dispõe que, na determinação do valor aduaneiro, independentemente do método de valoração aduaneira utilizado, serão incluídos os gastos relativos à descarga da mercadoria do veículo de transporte internacional no território nacional no valor aduaneiro, independentemente da responsabilidade pelo ônus financeiro e da denominação adotada1. Devemos nos questionar, dessa forma, se cabe à Instrução Normativa tratar sobre a determinação do valor aduaneiro, visto que este é a base de cálculo do Imposto de Importação.
O constituinte originário preocupou-se em prever, dentre os direitos e garantias fundamentais, previstos no art. 5º, que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. A previsão está no inciso II, que encerra um dispositivo fundamental que impede que o Estado aja com arbítrio em suas relações com o indivíduo, que, afinal, tem o direito de fazer tudo quanto a lei não lhe proíbe2.
Já no art. 150, I, da Constituição Federal o constituinte, empenhado em acautelar direitos dos contribuintes dispôs que: sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça, reforçando, desta forma, a intensidade do princípio da legalidade no campo tributário e de forma a deixar claro que qualquer exação deve ser instituída ou aumentada não simplesmente com base em lei, mas pela própria lei e diretamente dela3. Está tratada, assim, na Constituição Federal, a legalidade tributária.
Devemos destacar, também, a doutrina de Luís Eduardo Schoueri, que faz uma comparação entre o texto do art. 5º, II, com o texto do art. 150, I e percebe que o constituinte não foi redundante quando tratou da matéria tributária, pois se, em geral, um comportamento será exigido “em virtude” de uma lei, nas questões tributárias tem-se a exigência de a obrigação estar prevista na própria lei4.
Não há, dessa forma, espaço para delegação. Será a lei o fundamento imediato da exigência. Ao legislador cumpre definir o antecedente e o consequente da norma tributária5. O autor denomina reserva de lei a característica que decorre da comparação do art. 150, I com o art. 5º, II, da Constituição Federal. Enquanto este tolera a delegação, aquele implica que somente a lei (ela mesma) é que institui ou majora tributo.
Devemos concluir, a partir desta breve exposição, que a inclusão das despesas com capatazia na base de cálculo do Imposto de Importação por meio de Instrução Normativa da Secretaria da Receita Federal fere o Princípio da Legalidade, tendo em vista que a base de cálculo constitui elemento da reserva legal e apenas uma lei, em sentido formal, poderia alterar o conceito de valor aduaneiro, que é base de cálculo do Imposto de Importação.
3. A questão das despesas com capatazia
Fizemos uma breve exposição acerca do Princípio da Legalidade em matéria tributária, bem como trouxemos a redação do § 3º do art. 4º da Instrução Normativa n. 327/2003, da Secretaria da Receita Federal e indicamos sua ilegalidade. Podemos, agora, tratar de uma forma mais minuciosa da questão das despesas com capatazia.
Além da afronta ao Princípio da Legalidade em matéria tributária, a referida Instrução Normativa ignora que há previsão no Acordo de Valoração Aduaneira, assinado pelo Brasil, e internalizado pelo Decreto n. 2.498, de 1998 (atual Decreto n. 6.759, de 2009).
Neste Decreto há indicação de que a base de cálculo do Imposto de Importação é o valor aduaneiro, e seu o art. 776 determina que deve compor o valor aduaneiro o custo de transporte da mercadoria importada até o porto ou o aeroporto alfandegado de descarga ou o ponto de fronteira alfandegado onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro; os gastos relativos à carga, à descarga e ao manuseio, associados ao transporte da mercadoria importada até a chegada aos locais referidos acima; e o custo do seguro da mercadoria durante a operação de importação.
Para superar qualquer dúvida a este respeito, o legislador do mencionado decreto estabeleceu, no art. 797, aquilo que não deverá ser considerado para fins de composição do valor aduaneiro, determinando expressamente que os gastos associados ao transporte, incorridos no território aduaneiro a partir do porto ou aeroporto alfandegado de descarga ou o ponto de fronteira alfandegado onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro não integram o valor aduaneiro.
Podemos perceber que toda espécie de gasto que deverá compor o valor aduaneiro só poderá ser considerado até determinado ponto, até determinado momento, que é quando da chegada da mercadoria no porto ou aeroporto e que não deverão ser considerados, para fins de composição do valor aduaneiro, os gastos associados ao transporte incorridos no território aduaneiro.
Essa constatação nos leva à conclusão de que não deverá incidir qualquer outro custo que não os indicados no artigo antecedente, que dispõe de forma exaustiva sobre estes. Assim, não restam dúvidas de que os valores incorridos a título de despesas com capatazia não devem integrar a base de cálculo do Imposto de Importação já que esta, nos termos do art. 40, § 1º, I, da Lei n. 12.815, de 20138, nada mais é que a atividade de movimentação de mercadorias nas instalações dentro do porto, o que compreende recebimento, conferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelhamento portuário.
Neste sentido, Alexandre Luiz Moraes do Rêgo Monteiro9 destaca que as regras previstas em acordos de bitributação consistem em limitações à aplicação da legislação interna, na medida em que, muito embora não revogando ou alterando as leis, impedem a sua eficácia especificamente em relação às situações abrangidas pelos referidos acordos.
Ricardo Maitto da Silveira10 tem entendimento similar e explica que, por força dos princípios de Direito Internacional Público consubstanciados na própria Convenção de Viena11, os acordos têm prevalência sobre o Direito interno, não podendo os países signatários invocar as disposições de suas legislações para justificar o inadimplemento destes.
Neste sentido, também, a doutrina de Thomas Ampessan12, que dispõe que os custos com capatazia não devem ser incluídos no valor aduaneiro das mercadorias importadas, visto que, ao submeter tais custos à tributação pelo Imposto de Importação, desrespeita-se o AVA-GATT.
Concluímos, assim, que o § 3º do art. 4º da Instrução Normativa n. 327/2003, da Secretaria da Receita Federal, que dispõe que na determinação do valor aduaneiro, independentemente do método de valoração aduaneira utilizado, serão incluídos os gastos relativos à descarga da mercadoria do veículo de transporte internacional no território nacional no valor aduaneiro restará inaplicável no presente caso, tendo em vista que contraria frontalmente o Acordo de Valoração Aduaneira, assinado pelo Brasil e internalizado pelo Decreto n. 2.498, de 1998 (atual Decreto n. 6.759, de 2009).
Mister se faz ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça segue o entendimento aqui defendido, conforme pode-se destacar a partir de decisão publicada em 4 de maio de 2017, no julgamento do Recurso Especial n. 1.239.625/SC, cujo relator foi o Ministro Benedito Gonçalves, em que se decidiu que os gastos tidos após a chegada das mercadorias no porto, em especial com capatazia, não se incluem no valor aduaneiro, base de cálculo do Imposto de Importação. Segue ementa13:
“Tributário. Recurso especial. Imposto de Importação. Base de cálculo. Valor aduaneiro. Despesas de capatazia. Inclusão. Impossibilidade. Art. 4º, § 3º, da IN SRF 327/2003. Ilegalidade. 1. Cinge-se a controvérsia em saber se o valor pago pela recorrida ao Porto de Itajaí, referente às despesas incorridas após a chegada do navio, tais como descarregamento e manuseio da mercadoria (capatazia), deve ou não integrar o conceito de ‘Valor Aduaneiro’, para fins de composição da base de cálculo do Imposto de Importação. 2. Nos termos do artigo 40, § 1º, inciso I, da atual Lei dos Portos (Lei 12.815/2013), o trabalho portuário de capatazia é definido como ‘atividade de movimentação de mercadorias nas instalações dentro do porto, compreendendo o recebimento, conferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelhamento portuário’. 3. O Acordo de Valoração Aduaneira e o Decreto 6.759/09, ao mencionar os gastos a serem computados no valor aduaneiro, referem-se à despesas com carga, descarga e manuseio das mercadorias importadas até o porto alfandegado. A Instrução Normativa 327/2003, por seu turno, refere-se a valores relativos à descarga das mercadorias importadas, já no território nacional. 4. A Instrução Normativa 327/03 da SRF, ao permitir, em seu artigo 4º, § 3º, que se computem os gastos com descarga da mercadoria no território nacional, no valor aduaneiro, desrespeita os limites impostos pelo Acordo de Valoração Aduaneira e pelo Decreto 6.759/09, tendo em vista que a realização de tais procedimentos de movimentação de mercadorias ocorre apenas após a chegada da embarcação, ou seja, após a sua chegada ao porto alfandegado. 5. Recurso especial não provido.” (STJ, REsp n. 1.239.625/SC 2011/0042849-4, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 04.09.2014, DJe 04.11.2014)
Demonstramos, dessa forma, que o STJ já tem entendimento sobre a ilegalidade do art. 4º, § 3º, da Instrução Normativa n. 327, de 2003, não devendo, portanto, as despesas com capatazia serem incluídas na base de cálculo do Imposto de Importação, por clara violação ao Princípio da Legalidade em matéria tributária.
Há diversas decisões do STJ no sentido de não inclusão das despesas com capatazia na base de cálculo do Imposto de Importação e não colacionaremos todas para não incorrer em prolixidade14.
O que importa saber neste momento é que, de acordo com o entendimento deste Tribunal, somente poderiam ser incluídos no valor aduaneiro, que é a base de cálculo do Imposto de Importação, os gastos incorridos até a chegada da mercadoria ao porto do país de importação. De forma que os valores incorridos após a chegada da mercadoria ao porto do país de importação não podem compor o valor aduaneiro, pois tratar-se-iam de elementos estranhos à operação de importação em si.
No mesmo sentido, vale colacionar Acórdão da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Quarta Região, julgado em 10 de outubro de 201815:
“Agravo de instrumento. Tributário. Aduaneiro. Tutela provisória de urgência. Tributos incidentes na importação. Base de cálculo. Valor aduaneiro. Capatazia/THC. IN/SRF nº 327/2003. Ilegalidade. 1. A Capatazia é a atividade de movimentação de mercadorias nas instalações dentro do porto (art. 40, § 1º, I, da Lei 12.815/2013 – Lei dos Portos). 2. A expressão ‘até o porto’, contida no AVA/GATT e no Regulamento Aduaneiro, não abrange despesas ocorridas após a chegada do navio ao porto, o que inclui gastos com capatazia/THC (Terminal Handling Charge). 3. A Instrução Normativa STF nº 327/2003, extrapolou o contido no art. 8º do Acordo de Valoração Aduaneira e art. 77 do Decreto nº 6.759/2009. Precedentes desta Corte e do STJ. 4. Logo, os gastos com capatazia não podem ser considerados na composição do valor aduaneiro para fins de incidência do Imposto de Importação, do IPI-importação e do PIS/COFINS-importação. 5. Agravo de Instrumento provido.” (TRF-4, AG n. 50306238020184040000 5030623-80.2018.4.04.000, Rel. Roger Raupp Rios, Primeira Turma, julgado em 10.10.2018)
Trazemos à baila, ainda, recente Acórdão do CARF (n. 3402-006.218), julgado pela Segunda Turma da Quarta Câmara da Terceira Seção que, por maioria, negou provimento a recurso de ofício, entendendo que a capatazia não poderia compor a base de cálculo do PIS e da COFINS-Importação uma vez que, nos termos do art. 8º do acordo sobre a implementação do art. VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio, considerava-se valor aduaneiro de mercadorias o preço da mercadoria até a chegada no porto (preço CIF), não abrangendo aqueles dispêndios incorridos após a chegada no porto de destino, como é o caso das despesas com capatazia16.
Ementas colacionadas adiante17:
“Assunto: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS
Período de apuração: 05/01/2010 a 29/12/2010
Valor aduaneiro. PIS/COFINS Importação. Despesas de descarga e movimentação de mercadorias importadas. Capatazia.
Por se tratar de valor despendido para a movimentação das mercadorias após a chegada no porto de destino, a capatazia não compõe o valor aduaneiro das mercadorias, não integrando, portanto, a base de cálculo do PIS/COFINS Importação.
Assunto: Contribuição para o PIS/PASEP
Período de apuração: 05/01/2010 a 29/12/2010
Valor aduaneiro. PIS/COFINS Importação. Despesas de descarga e movimentação de mercadorias importadas. Capatazia.
Por se tratar de valor despendido para a movimentação das mercadorias após a chegada no porto de destino, a capatazia não compõe o valor aduaneiro das mercadorias, não integrando, portanto, a base de cálculo do PIS/COFINS Importação.
Recurso de Ofício Negado.” (CARF, Acórdão n. 3402-006.2018, Rel. Cons. Maysa de Sá Pittondo Deligne, Segunda Turma da Quarta Câmara da Terceira Seção, julgado em 25.02.2019)
Mesmo que a decisão em tela seja relacionada ao PIS e à COFINS-Importação, entendemos que a lógica de decidir foi a mesma, visto que se baseou no entendimento de que as despesas com a movimentação das mercadorias após a chegada no porto de destino não poderiam compor o valor aduaneiro, por desrespeitar frontalmente o AVA-GATT.
Superadas as questões doutrinárias e jurisprudenciais acerca da temática, podemos dedicar a parte final do presente trabalho às questões práticas acerca da temática, em especial às questões relacionadas à identificação das despesas com capatazia e ao cálculo do valor a ser restituído.
Os valores relativos às despesas com capatazia podem ser encontrados a partir do cruzamento de dados das planilhas de relatório de preço de transferência e de relatório ad hoc, extraídas do Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX). O relatório preço de transferência informa, de maneira detalhada, todas as importações de determinado período (no caso deverá ser feita a extração das importações realizadas nos últimos cinco anos) e o relatório ad hoc traz, também de forma detalhada, todos os acréscimos incorridos no mesmo período para as importações.
Dessa forma, pode-se chegar a um work paper com todas as Declarações de Importação cujos valores estão majorados pelas despesas com capatazia. Sendo importante ressaltar que entendemos como valor de capatazia os valores de acréscimos incluídos no campo “Carga, descarga e manuseio na entrada – país de importação” da Declaração de Importação.
Para o cálculo do valor a ser restituído a título de Imposto de Importação incidente sobre o Valor Aduaneiro majorado pelas despesas com capatazia pode-se fazer a seguinte operação matemática: somam-se os valores relativos ao frete, ao seguro, e ao FOB para chegar ao valor aduaneiro. Em seguida, subtrai-se o valor dos acréscimos de despesas com capatazia deste. A partir daí tem-se o valor aduaneiro sem acréscimos de despesas com capatazia e pode-se fazer incidir a alíquota do Imposto de Importação sobre a base correta (que não é composta pelos mencionados acréscimos). Por fim, basta subtrair do valor a recolher do Imposto de Importação o valor a recolher do Imposto de Importação sem capatazia e atualizá-lo pela Taxa Selic acumulada18, chegando-se, assim, ao valor a restituir.
A equação poderia ser representada pela seguinte fórmula:
{Valor a Recolher II – [(Frete + Seguro + FOB – Despesas com Capatazia) * Alíquota II]} * (1 + Taxa Selic acumulada) = Valor a restituir
Dessa forma, somando-se o valor a restituir relativo a todas as operações dos últimos cinco anos chegar-se-á ao valor total a restituir.
4. Considerações finais
Para demonstrar a ilegalidade da inclusão das despesas com capatazia na base de cálculo do Imposto de Importação prevista no art. 4º, § 3º, da Instrução Normativa n. 327/2003 da Secretaria da Receita Federal, fizemos um breve estudo sobre o Princípio da Legalidade em matéria tributária e verificamos que a base de cálculo constitui elemento da reserva legal e apenas uma lei, em sentido formal, poderia alterar o conceito de valor aduaneiro, que é base de cálculo do Imposto de Importação.
Em seguida tratamos da questão das despesas com capatazia propriamente dita, explicando como surgiu a controvérsia, expondo nosso entendimento acerca da temática sob a ótica das leis e dos decretos que versam sobre a questão e da jurisprudência consolidada no Superior Tribunal de Justiça e concluímos que, além de ferir o Princípio da Legalidade, o art. 4º, § 3º, da Instrução Normativa afronta frontalmente o Acordo de Valoração Aduaneira, do qual o Brasil é signatário.
Após estas considerações, pudemos tratar dos aspectos práticos relacionados à identificação das despesas com capatazia a partir do relatório ad hoc e do relatório de preço de transferência e ao procedimento para cálculo do valor a ser restituído.
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1 Instrução Normativa n. 327/2003, art. 4º: “Na determinação do valor aduaneiro, independentemente do método de valoração aduaneira utilizado, serão incluídos os seguintes elementos:
I – o custo de transporte das mercadorias importadas até o porto ou aeroporto de descarga ou o ponto de fronteira alfandegado onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro;
II – os gastos relativos a carga, descarga e manuseio, associados ao transporte das mercadorias importadas, até a chegada aos locais referidos no inciso anterior; e
III – o custo do seguro das mercadorias durante as operações referidas nos incisos I e II
[…]
§ 3º Para os efeitos do inciso II, os gastos relativos à descarga de mercadoria do veículo de transporte internacional no território nacional serão incluídos no valor aduaneiro, independentemente da responsabilidade pelo ônus financeiro e da denominação adotada.”
2 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 262.
3 Ibidem, p. 264-265.
4 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 310-311.
5 Ibidem, p. 311.
6 Decreto n. 6.759, art. 77: “Integram o valor aduaneiro independentemente do método de valoração utilizado (Acordo de Valoração Aduaneira, Artigo 8, parágrafos 1 e 2, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 1994; e Norma de Aplicação sobre a Valoração Aduaneira de Mercadorias, Artigo 7º, aprovado pela Decisão CMC nº 13, de 2007, internalizada pelo Decreto nº 6.870, de 4 de junho de 2009): (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010).
I – o custo de transporte da mercadoria importada até o porto ou o aeroporto alfandegado de descarga ou o ponto de fronteira alfandegado onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro;
II – os gastos relativos à carga, à descarga e ao manuseio, associados ao transporte da mercadoria importada, até a chegada aos locais referidos no inciso I; e
III – o custo do seguro da mercadoria durante as operações referidas nos incisos I e II.”
7 Decreto n. 6.759, art. 79: “Não integram o valor aduaneiro, segundo o método do valor de transação, desde que estejam destacados do preço efetivamente pago ou a pagar pela mercadoria importada, na respectiva documentação comprobatória (Acordo de Valoração Aduaneira, Artigo 8, parágrafo 2, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 1994):
I – os encargos relativos à construção, à instalação, à montagem, à manutenção ou à assistência técnica, relacionados com a mercadoria importada, executados após a importação; e
II – os custos de transporte e seguro, bem como os gastos associados ao transporte, incorridos no território aduaneiro, a partir dos locais referidos no inciso I do art. 77.”
8 “O trabalho portuário de capatazia, estiva, conferência de carga, conserto de carga, bloco e vigilância de embarcações, nos portos organizados, será realizado por trabalhadores portuários com vínculo empregatício por prazo indeterminado e por trabalhadores portuários avulsos.
§ 1º Para os fins desta Lei, consideram-se:
I – capatazia: atividade de movimentação de mercadorias nas instalações dentro do porto, compreendendo o recebimento, conferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelhamento portuário.”
9 MONTEIRO, Alexandre Luiz Moraes do Rêgo. Direito tributário internacional: a arbitragem nos acordos de bitributação celebrados pelo Brasil. Série Doutrina Tributária v. XX. São Paulo: Quartier Latin, 2016, p. 41.
10 SILVEIRA, Ricardo Maitto da. O escopo pessoal dos acordos internacionais contra a bitributação: regimes fiscais especiais, conflitos de qualificação e casos triangulares. Série Doutrina Tributária v. XIX. São Paulo: Quartier Latin, 2016, p. 32.
11 A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados prevê: “Artigo 26. Todo tratado em vigor obriga as partes e deve ser cumprido por elas de boa fé”. “Artigo 27. Uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado.”
12 SILVA, Thomas Ampessan Lemos da. A não incidência do Imposto de Importação sobre o Therminal Handling Charge (THC) ou capatazia. Revista Dialética de Direito Tributário n. 237. São Paulo: Dialética, 2015, p. 164.
13 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial n. 1.239.625/SC (2011/0042849-4), Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 04.09.2014, DJe 04.11.2014. Disponível em: <https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/153485226/recurso-especial-resp-1239625-sc-
2011-0042849-4>. Acesso em: 9 dez. 2017.
14 Neste sentido c.f. Recurso Especial n. 1.626.971, cuja Relatora foi a Ministra Assusete Magalhães, julgado em 25 de abril de 2017, em que se decidiu que o art. 4º, § 3º, da Instrução Normativa n. 327/2003, ao incluir os gastos com capatazia efetuados após a chegada da mercadoria no país importador, na constituição do valor aduaneiro, para fins de cobrança do Imposto de Importação, desbordou de seus limites de regulamentação da legislação federal (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial n. 1.626.971/SC (2016/0246580-5), Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 25.04.2017, DJe 04.05.2017. Disponível em: <https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/465718745/recurso-especial-resp-1626971-sc-2016-0246580-5>. Acesso em: 9 dez. 2017).
15 BRASIL. Tribunal Regional Federal da Quarta Região, Agravo de Instrumento n. 5030623-80.2018.4.04.0000, Rel. Roger Raupp Rios, Primeira Turma, julgado em: 10.10.2018. Disponível em: <https://trf-4.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/636983215/agravo-de-instrumento-ag-
50306238020184040000-5030623-8020184040000?ref=serp>. Acesso em: 11 mai. 2019.
16 RIBEIRO, Diego Diniz; e BRANCO Leonardo Ogassawara de Araújo. CARF diverge sobre despesas de capatazia no cálculo de PIS e COFINS Importação. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2019-mar-27/direto-carf-carf-diverge-gastos-capatazia-pis-cofins-importacao>. Acesso em: 11 mai. 2019.
17 BRASIL. Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, Acórdão n. 3492-006.218 (Processo n. 11128.730446/2014-56), Rel. Cons. Maysa de Sá Pittondo Deligne, Segunda Turma da Quarta Câmara da Terceira Seção, julgado em 25.02.2019. Disponível em: <https://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/listaJurisprudenciaCarf.jsf>. Acesso em: 11 mai. 2019.
18 Para verificar a Taxa Selic acumulada c.f. <http://receita.economia.gov.br/orientacao/tributaria/pagamentos-e-parcelamentos/taxa-de-juros-selic>. Acesso em: 11 mai. 2019.