Artigos Selecionados em Sistema Double Blind Peer Review

Contribuição ao Estudo do Lançamento de Créditos Tributários em Face de Entidades Educacionais Imunes. Análise a partir do Regime Jurídico-tributário Aplicável e dos Elementos da Ordem Econômica

Contribution to the Study of the Constitution of Tax Credits against Immune Educational Legal Entities. An Analysis at the Perspectives of the Legal Tax Regime and the Economic Order

André Elali

Professor Adjunto de Direito Tributário da UFRN. Mestre e Doutor em Direito. E-mail: andreelali@andreelali.com.br.

Evandro Zaranza

Professor de Direito Tributário da UNI-RN. Mestre em Direito. E-mail: evandrozaranza@andreelali.com.br.

Resumo

Os autores visam examinar a desconsideração da imunidade tributária de entidades de educação sem fins lucrativos, relacionando o tema aos requisitos do lançamento do crédito tributário e aos preceitos da ordem econômica. Pretende-se examinar de que forma o lançamento pode desconsiderar a proteção constitucional de agentes econômicos que, não tendo por objetivo o lucro per se, não revelam capacidade contributiva.

Palavras-chave: imunidade tributária, lançamento do crédito tributário, capacidade contributiva, ordem econômica.

Abstract

The authors will examine the tax immunity for nonprofit education entities and the possibility of its suspension by fiscal authorities. The authors intend to study how may fiscal authorities suspend the immunity and constitute tax credits against those economical agents, which, in general, do not have ability to pay. They will also analyse the impacts of the taxation of non-profit educational entities.

Keywords: tax immunity, constitution of the tax credit, ability to pay, economic order.

I. Objeto do Estudo

O presente estudo visa a analisar o lançamento de créditos tributários em face de instituições educacionais sem fins lucrativos, com a desconsideração da imunidade tributária por parte dos órgãos da administração tributária por meras presunções1.

Visa-se a examinar o ônus da prova quando da expedição dos atos de lançamento tributário, bem como averiguar os limites das desconsiderações que vêm sendo realizadas pelos fiscos sem a necessária prova de alguma irregularidade que comprometa a finalidade não lucrativa das entidades imunes.

Finalmente, analisar-se-á os efeitos do uso indevido de incentivos fiscais nas finanças públicas, na tributação em si, bem como no ambiente concorrencial.

II. A Imunidade Tributária das Entidades de Educação. Função Pública Levada a Efeito pelo Agente Privado

Sabe-se que a imunidade da tributação consiste numa efetiva limitação às competências tributárias, ou seja, limitação ao chamado poder tributante, impedindo que os entes federativos criem e cobrem tributos por evidente falta de competência tributária (art. 150, VI, da CF)2. Pondera Cristiano Rosa de Carvalho, a propósito do tema, que “as imunidades tributárias são limites objetivos porque, assim como os demais limites objetivos, é necessário comprovar o produto do exercício da competência para verificar se tais regras foram observadas”3.

Assim sendo, presente hipótese de imunidade à tributação, fala-se em falta de competência tributária ou até mesmo em incompetência. Dessa forma, tendo em vista que “competência tributária é a faculdade que as pessoas políticas têm para criar, in abstracto, os vários tributos que, nos termos da Constituição Federal, lhes são afetos”4, presente a imunidade, faltará ao ente federativo a necessária competência tributária.

Por outro lado, as imunidades tributárias mantêm íntima relação com os direitos fundamentais, com os objetivos do Estado, daí por que se trata de limitação absoluta em face das liberdades preexistentes5. É esta a lição de Ricardo Lobo Torres, falando em vinculação ao mínimo existencial:

“É um dos aspectos da proteção ao mínimo existencial. O art. 150, VI, c, protege a educação, a cultura, a saúde e a assistência social, que, em sua expressão mínima, constituem direitos humanos inalienáveis e imprescritíveis, ainda que implícitos no elenco do art. 5º do texto básico. Em outros países a garantia aparece sob o apelido de isenção, posto que não desenvolveram a teoria das imunidades. Mas a extensão, o fundamento e o significado devem ser o mesmo que prevalece entre nós. O fundamento da imunidade das instituições de educação e de assistência social é a proteção da liberdade.6

Em tal sentido, tratando-se de entidade reconhecidamente vinculada à educação, sem fins lucrativos, inexiste competência tributária relativamente aos impostos. O que se impõe, de qualquer sorte, é o atendimento aos requisitos do CTN, que dispõe:

“Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas:

I - não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título;

II - aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;

III - manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.”

Sobre o assunto, já se manifestou Carlos Vaz, aduzindo:

“Convém lembrar, inicialmente, que as entidades de educação se distinguem de acordo com a origem dos recursos que as constituem e as mantêm. Assim, há entidades que asseguram a sua existência com recursos exclusivamente do poder público; outras, como as autarquias e fundações que, além dos recursos orçamentários do governo, possuem outras fontes de receitas próprias (Decreto-lei nº 200/67, art. 5º, inciso I) e, outras, ainda, com fins lucrativos, que são mantidas apenas com recursos dos particulares, sujeitas aos tributos e contribuições em geral. Existem, porém, aquelas outras instituições de educação particulares, sem fins lucrativos, que são amparadas pela imunidade, por prestarem serviços para os quais houverem sido instituídas e que os colocam à disposição da população em geral, em caráter complementar às atividades do Estado, além de atenderem, obrigatoriamente, a determinados requisitos de lei, que serão examinados mais adiante.”7

Infere-se, pois, que das várias espécies de instituições de educação, destaca-se a entidade sem fins lucrativos, à qual se dirigiu a Constituição, protegendo-lhe da tributação em face de sua importância na concretização dos próprios objetivos do Estado brasileiro.

O Supremo Tribunal Federal, ao enfrentar questões relativas à temática sob exame, já se manifestou no sentido de que: “A natureza pública da instituição não provém da generalidade de seus participantes e beneficiários, mas dos fins sociais a que atende.”8 Assim, é de se concordar totalmente com a lição de Humberto Ávila, que pondera:

“A natureza das entidades de educação e assistência social depende da finalidade estatutária. É o estatuto social que dispõe sobre as finalidades a serem atingidas. E o fim social atendido é o elemento caracterizador da entidade. (...) As instituições de educação e assistência social podem exercer outras atividades, bem como podem receber contraprestação pelo seu exercício. (...) Equivale a dizer - como já elucidado - que a finalidade da entidade resulta de seus estatutos, não podendo os mesmos prever qualquer forma de distribuição de lucros aos seus sócios. (...)”9

Examinando-se os dispositivos no CTN, nota-se que o requisito essencial é a ausência de fins lucrativos, segundo a lição irretocável de Hugo de Brito Machado, que acentua:

“O sem fins lucrativos é o único requisito essencial para o gozo da imunidade. Os requisitos que a lei pode estabelecer dizem respeito à demonstração daquele requisito essencial. Em outras palavras, os requisitos que a lei pode estabelecer dizem respeito ao modo de demonstrarem aquelas entidades a ausência de fins lucrativos.”10

Destaque-se que a entidade imune não precisa adotar a forma de fundação para obter o tratamento indicado na Constituição, podendo, até mesmo, ser constituída na forma de sociedade e/ou de associação, porquanto, como anotou Fábio Fanucchi: “Não é a forma jurídica que importa e sim o objetivo visado pela criação da entidade.”11

Tanto é assim que, como aponta Hugo de Brito Machado:

“O Tribunal Federal de Recursos, confirmando decisão concessiva de mandado de segurança deferido pelo emitente Juiz e jurista dos mais respeitados, José de Aguiar Dias, reconheceu ser imune um estabelecimento de ensino que aplica seus rendimentos só em seus serviços e instalações, embora esteja organizado sob a forma de sociedade anônima, cujo estatuto prevê a distribuição de dividendos e a remuneração de diretores, mas no caso comprovou não ter feito nem uma coisa nem outra.”12

Noutras palavras, como definido por Aliomar Baleeiro:

“A Constituição quer imunes instituições desinteressadas e nascidas do espírito de cooperação com os poderes públicos, em suas atividades específicas.”13

Por isso, fala-se que as entidades privadas que gozam da imunidade acabam exercendo verdadeira função pública, pois exercem atividade que gera benefícios coletivos. Acabam, pois, realizando os objetivos do Estado Regulador, concretizando (ou auxiliando a concretização) dos elementos previstos na ordem econômica.

Como bem registrado por Cristiano Rosa de Carvalho em recente tese: “A mesma mão que cobra o tributo concede o benefício.”14 Por isso que os incentivos fiscais devem visar à coletividade e não os denominados rent-seekers15, pois estes acabam se beneficiando isoladamente das finanças públicas, gerando distorções econômicas.

Para tanto, recebem uma espécie de incentivo fiscal, pois deixam de recolher impostos sobre uma atividade econômica dentro do chamado domínio econômico (mercado)16. E a concessão de incentivos fiscais, de qualquer ordem e sob a forma de qualquer elemento, exige uma medida socialmente desejável e acaba, pela medida financeira que representa, induzindo a comportamentos que o Estado entende como adequados para certos momentos históricos17.

Abrindo mão da tributação, o Estado permite que o agente econômico beneficiário realize um comportamento desejável. E é isso que se espera das entidades imunes, que recebem proteção constitucional das exigências fiscais em face da importante atividade que devem realizar em face do sistema social. Eis o “jogo” dos incentivos fiscais: concessão de um privilégio em face de um comportamento desejável18.

A tributação afeta as escolhas racionais dos agentes econômicos19. Sem a tributação que é imposta a todos (num dever geral de contribuir ao Estado Fiscal), os agentes beneficiados têm a função de auxiliar o Estado Regulador (no sentido de concretização da ordem econômica).

III. Necessidade de Controle da Imunidade para evitar-se o Enriquecimento Ilícito com o Subsídio Financeiro do Estado, o Efeito Nocivo da Subtributação e o Desvio Concorrencial. Efeitos Nocivos sobre a Ordem Econômica

Torna-se importante ponderar que as imunidades tributárias, ao concederem exceção à regra geral da capacidade contributiva, devem ser amplamente fiscalizadas para impedir o enriquecimento ilícito das entidades beneficiadas, o empobrecimento do Estado Fiscal (subtributação) e, o que seria mais danoso, desvios concorrenciais, com efeitos sobre toda a ordem econômica (liberdades econômicas e externalidades negativas).

Ao se beneficiar de qualquer espécie de incentivo fiscal o agente econômico é obrigado a respeitar os requisitos que lhe são colocados. No plano das imunidades, a ideia é a mesma: abre-se mão da tributação (via impostos), para que o agente faça algo de que o Estado necessita, pelo bem de todos.

No momento em que algum agente econômico se socorre de estímulos estatais e não realiza sua contraprestação, há danos evidentes sobre o sistema social: (i) ocorre o enriquecimento ilícito do agente com subsídios públicos; (ii) gera-se um efeito negativo na tributação, que acaba sendo suportada por outras categorias econômicas para compensar o incentivo deferido; (iii) cria-se um ambiente desigual de competividade. Eis a visão da necessidade de se fiscalizar corretamente os beneficiários dos regimes de incentivos fiscais.

Como se sabe, os denominados princípios da ordem econômica devem ser interpretados e aplicados conjuntamente, de forma sistemática, porque influenciam o modo de atuação do Estado regulador e dos agentes econômicos, tutelando tanto os elementos vinculados ao regime de produção capitalista, como aqueles socialmente relevantes, numa escala de conciliação que tende a permanecer. Isso se reitera no momento em que se confirma a noção de que sem Estado inexistirá mercado.

Nesse sentido, o Estado vem adotando uma nova postura em relação à liberdade dos agentes econômicos no mercado, falando-se num distinto modelo de Estado, qual seja, o do Estado regulador20, aquele que garante a liberdade através da sua própria regulação. É, pois, um meio-termo: nem só liberdade; nem só regulação, porquanto o mercado não é um estado de conflitos entre todos contra todos21.

Para esse modelo de Estado, é fundamental a implementação de condições estruturais que permitam a livre iniciativa e a livre concorrência dos agentes econômicos, afastando-se, pois, as chamadas falhas de mercado, que acabam gerando ineficiências econômicas e problemas sociais.

A defesa da concorrência, portanto, acaba sendo a base de uma série de medidas de política econômica e fiscal do Estado, visando-se ao bem comum e ao próprio funcionamento do mercado. A concorrência aumenta o bem-estar social, gerando comportamentos econômicos que beneficiam o sistema social, “porque o medo de ser excluído pelos concorrentes obriga o agente a alocar recursos eficientemente, assim como promover a inovação e o desenvolvimento tecnológico”22. E num mercado competitivo aumenta-se o número de empregos e desenvolve-se a qualidade de vida social23.

As políticas de defesa da concorrência acabam constituindo mecanismos usados por governos para estabelecer as condições da competição regular no mercado, criando-se “pré-condições que garantam o efetivo funcionamento da concorrência, assim como com a imposição de sanções pelas suas violações”24. E isso porque o mercado, por ele mesmo, não funciona perfeitamente, exigindo a intervenção do Estado, que deve garantir a liberdade daquele25.

Em consequência, as políticas de defesa da concorrência são instrumentos necessários em economias cada vez mais abertas e integradas26, para que se evitem as chamadas falhas de mercado, que acabam distorcendo a alocação, coordenação e distribuição dos fatores de produção, manipulando-se os preços e reduzindo-se o bem-estar do consumidor. Na prática, criou-se um paradoxo, pois a liberdade do mercado acaba dependendo da sua própria regulação27.

Ademais, a defesa da concorrência tem como objetivos maiores proteger a competição, maximizar a riqueza econômica do consumidor, distribuir melhor a renda, estabilizar a economia e promover a ideia de justiça. Em outros termos, sem uma concorrência verdadeira, o sistema econômico fica sujeito às manipulações por parte dos agentes econômicos e às deficiências de políticas públicas inadequadas, não se limitando os danos aos consumidores e agentes prejudicados, porquanto influenciam nas estruturas do próprio Estado.

Por tais fundamentos, tem o Estado o papel de regular - no sentido de “normalizar” - a liberdade absoluta de atuação dos agentes econômicos, evitando, pois, as concentrações, representadas por monopólios. Como ensinam Cooter e Ulen, o mercado tem estruturas diferentes quando há competitividade real e quando existem monopólios, surgindo duas estruturas diferenciadas: (i) o equilíbrio do mercado, com a competição perfeita; e (ii) o mercado monopolístico (Monopolistic Market), no qual há apenas um fornecedor, então a firma e a indústria são idênticas, porque estão no mesmo elo da cadeia28.

O que leva, então, o Estado a regular a economia é a existência de falhas de mercado ou, em casos específicos, a própria ausência de mercado29. E falha de mercado, para a doutrina jurídico-econômica, consiste na alocação ineficiente de recursos, surgindo ineficiências como: (i) o controle insuficiente sobre bens e serviços; (ii) custos excessivos de informação; e (iii) inviabilidade de formalização de contratos30. As falhas de mercado, ou dos chamados mecanismos de mercado, são assim classificadas na doutrina: (i) mobilidade dos fatores; (ii) acesso à informação; (iii) concentração econômica; e (iv) externalidades31.

O que se defende aqui é que as imunidades tributárias não podem criar falhas dos mecanismos de mercado. Devem, ao contrário, promover o desenvolvimento econômico. Assim, qualquer agente que seja beneficiado de forma equivocada por imunidades tributárias estará participando de modo incoerente e inadequado do sistema.

Por tais motivos, é dever do Estado fiscalizar as entidades imunes e garantir que as mesmas exerçam corretamente o seu papel, sob pena de não se permitir o uso do incentivo fiscal.

IV. A Desconsideração da Imunidade Tributária. Efeitos. Requisitos do Lançamento Tributário. Limites da Requalificação dos Negócios Jurídicos

As autoridades fiscais detêm competência privativa de realização do lançamento tributário, entendido como o ato de constituição do crédito tributário. Para tanto, devem realizar o que Fernando Zilveti denomina de processo normativo, isto é, interpretar a lei e aplicá-la ao caso concreto32.

O ato de lançamento, entretanto, não é expedido isoladamente de um contexto33. Deve, pois, ser precedido de um procedimento adequado, que levante as informações relativas ao eventual fato gerador. Sem adequação no procedimento, fica prejudicado o lançamento, pois naquele se baseia o ato de constituição do crédito tributário.

Tem sido comum, nas lides tributárias, a desconsideração da imunidade tributária por presunção. Afasta-se, assim, a imunidade tributária por mera presunção de que algumas das regras do art. 14 do CTN foram descumpridas. Ocorre que esse método de operar da Administração é incoerente com o sistema constitucional e com os regimes jurídicos em questão. Sobre o tema, adverte Humberto Ávila:

“(...) À autoridade administrativa é vedado cassar a imunidade. Ela não pode ‘tirar’ a imunidade tributária de uma instituição de educação e assistência social indefinidamente. Essas entidades têm direito à imunidade sobre o patrimônio, a renda ou os serviços relacionados com suas finalidades essenciais se forem instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos. Realizadas essas condições previstas em nível constitucional, existente está o direito à imunidade. A existência desse direito é indiferente à autorização administrativa. Isso equivale a dizer que a entidade de educação e assistência social, relativamente à não-observância dos requisitos legais, não corre o risco de perder a imunidade, mas tão-só possui a possibilidade de ter suspensa sua fruição, algo bem diverso, na medida em que, restabelecidos os requisitos, renovado estará o direito à fruição, mesmo que isso tenha que ser feito judicialmente.”34

Isso impõe que a administração tributária, em eventual circunstância de não preenchimento dos requisitos constitucionais e do CTN por parte de entidade educacional ou assistencial, tem o dever de restabelecer a fruição quando sanado eventual vício. E assim deve ser por que:

“O direito à imunidade é inatingível. E como se trata de um instrumento ou meio para assegurar direitos fundamentais é razoável entender-se que não pode ser extinto, nem mesmo por emenda constitucional. O exercício desse direito, vale dizer, o gozo da imunidade tributária, entretanto, pode ser suspenso, nos casos e mediante o procedimento próprio (...).”35

Não é novidade alguma a sujeição do processo e do procedimento administrativos a determinados princípios específicos e genéricos, provenientes tanto da legislação processual, quanto da própria Constituição Federal, inserindo-se na temática, de modo especial, dois princípios: (i) o princípio da motivação; (ii) o princípio da vinculação.

No mesmo sentido, a expedição de atos administrativos se submete a limitações objetivas, que são, em verdade, garantias do Estado Democrático, para o fim de se evitar o arbítrio, o excesso, práticas contrárias ao que se entende por razoável. A propósito, sabe-se que são pressupostos de validade de qualquer ato administrativo: (i) o sujeito; (ii) o motivo; (iii) os requisitos procedimentais; (iv) a finalidade; (v) a causa; e (vi) a formalização. Logo, qualquer defeito em pressuposto de validade suscita o dever de invalidação36.

Destarte, a motivação do ato administrativo possui duas dimensões: (i) a formal e (ii) a substancial. Enquanto a primeira diz respeito à exposição das razões de fato e de direito que ensejaram a edição do ato, a segunda “é um meio que permite a recondução do conteúdo do ato a um parâmetro jurídico que o torne compatível com as demais normas do sistema do direito positivo. Noutro giro: confere ao ato um laço de validade com o ordenamento jurídico.”37 Inter alia, a motivação não é qualquer exposição ilógica e sem coerência. De fato, como aduz Vladimir da Rocha França, “faz-se necessário que haja a exposição de elementos que sejam idôneos para justificar sua expedição. Noutras palavras, que a motivação seja suficiente.38

Como aduz Odete Medauar, “se o ato administrativo contém defeitos, desatendendo aos preceitos do ordenamento, é nulo, em princípio”39. E o lançamento tributário segue essa mesma regra, pois se trata de ato administrativo que constitui o crédito tributário, resultante de um procedimento administrativo-tributário próprio do poder de tributar.

O lançamento, pois, se trata, no dizer de Lúcia Vale Figueiredo, de “ato constitutivo formal, resultante de procedimento administrativo, que, declarando quantum debeatur, habilita a Administração a poder exigir a importância devida”40, submetendo-se ao mesmo regime jurídico de qualquer ato administrativo, por óbvio.

Sendo assim, evidencia-se a necessidade de submissão do lançamento ao princípio da motivação, posto que o ato de constituir o crédito tributário deve se fundamentar em uma exposição lógica e clara da interpretação-aplicação do direito pelo Estado. Isso quer dizer que a motivação não é a mera referência a algum dispositivo normativo ou parecer. Como anotam Sérgio Ferraz e Adilson Abreu Dallari, o princípio da motivação determina que cabe à autoridade fiscal apresentar as razões que levaram-na a tomar certa decisão. Motivar, portanto, não se confunde com fundamentar, que seria a simples “indicação da norma que supedaneou a decisão”41.

Tem sido constante a discussão, no Poder Judiciário, de lançamentos tributários realizados sem observância da motivação, sendo reiterada a manifestação de que em casos tais os efeitos do ato administrativo devem ser imediatamente afastados42.

Como se sabe, o lançamento tributário, se impugnado, passa a ser objeto do processo administrativo, que visa, primordialmente, à busca da verdade real. Assim, uma vez não atendido o requisito da motivação, fica ainda mais complexa a comprovação da verdade real, seja pelo particular, seja pelo Estado. Não se pode deixar de lado, portanto, a noção de que a busca da verdade material é princípio indeclinável da Administração tributária no âmbito de suas atividades procedimentais e processuais43. E a exigência da verdade material corresponde à busca pela aproximação entre a realidade factual e a sua representação formal. Disso decorre a conclusão de que “as faculdades fiscalizatórias da Administração tributária devem ser utilizadas para o desvelamento da verdade material e seu resultado deve ser reproduzido fielmente no bojo do procedimento e do processo administrativo”44.

Destarte, tem sido discutido com frequência de quem é o ônus da prova em matéria tributária45. Com a evolução dos estudos doutrinários, tem sido suscitado que a prova é ônus da Administração Tributária, porquanto a própria lei obriga que o ato jurídico seja fundamentado, conforme registra Paulo de Barros Carvalho, que afirma:

“Significa dizer que o Fisco tem que oferecer prova concludente de que o evento ocorreu na estrita conformidade da previsão genérica da hipótese normativa. Caso o sujeito passivo venha a contestar a fundamentação do ato aplicativo lavrado pelo Fisco, o ônus de exibir a improcedência dessa iniciativa impugnatória volta a ser, novamente, da Fazenda, a quem quadrará provar o descabimento jurídico da impugnação, fazendo remanescer a exigência.”46

Nesse contexto, infere-se que uma coisa é a presunção de legitimidade da existência do ato administrativo; outra coisa é o conteúdo em si do ato administrativo. Como ensina Suzy Gomes Hoffman, a presunção de legitimidade em questão não diz respeito ao conteúdo do ato administrativo, mas à sua existência no mundo jurídico47. Isso, inclusive, remete o tema ao método de interpreta­ção-aplicação do direito no momento contemporâneo, afastando-se do enfoque político estatista e autoritário do passado48. Cite-se, por oportuno, precedente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região em que foi relator o Professor João Batista Gomes Moreira, e no qual ficou assentado que:

“(...) A presunção de legitimidade do ato administrativo, atributo que, por sua raiz absolutista, vem perdendo prestígio, não é suficiente para inverter o ônus da prova no processo administrativo destinado à aplicação de pena.” (TRF da 1a Região, AMS 1999.01.00.037217-6/MG, DJ de 25.10.2002)

Sendo assim, é insustentável o lançamento tributário ou qualquer ato administrativo expedido sem suporte em provas. E mesmo nas hipóteses de presunções fiscais49, ainda continua competindo à autoridade administrativa “apresentar provas do fato a partir do qual se estabelece o raciocínio presuntivo. Qualquer que seja a modalidade de presunção, é imprescindível a prova dos indícios para, a partir deles, demonstrar a existência de causalidade.”50

Logo, o lançamento há de se submeter à noção de que constitui, na linguagem de Marcio Pestana, verdadeira “mensagem de ataque”, pois exige do “Administrado a adoção de uma certa conduta”, e, para tanto,

“perquire da tipologia tributária, ou seja, procura identificar, segundo o contexto jurídico e de acordo com a linguagem apropriadamente utilizada para tal finalidade, a previsão constante do cardápio que reúna condições de potencialmente ser aplicada ao caso concreto (...). Se a situação almoldar-se ao que se convenciona designar obrigação tributária, exigirá o pagamento do tributo.”51

A autoridade lançadora precisa comprovar o cometimento de eventual ilícito para o fim de aplicar o direito, através da teoria da regra-matriz, utilizando-se, pois, dos critérios necessários à imputação da obrigação objeto da relação52.

Disso conclui-se que, inexistindo provas para a comprovação do narrado no lançamento, este deve ser nulificado, porquanto contrário ao sistema, que impõe a presunção de cumprimento da legislação por parte dos particulares. Ou seja, a presunção é sempre que tudo está ocorrendo como deveria, sendo a exceção o cometimento do ilícito, que há de ser provado53.

Concorda-se, portanto, com Fabiana Del Padre Tomé, que afirma:

“Tratando-se de lançamento realizado pela autoridade administrativa, esta precisa motivar seu ato mediante emprego de linguagem das provas. Sendo a norma individual e concreta emitida pelo particular, a ele incumbe demonstrar a veracidade dos fatos alegados (essa comprovação pode consistir em deixar à disposição da fiscalização os documentos relativos ao fato relatado no antecedente da norma individual e concreta). Caso o ato de lançamento não se fundamente em provas, estará irremediavelmente maculado, devendo ser retirado do ordenamento.”54

Com base nessas ponderações, nota-se que, para gerar efeitos no âmbito do sistema, o lançamento deve fiel obediência à motivação. Não motivado o ato de constituição de crédito tributário, especialmente quando afastada hipótese de imunidade, põe-se de lado a própria segurança jurídica, porquanto se afasta a certeza em face de uma dúvida, uma presunção não revestida de prova. Se for o caso, deve a autoridade provar; não o fazendo, não pode simplesmente desnaturar a figura da entidade imune.

O uso de presunções no direito tributário não é apenas possível como necessário. O Estado, para viabilizar seus objetivos e tornar eficientes suas políticas, necessita de instrumentos que viabilizem a arrecadação fiscal. No entanto, no tema do lançamento, especialmente no que tange às entidades educacionais imunes, o dever de provar alguma irregularidade é do Fisco, não sendo admissível a presunção contraria à regra geral, de que há o atendimento aos requisitos legais.

O ponto de vista ora defendido, apesar de não ser pacífico, vem revelando a tendência de alguns precedentes jurisprudenciais, que são importantes orientações à sociedade55.

V. Análise Crítica da Desconsideração das Imunidades Tributárias sem Prova de Irregularidades por Parte das Instituições de Educação. Obrigatoriedade de Apresentação da Prova do Agente Fiscal

A atividade fiscalizatória do Estado deve observar certos parâmetros de comportamento sob pena de violar as próprias regras de competência instituídas no sistema jurídico. Em relação ao lançamento de créditos tributários em face de entidades imunes, é de se enfatizar a necessidade de a autoridade fiscal comprovar, material e formalmente, eventual violação aos elementos do art. 14 do Código Tributário Nacional.

A edição de ato administrativo de lançamento desprovido de provas é contrária ao Estado de Direito e não confere as condições essenciais à validade da exigência fiscal.

No caso das imunidades tributárias, tem havido uma divergência por parte de alguns Tribunais quanto à prova para a validade do lançamento de créditos tributários. Não obstante ainda existam certos entendimentos que impõem ao sujeito passivo o ônus da prova da regularidade de suas atividades quando do lançamento tributário, entende-se aqui que a interpretação coerente com o sistema tributário e com os objetivos do Estado brasileiro (dentro dessa visão de ser a imunidade um mecanismo de concretização de objetivos institucionais) é justamente o inverso, isto é, que é dever do fisco a comprovação de eventual vício da entidade imune.

Inter alia, essa visão é ratificada pela necessidade de apuração da responsabilidade civil e criminal do beneficiário de recursos subsidiados pelo Estado por meio dos incentivos na esfera da Constituição (imunidades), pois como já exposto, todo e qualquer incentivo deve ser examinado globalmente, ou seja, pela ótica da despesa e da receita públicas.

Isso, reitere-se, é ainda mais relevante ao se examinar o efeito do uso indevido de incentivos fiscais dentro do domínio econômico, o qual não deve permitir (pela regulação do Estado) tratamentos discriminatórios e anticoncorrenciais em nome de valores constitucionais fundamentais para o Estado brasileiro.

O Superior Tribunal de Justiça, em alguns dos acórdãos que acabaram examinando o tema (pela vedação do reexame de prova na maioria dos processos estudados), tem manifestado entendimento coerente com as premissas aqui adotadas, ao impor ao fisco o dever da prova no lançamento tributário. Nesse sentido, cumpre observar-se o teor de recentes entendimentos da Corte Especial:

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Processual civil. Inexistência de violação ao art. 535 do CPC. Tributário. Embargos à execução fiscal. IPTU. Imunidade tributária. Autarquia. Presunção de que o imóvel está sendo utilizado no atendimento às finalidades institucionais da autarquia. Prova em contrário. Ônus do poder tributante. Entendimento em consonância com o do STJ. Incidência da Súmula 83/STJ. Precedentes: AgRg no AREsp 304.126/RJ, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 22.08.2013; AgRg no REsp 1.233.942/RJ, rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe 26.09.2012; e AgRg no AREsp 236.545/MG, rel. Min. Mauro Camp­bell Marques, DJe 26.11.2012. Agravo regimental do Município de Belo Horizonte desprovido. 1. Inexiste no caso dos autos a apontada violação ao art. 535 do CPC. O Tribunal de origem apreciou fundamentadamente a controvérsia, não padecendo o acórdão recorrido de qualquer omissão, contradição ou obscuridade. 2. Consoante entendimento desta Corte Superior, cabe ao Poder Tributante o ônus de provar que o imóvel gerador do tributo, locado pela entidade autárquica a terceiros, não está afetado às suas finalidades institucionais para efeito de afastar a imunidade que aquela usufrui. 3. Precedentes: AgRg no AREsp 304.126/RJ, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJE 22.08.2013; AGRG no REsp 1.233.942/RJ, rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJE 26.09.2012; e AGRG no AREsp 236.545/MG, rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJE 26.11.2012. Incide à espécie a Súmula 83/STJ. 4. Agravo Regimental do Município de Belo Horizonte desprovido.” (AgRg no AREsp 493525/MG, Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial 2014/0067861-1, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho (1133), j. em 8.5.2014)

“Tributário. IPTU. Imunidade de autarquia. Ônus da prova. A imunidade tributária da autarquia só cede ante a prova de que o imóvel registrado em seu nome não está sendo utilizado para a finalidade institucional. Agravo regimental desprovido.” (STJ, Processo AgRg no REsp 1.301.276/RJ, Agravo Regimental no Recurso Especial 2011/0312118-0, rel. Min. Ari Pargendler (1104), j. em 1º.4.2014)

“Processual civil. Agravo regimental no agravo. Recurso especial. Tributário. ITBI. Entidade religiosa. Imunidade tributária. Art. 333, II, do CPC. Ônus da prova. 1. Sendo a recorrida entidade religiosa, há presunção relativa de que o terreno adquirido para construção do templo gerador do débito é revertido para suas finalidades essenciais. Assim é que caberia à Fazenda Pública, nos termos do artigo 333, inciso II, do CPC, apresentar prova de que o terreno em comento estaria desvinculado da destinação institucional. 2. Agravo Regimental não provido.” (STJ, Processo AgRg no AREsp 417964/ES, Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial 2013/0357211-4, rel. Min. Herman Benjamin (1132), j. em 11.3.2014)

“Processual civil e tributário. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Imunidade tributária. IPTU. Ônus da prova. Presunção de que o imóvel se destina aos fins institucionais da pessoa de direito público titular. Prova em contrário: ônus do tributante. 1. Há presunção que o imóvel de entidade autárquica está afetado a destinação compatível com os objetivos e finalidades institucionais. Logo, o ônus de provar o contrário, para fins de afastar a imunidade, recai sobre o poder público tributante. Precedentes: AgRg no REsp 1.233.942/RJ, rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 18/09/2012, DJe 26/09/2012 e AgRg no AREsp 236.545/MG, rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 20/11/2012, DJe 26/11/2012. 2. Agravo regimental não provido.” (STJ, AgRg no AREsp 304126/RJ, Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial 2013/0053035-1, rel. Min. Benedito Gonçalves (1142), j.em 13.8.2013)

A partir das premissas identificadas nos recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça, infere-se uma coerência lógica e sistemática com as seguintes questões: (i) há uma presunção relativa das entidades preencherem os requisitos da lei quanto à aplicação das limitações formais e materiais da tributação; (ii) a presunção relativa em favor da imunidade afasta a presunção negativa, isto é, impede, do ponto de vista técnico, a desqualificação sem comprovação; (iii) sendo assim, exige-se a prova da falta de observância da imunidade para que o lançamento tenha suporte jurídico.

O apontamento da prova da irregularidade da entidade imune releva também a necessidade de a autoridade fiscal indicar os beneficiários dos recursos financeiros relativos a essa modalidade de subsídios/incentivos fiscais, os quais deverão ser devolvidos em face da possível apropriação indevida, seja em nome do regime público dos incentivos fiscais e das finanças, seja em nome da livre-concorrência e todos os efeitos negativos sobre o modelo da ordem econômica teorizada pelo constituinte.

VI. Conclusões

O tema das imunidades revela uma grande complexidade no âmbito do direito tributário, por envolver a exceção à regra geral da tributação, porquanto as entidades imunes não revelam capacidade contributiva56. Com isso, abre-se mão da regra geral da generalidade da tributação em favor de certas categorias que acabam tendo importância para os objetivos constitucionais do Estado brasileiro.

Como as imunidades veiculam verdadeiras ajudas estatais, com representação econômica e financeira, devem ser cuidadosamente analisadas, posto que o uso indevido de auxílios fiscais (sob qualquer forma e denominação) gera numerosas distorções no sistema social.

Por isso que, para a fruição da imunidade tributária, são obrigatórios os requisitos do CTN, que vinculam a finalidade das entidades aos objetivos do Estado, porquanto se está, aqui, diante de auxílio de Estado, ou seja, com a figura do incentivo, subsídio ou subvenção. Entidades imunes, portanto, são sim auxiliadas financeiramente pelo Estado, daí por que devem obediência aos limites do CTN, instrumento normativo hábil a regular tais elementos por se tratar de lei complementar.

O problema de entidades imunes não atenderem aos requisitos legais diz respeito ao lançamento tributário, eis que, sendo atividade vinculada à constituição de créditos tributários em face de pessoas “protegidas” da tributação, que, a rigor, não deveriam revelar capacidade contributiva, se torna fundamental a produção de prova da falta de atendimento dos tais requisitos (art. 14 do CTN, em especial).

Não sendo possível a produção de prova no sentido de que a entidade imune não atende aos requisitos do CTN, não se pode presumir alguma irregularidade em prol do lançamento. Quem tem o ônus de apontar e provar qualquer irregularidade é o Fisco, não o contrário. Presume-se, sempre, a boa-fé, a regra geral sendo a de respeito ao sistema. O desrespeito ao sistema há de ser provado.

Essa conclusão é coerente com os precedentes mais recentes do Superior Tribunal de Justiça, que apontam o dever de apresentação da prova à autoridade lançadora do crédito tributário, sob pena de sua invalidade.

Se de um lado o Estado subsidia essas figuras, por auxiliarem, por outro lado, na promoção da ordem econômica teorizada na Constituição; por outro as entidades acabam sendo de fundamental relevância para a sociedade, merecendo, por isso mesmo, tratamento excepcional.

Vem merecendo severas críticas doutrinárias e jurisprudenciais a ideia absolutista da presunção de legitimidade do ato administrativo, o que acaba renovando a discussão do lançamento tributário, especialmente quando se está diante de agentes econômicos que auxiliam as funções do Estado, exercendo, por exemplo, serviços de relevância pública.

As formalidades exigidas pelo CTN, tal qual defendido por Hugo de Brito Machado e outros, como Alberto Xavier, são essencialmente vinculadas à inexistência de finalidade lucrativa. As demais exigências são acessórias, sendo aquela a verdadeira base da imunidade tributária. Da mesma forma, não interessa do ponto de vista da tributação a forma sob a qual se constituiu a entidade, porquanto até mesmo uma sociedade pode exercer atividade sem fins lucrativos, obtendo, nesse desiderato, o tratamento de entidade imune.

O uso de entidades imunes para desvio de sua finalidade não pode ser entendido como regra geral, mas sim exceção, devendo, inclusive, ser objeto de procedimento criminal, até porque se está, eventualmente, diante de prática concorrencial desleal no mercado, o que é ainda mais nocivo ao sistema.

Inter alia, a prática arbitrária de auditores fiscais, no que diz respeito ao lançamento tributário descabido, deve constituir objeto de ação própria contra o agente causador do dano, visando-se à indenização57 e apuração do eventual cometimento de ilícitos. Somente assim se fortalecerá o Estado brasileiro e o exercício legítimo dos direitos, inclusive econômicos, concretizando-se a ordem econômica proposta na ordem jurídica, sem a qual não se poderá falar em desenvolvimento econômico, redução de desigualdades, liberdade e concorrência no mercado.

De um lado, tem-se a importante utilização de incentivos fiscais para a concretização dos objetivos do Estado (ordem econômica); por outro, os agentes beneficiados devem fiel obediência aos requisitos legais, sob pena de gerarem danos ao sistema, destacando-se: (i) o enriquecimento ilícito às custas do subsídio estatal; (ii) o empobrecimento do Estado Fiscal, através do que, no direito tributário, se rotula de subtributação, com todos os efeitos negativos de regressividade; e (iii) danos ao ambiente concorrencial, que acabam impedindo a realização da adequada ordem econômica.

Tem-se, portanto, que o instituto das imunidades tributárias deve ser respeitado e os agentes privados beneficiados têm o dever de cumprir a lei para não se gerar um desequilíbrio na relação entre custos e benefícios, medida necessária no controle dos incentivos estatais. Entretanto, a Administração Tributária não pode desconsiderar as imunidades tributárias por meras presunções, visto que lhes compete comprovar, em procedimento e ato adequados, eventuais irregularidades dos agentes, para garantir o cumprimento da lei e dos objetivos constitucionais das medidas tributárias.

Referências Bibliográficas

AMATUCCI, Andrea. “Misure tributarie per lo sviluppo econômico”. In: TÔRRES, Heleno Taveira (coord.). Comércio internacional e tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2005.

ÁVILA, Humberto. Presunções e ficções frente à eficiência administrativa. Grandes Questões Atuais do Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 2008.

Sistema constitucional tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

AVI-YONAH, Reuven S. “Corporate Social Responsability and Strategic Tax Behavior”. In: SCHÖN, Wolfang (ed.). Tax and Corporate Governance. Berlin: Springer, 2008.

BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. Rio de Janeiro: Forense, 1951.

CARBAJALES, Mariano. El Estado regulador - hacia un nuevo modelo de Estado. Buenos Aires: Abaco, 2006.

CARVALHO, Cristiano Rosa de. Teoria da decisão tributária. São Paulo: Saraiva, 2013.

–. Teoria do sistema jurídico - Direito, economia, tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2005.

CARVALHO, Paulo de Barros. “Notas sobre a prova no processo administrativo tributário”. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.). Direito Tributário - homenagem a Paulo de Barros Carvalho. São Paulo: Quartier Latin, 2008.

–. “Notas sobre a prova no processo administrativo tributário”. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.). Direito Tributário - homenagem a Alcides Jorge Costa. V. II. São Paulo: Quartier Latin, 2003.

CARRAZZA, Roque Antonio. “Imunidade, isenção e não-incidência”. In: BARRETO, Aires F.; e BOTTALLO, Eduardo Domingos (coords.). Curso de iniciação em Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 2004.

COOTER, Robert; e ULEN Thomas. Economic Analysis of Law. Massachussets: Addison-Wesley, 2000.

COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009.

ELALI, André. Tributação e regulação econômica - um exame da tributação como instrumento de regulação econômica na busca da redução das desigualdades regionais. São Paulo: MP, 2006.

FALCÃO, Amílcar de Araújo. Fato gerador da obrigação tributária. São Paulo: RT, 1971.

FANUCCHI, Fábio. Comentários ao Código Tributário Nacional. V. I. Coord. Ives Gandra da Silva Martins. São Paulo: Saraiva, 2006.

FERRAZ, Sérgio; e DALLARI, Adilson Abreu. Princípios do processo administrativo. São Paulo: Malheiros, 2002.

FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de Direito Administrativo. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001.

FRANÇA, Vladimir da Rocha. Estrutura e motivação do ato administrativo. São Paulo: Malheiros, 2007.

HOEKMAN, Bernd; e HOLMES, Peter. Competition Policy, Developing Countries, and the World Trade Organization, 2-3; 12. Disponível em http:/www.worldbank.org.

HOFFMANN, Susy Gomes. Teoria da prova no Direito Tributário. Campinas: Copola, 1999.

JENNY, Frédéric. “Prefácio”. In: OLIVEIRA, Gésner; e RODAS, João Grandino. Direito e economia da concorrência. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.

MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional. V. I. São Paulo: Atlas, 2003.

–. Comentários ao Código Tributário Nacional. V. II, 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.

–. “Responsabilidade pessoal do agente público por danos ao contribuinte”. Revista Dialética de Direito Tributário nº 95. São Paulo: Dialética, 2003.

MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo moderno. 3ª ed. São Paulo: RT, 1999.

–. Processualidade no Direito Administrativo. São Paulo: RT, 1993.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1999.

MONCADA, Luís S. Cabral de. Direito econômico. 4ª ed. Coimbra: Coimbra, 2003.

MOREIRA, João Batista Gomes. Direito Administrativo (da rigidez autoritária à flexibilidade democrática). Belo Horizonte: Fórum, 2005.

NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1995.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2005.

OECD & World Bank. A Framework for the design and implementation of competition law and policy 1. Paris: OECD/World Bank, 1998.

PEREIRA, Manuel Henrique de Freitas. Fiscalidade. 2ª ed. Coimbra: Almedina, 2007.

PESTANA, Marcio. A prova no processo administrativo tributário. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

ROTHMANN, Gerd Willi. Extrafiscalidade e desenvolvimento econômico. Separata do Relatório 1966-1970. São Paulo: Câmara Teuto-Brasileira de Comércio e Indústria.

SCHOUERI, Luís Eduardo. “Notas acerca da imunidade tributária: limites a uma limitação ao poder de tributar”. Tributação, justiça e liberdade - homenagem a Ives Gandra da Silva Martins. Curitiba: Juruá, 2004.

–. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

TOMÉ, Fabiana Del Padre. “Prova e aplicação do Direito Tributário”. In: SCHOUE­RI, Luís Eduardo (coord.). Direito Tributário - homenagem a Paulo de Barros Carvalho. São Paulo: Quartier Latin, 2008.

TORRES, Ricardo Lobo. Os direitos humanos e a tributação - imunidades e isonomia. Rio de Janeiro: Renovar, 1995.

–. Tratado de Direito Constitucional Financeiro e Tributário. V. III. 3ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.

VAZ, Carlos. “A imunidade das instituições de educação sem fins lucrativos”. Revista de Direito da UFF, 2000.

VÁRIOS AUTORES. A prova no processo tributário. Coord. NEDER, Marcos Vinicius; SANTI, Eurico Marcos Diniz de; e FERRAGUT, Maria Rita. São Paulo: Dialética, 2010.

WEINRAUCH, Roland. Competition Law in the WTO - The Rationale for a Framework Agreement. Bélgica: Intersentia Publishers, 2004.

YOUNG, David; e METCALFE, Stan. Competition Policy in the Economics of the European Union: Policy and Analysis. UNCTAD/World Investment Report, 1997.

ZILVETI, Fernando Aurelio. Obrigação tributária - fato gerador e tipo. São Paulo: Quartier Latin, 2009.

1 As presunções ora mencionadas se referem aos requisitos do art. 14 do Código Tributário Nacional, que exigem a manutenção dos recursos financeiros no país, seu reinvestimento na atividade da entidade, bem como o registro contábil adequado, para garantir transparência na gestão dos recursos que englobam subsídios estatais, representados pelas receitas tributárias de que abre mão o Estado Fiscal em nome dos objetivos da ordem econômica.

2 Ensina Amílcar de Araújo Falcão, em trabalho clássico sobre o fato gerador, que a imunidade é “uma forma qualificada ou especial de não-incidência, por supressão, na Constituição, da competência impositiva ou do poder de tributar, quando se configuram certos pressupostos, situações ou circunstâncias previstos no estatuto supremo” (cf. FALCÃO, Amílcar de Araújo. Fato gerador da obrigação tributária. São Paulo: RT, 1971, p. 117).

3 Cf. CARVALHO, Cristiano Rosa de. Teoria do sistema jurídico - Direito, economia, tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 395.

4 CARRAZZA, Roque Antonio. “Imunidade, isenção e não incidência”. In: BARRETO, Aires F.; e BOTTALLO, Eduardo Domingos (coords.). Curso de iniciação em Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 2004, p. 95.

5 Cf. TORRES, Ricardo Lobo. Os direitos humanos e a tributação - imunidades e isonomia. Rio de Janeiro: Renovar, 1995, p. 231.

6 Cf. TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário. V. III, 3ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, pp. 265-267.

7 Cf. VAZ, Carlos. “A imunidade das instituições de educação sem fins lucrativos”. Revista de Direito da UFF, 2000, pp. 213 e ss.

8 STF, RE n. 108.796, rel. Min. Carlos Madeira, DJ 12.9.1986, p. 16.426.

9 Cf. ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, pp. 226-227.

10 Cf. MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional. V. I. São Paulo: Atlas, 2003, pp. 216-217.

11 Cf. FANUCCHI, Fábio. Comentários ao Código Tributário Nacional. V. I. Coord. Ives Gandra da Silva Martins. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 137.

12 Cf. MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional. V. I. Op. cit., p. 218.

13 Cf. BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. Rio de Janeiro: Forense, 1951, p. 116.

14 Cf. CARVALHO, Cristiano Rosa de. Teoria da decisão tributária. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 162.

15 Ibidem, p. 164.

16 “Esta intervenção, no controle da economia, é realizada pelo Estado sobretudo por meio de seu poder impositivo. É, pois, no campo da Receita, que o Estado transforma e moderniza seus métodos de ingerência. O imposto deixa de ser conceituado como exclusivamente destinado a cobrir as necessidades financeiras do Estado. É também, conforme o caso e o poder tributante, utilizado como instrumento de intervenção e regulamentação de atividades. É o fenômeno que hoje se agiganta com a natureza extrafiscal do imposto.” (Cf. NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1995, pp. 184-185)

17 Cf. AVI-YONAH, Reuven S. “Corporate Social Responsability and Strategic Tax Behavior”. In: SCHÖN, Wolfang (ed.). Tax and Corporate Governance. Berlim: Springer, 2008, pp. 197-198. Sobre o conceito, natureza e regime das “normas tributárias indutoras”, v. SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

18 Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Op. cit.; ROTHMANN, Gerd Willi. Extrafiscalidade e desenvolvimento econômico. Separata do Relatório 1966-1970. São Paulo: Câmara Teuto-Brasileira de Comércio e Indústria, pp. 107 e ss.; ELALI, André. Tributação e regulação econômica - um exame da tributação como instrumento de regulação econômica na busca da redução das desigualdades regionais. São Paulo: MP, 2006. No mesmo diapasão, v. Andrea Amatucci: “La legge tributaria, como la legge di spesa, la legge di bilancio e le leggi ad collegate, produce inevitabilmente effetti economici e sociali. Il legislatore, per la responsabilità che sui di lui grava, deve tener conto di tali effetti ed in questa funzione gli è di irrenunciable sostegno la scienza delle finanze che gli indica como egli possa controllarli sino al punto di formar ela legge in modo da raggiungere, in certe condizioni contigenti, determinati scopi economici. (...) Il conseguimento delle entrate può costituire um fine secondario. I diritti doganali ed i diritti di compensazione all’importazione sono da considerare imposte agli effetti di questa legge. (...) Perseguita questa finalità, è consentito prendere in considerazione altre funzioni, senza che ciò comporti l’adesione alla tesi della distinzione di um fine principale (fiscale) da um altro secondario o diverso (extrafiscale) dell’imposta.” (Cf. AMATUCCI, Andrea. “Misure tributarie per lo sviluppo econômico”. In: TÔRRES, Heleno Taveira (coord.). Comércio internacional e tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2005, pp. 560-567.

19 “Um imposto pode influenciar de vários modos a eficiência económica, nomeadamente quanto à oferta e procura de trabalho, à poupança e sua utilização produtiva, à afectação de recursos em geral. É que o imposto é algo que se impõe aos agentes econômicos e pode, por isso, modificar os preços relativos das variáveis económicas directa ou indirectamente relacionadas com a sua incidência. Dessa modificação de preços relativos pode resultar ineficiência econômica, que os economistas costumam analisar através da chamada ‘carga excedentária’. O objectivo é, assim, minimizar esta, ou seja, assegurar que os impostos sejam o menos distorcionários possível. O que, dito de outro modo, implica a neutralidade do imposto. Importa a este propósito ter em conta que os efeitos do imposto são de dois tipos: efeito rendimento (income effect) e efeito substituição (substitution effect). O efeito rendimento resulta do facto de a criação de um imposto ou a sua subida diminuir o rendimento disponível, o poder de compra do contribuinte, na pessoa que o suporta. Em si mesmo um efeito rendimento não produz ineficiência econômica. Mas a alteração fiscal acima mencionada pode levar o contribuinte a substituir uma actividade por outra, o consumo de um bem por outro e até, em última análise, se o imposto em causa onerar o rendimento que se obtém do trabalho, levar o trabalhador a preferir o ócio. É o efeito substituição. Deste pode resultar ineficiência econômica se desta interferência nas escolhas individuais resultar uma perda de bem estar para o contribuinte que não se traduza em aumento de recursos para o Estado ou para o outro ente público destinatário da receita do imposto.” (Cf. PEREIRA, Manuel Henrique de Freitas. Fiscalidade. 2ª ed. Coimbra: Almedina, 2007, pp. 69-70)

20 Cf. CARBAJALES, Mariano. El Estado regulador - Hacia un nuevo modelo de Estado. Buenos Aires: Abaco, 2006, p. 21.

21 Cf. MONCADA, Luís S. Cabral de. Direito Econômico. 4ª ed. Coimbra: Coimbra, 2003, p. 33.

22 Cf. WEINRAUCH, Roland. Competition Law in the WTO - The Rationale for a Framework Agreement. Bélgica: Intersentia Publishers, 2004, p. 17. Tradução livre.

23 V. OECD & World Bank. A Framework for the design and implementation of competition law and policy 1. Paris: OECD/World Bank, 1998, p. 22.

24 Cf. HOEKMAN, Bernd; HOLMES, Peter. Competition Policy, Developing Countries, and the World Trade Organization, 2-3; 12. Disponível em http::/www.worldbank.org. Acesso em 14 de julho de 2008, às 9h45. Tradução livre.

25 Cf. YOUNG, David; METCALFE, Stan. Competition Policy in the Economics of the European Union: Policy and Analysis. UNCTAD/World Investment Report 1997, p. 119.

26 Cf. JENNY, Frédéric. “Prefácio”. In: OLIVEIRA, Gésner; e RODAS, João Grandino. Direito e economia da concorrência. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.

27 “As a consequence, monopolies and cartels contradict the essence of free competition and govern­ment intervention becomes necessary. Competition policy and law are designed to promote competition and to prevent monopolization and cartelization. This creates a paradox according to which free competition is promoted and limited by competition law and policy at the same time.” (Cf. WEINRAUCH, Roland. Competition Law in the WTO - The Rationale for a Framework Agreement. Op. cit., p. 19)

28 Cf. COOTER, Robert; ULEN Thomas. Economic Analysis of Law. Massachussets: Addison-Wesley, 2000, pp. 33 e ss.

29 Cf. CARBAJALES, Mariano. El Estado regulador - hacia um nuevo modelo de Estado. Op. cit., p. 112.

30 Ibidem, p. 113.

31 Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Op. cit., pp. 74-78.

32 Cf. ZILVETI, Fernando Aurelio. Obrigação tributária - Fato gerador e tipo. São Paulo: Quartier Latin, 2009, pp. 178 e ss.

33 Após vasta pesquisa no direito europeu, Fernando Zilveti conclui que o lançamento nada mais é do que a “concreção daquilo preexistente em abstrato”, isto é, “é ato de simplesmente conferir liquidez e exigibilidade ao crédito tributário, condição necessária para o exercício do direito de crédito tributário pelo ente público”. Ao final, arremata o autor: “Lançamento é formalização do crédito tributário”. Cf. ZILVETI, Fernando Aurelio. Obrigação tributária - fato gerador e tipo. Op. cit., p. 80.

34 Cf. ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. Op. cit., p. 224.

35 Cf. MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional. V I. Op. cit., p. 227.

36 Cf. FRANÇA, Vladimir da Rocha. Estrutura e motivação do ato administrativo. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 76.

37 Ibidem, p. 92.

38 Ibidem, p. 129.

39 Cf. MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo moderno. 3ª ed. São Paulo: RT, 1999.

40 Cf. FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de Direito Administrativo. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 174. Afirma Regina Helena Costa, ao seu turno, que o lançamento “é o ato administrativo vinculado, declaratório do nascimento da obrigação principal, mediante o qual se procede à identificação dos sujeitos dessa relação, bem como à apuração do valor a ser pago a título de tributo, conferindo-se exigibilidade ao crédito correspondente” (Cf. COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 221).

41 Cf. FERRAZ, Sérgio; e DALLARI, Adilson Abreu. Princípios do processo administrativo. São Paulo: Malheiros, 2002, pp. 58 e ss.

42 Nesse diapasão: “Direito Administrativo (...) - Auto de infração - Ato e procedimento administrativo - Falta de motivação - Invalidade - (...) 3. É nula a decisão administrativa e, conseqüentemente, o procedimento administrativo instaurado (com contaminação do auto de infração), em virtude de ausência de motivação para a conclusão a respeito da existência de infração administrativa eventualmente praticada pela impetrante. 4. A ausência de motivação vicia inexoravelmente o ato administrativo impugnado, não sendo possível que a administração pública atue sem que haja demonstração clara e segura da ocorrência da infração supostamente praticada pelo administrado. Faz-se mister que o ato administrativo seja revestido de legalidade substancial, aí incluída a motivação da decisão no âmbito do procedimento administrativo instaurado. 5. Apelação e remessa necessária conhecidas e improvidas.” (TRF da 2ª Região, 8ª T., AMS nº 96.02.40401-9, rel. Juiz Fed. Conv. Guilherme Calmon Nogueira da Gama, DJU de 18.9.2006, p. 449); “Ato administrativo - Fundamentação e motivação - Ausência - Nulidade - (...) É dever da administração analisar eventual recurso que possa ser interposto visando à desconstituição do ato administrativo. Exigência constitucional do art. 93, inciso IX. A motivação abrange não só a série de circunstância de fato e de direito da decisão administrativa, mas também seus fundamentos jurídicos e o resultado final almejado. É imprescindível, para avaliação da razoabilidade, conhecer os motivos que levaram a administração a adotar determinada medida (objeto do ato administrativo) para alcançar a finalidade que decorre implícita ou explicitamente da lei. Daí a necessidade de motivação. Não se exige fórmula sacramental para a motivação; o que se entende necessário é que fiquem documentados, de algum modo, os motivos, para posterior apreciação, seja pela própria administração, seja pelos demais poderes do estado, nos limites de suas competências constitucionais. Recurso improvido.” (TJSP, 9ª Câm. de Direito Público, AC nº 137.970-5/9-00, rel. Des. Antonio Rulli, DJSP 4.12.2003, p. 47)

43 Cf. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 246. No mesmo diapasão, infere-se a lição de Odete Medauar e de Hely Lopes Meirelles. Veja-se: MEDAUAR, Odete. Processualidade no Direito Administrativo. São Paulo: RT, 1993; MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1999.

44 Cf. MARINS, James. Direito Processual Tributário Brasileiro (administrativo e judicial). 5ª ed. São Paulo: Dialética, 2010, pp. 177-178.

45 Cf., especialmente: A prova no processo tributário. Coord. NEDER, Marcos Vinicius; SANTI, Eurico Marcos Diniz de; e FERRAGUT, Maria Rita. São Paulo: Dialética, 2010. Vários autores.

46 Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. “Notas sobre a prova no processo administrativo tributário”. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.). Direito Tributário - homenagem a Alcides Jorge Costa. V. II. São Paulo: Quartier Latin, 2003, pp. 859-860.

47 Cf. HOFFMAN, Suzy Gomes. Teoria da prova no Direito Tributário. Campinas: Copola, 1999, p. 127.

48 Cf. MOREIRA, João Batista Gomes. Direito Administrativo (da rigidez autoritária à flexibilidade democrática). Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 265.

49 Cf. ÁVILA, Humberto. “Presunções e ficções frente à eficiência administrativa”. Grandes questões atuais do Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 2008, pp. 277-280.

50 Cf. TOMÉ, Fabiana Del Padre. “Prova e aplicação do Direito Tributário”. In: SCHOUERI, Luís Eduardo (coord.). Direito Tributário - homenagem a Paulo de Barros Carvalho. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p. 623.

51 Cf. PESTANA, Marcio. A prova no processo administrativo tributário. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007, pp. 163 e ss.

52 “A mensagem de ataque, endereçada a registrar a ocorrência de um agir desconforme ao contexto e aos códigos jurídicos correspondentes, imprescindivelmente deve registrar o exato momento da sua ocorrência, segundo tábua de controle do tempo que seja reconhecida pela ordem jurídica como apropriada para servir de referencial para registrar-se o instante da ocorrência relatada. Na modalidade de mensagem endereçada ao ilícito, torna-se relevante realçar o marco temporal que se refira aos instantes em que os motivos do agente estavam sendo encorpados. O motivo do agir, e, mesmo, às circunstâncias que envolveram este agir, como se sabe, especialmente no que se refere a assuntos ligados ao segmento tributário, quando dizem respeito a dolo, não são tomados de supetão ou como respostas meramente reflexas a uma determinação. A narrativa acerca do tempo em que o agir motivacional teve lugar, assim como das circunstâncias que o envolveram, auxilia a mensagem de ataque a ganhar robustez e chances de prosperidade, segundo os códigos comunicacionais da realidade jurídico-tributária. Assim, ao motivo de agir e às circunstâncias associa-se o elemento temporal, compondo o trinômio valioso para surpreender-se a ação desconforme à realidade jurídica.” (Cf. PESTANA, Marcio. Op. cit., pp. 206-207)

53 Sobre o assunto, assim se manifesta reiteradamente o CARF, antigo Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda: “IRPJ - Omissão de receitas - Indícios - A atividade administrativa de lançamento há de se submeter ao princípio da reserva legal, o que faz com que as exigências tributárias somente possam ser formalizadas com prova segura dos fatos que revelem o auferimento da receita passível de tributação ou mediante a demonstração de que ocorreram os fatos expressamente arrolados pela lei como presunção de omissão de receitas.” (CC, 3ª Câmara, 2ª T., Acórdão 103-21-652, rel. Cons. Paulo Jacinto do Nascimento, j. em 18.6.2004); “Recurso voluntário - Omissão de receita - Presunção simples. - Incumbe à fiscalização apresentar um conjunto de indícios que permita ao julgador alcançar a certeza necessária para seu convencimento, afastando possibilidades contrárias, mesmo que improváveis. A certeza é obtida quando os elementos de prova confrontados pelo julgador estão em concordância com a alegação trazida aos autos. Se remanescer uma dúvida razoável de improcedência da exação, o julgador não poderá decidir contra o acusado. No estado de incerteza, o Direito preserva a liberdade em sua acepção mais ampla, protegendo o contribuinte da inferência do Estado sobre seu patrimônio.” (Câmara Superior de Recursos Fiscais, 1ª T., Acórdão 01-05-095, rel. Marcos Vinícius Neder de Lima, j. 17.10.2004)

54 Cf. TOMÉ Fabiana Del Padre. “Prova e aplicação do Direito Tributário”. Op. cit., p. 621.

55 Nesse sentido: “Tributário e processual civil - Liminar em ação civil pública para anulação de ‘Cebas/CNAS’ - Intimação pessoal anterior à decisão proferida nos termos do art. 557, §1º-A do CPC: Desnecessidade - Agravo interno não provido. 1. Compete ao relator dar provimento ao recurso contra decisão que esteja em manifesta desconformidade com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do STF ou de Tribunal Superior (art. 557, caput, do CPC), sem que isso signifique afronta ao princípio do contraditório (ou à ampla defesa), porque atende à agilidade da prestação jurisdicional. Quando o relator assim age não ‘usurpa’ competência do colegiado, mas atua dentro do permissivo legal. 2. Tratando-se de decisão sumária (superficial cognição) e passível de, após melhor instrução, reversão, se o caso, pela sentença, importa perquirir se há fumaça do bom direito e risco do retardo. 3. Se a entidade goza de imunidade há longos anos, jamais contestada, deferida pela Administração Publica (em prol de quem militam presunções várias), não se pode - de inopino - pressupor dolo, simulação, fraude (sem prova plena em cognição exauriente), nem determinar-se o lançamento das contribuições da ré. 4. Agravo interno não provido. 5. Peças liberadas pelo Relator, em 02/06/2009, para publicação do acórdão.” (AGTAG 200801000499203, Des. Federal Luciano Tolentino Amaral, TRF da 1ª Região, 7ª T., 12.6.2009); “Agravo Regimental no Agravo de Instrumento. Processual civil e tributário. Execução fiscal. IPTU. Sindicato. Imunidade tributária. Embargos do devedor. Ônus da prova. Fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Art. 333, II, do CPC. Desprovimento. 1. Se o embargante fez a prova de que teve o seu direito à imunidade expressamente reconhecido pela Fazenda Municipal por meio de processo administrativo, competia ao exequente/embargado a contraprova, porquanto a existência do título executivo, por si só, não é apta a desconstituir o mencionado processo, constituído com a observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa. Precedentes do STJ. 2. Agravo regimental desprovido.” (STJ, 1ª T., AGA 200801277385, Denise Arruda, 4.5.2009)

56 Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. “Notas acerca da imunidade tributária: limites a uma limitação ao poder de tributar”. Tributação, justiça e liberdade - homenagem a Ives Gandra da Silva Martins. Curitiba: Juruá, 2004, p. 393.

57 Cf. MACHADO Hugo de Brito. “Responsabilidade pessoal do agente público por danos ao contribuinte”. Revista Dialética de Direito Tributário nº 95. São Paulo: Dialética, 2003.