A Criminalização do não Recolhimento do ICMS Próprio e a Ficção de Repercussão Jurídica dos Tributos

The Criminalization of Non-payment of ICMS and the Fiction of Juridical Repercussion of Taxes

Paulo Arthur Cavalcante Koury

Doutorando em Direito Tributário na USP. Cursa o LLM (Master of Laws) na University of Cambridge. E-mail: paulo.arthur@airesbarreto.adv.br.

Recebido em: 28-07-2019

Aprovado em: 22-10-2019

Resumo

O presente artigo visa determinar se é válida a aplicação indistinta da ficção de repercussão jurídica dos tributos não cumulativos em matéria de competências tributárias e em questão de Direito Penal. Para tanto, iniciar-se-á pela demonstração da incorporação parcial, pelo Direito Tributário brasileiro, do pressuposto econômico de repercussão do tributo indireto, dando ensejo à chamada ficção de repercussão jurídica nos tributos não cumulativos. Em seguida, examinar-se-á a natureza jurídica dessa norma, bem como a sua função. Conclui-se que a ficção de repercussão jurídica dos tributos é eficaz relativamente à interpretação e aplicação das normas cuja função imediata seja a de resguardar direitos fundamentais de liberdade, como ocorre no caso das normas constitucionais de competência tributária e de imunidade tributária. No entanto, a ficção de repercussão jurídica dos tributos não é eficaz relativamente a normas que possuam a função imediata de limitação de direitos de liberdade, como são as regras de Direito Penal.

Palavras-chave: crime tributário, ficção, repercussão jurídica, não cumulatividade.

Abstract

The present article aims at determining if the indistinct application of the fiction of juridical repercussion of non-cumulative taxes is valid, considering the interpretation and application of tax competence and criminal law norms. In order to address this issue, the article begins by explaining the partial incorporation of the economic premise of indirect tax repercussion, by Brazilian Tax Law, leading to the fiction of juridical repercussion regarding non-cumulative taxes. Following, the article examines the juridical nature of this norm, as well as its function. It concludes that the fiction of juridical repercussion of taxes is efficacious regarding the interpretation and application of norms whose immediate function is to protect fundamental freedom rights, such as tax competences and tax immunities. However, the fiction of juridical repercussion of taxes is not efficacious regarding norms whose immediate function is the restriction of fundamental rights, like penal norms.

Keywords: tax crime, fiction, juridical repercussion, input tax credit.

“Das was, einmal gesehen, das Auffallendste und Stärkste ist, fällt uns nicht auf.”

“We fail to be struck by what, once seen, is most striking and most powerful.” (Ludwig Wittgenstein1)

Introdução

O intérprete do Direito não raramente vive um dilema. De um lado, a interpretação do Direito demanda coerência. De outro, na busca pela coerência, corre-se o risco de generalizações apressadas.

Coerência, em um sentido amplo, significa justificação de uma proposição como um elemento de um conjunto de proposições internamente consistentes entre si2. No Direito, o dever de coerência pode ser derivado do caráter sistemático que se deve imprimir ao ordenamento jurídico. Conforme Eros Grau, “não se interpretam textos de direito, mas o direito, no seu todo”3. De outra parte, a própria norma da igualdade demanda coerência, na medida em que exige justificação para quaisquer tratamentos desiguais, assim entendidas as razões que demonstrem fundamentos jurídicos suficientes para tanto4.

Obviamente, não é adequado predicar a coerência como total ausência de antinomias em um sistema (dogma della coerenza), mas deve-se apenas reconhecer a validade jurídica do chamado argumento da coerência (argomento della coerenza)5. Contudo, também é necessário cuidar para que a busca pela interpretação coerente dos dispositivos do sistema jurídico não redunde em generalizações apressadas, que consubstanciam uma das falácias relativas ao contexto, verificadas sempre que proposições gerais são derivadas sem fundamentação suficiente6. Com efeito, deve-se deixar de lado a busca pela total abrangência (comprehensiveness) das proposições, para testar-se uma determinada posição em face de um subconjunto adequado de proposições7.

O desafio jurídico, no entanto, é estabelecer qual o subconjunto adequado de proposições contra o qual uma proposição jurídica deve ser testada. Trata-se do sistema jurídico como um todo? De um ramo do direito? De um tipo de normas?

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, recentemente, viu-se confrontada com questão dessa natureza, no julgamento do HC n. 399.109 (DJe 31.08.2018). Tratava-se de discussão acerca da interpretação adequada do tipo penal “deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos”, previsto no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990. Enquanto a Sexta Turma do Tribunal entendia que o tipo somente seria aplicável ao ICMS devido por substituição tributária, a Quinta Turma vinha julgando no sentido de que seria possível, em tese, a aplicação do tipo penal ao ICMS próprio, declarado e não recolhido.

A matéria em questão envolvia as relações e referências entre o Direito Penal e o Direito Tributário, o que demandou apreciação interdisciplinar8 dos Ministros da Terceira Seção do STJ, especializada em Direito Penal. Com efeito, todos os Ministros que formalizaram votos fizeram referência a conceitos dos dois ramos do Direito. De um lado, a Ministra Maria Thereza de Assis Moura (acompanhada pelos Ministros Jorge Mussi e Sebastião Reis Júnior), em seu voto vencido, assentou inexistir relação jurídica entre o consumidor final e o ente tributante, de modo que não se poderia falar em ICMS “cobrado” ou “descontado”, como exige o tipo penal. Nos termos do voto da Ministra, o “consumidor é, apenas, ‘contribuinte de fato’, conceito que, juridicamente, tem relevância unicamente para fins de repetição de indébito tributário (CTN, art. 166)”. Com isso, a Ministra concedia o habeas corpus, para absolver sumariamente os pacientes, por entender que o tipo penal do art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990 não poderia abranger o ICMS próprio, declarado e não recolhido.

Esse não foi, contudo, o sentido adotado pela maioria dos Ministros da Terceira Seção do STJ, que decidiu pela denegação da ordem, assentando-se na justificativa de que a repercussão econômica dos tributos indiretos autorizaria concluir-se que o ICMS próprio seria “cobrado” do consumidor para posterior “repasse” ao Estado. Nesse contexto, vale destacar os seguintes trechos do voto do Relator, Ministro Rogerio Schietti Cruz:

“praticamente todos os tributos de comércio sofrem a repercussão econômica (ISS, ICMS, IPI), pois de maneira lógica, no momento que o produtor efetuar a venda do produto, considerará o custo tributário no preço da mercadoria.

[...]

mesmo no caso do ICMS incidente sobre operações próprias, o produtor ‘cobra’ (é reembolsado pela retenção) do próximo adquirente do produto na cadeia de produção, até que o consumidor final, após sucessivas transferências de encargo, suporte o ônus de pagar o valor correspondente ao ICMS, que será acrescido ao valor final do produto.”

Alcançando a mesma conclusão, o Ministro Reynaldo Soares da Fonseca ressaltou o reconhecimento jurídico da repercussão do ICMS (presumidamente por conta da regra de não cumulatividade), afirmando que “o repasse do ICMS ao consumidor não se confunde com os demais custos fixos da atividade comercial, porquanto é a própria lei que estabelece mencionada transferência”. Nesse sentido, o Ministro buscou fundamentação para o reconhecimento da repercussão jurídica do ICMS na decisão do Supremo Tribunal Federal nos autos do RE n. 574.706 (DJ 02.10.2017) em que se firmou a tese de que “o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS”. Da fundamentação desse julgado, o Ministro colheu a premissa de que o ICMS não consubstancia receita da empresa vendedora, a qual, nas suas palavras, “apenas faz o intermédio no repasse do imposto efetivamente cobrado do consumidor, que deve ser diretamente repassado ao Estado”.

Percebe-se que, nesse julgado, houve transposição da premissa de repercussão jurídica do ICMS, do contexto de um julgado do STF em que se discutia a questão do conteúdo e alcance da norma constitucional que atribui competência à União para a instituição de contribuições sobre a “receita e o faturamento” (CF/1988, art. 195, I, “b”), para a discussão que diz respeito à regra de Direito Penal reconstruída a partir do art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990. Em uma primeira análise, a transposição em questão responde aos reclamos de coerência no Direito, já que, poder-se-ia argumentar, o mesmo peso e a mesma medida estão sendo utilizados para situações que possuem aspectos fáticos similares. No entanto, para se determinar se, de fato, trata-se do cumprimento do dever de coerência, ou reversamente, se se trata de uma generalização apressada, deve-se examinar se os diferentes subconjuntos normativos consubstanciariam contextos distintos, que não autorizariam aplicação indiscriminada da premissa em questão. Em outras palavras, deve-se se determinar se a ficção de repercussão jurídica dos tributos produz eficácia interpretativa indistintamente, com relação a normas de funções diferentes. Naturalmente, a resposta a essas questões, como quaisquer temas jurídicos, demanda justificação com base no próprio direito9.

Em face desse contexto, a questão específica a que visa responder este artigo consiste na indagação: é válida a aplicação indistinta da ficção de repercussão jurídica em matéria de competências tributárias e em questão de Direito Penal? Por trás dessa questão há uma pergunta de pesquisa mais ampla, que diz respeito à extensão da eficácia interpretativa da ficção de repercussão econômica dos tributos. Trata-se de questão que, a par de sua evidente relevância teórica, possui grande importância prática, uma vez que o Plenário do Supremo Tribunal Federal deve examinar a questão, conforme decisão monocrática do Ministro Luís Roberto Barroso no Recurso em Habeas Corpus n. 163.334 (DJ 13.02.2019). Nesta decisão, o ministro concedeu liminar para suspender a execução da pena contra os pacientes e determinou a apreciação da matéria pelo Plenário da Corte, fazendo referência a reportagem de jornal conforme a qual haveria 166.088 empresários a serem potencialmente processados pelo não recolhimento de ICMS apenas no Estado de São Paulo10.

Para responder a essas questões, este artigo iniciará por demonstrar a incorporação parcial, pelo Direito Tributário brasileiro, do pressuposto econômico de repercussão do tributo indireto, dando ensejo à chamada ficção de repercussão jurídica. Em seguida, examinar-se-á a natureza jurídica dessa norma, bem como a sua função, buscando-se bases para a identificação de sua eficácia interpretativa, conforme os ditames do Direito nacional. Nesse passo, a hipótese de pesquisa é que a eficácia interpretativa da ficção de repercussão jurídica dos tributos apresenta limites distintos conforme se trate de interpretação dos dispositivos a partir dos quais se reconstroem as: (i) normas com função imediata de resguardo de direitos fundamentais de liberdade, como a regra da não cumulatividade; e (ii) normas com função imediata de restrição de direitos fundamentais de liberdade.

1. Da repercussão econômica à repercussão jurídica

Os economistas estudam a chamada incidência econômica dos tributos (tax incidence). Trata-se de estudo que nada tem a ver com a incidência jurídica. Conforme Stiglitz, os economistas distinguem entre aqueles que suportam o peso da tributação (bear the burden) e aqueles que são cobrados pelo Estado11. O peso da tributação, nesse caso, é definido como o verdadeiro ônus econômico do tributo, sendo preferido o termo “incidência” em face de sua maior neutralidade12. Para os fins do presente trabalho, visando evitar confusão com termos jurídicos correntes, utilizar-se-á a expressão repercussão econômica para referir-se ao fenômeno econômico da falta de identidade entre o contribuinte e aquele que suporta o peso da tributação.

O estudo da repercussão econômica e da incidência econômica dos tributos é especialmente relevante para temas que podem informar a avaliação do Direito e sua modificação de lege ferenda, tais como: (i) as implicações da tributação relativamente à eficiência econômica ou como os tributos afetam o tamanho da torta econômica (economic pie)13; (ii) modelos de tributação ideal relativamente aos quais são testados os tributos reais14; (iii) os efeitos da tributação relativamente à oferta e à demanda de determinados bens e serviços em mercados competitivos e não competitivos15; (iv) as relações de equivalência entre dois tributos aparentemente distintos16; e (v) os efeitos da tributação sobre as escolhas dos contribuintes17.

É curioso notar que, em muitos estudos dessa natureza, são alcançadas conclusões altamente contraintuitivas da perspectiva leiga. Ao estudar os tributos locais, por exemplo, David Wildasin conclui que a sua carga econômica de impostos recairia, no longo prazo, sempre sobre os proprietários de recursos imóveis, pois estariam encurralados (traped) na localidade18. Relativamente à tributação da renda das empresas, economistas apontam que esta pode ser economicamente transladada não somente para os sócios, como, também, para empregados (por meio de salários menores) e para consumidores (por intermédio de preços maiores), a depender de uma série de fatores19.

Especificamente no tocante aos fatores que influenciam a repercussão econômica, ou não, de um tributo sobre o consumo, do contribuinte para outros agentes (consumidores, empregados, sócios etc.), Schoueri identifica uma série de fatores diferentes que influem nesse resultado. Trata-se de questões pertinentes ao tempo considerado, às características do tributo, às características do bem onerado e de suas trocas econômicas, ao regime econômico em questão, ao sujeito passivo da obrigação e à conjuntura econômica20. Combinando as diferentes possibilidades em relação a cada um desses fatores, o autor chega ao número de 566.231.040 diferentes situações de repercussão econômica, ou não, de um tributo21.

Em face dessa breve incursão nos estudos acerca da repercussão econômica dos tributos, pode-se perceber que a economia reconhece a possibilidade de os tributos serem arcados por sujeitos diferentes daqueles que compõem o polo passivo da obrigação tributária. No entanto, não há, de modo algum, uma relação de necessidade entre determinada espécie tributária e a repercussão do ônus econômico da tributação, motivo pelo qual se pode afirmar, inclusive, a impropriedade da classificação entre tributos diretos e indiretos baseada exclusivamente na repercussão econômica como dado necessário de certas espécies de tributos22.

Não obstante, o Direito Tributário brasileiro conferiu relevância jurídica para a repercussão econômica dos tributos em pelo menos duas hipóteses. Em primeiro lugar, o art. 166 do CTN limita a restituição dos “tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro” a quem “prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la”. Trata-se de um dispositivo severamente criticado e inquinado de inconstitucionalidade por parcela relevante da doutrina. Brandão Machado, nesse sentido, afirma que o “circunlóquio utilizado” pelo código não permite identificar os tributos a que se refere o art. 166, pois “todos os tributos comportam, por sua natureza (qualquer que seja ela), a transferência a terceiro do respectivo encargo financeiro”23.

A segunda instância em que o Direito Tributário brasileiro conferiu importância jurídica para a repercussão econômica dos tributos terá relevância para o estudo em tela, uma vez que fundamenta a ficção de que se pretende tratar. Trata-se da regra de não cumulatividade, que, a teor da Constituição, é obrigatória para o Imposto estadual sobre operações de Circulação de Mercadorias e Serviços de transporte intermunicipal e interestadual e comunicações – ICMS (CF/1988, art. 155, § 2º, I) e para o Imposto federal sobre Produtos Industrializados – IPI (CF/1988, art. 153, § 3º, II), sendo facultativa para as contribuições sobre receita (CF/1988, art. 195, § 12). A relevância dessa previsão normativa para o presente estudo decorre, de um lado, de seu assento constitucional. De outro lado, decorre da circunstância de ter ela sido referida como fundamento de um princípio geral da repercussão jurídica, consoante o qual o Direito Tributário prescreve que o ICMS (e os demais tributos não cumulativos) não deve ser suportado pelo seu contribuinte, mas por licença constitucional, deve onerar o consumidor final, ao qual o custo do tributo será repassado por meio do preço dos bens ou serviços adquiridos24.

Trata-se da juridicização parcial da repercussão econômica, uma vez que a existência da regra de não cumulatividade não garante que, necessariamente, o tributo será repercutido para os agentes subsequentes da cadeia. Como destaca Misabel Derzi, pode ser que o contribuinte adquira o produto a um preço tão favorecido que os tributos, embora destacados na respectiva nota fiscal, tenham sido arcados pelo fornecedor (transferência para trás ou shift backwards)25. Não obstante, não há dúvidas de que, ao garantir a não cumulatividade, o legislador parte do pressuposto de que o tributo será juridicamente transladado para o próximo agente na cadeia26.

As possíveis razões para que o legislador tenha adotado essa premissa são várias, dentre as quais se destacam os seguintes aspectos negativos associados à cumulatividade dos tributos incidentes em cadeias de produção de bens ou serviços: (i) indução da verticalização dos agentes econômicos; (ii) discriminação em favor dos maiores contribuintes, que consigam realizar mais etapas da produção de forma concentrada; (iii) inviabilização da efetiva desoneração das exportações, para realização do princípio do destino; (iv) discriminação dos produtos nacionais em relação aos estrangeiros, já que os primeiros serão submetidos a maior tributação por conta do efeito da cumulação; e (v) falta de transparência a respeito da carga tributária efetiva27. Percebe-se que grande parte das justificativas para a positivação da regra da não cumulatividade encontra assento, em última instância, no princípio da igualdade, que exige a neutralidade da tributação relativamente à quantidade de etapas em determinado ciclo produtivo28.

De toda sorte, independentemente dos motivos que tenham levado o constituinte à positivação das regras de não cumulatividade, impõe-se assumir que, ao fazê-lo, criou um pressuposto geral de repercussão jurídica. A eficácia interpretativa desse pressuposto, contudo, deve ser analisada conforme sua função sistemática, conforme se passa a demonstrar.

2. A natureza da repercussão jurídica e sua função

Acima restou assentado que o constituinte, ao positivar regras de não cumulatividade, partiu do pressuposto da possibilidade (e quiçá da probabilidade) de haver repercussão econômica de determinados tributos para os próximos agentes de cadeias econômicas de produção de bens (shift forward). Nesse ensejo, cumpre perquirir se, ao assim proceder, a Constituição teria incorporado um princípio implícito da repercussão legal obrigatória de determinados tributos, ou se, por outro lado, tratar-se-ia de mero pressuposto das regras de não cumulatividade, que poderia, ou não, justificar uma regra interpretativa consoante a qual se deveria considerar haver repercussão jurídica sempre que se tratasse de tributos não cumulativos.

Seguindo pela primeira linha, Ricardo Lobo Torres identifica um “princípio da repercussão legal obrigatória” do qual a não cumulatividade seria um subprincípio29. Para o autor, trata-se da exigência de que o ICMS repercuta sobre o contribuinte de fato, quem seja, o consumidor30. Em face desse cenário, seria possível definir o princípio da repercussão legal obrigatória como uma norma que exige a realização de um estado de coisas qualificado pela repercussão econômica dos tributos sobre o consumo ao consumidor final, conforme as possibilidades fáticas e normativas.

No entanto, deve-se reconhecer que a não cumulatividade não institui a possibilidade de repercussão econômica do ônus da tributação, que sempre existirá, em relação a qualquer tributo31. Com efeito, o que a norma busca fazer é evitar que a eventual repercussão econômica do tributo implique, em razão da existência de um número maior ou menor de agentes intermediários, modificação do ônus tributário final32. Trata-se, conforme referido acima, da concretização do princípio da igualdade entre contribuintes inseridos no contexto de cadeias de produção e contribuintes verticalizados, que concentram o que poderiam ser diversas etapas da produção.

Logo, o princípio em questão seria mais bem enunciado como uma norma que exige a realização de um estado de coisas qualificado pela neutralidade da repercussão econômica dos tributos sobre o consumo. Nessa acepção, no entanto, tem-se o princípio da não cumulatividade e não o princípio da repercussão legal obrigatória. Deve-se lembrar que um mesmo texto normativo pode dar ensejo a mais de uma norma. Como explica Guastini, quase todas as disposições dão ensejo à reconstrução não apenas de uma, mas de várias normas que convivem conjuntamente33. Nesse passo, seguindo a terminologia de Humberto Ávila34, pode-se falar em uma dimensão de regra da não cumulatividade e em uma dimensão de princípio da mesma. Enquanto a dimensão de regra determina o meio como a não cumulatividade deve ser perseguida (método de crédito destacado, método da subtração do crédito, método da subtração de vendas, método da adição etc.35), a dimensão de princípio determina a promoção de um estado ideal de coisas marcado pela neutralidade da repercussão econômica dos tributos sobre o consumo.

Logo, percebe-se que, seja considerando o princípio da não cumulatividade, conforme enunciado supra, seja-se considerando a regra da não cumulatividade, a repercussão econômica (convertida em jurídica) funciona como um pressuposto tomado em consideração pelo constituinte. Ao ser tomado por relevante pelo direito, no entanto, esse pressuposto é juridicizado, dando ensejo a uma verdadeira ficção de que, relativamente aos tributos aos quais se aplica a não cumulatividade, sempre haveria a repercussão econômica para as próximas etapas da cadeia, onerando-se o consumidor final.

Conforme Derzi, a repercussão jurídica no ICMS decorre da circunstância de a Constituição Federal atribuir créditos a todos os agentes de uma cadeia de produção e comercialização de mercadorias, com exceção do consumidor final, o que conduz à conclusão de que se atribui a este, idealmente, o ônus econômico do tributo36. Essa circunstância leva autores como Kirchoff a concluir que a tributação do consumo, diferentemente da tributação do patrimônio ou da renda, opera com a presunção da mensuração da capacidade contributiva do consumidor final37. Conforme André Mendes Moreira, a não cumulatividade é instituto que, se presente em uma exação, a qualifica como indireta, da perspectiva jurídica38.

Nesse ensejo, pode-se definir a repercussão jurídica dos tributos como a ficção eleita pelo constituinte ou legislador, como pressuposto para a instituição de normas sobre a não cumulatividade, conforme a qual sempre haveria a repercussão econômica para as próximas etapas da cadeia, onerando-se o consumidor final.

Fala-se em ficção, nesse caso, e não em presunção, por tratar-se de uma norma de direito material, e não de uma regra relativa à distribuição sobre o ônus de prova39. De maneira geral, pode-se falar em uma presunção como um movimento dialógico em que se faz uma asserção sem necessariamente oferecer fundamentos para tanto40. Sua estrutura é a seguinte: “se X, então está provado Y”41. No caso em tela, não se tem uma norma que diga respeito à prova da existência ou não de repercussão econômica, mas sim uma regra de direito material, que estende a todas as operações envolvendo determinados tributos não cumulativos, a consequência que seria aplicável apenas aos casos em que houvesse repercussão econômica, qual seja a não cumulatividade, como meio para alcançar a neutralidade. Nessa linha, encontra-se satisfeito o conceito de ficção enunciado por Schoueri como uma norma por meio da qual se determina a aplicabilidade, “a dada hipótese de incidência (fingierter Tatbestand, ou hipótese ficta), [de] determinadas sanções previamente definidas para outra situação (Fiktion basis, ou base da ficção)”42.

Nesse contexto, pode-se perceber que a repercussão jurídica corresponde a uma ficção que foi tomada como relevante pela Constituição e por leis ordinárias, relativamente à positivação de normas de não cumulatividade. Naturalmente, trata-se de uma generalização baseada no que ocorre na maior parte dos casos (repercussão econômica dos tributos indiretos), que dá ensejo a uma regra favorável aos contribuintes. É dizer, trata-se de um pressuposto considerado normativamente relevante para fins das normas da não cumulatividade, que consubstanciam normas de mitigação de encargo, definidas como aquelas que melhoram a situação jurídica dos destinatários, possuindo como função imediata o resguardo de direitos fundamentais de liberdade.

Nesse ensejo, é relevante, para o presente artigo, definir se, e em que medida, pode-se derivar dessa generalização efetuada pelo constituinte uma regra implícita conforme a qual sempre que houver não cumulatividade de um tributo, deve-se partir do pressuposto de que haverá repercussão econômica. Trata-se, nesse caso, da eficácia interpretativa da ficção de repercussão jurídica. É justamente esse o pressuposto da argumentação adotada pelo STJ, no referido HC n. 399.109, ao afirmar que o contribuinte do ICMS sempre repassaria o tributo ao adquirente da mercadoria, por meio do preço.

Para identificar a validade de uma norma implícita dessa natureza, contudo, deve-se tomar em consideração que a generalização na qual ela se baseia (de que sempre haveria repercussão econômica em relação a determinados tributos) surge no contexto da proteção do contribuinte em face dos efeitos anti-isonômicos da cumulatividade. De fato, a identificação da função de uma norma em relação ao sistema é essencial para delimitar o seu sentido e função eficacial, compreendida como sua função normativa, ou a forma que produz efeitos em relação a outras normas43. Desse modo, a compreensão da função normativa da regra de ficção de repercussão jurídica desempenhará papel fundamental no exame de sua eficácia interpretativa, que consubstancia o objeto deste artigo.

2.1. Análise da função da ficção de repercussão jurídica em face da regra de não cumulatividade

Quando se examina a ficção de repercussão jurídica em relação à própria regra da não cumulatividade, verifica-se que poderá haver casos em que, muito embora se aplique a não cumulatividade, não haja efetiva repercussão econômica do tributo. Trata-se da hipótese referida acima em que se adquire o produto a um preço tão favorecido que os tributos, embora destacados na respectiva nota fiscal, são arcados pelo fornecedor.

Nesse caso, poder-se-ia questionar se a demonstração da não veracidade da ficção de repercussão econômica, em um caso concreto, poderia conduzir à não aplicação da regra de não cumulatividade. Trata-se de situação que poderia ser reconstruída como um caso de sobreincludência da regra que estabelece a não cumulatividade, consistente em uma situação na qual a regra abarca número de casos maior do que o faria a aplicação direta de sua finalidade subjacente44. Com efeito, se a justificação da regra de não cumulatividade está na neutralidade das operações em que há repercussão jurídica do tributo, com fundamento ulterior no princípio da igualdade, resta claro que, pela aplicação direta da justificativa, não se conferiria direito a crédito em uma hipótese na qual não tivesse havido repercussão econômica do tributo.

Contudo, ao formular a regra da não cumulatividade, o constituinte, em relação ao ICMS e ao IPI, entrincheirou a generalização, de modo que, sempre que se verificar o antecedente da regra atributiva de crédito (aquisição de insumo, por exemplo), será aplicável o consequente, consistente no direito à tomada de créditos. Nesse ensejo, além da justificação de primeira ordem para a regra da não cumulatividade (promoção da neutralidade), o constituinte também teve em conta razões de segunda ordem, que justificam a edição de uma regra, em vez da simples aplicação direta da justificativa45. Dentre essas razões, exercem papel fundamental a previsibilidade e a eficiência.

De um lado, a previsibilidade é promovida por meio da positivação da regra da não cumulatividade, uma vez que se sabe que, sempre que forem adquiridas mercadorias para emprego na produção de outras mercadorias, ter-se-á o direito a crédito do IPI e ICMS, independentemente de complexas análises sobre a repercussão do tributo. É dizer, promove-se uma situação de calculabilidade, em que o contribuinte pode conhecer hoje, com alguma facilidade, as consequências jurídicas futuras de sua conduta46. Trata-se de uma exigência do princípio da segurança jurídica47. De outra parte, a regra da não cumulatividade promove a eficiência por meio da redução de custos de deliberação48, uma vez que seria impossível aferir, em cada caso concreto, se teria havido, ou não, repercussão econômica do tributo, para, somente em caso positivo, conferir-se o direito ao crédito. Consoante exposto acima, trata-se de uma ficção de repercussão jurídica e não de uma presunção, que diria respeito ao âmbito probatório.

Vê-se que eventual desconsideração da regra de não cumulatividade em um caso no qual se demonstrasse a sua sobreincludência faria ruir as próprias justificativas para que exista uma regra desse tipo, acabando com a generalização insculpida pelo ordenamento jurídico em favor dos contribuintes (com quebra de calculabilidade) e dando ensejo a possibilidades infinitas de multiplicação de conflitos (com quebra da eficiência)49.

Desse modo, conclui-se que a função da ficção de repercussão jurídica, relativamente à regra de não cumulatividade, consiste em conferir segurança jurídica e eficiência à realização do desiderato de que a tributação seja neutra em relação ao número de etapas envolvidas em uma cadeia produtiva. Trata-se, portanto, de função normativa atrelada à realização de direitos dos contribuintes que, por via reversa, implica limitações aos poderes do Estado, na exigência tributária.

3. A eficácia interpretativa da ficção de repercussão jurídica

Consoante exposto, a repercussão jurídica consiste na ficção levada em consideração pela Constituição ao positivar a regra e o princípio da não cumulatividade, segundo a qual os tributos não cumulativos sempre são repassados ao consumidor final. Nesse passo, deve-se perquirir se, a partir dessa ficção, seria possível reconstruir uma regra interpretativa implícita conforme a qual, sempre que se tratar de um tributo não cumulativo, deverá o intérprete adotar a premissa de que haverá repercussão econômica (juridicizada) do tributo. Para fins de simplificação, passar-se-á a referir a essa regra implícita como eficácia interpretativa da ficção de repercussão jurídica dos tributos.

Considerando-se a conclusão alcançada acima, no sentido de que a função da ficção de repercussão jurídica dos tributos está calcada na promoção da segurança jurídica e da eficiência do sistema, pela redução dos custos de decisão, verifica-se a necessidade de dissociar os contextos em que se poderia aplicar a eficácia interpretativa da ficção de repercussão jurídica conforme a função das normas que serão aplicadas, em relação aos direitos fundamentais.

De um lado, há normas cuja função imediata é a de resguardar direitos fundamentais de liberdade, como é o caso da regra da não cumulatividade. Consoante exposto, o fundamento da não cumulatividade está na neutralidade, que deriva da isonomia. Nesse passo, a função imediata dessa norma é a de resguardo da isonomia entre os contribuintes, consistente na proteção de uma situação tendente à realização desse ideal50. Obviamente, a regra da não cumulatividade também possui outras funções mediatas, como a obrigação do Estado de positivar regras que a promovam. Não se trata, no entanto, de sua função primordial, que deve ser aferida relativamente aos direitos fundamentais, mesmo porque o constitucionalismo moderno surge como proteção do indivíduo contra o Estado, feição esta atenuada, porém não eliminada pelo advento do Estado Social51.

De outro lado, há normas cuja função imediata não é a de resguardar direitos fundamentais de liberdade, mas, reversamente, de restringi-los. Conforme se verá abaixo, é esse o caso das normas penais, cuja função imediata é de restringir os direitos de liberdade de um indivíduo, em conformidade com os ditames do Estado de Direito. Naturalmente, a justificativa dessa norma está em sua função mediata de proteger a liberdade dos concidadãos, impedindo que a atuação de um indivíduo restrinja os direitos dos demais, ou protegendo determinados “bens jurídicos” contra eventuais lesões52. Não obstante, tomando-se por base o mesmo parâmetro utilizado acima, qual seja, os direitos fundamentais, que se aplicam aos indivíduos e não em favor do Estado, tem-se que a função imediata de normas dessa natureza é a de limitação de direitos fundamentais de liberdade.

Com base nessa distinção, passa-se a examinar a aplicabilidade da chamada eficácia interpretativa da ficção de repercussão jurídica dos tributos relativamente à aplicação das normas com função imediata de resguardo de direitos de liberdade, em primeiro lugar, e no tocante às normas com função imediata de limitação de direitos de liberdade, em segundo lugar.

3.1. Normas com função imediata de resguardo de direitos fundamentais de liberdade

Dentre as normas com função imediata de resguardo de direitos de liberdade, encontram-se: (i) as normas limitadoras da competência tributária dos entes públicos; e (ii) as normas que instituem imunidades tributárias.

Em primeiro lugar, as normas de competência tributária na Constituição Federal de 1988 existem para circunscrever o âmbito do exercício possível da percussão tributária pelos entes federados. Muito embora essas regras sejam constitutivas do poder de tributar que sem elas não existiria53, sua função em relação aos direitos fundamentais de liberdade é de resguardo. Como explica Ávila, a finalidade das regras constitucionais atributivas de competência tributária é de “limitar o poder dos entes federados mediante a demarcação do âmbito de poder e a determinação das condições do seu exercício”54. Com efeito, as competências tributárias poderiam ter sido instituídas de forma genérica, ou por meio de princípios, ou somente com a indicação dos sujeitos competentes e do procedimento, como fazem outros sistemas jurídicos55. No entanto, sua positivação por intermédio de regras com predeterminação de critérios materiais de validade denota sua função imediata de resguardar o âmbito dos direitos de liberdade e propriedade limitados pela tributação, conferindo segurança jurídica acerca dos aspectos que podem, e que não podem, ser alcançados pela tributação.

Em segundo, as normas de imunidade consubstanciam “exclusão da competência tributária em relação a certos bens, pessoas e fatos”56. Trata-se de normas instrumentais a outros direitos de liberdade, exercendo função de resguardo de situações em que a incidência tributária não prejudica o exercício das referidas liberdades. Por exemplo, a imunidade dos partidos políticos (CF/1988, art. 150, VI, “c”) visa resguardar o direito de participação política, corolário do princípio democrático (CF/1988, arts. 14 e seguintes). De forma similar, a imunidade dos templos de qualquer culto visa resguardar o direito de culto religioso (CF/1988, art. 5º, VI a VIII) contra interferência estatal por meio da tributação.

Relativamente aos dois tipos de normas aqui examinados, que possuem a função de resguardar determinadas situações que promovem a realização de direitos fundamentais de liberdade, verifica-se haver confluência de contextos com a situação na qual a Constituição Federal adotou a ficção de repercussão jurídica dos tributos. Com efeito, consoante demonstrado acima, o constituinte utilizou essa ficção como pressuposto para a positivação da regra de não cumulatividade, que, por sua vez, visa resguardar a neutralidade da percussão tributária sobre o consumo, realizando o direito à igualdade tributária (CF/1988, art. 150, II e art. 5º, caput). Logo, como as normas de competência e de imunidade tributária exercem a mesma função de resguardo de liberdades fundamentais da regra em relação à qual a Constituição erigiu a ficção de repercussão jurídica (não cumulatividade), a eficácia interpretativa dessa ficção pode a elas ser estendida. É dizer, a confluência de funções permite que a ficção de repercussão jurídica produza eficácia interpretativa com relação a outras normas que visam resguardar direitos de liberdade.

Em face dessa primeira conclusão, pode-se examinar, criticamente, a jurisprudência recente do Supremo Tribunal Federal em relação aos efeitos interpretativos da ficção de repercussão jurídica dos tributos não cumulativos, relativamente a regras de competência tributária e a regras de imunidade.

No tocante à competência tributária, a ficção de repercussão jurídica do ICMS parece ter sido relevante no RE n. 574.706 (DJ 02.10.2017) em que, conforme exposto supra, firmou-se o entendimento de que “o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS”. Examinando-se o julgado, percebe-se a adoção da seguinte argumentação:

i) os conceitos constitucionais de receita e faturamento englobam apenas os valores que se incorporam definitivamente ao patrimônio do contribuinte das contribuições;

ii) o ICMS destacado na Nota Fiscal e pago pelo adquirente da mercadoria ao vendedor, por meio do preço, não consubstancia ingresso que se incorpora definitivamente ao patrimônio do contribuinte (vendedor), pois será pago ao Estado;

iii) Logo, o ICMS destacado em nota não consubstancia receita ou faturamento do vendedor, motivo pelo qual não poderá compor a base de cálculo da Contribuição ao PIS e da COFINS.

Não cabe, considerando-se as limitações temáticas deste artigo, examinar a validade de cada uma dessas premissas. No entanto, o que importa destacar é que a premissa (ii), no sentido de que o ICMS destacado em nota não consubstancia ingresso permanente no patrimônio do contribuinte-vendedor, decorre da consideração da eficácia interpretativa da ficção de repercussão jurídica do ICMS. Com efeito, toma-se a existência da não cumulatividade do tributo como prova suficiente de que o valor correspondente está sendo repercutido ao adquirente, por meio do preço, de modo que o ingresso respectivo não consubstancia valor que se incorpora ao patrimônio do vendedor, mas sim mero reembolso ou recurso que ali transita para pagamento ao Estado.

Essa argumentação resta clara do voto proferido pelo então Ministro Cezar Peluso no RE n. 240.785/MG, em trecho incorporado ao voto do Ministro Celso de Mello no RE n. 574.706/PR, em que se afirmou que “se destaca o valor do ICMS para efeito de controle da transferência para o patrimônio público, sem que isso se incorpore ao patrimônio do contribuinte”. Na mesma linha, importa ressaltar que a ementa do último julgado fez referências expressas à regra de não cumulatividade como fundamento normativo para a eficácia interpretativa da ficção de repercussão jurídica do ICMS, ao afirmar que

“O regime da não cumulatividade impõe concluir, conquanto se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, não se incluir todo ele na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal. O ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da COFINS.”

Nesse contexto, resta claro que a ficção de repercussão jurídica do ICMS foi aplicada para fins da análise da norma que atribui competência à União para instituir contribuições sobre o faturamento e a receita (CF/1988, art. 195, I, “b”). Conforme as premissas fixadas neste estudo, trata-se da correta aplicação dessa ficção, uma vez que a norma que atribui competência tributária, assim como a norma que obriga à não cumulatividade, tem função de resguardo de direitos de liberdade. É dizer, trata-se de aplicação da ficção para a mesma função para a qual ela foi pressuposta pelo constituinte.

O mesmo não se pode dizer, no entanto, da rejeição da eficácia interpretativa da ficção de repercussão jurídica dos tributos não cumulativos em casos envolvendo análises de normas de imunidade. Conforme exposto acima, trata-se de regras que visam ao resguardo de direitos fundamentais de liberdade, motivo pelo qual seria adequado empregar, na sua interpretação e aplicação, a ficção de repercussão jurídica dos tributos não cumulativos. No entanto, na análise da imunidade das instituições de assistência social, que visa concretizar os direitos sociais previstos no art. 6º da CF/1988, o Supremo Tribunal Federal vem rejeitando a relevância interpretativa dessa ficção. Trata-se de casos em que a entidade de assistência social funciona como adquirente de produtos, de modo que a ficção em questão atestaria que ela arca com o ônus econômico do ICMS, muito embora o vendedor figure como contribuinte. Contudo, ao analisar essas situações, o STF vem afirmando que a imunidade se restringe ao contribuinte de direito, do que decorre a irrelevância da repercussão jurídica do tributo à entidade imune. Veja-se, nesse sentido, o seguinte julgado, proferido em sede de repercussão geral:

“Imunidade do art. 150, VI, c, CF. Entidade beneficente de assistência social. ICMS. Aquisição de insumos e produtos no mercado interno na qualidade de contribuinte de fato. Beneplácito reconhecido ao contribuinte de direito. Repercussão econômica. Irrelevância. [...]

A imunidade tributária subjetiva aplica-se a seus beneficiários na posição de contribuinte de direito, mas não na de simples contribuinte de fato, sendo irrelevante para a verificação da existência do beneplácito constitucional a repercussão econômica do tributo envolvido.” (RE n. 608.872, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 23.02.2017, DJe 27.09.2017, Tema 342)57

Nota-se que, nesse julgado, o STF deixa de considerar a eficácia interpretativa da ficção de repercussão jurídica do ICMS, muito embora trata-se de caso adequado para tanto, uma vez que, a exemplo da regra da não cumulatividade, a regra de imunidade tem por função resguardar direitos de liberdade. Ao rejeitar a eficácia interpretativa da referida ficção no caso em tela, o Tribunal, além de criar uma contradição com o julgado anteriormente analisado, atinente à base de cálculo da Contribuição ao PIS e da COFINS, também institui contradição em relação aos julgados da mesma Corte em que esta sindica a aplicabilidade da imunidade quando a entidade imune adquire mercadorias do exterior, funcionando, portanto, como contribuinte de direito do ICMS-Importação58.

Percebe-se, desse modo, que a desconsideração de ineficácia interpretativa da ficção de repercussão jurídica dos tributos não cumulativos, quando da análise das regras que conferem imunidades subjetivas, implica, também, incoerência com a jurisprudência do próprio Tribunal, vez que não há sentido em discriminar aquisições internas de aquisições por importação, considerando-se as finalidades das normas em questão.

Em síntese, pode-se concluir que a ficção de repercussão jurídica dos tributos deve ser aplicada, produzindo efeitos interpretativos, relativamente à interpretação e aplicação das normas cuja função seja a de resguardar direitos fundamentais de liberdade, como ocorre no caso das normas constitucionais de competência tributária e de imunidade tributária.

3.2. Normas com função imediata de restrição de direitos fundamentais de liberdade

Por outro lado, a ficção de repercussão jurídica dos tributos indiretos não produz eficácia interpretativa relativamente a normas cuja função seja a de limitar direitos fundamentais de liberdade, por dois motivos.

Primeiramente, a “importação” da referida ficção para o contexto das regras limitadoras de direitos fundamentais implica sua retirada de contexto59. É como se se dissesse que o movimento do cavalo deve ser aplicado ao jogo de damas. Contudo, o cavalo não tem sentido fora do jogo de xadrez. Logo, caso se quisesse inventar um novo jogo com as peças de dama e o cavalo, seria necessário justificar a função desse último em relação às demais peças. É o mesmo que ocorre em relação à importação da ficção de repercussão jurídica para o contexto das normas limitadoras de direitos fundamentais. A justificativa que suporta a referida ficção em seu campo original de produção de eficácia deixa de ser aplicável (pois não se trata mais de garantir o exercício dos direitos de liberdade), de modo que outras justificativas normativas teriam que ser apontadas para a referida ficção.

Em segundo, não cabe o argumento da coerência para justificar a aplicação indistinta da ficção de repercussão jurídica dos tributos relativamente às regras de resguardo e de limitação de liberdades, na forma do adágio popular “o pau que dá em Chico dá em Francisco”. De um lado, a aplicação do princípio da igualdade demanda a consideração das finalidades perseguidas60, de modo que a ficção que se justifica para expandir direitos, aceitando-se eventual sobreincludência favorável aos administrados, não se aplica para restringi-los, levando-se a potencial sobreincludência desfavorável aos administrados. De outro, não se pode perder de vista que a relação entre o Estado fazedor e aplicador das leis e o particular não é simétrica e parelha. Com efeito, o particular está em potencial posição de submissão em face do Estado, motivo pelo qual a Constituição visa resguardar diversos direitos de liberdade. Desse modo, estender a aplicação de uma ficção pressuposta para o resguardo desses direitos de liberdade à sua restrição implicaria subversão da própria função do sistema jurídico, na parte em que visa resguardar liberdades individuais.

Essa conclusão é reforçada tanto pela função dos direitos fundamentais, como pela hierarquização axiológica levada a efeito pela Constituição de 1988.

Conforme explica Schauer, os direitos representam exigências de maior nível de justificação para que determinado interesse estatal possa vir a infringir a liberdade do indivíduo61. Nesse passo, o autor utiliza a metáfora dos direitos como uma armadura, que protege o cidadão dos ataques do Estado62. Enquanto armadura argumentativa, os direitos impedem que determinados argumentos que podem ser usados contra o Estado (que não veste a armadura de direitos) sejam empregados contra o contribuinte. Dentre esses argumentos bloqueados pela armadura de direitos está, justamente, a eficácia interpretativa da ficção de repercussão jurídica dos tributos, cuja função é de resguardo aos direitos de liberdade, cuja titularidade é sempre do particular e nunca do Estado.

Além disso, a Constituição Federal de 1988 confere clara prevalência axiológica aos direitos individuais, a justificar a sua eficácia de bloqueio em relação a investidas argumentativas do Estado, sem que este último possa contar com as mesmas proteções. Com efeito, os “os direitos e garantias individuais” previstos na Constituição não podem ser abolidos sequer por meio de emenda constitucional (art. 60, § 4º, IV). Dentre todos os interesses e posições direta ou indiretamente protegidos pela Constituição, ao lado do direito de voto, da forma federativa e da separação de poderes, apenas os direitos individuais mereceram especial proteção do constituinte em relação à atividade do constituinte reformador, a demonstrar a sua clara prevalência. Outrossim, em relação aos direitos e garantias individuais previstos no art. 5º da CF/1988, previu-se a cláusula de recepção de direitos previstos de forma implícita pela Constituição ou por meio de tratados firmados pelo Brasil (§§ 2º e 3º). É dizer, o constituinte preocupou-se em expressamente determinar a sua tendência valorativa à prevalência dos direitos e garantias individuais, ao estabelecer a permeabilidade do sistema a novos direitos, o que não fez em relação a qualquer outro interesse, especialmente os estatais.

Nesse contexto, seja pela função da ficção de repercussão dos tributos, pela função dos direitos fundamentais, ou pela hierarquização axiológica empreendida pela CF/1988, conclui-se ser incabível a aplicação da eficácia interpretativa da repercussão jurídica dos tributos, levada a efeito pelo STJ no HC n. 399.109. Conforme exposto supra, o Tribunal aplicou a ficção de que o contribuinte do ICMS sempre repassa o valor do tributo ao adquirente na interpretação do dispositivo de lei penal previsto no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990, conduzindo ao entendimento de que o não recolhimento do ICMS próprio implicaria apropriação indébita de valor “descontado ou cobrado” em favor do ente público. No entanto, só se estaria diante da prática, em tese, desse delito, caso verificado o elemento essencial do tipo “cobrar em nome de terceiro”, o que, conforme exposto, nem sempre ocorre no tocante à tributação, dependendo de milhares de fatores de mercado. Logo, somente a ficção de repercussão jurídica poderia justificar a decisão da Terceira Seção do STJ, que parece ter assumido que o tributo sempre é repassado. No entanto, conforme se buscou demonstrar, a ficção de repercussão jurídica dos tributos não cumulativos é desprovida de eficácia interpretativa em se tratando de dispositivos imediatamente limitadores de direitos fundamentais de liberdade, como é o caso de normas penais. Dessa forma, deveria ter prevalecido o voto da divergência aberta pela Ministra Maria Thereza de Assis Moura assentado na inexistência de relação jurídica entre o consumidor final e o ente tributante, não se podendo falar em ICMS “cobrado” ou “descontado”, como exige o tipo penal.

Em conclusão, tem-se que o reconhecimento da possibilidade do emprego da ficção de repercussão jurídica dos tributos indiretos relativamente à interpretação e à aplicação de normas cuja função imediata seja a de resguardo de direitos fundamentais de liberdade (como é o caso das normas de competência tributária e das normas de imunidades tributárias) não autoriza a sua aplicação no tocante a normas com função imediata de limitação dos referidos direitos (como são as normas penais). Com efeito, trata-se de uma ficção eleita como relevante pelo sistema jurídico para fins de proteção de âmbitos de liberdade particular em face do Estado, conforme a Constituição, que não pode ser estendida para a expansão do poder do Estado sobre o indivíduo, apesar da Constituição.

4. Conclusões

Em face do quanto exposto, pode-se concluir que:

1. A repercussão jurídica dos tributos consiste na ficção eleita pelo constituinte ou legislador, como pressuposto para a instituição de normas sobre a não cumulatividade, conforme a qual sempre haveria a repercussão econômica para as próximas etapas da cadeia, onerando-se o consumidor final.

2. A função da ficção de repercussão jurídica, relativamente à regra de não cumulatividade, consiste em conferir segurança jurídica e eficiência à realização do desiderato de que a tributação seja neutra em relação ao número de etapas envolvidas em uma cadeia produtiva. Trata-se, portanto, de função normativa atrelada à realização de direitos dos contribuintes que, por via reversa, implica limitações aos poderes do Estado, na exigência tributária.

3. A ficção de repercussão jurídica dos tributos produz eficácia interpretativa relativamente à interpretação e aplicação das normas cuja função seja a de resguardar direitos fundamentais de liberdade, como ocorre no caso das normas constitucionais de competência tributária e de imunidade tributária. Como as normas de competência e de imunidade tributária exercem a mesma função de resguardo de liberdades fundamentais da regra em relação à qual a Constituição erigiu a ficção de repercussão jurídica (não cumulatividade), a eficácia interpretativa dessa ficção pode a elas ser estendida.

4. Contudo, a ficção de repercussão jurídica dos tributos indiretos é desprovida de eficácia interpretativa relativamente a normas cuja função seja a de limitar direitos fundamentais de liberdade. Primeiramente, a “importação” da referida ficção para o contexto das regras limitadoras de direitos fundamentais implica sua retirada de contexto, deixando de ser aplicável a sua justificativa original. Em segundo, estender a aplicação de uma ficção pressuposta para o resguardo desses direitos de liberdade à sua restrição implicaria subversão da própria função do sistema jurídico, na parte em que visa resguardar liberdades individuais. Os direitos fundamentais consubstanciam armaduras dos cidadãos contra argumentos do Estado, não funcionando em sentido contrário. Outrossim, a Constituição de 1988 demonstra clara prevalência axiológica dos direitos individuais em face do estado.

5. A ficção de repercussão econômica dos tributos foi eleita como relevante pelo sistema jurídico para fins de proteção de âmbitos de liberdade particular em face do Estado, conforme a Constituição, que não pode ser estendida para a expansão do poder do Estado sobre o indivíduo, apesar da Constituição.

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1 WITTGENSTEIN, Ludwig. Philosophical investigations. Tra. G. E. M. Anscombe. 2. ed. Oxford: Blackwell, 1997, p. 50, § 129.

2 HAGE, Jaap. Anything goes. An apology for parallel distributed legal science. Maastricht European Private Law Institute, Working Paper no. 2016/02, p. 3.

3 GRAU, Eros. Por que tenho medo dos juízes (a interpretação/aplicação do direito e os princípios). São Paulo: Malheiros, 2014, p. 84.

4 ÁVILA, Humberto. Teoria da igualdade tributária. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 157.

5 CHIASSONI, Pierluigi. Tecnica dell’interpretazione giuridica. Il Mulino, 2007, p. 105.

6 KELLEY, David. The art of reasoning. 3. ed. New York: W.W. Norton & Company, 1998, p. 114.

7 HAGE, Jaap. Three kinds of coherentism. In: ARASZKIEWICZ, M.; e ŠAVELKA, J. (ed.). Coherence: insights from philosophy, jurisprudence and artificial intelligence. Law and Philosophy Library v. 107. Dordrecht: Springer, 2013, p. 19.

8 Cf. BARRETO, Paulo Ayres. Planejamento tributário. Limites normativos. São Paulo: Noeses, 2016, p. 29 e ss.

9 ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da fundamentação jurídica. Trad. de Zilda Hutchinson Schild Silva. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 210.

10 Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/12/governo-de-sp-quer-criminalizar-divida-de-icms-de-16-mil-empresarios.shtmlhttps://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/12/governo-de-sp-quer-criminalizar-divida-de-icms-de-16-mil-empresarios.shtml>. Acesso em: 28 jul. 2019.

11 STIGLITZ, Joseph. Economics of the public sector. 3. ed. New York: W.W. Norton & Company, 1999, p. 482.

12 Ibidem, p. 483.

13 GRUBER, Jonathan. Public finance and public policy. New York: Worth Publishers, 2011, p. 590.

14 JAMES, Kathryn. The rise of the value-added tax. Cambridge: Cambridge University Press, 2015, p. 81 e ss.

15 STIGLITZ, Joseph. Economics of the public sector. 3. ed. New York: W.W. Norton & Company, 1999, p. 514.

16 Ibidem.

17 BRACEWELL-MILNES, Barry. A liberal tax policy: tax neutrality and freedom of choice. British Tax Review v. 110, 1976, p. 110-121, p. 110.

18 WILDASIN, David E. Fiscal competition. In: WITTMAN, Donald A.; e WEINGAST, Barry R. The Oxford handbook of political economy. Oxford: Oxford University Press, 2008.

19 MUSGRAVE, Richard A.; e MUSGRAVE, Peggy B. Finanças públicas. Teoria e prática. Rio de Janeiro: Campus e São Paulo: EDUSP, 1980, p. 248.

20 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 62-63.

21 Ibidem, p. 63.

22 VEGA, Mauricio Alfredo Plazas. La classificación de los impuestos en directos e indirectos y el derecho tributario comunitário. In: UCKMAR, Victor (org.). Corso di diritto tributario internazionale. 2. ed. Padova: CEDAM, 2002, p. 998-999.

23 MACHADO, Brandão. Repetição do indébito no direito tributário. In: MACHADO, Brandão (coord.). Direito tributário. Estudos em homenagem ao Prof. Ruy Barbosa Nogueira. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 82.

24 DERZI, Misabel Abreu Machado. Distorções do princípio da não-cumulatividade no ICMS – comparação com o IVA europeu. In: COÊLHO, Sacha Calmon Navarro et. al. (coord.). Temas de direito tributário: I Congresso Nacional da Associação Brasileira de Direito Tributário. Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p. 117.

25 Ibidem, p. 118.

26 Ibidem.

27 DERZI, Misabel Abreu Machado; e MOREIRA, André Mendes. A tributação sobre o valor acrescido e os impostos sobre o consumo no Brasil: influências externas. In: BARRETO, Aires Fernandino (coord.). Direito tributário contemporâneo. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 538-539.

28 TERVOORT, Terence. Interpretation methods of the CJEU and the meaning of the principle of fiscal neutrality: a commentary on the Case C-366/12 Klinikum Dortmund. World Journal of VAT/GST Law v. 4, n. 2, 2015, p. 116.

29 TORRES, Ricardo Lobo. O princípio da não-cumulatividade e o IVA no direito comparado. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Série Pesquisa Tributárias n. 10. São Paulo: RT, 2004, p. 163.

30 Ibidem.

31 DERZI, Misabel Abreu Machado. Distorções do princípio da não-cumulatividade no ICMS – comparação com o IVA europeu. In: COÊLHO, Sacha Calmon Navarro et. al. (coord.). Temas de direito tributário: I Congresso Nacional da Associação Brasileira de Direito Tributário. Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p. 118.

32 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Repetição do indébito: incoerências e contradições. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 90.

33 GUASTINI, Riccardo. Interpretare e argomentare. Milano: Giuffrè, 2011, p. 65-66.

34 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 167-168.

35 SCHENK, Alan; e OLDMAN, Oliver. Value added tax: a comparative approach. Cambridge: Cambridge University Press, 2007, p. 38-46.

36 DERZI, Misabel Abreu Machado. Distorções do princípio da não-cumulatividade no ICMS – comparação com o IVA europeu. In: COÊLHO, Sacha Calmon Navarro et. al. (coord.). Temas de direito tributário: I Congresso Nacional da Associação Brasileira de Direito Tributário. Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p. 116-117.

37 KIRCHHOF, Paul. Tributação no Estado constitucional. Trad. de Pedro Adamy. São Paulo: Quartier Latin, 2016, p. 36.

38 MOREIRA, André Mendes. A não-cumulatividade dos tributos. 3. ed. São Paulo: Noeses, 2018, p. 12.

39 SCHOUERI, Luís Eduardo. Distribuição disfarçada de lucros. São Paulo: Dialética, 1996, p. 113.

40 WALTON, Douglas. Burden of proof, presumption and argumentation. New York: University of Cambridge, 2014, p. 21.

41 ÁVILA, Humberto. Teoria da prova: standards de prova e os critérios de solidez da inferência probatória. Revista de Processo ano 43, v. 282. São Paulo: RT, ago. 2018, p. 134.

42 SCHOUERI, Luís Eduardo. Distribuição disfarçada de lucros. São Paulo: Dialética, 1996, p. 104.

43 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2016, p. 651.

44 SCHAUER, Frederick. Playing by the rules – a philosophical examination of rule-based decision-making in law and in life. Oxford: Clarendon, 1991 (reprinted 2002), p. 32.

45 Ibidem, p. 94.

46 GOMETZ, Gianmarco. La certezza giuridica come prevedibilità. Torino: G. Giappichelli, 2005, p. 216.

47 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2016, p. 286.

48 SCHAUER, Frederick. Playing by the rules – a philosophical examination of rule-based decision-making in law and in life. Oxford: Clarendon, 1991 (reprinted 2002), p. 145.

49 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 142-146.

50 FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Direito constitucional. Liberdade de fumar, privacidade, Estado, direitos humanos e outros temas. São Paulo: Manole, 2007, p. 252.

51 AARNIO, Aulis. Essays on the doctrinal study of law. Heidelberg: Springer, 2011, p. 117-118.

52 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal. Parte Geral 1. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 83.

53 BELTRÁN, Jordi Ferrer. Las normas de competencia: un aspecto de la dinámica jurídica. Madrid: Boletín Oficial del Estado/Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2000, p. 147.

54 ÁVILA, Humberto. Competências tributárias: um ensaio sobre a sua compatibilidade com as noções de tipo e conceito. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 25.

55 ÁVILA, Humberto. Competências tributárias: um ensaio sobre a sua compatibilidade com as noções de tipo e conceito. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 22.

56 BARRETO, Aires F.; e BARRETO, Paulo Ayres. Imunidades tributárias: limitações constitucionais ao poder de tributar. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2001, p. 11.

57 No mesmo sentido: “A imunidade prevista no art. 150, VI, c, do Diploma Maior, a impedir a instituição de impostos sobre patrimônio, renda ou serviços das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, está umbilicalmente ligada ao contribuinte de direito, não abarcando o contribuinte de fato.” (RE n. 491.574 AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 21.08.2012, DJe 06.09.2012)

58 “Na tributação das operações de importação, o contribuinte por excelência do tributo é o importador (que tende a ser o adquirente da mercadoria) e não o vendedor. Há confusão entre as figuras do contribuinte de direito e do contribuinte de fato. Assim, não faz sentido argumentar que a imunidade tributária não se aplica à entidade beneficente de assistência social nas operações de importação, em razão de a regra constitucional não se prestar à proteção de terceiros que arquem com o ônus da tributação.” (AI n. 476.664 AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 06.04.2010, DJe 07.05.2010)

“Tributário. ICMS. Imunidade. Operações de importação de mercadoria realizada por entidade de assistência social. [...] A jurisprudência da Corte é no sentido de que a imunidade prevista no art. 150, VI, c, da CF abrange o ICMS incidente sobre a importação de mercadorias utilizadas na prestação de seus serviços específicos.” (AI n. 669.257 AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 17.03.2009, DJe 17.04.2009)

59 Cf. WITTGENSTEIN, Ludwig. Philosophical investigations. Tra. G. E. M. Anscombe. 2. ed. Oxford: Blackwell, 1997, p. 79, § 194.

60 ÁVILA, Humberto. Teoria da igualdade tributária. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 30.

61 SCHAUER, Frederick. A comment on the structure of rights. Georgia Law Review v. 27, 1992, p. 415, p. 430.

62 Ibidem, p. 429.