Normas Antielisivas e Segurança Jurídica: Análise da Jurisprudência do CARF sobre a Tributação na Segregação de Atividades Empresariais

Anti-avoidance Rules and Legal Certainty: Analysis of CARF’s Jurisprudence on Taxation in the Segregation of Business Activities

Carlos Augusto Daniel Neto

Doutor em Direito Tributário pela USP. Mestre em Direito Tributário pela PUC-SP. Ex-Conselheiro Titular da 1ª e 3ª Seções do CARF. Professor da Pós-graduação do IBDT. Advogado. E-mail: carlos.daniel@ddtax.com.br.

Thais De Laurentiis

Conselheira titular da 3ª Seção do CARF. Árbitra do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA). Doutoranda e Mestre em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da USP, este último parcialmente cursado no Institut d’Études Politiques de Paris (SciencesPo). Especialista em Direito Tributário pelo IBET. Professora de Direito Tributário e Aduaneiro. E-mail: thaisdelaurentiis@gmail.com.

Recebido em: 16-08-2019

Aprovado em: 22-10-2019

Resumo

O presente trabalho irá analisar a relação entre a utilização de regras específicas e gerais antielisivas e a segurança jurídica do contribuinte, tendo como pano de fundo o exame de decisões proferidas no âmbito do CARF acerca da cobrança do PIS/COFINS monofásico e do IPI em situações nas quais ocorreu a segregação das atividades empresariais. Com isso pretende-se demonstrar que, no panorama atual, a presença de uma norma específica antielisiva, que deveria ser um instrumento de proteção da segurança jurídica nas ações contra o planejamento tributário, foi subvertida em fonte de incerteza para o contribuinte, em razão da interpretação que o CARF tem lhe dado nesses casos.

Palavras-chave: CARF, segregação de atividades empresariais, normas específica antielisiva, segurança jurídica, planejamento tributário.

Abstract

This paper will analyze the relationship between the use of specific and general anti-avoidance rules and the taxpayer’s legal certainty, against the background of CARF’s decisions on single-phase PIS/COFINS and IPI in cases in which the segregation of business activities occurred. Thus, it is intended to demonstrate that, in the current scenario, the presence of a specific anti-avoidance rule, which should be an instrument of protection of legal certainty in the actions against tax planning, has been subverted in sources of uncertainty for the taxpayer, due to the interpretation that CARF has given in those cases.

Keywords: CARF, segregation of business activities, specific anti-avoidance rule, legal certainty, tax planning.

1. Introdução

O presente estudo propõe uma análise da jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) acerca da tributação pela Contribuição ao PIS e a COFINS, na modalidade monofásica, bem como pelo IPI, sobre operações efetuadas por empresas que optam por segregar suas atividades de industrialização e comercialização em pessoas jurídicas distintas.

Para tanto, será feito um exame qualitativo e quantitativo das decisões levantadas. Ademais, basear-nos-emos na diferenciação entre regra geral antielisiva (“general antiavoidance rule” – GAAR) e regra específica antielisiva (“special antiavoidance rule” – SAAR), para avaliar a forma como as regras existentes no sistema tributário influenciam a oponibilidade ou não da segregação de atividades perante o Fisco.

Assim será possível apresentar um interessante panorama sobre como se desenvolveu o contencioso administrativo tributário sobre o tema, levando-se em conta que enquanto na seara da Contribuição ao PIS e da COFINS monofásicas a lei não traz nenhuma norma específica antielisiva sobre a matéria, a legislação relativa ao IPI o faz de diversas formas.

2. O contexto normativo da incidência tributária na segregação de atividades

2.1. A monofasia da contribuição ao PIS e da COFINS

Como é consabido, a contribuição ao PIS e da COFINS são contribuições sociais, especificamente da subespécie das contribuições destinadas à seguridade social que, incidindo sobre a receita ou o faturamento das sociedades empresárias (art. 195, inciso I, alínea “b”, da Constituição), podem se submeter seja à sistemática cumulativa (Lei n. 9.784/1999), seja a não cumulativa (art. 195, § 2º, da Constituição e Leis n. 10.637/2002 e n. 10.833/2003).

Dentro desse cenário, especificamente os produtos de perfumaria, toucador, higiene e farmacêuticos, com o advento da Lei n. 10.147/2000, passaram a ser tributados pela Contribuição ao PIS e pela COFINS na modalidade monofásica, incidindo uma única vez no fabricante ou importador e desonerando a receita da venda desses produtos nos distribuidores e varejistas.

Tal regime diferenciado de tributação volta-se para os setores da economia que envolvem produtos de alto valor agregado, compreendendo, entre outros, o de combustíveis, máquinas e veículos, bebidas, medicamentos.

Cumpre relembrar o contexto em que se insere a disciplina tributária contida na Lei n. 10.147/2000.

Como mencionado, a citada lei veio instaurar o regime monofásico de tributação para alguns produtos. No âmbito desse regime especial, a lei elege os elos da cadeia produtiva que sofrerão a tributação em alíquotas diferenciadas, superiores às alíquotas gerais, de forma a concentrar o recolhimento do tributo sobre um universo menor de contribuintes, desonerando os demais pela utilização da alíquota zero. Em outras palavras, a incidência monofásica tem por objetivo concentrar a incidência tributária, de modo que são aplicadas aos produtores ou importadores alíquotas diferenciadas, superiores às básicas, enquanto os demais (atacadistas e varejistas) não recolhem tributo algum.

Vale destacar que a incidência monofásica não se confunde com o instituto da substituição tributária, uma vez que nesta última as receitas estão obrigatoriamente sujeitas ao regime cumulativo, o que não acontece na primeira. Dessa forma, mesmo dentro da sistemática monofásica, os produtos sujeitos às alíquotas diferenciadas poderão estar enquadrados no regime cumulativo ou não cumulativo, de acordo com a tributação da pessoa jurídica (lucro presumido ou real, respectivamente). Ou seja, a incidência monofásica não é necessariamente exceção à aplicação do regime não cumulativo e, consequentemente, ao desconto de créditos inerente à essa modalidade de tributação1.

Para os produtos de perfumaria, higiene e toucador a legislação impôs a alíquota de 12,5% sobre as receitas dos industriais/fabricantes, enquanto que no setor de farmacêuticos a alíquota foi estipulada no patamar de 12%. Esses valores são efetivamente mais elevados do que aqueles que incidem como regra geral, na sistemática da não cumulatividade da Contribuição ao PIS e da COFINS, totalizando 9,25% de alíquota.

2.2. A (não) equiparação do estabelecimento comercial ao industrial para
fins do IPI

Para as mesmas empresas que se submetem à tributação da Contribuição ao PIS e da COFINS na modalidade monofásica, também é imposta a tributação pelo Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), incidente sobre as saídas das mercadorias dos seus estabelecimentos, tudo nos moldes dos arts. 153, inciso IV, da Constituição, 46 a 51 do CTN e do Regulamento do IPI (Decreto n. 7.212/2010 – RIPI/2010).

Importante nesse pronto lembrar que, mesmo na ausência da atividade de industrialização propriamente dita, é possível que determinadas sociedades sejam tributadas pelo IPI na condição de estabelecimentos equiparados a industriais. É o que permite o art. 51, inciso III, do CTN, o qual é sempre objeto de regulamentação, seja por lei ordinária, seja por decretos.

Tendo isso em vista, três marcos legais são importantes para o tema da incidência do IPI no setor de perfumaria, higiene e toucador, quais sejam: (i) a Lei n. 7.798/1989, que promoveu a equiparação desses estabelecimentos comerciais ao industrial; (ii) o Decreto n. 1.217/1994, que, alterando a regra anterior, determinou que o estabelecimento atacadista/varejista que revende produtos de perfumaria, higiene e toucador não é equiparado a industrial; (iii) o Decreto n. 8.393/2015 que, retomando a diretriz da Lei n. 7.798/1989, novamente impôs a equiparação dos citados estabelecimentos comerciais aos industrial.

Isso quer dizer que, durante o período de 1994 a 2015, os atacadistas e varejistas de produtos de perfumaria, higiene e toucador ficaram dispensados da recolher o IPI sobre suas atividades. Contudo, sempre houve a imposição legal para que o industrial pagasse o IPI nesses setores da economia.

2.3. A organização logística das empresas dos setores e o planejamento tributário

Nos específicos setores de industrialização e comercialização de produtos farmacêuticos, perfumaria, higiene e toucador é comum observarmos a organização das grandes empresas que ali operam da seguinte forma: ao invés de trabalharem de forma vertical, concentrando suas atividades de industrialização e comercialização dos produtos em uma única pessoa jurídica, é feita uma segregação de operações (o conhecido “split de operações”) em duas pessoas jurídicas distintas.

Enquanto a primeira trabalha unicamente como indústria, a segunda pessoa jurídica, comprando os produtos da sua empresa relacionada industrial, tem como objeto social a revenda desses mesmos produtos no mercado.

Tal formatação deve-se tanto à logística de suas operações, como também à melhor utilização do regime tributário descrito nos itens anteriores. Em outras palavras, fazendo uso da liberdade negocial que possuem, as empresas em questão organizam-se para aproveitarem ao máximo a sua estrutura empresarial e tributária2.

Afinal, sendo a saída dos produtos dos estabelecimentos industriais gravada por uma alta tributação – já que incide uma alíquota diferenciada da contribuição do PIS e da COFINS monofásica, bem como necessariamente o IPI segundo as regras do valor tributável mínimo (sobre a qual discorreremos com vagas nos tópicos abaixo) –, é mais vantajoso que essa operação tenha uma base de cálculo diminuta. Desse modo, a agregação de valor fica postergada para a operação subsequente (venda da pessoa jurídica comercial), sobre a qual as Contribuições Sociais possuem alíquota zero e o IPI, no período de 1994 a 2015, nem mesmo incidia.

Observando esse arranjo societário, a Fiscalização muitas vezes entende que o contribuinte está utilizando de formas ilícitas para se livrar da tributação, ao erodir a base de cálculo das operações praticadas pela indústria. Também em razão da existência de operações entre partes vinculadas, as autoridades fiscais entendem por vezes que as regras relativas ao VTM, para fins de IPI, estão sendo mal utilizadas pelos contribuintes. Daí advém o contencioso administrativo fiscal sobre o tema que pretendemos examinar.

Antes de avançarmos para a análise da jurisprudência administrativa sobre o tema, é preciso antes considerar a legislação de regência das duas situações, mormente as regras voltadas à anulação dos efeitos tributários da segregação de atividades. Como passo necessário, entretanto, é preciso também tratar do grau de liberdade do Estado para regular os efeitos tributários dessas operações.

3. O regramento da liberdade da segregação de atividades para fins tributários

O Estado Fiscal, em sua feição contemporânea, se assenta sobre sociedades abertas, nas quais a liberdade e a propriedade privada são pilares dos direitos de personalidade e da autodeterminação, e busca atingir, por meio dos tributos, o resultado econômico dessa autonomia3.

A atividade tributária, mormente no ordenamento jurídico brasileiro, que se destaca por ser especialmente analítico em disposições sobre a matéria no âmbito da Constituição, consagrando a regra de estrita legalidade tributária4 (tanto na criação e aumento quanto na redução de tributos), encontra suas balizas não apenas na identificação de realidades concretas que reflitam capacidade econômica (fatos que denotem conteúdo economicamente mensurável), mas também na determinação das hipóteses de incidência tributárias estabelecidas por meio de lei – em outras palavras, a Carta Magna não autoriza a tributação direta das riquezas, senão por meio da lei, sempre alinhada materialmente com as competências tributárias5.

Naturalmente, o estabelecimento de hipóteses tributárias, por meio de regras gerais e abstratas, esbarra na inevitável emergência de lacunas: espaços não abrangidos pela hipótese de incidência tributária, mas que englobam fatos jurídicos dotados de conteúdo econômico similar àqueles tributados. Isso pode se dar, tanto de forma voluntária e consciente, como por descuido na redação, mas sempre pela pena do legislador6, e, em ambos os casos, os contribuintes buscam utilizar-se desses loopholes para planejar seus negócios de modo a economizar tributos.

A discussão sobre a forma de eliminar essas lacunas existentes perpassa o conflito entre a segurança jurídica (que prescreve a adstringência ao conteúdo legal, pelo grau de determinação que o Direito deve ter) e a igualdade (pela demanda de que conteúdos econômicos similares sejam tributados de forma equânime).

Mais das vezes, esse confronto principiológico traz à baila o debate acerca da aceitabilidade ou não da analogia gravosa no âmbito tributário (a analogia que tem como efeito ampliar o alcance da hipótese de incidência tributária)7 – debate este que foi apercebido por Ruy Barbosa Nogueira ainda em fase inicial na doutrina alemã8.

Esse debate acerca da permissão ou não da utilização da analogia para tributação de determinadas situações é o pilar subjacente às teorias atuais sobre combate ao abuso de formas jurídicas no âmbito tributário e a pesquisa da substância econômica dos negócios jurídicos (substance over form doctrines): todas elas seriam, ao cabo, meios de mascarar a utilização de raciocínios analógicos na aplicação das regras tributárias9, sob diversas roupagens distintas na tentativa de se estabelecer uma preponderância da igualdade sobre a segurança em matéria tributária, tributando-se conteúdos econômicos similares com lei, sem lei, ou, por vezes, apesar da lei.

Entretanto, a própria temática da admissibilidade da analogia gravosa em matéria fiscal, e, portanto, também os meios de combate ao planejamento tributário, não são uma questão de metódica de interpretação, mas sim de direito positivo, de índole constitucional10.

Daí decorre a dificuldade de apropriação de conclusões hauridas em ordenamentos estrangeiros, para o Brasil. Ora, apenas em razão da inexistência de dispositivos específicos no ordenamento alemão, pôde o aplicador ponderar entre os princípios da segurança jurídica e da capacidade contributiva, reconhecendo a preponderância deste nos casos em que se estivesse perante situações de abuso11.

A despeito da atratividade do raciocínio principiológico desenvolvido pelos alemães, ele não resiste ao confronto com o texto constitucional brasileiro, onde há uma clara preponderância do formalismo em matéria tributária. Senão vejamos.

Como aponta Luís Eduardo Schoueri, o princípio da capacidade contributiva não tem um caráter positivo, como fundamento autônomo para a incidência tributária, mas serve apenas de parâmetro de graduação das cargas tributárias. Por outro lado, o constituinte repartiu as competências tributárias e deixou um conjunto de situações fáticas não abarcadas, efetuando o fechamento horizontal da repartição de poderes entre os entes federados por meio da competência residual (art. 154, I, da Constituição de 1988)12.

Nessa relação entre a capacidade contributiva e a repartição de competências, a legalidade tributária, no direito brasileiro, se torna condição sine qua non para a incidência tributária, estabelecida pelo ordenamento constitucional em seu art. 150, I, da CF/1988, e garantia do contribuinte de que será tributado de acordo com aquilo que foi consentido através de um sistema de representação política13, consolidando-se sobre a solidariedade social e a capacidade contributiva em razão da assunção de um modelo formal, com ênfase na segurança jurídica, na estrutura do sistema tributário brasileiro14.

Em outras palavras, diferentemente da Alemanha e de outros países europeus, a Constituição de 1988 fez uma escolha expressa pela segurança em detrimento da igualdade, em matéria tributária, consubstanciada na exigência da estrita legalidade, não restando margem para ponderação desses princípios diante da aplicação de regras tributárias a casos concretos que se encontrem fora do alcance das hipóteses de incidência.

Nesse sentido, a legalidade e a constitucionalização das regras tributárias (por meio da discriminação rígida e exaustiva de competências) são as formas mais eloquentes de compromisso do Estado com a segurança jurídica15.

Em razão da exigência de estrita legalidade na instituição de tributos, o emprego da analogia (às vezes travestido de outros nomes) para o combate da elisão fiscal acaba por ser substituído pela única forma de preenchimento das lacunas autorizada pela Constituição Brasileira: as normas antielisivas16, necessariamente veiculadas por meio de lei, que visam estabelecer limites ao planejamento tributário, consolidando uma dissociação entre a validade prática de atos e negócios perante as regras de Direito Privado da validade em relação às regras de Direito Tributário17.

3.1. Planejamento tributário: regra geral antielisiva (“general anti-avoidance rule” – GAAR) e regra específica antielisiva (“special anti-avoidance rule” – SAAR)

Na esteira do que foi dito acima, as regras antielisivas são voltadas ao fechamento de espaços de liberdade do contribuinte existentes nas dobras da legislação (loopholes). Trata-se, portanto, da manifestação expressa do legislador para situações de choque entre a liberdade do contribuinte e o interesse arrecadatório do Estado, tutelando-o juridicamente por meio dessas normas18 – a solução legislativa para a questão do planejamento.

Elas podem ser de duas espécies distintas: as regras gerais antielisivas (general anti-avoidance rule – GAAR) e as regras específicas antielisivas (special anti-avoidance rule – SAAR). A despeito de se destinarem à mesma finalidade de atacar atos de elisão fiscal, são normas que apresentam características e alcances bem distintos entre si.

As GAAR são previsões legislativas – sujeitas à reserva de lei – que têm em comum um pressuposto fático consistente em um instrumento de elisão formulado em termos genéricos, de modo a abarcar uma série de situações relativas aos diversos tributos do sistema19. Trata-se, portanto, de uma regra voltada a desqualificar um negócio jurídico lícito, anulando o tratamento fiscal distinto entre ele e outra operação tributada, considerando-se seu resultado econômico ou a substância econômica da operação20.

O exemplo histórico original é o art. 6º do RAO/1919 (Código Tributário Alemão), que vedava a utilização do abuso de formas (Missbrauch von Formen) para fraudar ou diminuir a obrigação tributária21. Cumpre ressaltar, entretanto, que a presença de normas gerais antielisivas é um fenômeno global, estando presente também em países como Espanha (art. 15 da Ley General Tributaria), Portugal (art. 38, n. 2, da Lei Geral Tributária) e França (art. 1.741 do Code Général des Impôts). Incluem-se também, entre as regras gerais antielisivas, aquelas desenvolvidas pela jurisprudência dos países de common law, como o business purpose test, nos Estados Unidos.

Em todas elas, o mecanismo legal se repete, de modo a requalificar as formas ou estruturas jurídicas utilizadas de modo a configurá-las de maneira adequada à finalidade econômica da operação, promovendo um tratamento igualitário a todos os sujeitos que realizarem a mesma materialidade econômica, ainda que por modos diversos.

A GAAR atribui à autoridade administrativa esse poder de requalificar as operações, a partir de uma hipótese de aplicação aberta e com baixo grau de determinação, com a finalidade de permitir a flexibilidade da sua aplicação para diversas situações tributárias passíveis de ocorrência22 – opera, pois, de forma paradoxal em relação à segurança jurídica que deve operar nas relações jurídicas de natureza tributária, em prol da igualdade de imposição com base na capacidade econômica manifestada pelos contribuintes. A sua indeterminação é necessária para que tenha a elasticidade suficiente para atingir grande número de casos concretos, que não poderiam ser atingidos por regras com hipóteses de incidência taxativas e com elevado grau de definição, como as regras específicas antielisivas23.

As SAARs, por outro lado, são regras especiais, ad hoc, estruturadas com base em um pressuposto fático rígido, detalhado e taxativo24, com a finalidade de evitar a elisão fiscal eliminando de forma objetiva determinada lacuna verificada no ordenamento tributário.

Ao invés de atribuir poderes para a Administração Fiscal requalificar atos e negócios jurídicos, a SAAR opera de maneira distinta: utiliza-se de ficções ou presunções relativas ao fato gerador ou à base de cálculo do tributo, como forma de eliminar a vantagem fiscal que decorria da lacuna existente preteritamente25. Não há, na sua aplicação, margem de discricionariedade ou avaliação do aplicador, mas verdadeira vinculação.

São exemplos de regras específicas antielisivas, no Brasil, aquelas relativas ao regime de preços de transferência, como forma de restringir a dedutibilidade de despesas contraídas com partes relacionadas, ou mesmo as regras de subcapitalização, para restringir a dedutibilidade de juros pagos a partes relacionadas, em especial àquelas situadas em paraísos fiscais. As regras antielisivas são uma prática comum a praticamente todos os tributos no Brasil, para o fechamento das lacunas existentes na legislação.

Sustenta Coêlho que a possibilidade de regras específicas antielisivas encontra amparo, no Brasil, no art. 109 do CTN26, que autoriza o legislador a criar presunções para atribuir a um fato jurídico o mesmo efeito tributário de outros27. Elas são, na lição de Alberto Xavier, o meio de tipificação a posteriori, por lei, de certos atos ou negócios jurídicos que a experiência revelou serem utilizados como forma anteriormente não prevista em lei de obter resultados equivalentes aos dos atos tributados28.

Diferentemente da GAAR, gerais e indeterminadas, o seu grau de taxatividade e determinação permite que se estruturem como verdadeiras “regras de correção”, aprimorando o alcance da incidência tributária, sem prejuízo à segurança jurídica dos contribuintes29. Elas são utilizadas sempre posteriormente à constatação, pela fiscalização de um campo aberto à elisão, através da alteração do direito positivo visando fechar aquela lacuna específica30.

O grau de determinação das regras específicas é tamanho a ponto de Molina sustentar que a ficção ou presunção estabelecida pela lei pode ser utilizada como uma norma de cobertura para a estruturação de outra forma de planejamento tributário, em outras palavras, a SAAR pode se tornar a plataforma de identificação de outras lacunas no sistema tributário, passíveis de aproveitamento pelos contribuintes31.

Essas duas espécies de regras antielisivas, por suas diferentes estruturas, apresentam regimes jurídicos próprios. Comparando-as, pode-se afirmar que as SAARs são aplicáveis apenas às hipóteses delimitadas taxativamente pelo legislador – o que permitiria a adoção de novas estratégias pelo contribuinte –, ao passo que a GAAR, pela sua indeterminação, possui aplicação mais ampla e não predeterminada.

Mais do que isso, Novoa aponta que as cláusulas específicas trazem uma inversão do ônus probatório32, estabelecendo uma situação a priori mais onerosa para o contribuinte, e transferindo para ele a carga de provar que sua situação está fora do alcance da referida regra. Por outro lado, na utilização das cláusulas gerais, o aplicador assume o ônus de comprovar a presença dos elementos de semelhança entre a operação realizada pelo contribuinte e aquela para a qual pretende realizar a requalificação.

Há que se pontuarem também as diferenças entre essas duas espécies de regras antielisivas no que pertine aos seus limites interpretativos.

Em razão do elevado grau de determinação das SAARs, ao dependerem de presunções e ficções elaboradas para atingir situações bastante específicas, essas normas não são passíveis de uma interpretação que ultrapasse a sua literalidade, visando ampliar o seu alcance33. Por outro lado, da indeterminação e generalidade das GAARs decorre a possibilidade de ampliação do seu alcance por meio da interpretação do aplicador, de modo a abranger todas as situações em que haja igualdade de manifestações econômicas passíveis de tratamento tributário análogo.

A doutrina, de modo geral, tem ponderado que ambas as espécies de regras antielisivas possuem vantagens e desvantagens, de modo que o ideal é que o sistema jurídico combine a utilização de uma GAAR com outras SAARs, visando estabelecer um instrumento amplo de combate ao planejamento tributário, ao passo que garante certo grau de segurança jurídica ao contribuinte em suas operações, permitindo-lhe antever o resultado estabelecido pela regra específica.

Essa coexistência, entretanto, não é sempre pacífica. Muitos países que possuem tanto GAAR quanto SAAR se depararam com a questão do escopo material delas e eventual superposição entre eles. Em outras palavras, questiona-se se diante de uma situação normatizada por meio de uma SAAR, seria possível a aplicação conjunta ou alternativa da GAAR34.

Zimmer menciona que essa questão foi recentemente debatida na Alemanha, após decisão do Bundesfinanzhof (BFH) que determinou que a regra geral não pudesse ser aplicada às situações abrangidas pela regra especial, aplicando a regra da lex specialis derogat legi generali35. Nessa mesma linha, De Broe e Luts defendem que as regras gerais só deveriam ser aplicadas aos casos de comportamentos abusivos que estejam completamente fora das regras específicas, de forma subsidiária36.

Em sentido contrário, os comentários da OCDE ao art. 1º da Convenção Modelo dão a entender que tanto a GAAR quanto a SAAR podem afetar as mesmas situações jurídicas, como se verifica no § 9.6, verbis:

“the potential application of general anti-abuse provisions does not mean that there is no need for the inclusion, in tax conventions, of specific provisions aimed at preventing particular forms of tax avoidance. Where specific avoidance techniques have been identified or where the use of such techniques is especially problematic, it will often be useful to add to the Convention provisions that focus directly on the relevant avoidance strategy”37.

Também contrária à aplicação da lex specialis, Carlos Palao Taboada aduz que a relação entre a GAAR e a SAAR não seria a mesma existente entre uma norma geral e especial, pois esta não seria um caso específico daquela, isto é, a hipótese da GAAR não inclui em seu bojo o pressuposto fático da SAAR, sendo, em rigor, regras independentes dotadas de condições de aplicação distintas38. Desse modo, a relação entre essas regras não estaria sujeita à máxima da lex specialis derogat legi generali.

Concordamos com a crítica de Taboada, mas sem que isso implique reconhecermos a possibilidade de aplicação conjunta das duas regras.

Ora, as regras antielisivas são uma medida excepcional do legislador para tentar colmatar lacunas no sistema tributário. Uma vez que uma regra específica foi elaborada para determinada situação, o legislador determina de forma clara o conjunto de fatos, atos ou negócios que pretende trazer para o âmbito da tributação, mas, da mesma forma, dá maior certeza sobre aqueles que estarão fora do alcance da norma tributária. Não há, pois, âmbito lacunoso a demandar aplicação da GAAR, pois para aquele conjunto de casos que continuaram fora da tributação, é de se reconhecer a diretiva expressa da legislação pela sua exclusão, pela forma particularista com a qual o ponto foi tratado.

Pois bem, feitas essas considerações sobre o regime jurídico das regras gerais e específicas antielisivas, podemos passar à análise da legislação que pretendemos empreender.

3.2. A (in)existência de norma antielisiva específica para a segregação de atividades

Analisando especificamente os casos de split de operações, objeto deste estudo, é preciso ressaltar a existência de uma disparidade de tratamento legislativo entre eles. Explicamos.

Abordando primeiramente o IPI, há que se frisar que o CTN, em seu art. 47, II, estabeleceu que a base de cálculo do IPI, no caso de saída de estabelecimento industrial ou importador, seria o valor da operação ou, na falta desse valor, o preço corrente da mercadoria, ou sua similar, no mercado atacadista da praça do remetente.

Havia, à época, grande preocupação com a segregação de atividades entre os atacadistas e industriais, como abordado anteriormente, e os efeitos dessa operação sobre a base tributável do IPI, em especial nas operações entre partes com determinado grau de relação, nas quais não haveria como evitar um controle artificial do preço de saída da indústria.

Para combater essa lacuna específica, criou-se na Lei n. 4.502/1964 a definição de firmas interdependentes (atualmente consolidado no art. 612 do RIPI/201039), e se estabeleceu a regra do valor tributável mínimo (VTM), disposta atualmente no art. 195 do RIPI/2010, verbis:

“Art. 195. O valor tributável não poderá ser inferior:

I – ao preço corrente no mercado atacadista da praça do remetente quando o produto for destinado a outro estabelecimento do próprio remetente ou a estabelecimento de firma com a qual mantenha relação de interdependência;”

Esse dispositivo tem a função de estabelecer uma base de cálculo ficta para as operações entre firmas interdependentes, evitando a erosão da base tributável do IPI pela prática de preços abaixo do mercado na transação entre industrial e atacadista relacionados. Trata-se, nesse ponto, de uma regra antielisiva específica (SAAR) semelhante àquela utilizada na sistemática de preços de transferência, para IRPJ40.

Essa regra do art. 195, I, do RIPI/2010, entretanto, só possui aplicabilidade nos casos em que há um mercado atacadista na praça41 do remetente – essa foi a situação escolhida pelo legislador para ser praticado o preço de atacado na saída da indústria –, hipótese em que há que se apurar a média ponderada dos preços do produto no mês antecedente à saída do estabelecimento remetente, conforme metodologia do art. 196, caput, do RIPI/201042.

Caso inexista preço corrente no mercado atacadista da praça do remetente, o art. 196, parágrafo único, do RIPI/2010, estabelece parâmetros para a apuração da base de cálculo, levando-se em conta o valor aduaneiro ou a cesta de custos, despesas e lucro normal. Já na hipótese de inexistir mercado atacadista na praça do remetente, o VTM será apurado com base no art. 195, III, do RIPI/2010, utilizando-se como base uma cesta de elementos objetivamente traçados pelo legislador, quais sejam, custos de produção, outras despesas e margem de lucro normal43.

A referida SAAR abarca, portanto, todas as possibilidades de arranjos circunstanciais, dando tratamento específico para cada uma delas, visando assim estabelecer uma base de cálculo ficta para a operação de saída sujeita a IPI.

Além da regra de VTM, a Lei n. 7.798/1989 traz outra regra específica antielisiva, baseada na equiparação dos estabelecimentos atacadistas a industriais, em seu art. 7º44, para determinados produtos listados em um anexo desta lei (relacionados aos setores mais propensos a esse tipo de planejamento tributário) – vide item 2.2. Desse modo, mesmo que haja uma base reduzida na saída do industrial, haverá nova incidência do IPI na saída do estabelecimento atacadista para o varejo, cobrando o tributo sobre o valor de mercado dos bens.

Em relação ao PIS/COFINS monofásico, entretanto, a situação legislativa é bem distinta. Conquanto esse tributo esteja sujeito aos efeitos do split de operações, reduzindo-se a base tributável da saída do estabelecimento industrial – erodindo a base de cálculo das contribuições, vide item 2.3 –, e sujeitando-se à alíquota zero nas demais etapas, não existe atualmente regra antielisiva específica para esses tributos.

A Medida Provisória n. 497/2010 introduziu, em seu art. 22, uma regra antielisiva específica semelhante à do art. 7º da Lei n. 7.798/1989. Destacamos o seu teor:

“Art. 22. Equipara-se a produtor ou fabricante, para efeitos da incidência da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS, a pessoa jurídica comercial atacadista que adquirir, de pessoa jurídica com a qual mantenha relação de interdependência, produtos por esta produzidos, fabricados ou importados e que estejam relacionados no § 1º e § 1º-A do art. 2º da Lei nº 10.833, de 2003.”

Essa introdução legislativa foi feita, conforme a Exposição de Motivos que acompanhou a MP, em razão de algumas pessoas jurídicas que produzem ou fabricam produtos sujeitos à incidência concentrada da PIS/COFINS “venderem sua produção para comerciais atacadistas, controladas ou coligadas, com preços subfaturados, erodindo a base de cálculo das contribuições”. Assim, o dispositivo, ao equiparar as pessoas jurídicas comerciais atacadistas aos produtores, teria o condão de eliminar a possibilidade desse planejamento tributário.

Entretanto, na conversão da MP n. 497/2010 na Lei n. 12.350/2010, o Poder Legislativo entendeu por não recepcionar o referido dispositivo, que perdeu sua força normativa. Houve, portanto, uma rejeição expressa à regra específica antielisiva, permanecendo aberta ao contribuinte a possibilidade de segregar suas operações, com efetiva redução no montante de PIS/COFINS monofásico pago na cadeia.

Como podemos ver, apesar de se tratar de uma operação que afeta diversos tributos (IPI, PIS e COFINS), o split foi objeto de regra específica antielisiva apenas relativa ao IPI, sendo rejeitada expressamente a regra estabelecida para as contribuições sociais, pela não conversão da mesma em lei, pelo Congresso Nacional.

Quanto à existência de uma regra geral antielisiva no ordenamento brasileiro, de forma bastante breve, entendemos que a Lei Complementar n. 104/2001, ao inserir o parágrafo único do art. 116 do CTN45, que autorizou a desconsideração de atos ou negócios praticados com a finalidade de “dissimular a ocorrência do fato gerador”, estabeleceu verdadeiro GAAR nacional: a utilização da expressão “dissimular” não foi feita no sentido típico do Direito Privado, mas em um sentido mais amplo, para atingir atos praticados com finalidade de elisão e combater os planejamentos tributários praticados com abuso de forma ou de direito, como disposto na Exposição de Motivos dessa lei.

Apesar disso, o referido dispositivo padece de ineficácia técnica, por exigir, na sua aplicação, a observância de procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária, que até o presente momento não foi aprovada46. A tentativa de regulamentá-lo por meio da Medida Provisória n. 66/2002 foi rejeitada pelo Congresso, restando completamente obstada a propagação dos efeitos jurídicos da GAAR brasileira, enquanto não editada a norma regulamentadora47.

A despeito disso, a posição que vem prevalecendo no âmbito do CARF é no sentido de que parágrafo único do art. 166 já está regulamentado pelo Decreto n. 70.235/1972, que foi recepcionado pela Constituição de 1988 com força de lei ordinária – muito embora o dispositivo regulamentador ter sido editado trinta anos antes do dispositivo regulamentado –, com base no “dever fundamental de pagar tributos, o princípio da capacidade contributiva e o valor de repúdio a práticas abusivas” (v. Acórdão CSRF n. 9101-003.447).

Pois bem, tais circunstâncias possuem consequências práticas relevantes, à luz do que foi dito acima acerca do regime jurídico das GAARs e SAARs, quais sejam: (i) a existência de SAAR para o IPI (VTM) elimina as lacunas existentes, e permite que o contribuinte utilize esse regramento para organizar suas operações; (ii) outros arranjos operacionais vantajosos, construídos à partir da regra de VTM, não poderão ser contestados com base em GAAR, pois essa lacuna já fora tratada de forma específica pelo legislador, restringindo o alcance de regras gerais; (iii) a regra específica antielisiva do IPI não pode ser interpretada extensiva ou analogicamente, por se tratar de uma hipótese de incidência fechada e restrita; (iv) em relação ao PIS/COFINS, a operação poderia ser confrontada à luz da GAAR, pela inexistência de regra específica (com nossa ressalva quanto a (in)eficácia do art. 116, parágrafo único, do CTN); (v) tanto no caso do IPI quanto do PIS/COFINS, a operação poderia ser confrontada nas hipóteses de simulação, dolo ou fraude, com fundamento no art. 149 do CTN.

À luz dessas conclusões de ordem teórica, podemos passar ao exame da jurisprudência administrativa a respeito da matéria.

4. A jurisprudência do CARF sobre o tema

Assentadas as premissas acima – com relação à tributação pela contribuição ao PIS/COFINS monofásicas e pelo IPI sobre os setores de produtos farmacêuticos, de perfumaria, higiene e toucador; bem como sobre a regra geral antielisiva e regra específica antielisiva, tanto no plano teórico como especificamente na legislação dos citados tributos – vejamos as decisões do CARF sobre o tema.

4.1. No âmbito da contribuição ao PIS e da COFINS monofásicas

Com relação à Contribuição ao PIS e da COFINS monofásicas, podemos destacar os seguintes julgados:

Acórdão

Data

Resultado

Composição

1

203-13.027

01.07.2008

Dado provimento ao recurso voluntário

Unanimidade

2

3402-001.908

26.09.2012

Dado provimento ao recurso voluntário

Maioria

3

3403-002.519

22.10.2013

Dado provimento ao recurso voluntário

Maioria

4

3403-002.854

26.03.2014

Negado provimento ao recurso de ofício

Unanimidade

5

3401-003.266

29.09.2016

Negado provimento ao recurso de ofício

Unanimidade

6

1402-002.337

05.10.2016

Dado provimento ao recurso voluntário

Unanimidade

7

3201-003.930

20.06.2018

Negado provimento ao recurso voluntário

Maioria

8

3201-004.699

29.01.2019

Negado provimento ao recurso voluntário

Maioria

O primeiro ponto a ser analisado são os fatos apontados pela Fiscalização como determinantes para entender que o planejamento tributário (split de operações) utilizado pelos contribuintes é abusivo, o que culmina na afirmação fazendária de que a pessoa jurídica comercial deve ser desconsiderada, fazendo incidir as contribuições não sobre o valor que as mercadorias são vendidas pela PJ indústria à PJ comercial, mas sim sobre a montante praticado nas vendas por essa última aos seus consumidores.

Normalmente as autuações fiscais afirmam: a PJ comercial não possui funcionários; tem único fornecedor e revendedor; possui os mesmos dirigentes e mesmo domicílio fiscal da PJ industrial; a empresa industrial não possui autonomia empresarial, de produção, de comercialização, de gestão e políticas ou preços praticados; a segregação de atividades foi feita com a única finalidade de diminuir a carga tributária; existe uma alta diferença de preço na revenda pelo atacadista; também uma alta diferença de lucratividade entre as empresas; verifica-se uma falta de lógica empresarial na separação de atividades; há subfaturamento apenas nos produtos do regime monofásico; o preço da venda da industrial a terceiros é muito superior do que aquele praticado com a atacadista coligada; constata-se uma ausência de margem de lucro; redução da receita bruta da industrial; além de ausência de propósito negocial; pode-se notar uma desproporção entre as vendas para a comercial e as vendas para os demais clientes; uma empresa financia a outra; dentre outros.

Diante desses elementos fáticos, a fiscalização imputa a existência seja de simulação por parte das sociedades (Acórdãos n. 203-13.027, n. 3201-003.930, n. 3402-001.908, n. 3403-002.519), planejamento tributário abusivo (n. 3403-002.854 e n. 3201-004.699), ausência de propósito negocial (n. 1402-002.337) e/ou subfaturamento (n. 3401-003.266)48.

Nos casos sob estudo, a apreciação destes elementos de fato e de direito pelo CARF, até 2016, era finalizada no cancelamento das autuações fiscais, e os motivos que levavam a esse posicionamento por parte Conselho eram diversos.

Com efeito. Eram alçados desde argumentos mais formalistas, como a necessidade de prevalência do princípio da legalidade (n. 3402-001.908)49, ao entendimento baseado em política fiscal (Acórdão n. 3403-002.519)50. Também informações fáticas, que afastavam per se o intuito abusivo da empresa autuada, foram levadas em consideração, como a opção do grupo empresarial pela segregação de atividades em pessoas jurídicas industrial e comercial ser anterior à legislação que instituiu a monofasia das contribuições sociais (Acórdãos n. 3403-002.854 e n. 3401-003.266). Paralelamente, a questão concorrencial não passou despercebida pelo CARF no Acórdão n. 1402-002.337, oportunidade em que se levou em consideração que a segregação de atividades é prática comum nos mercados analisados, de modo que haveria desvantagem competitiva se a empresa atuada não se movimentasse nesse sentido.

Outrossim, em diversas oportunidades, o fato de inexistir norma específica antielisiva (SAAR) para o PIS/COFINS monofásico levou os conselheiros a aceitarem a segregação de atividades perpetrada pelos contribuintes (Acórdão n. 203-13.027, n. 3401-003.266 e n. 1402-002.337).

A partir de 2018, contudo, observamos que os julgamentos a respeito da matéria tiveram um destino diferente, uma vez que o CARF, por meio dos Acórdãos n. 3201-003.930 e n. 3201-004.699 manteve os lançamentos tributários sobre a matéria.

Este fato chama a atenção porque um dos casos julgados (Acórdão n. 3201-003.930) tinha como parte interessada a mesma empresa que já havia tido sua operação anteriormente analisada e chancelada pelo CARF (Acórdão n. 3403-002.519).

Apesar dessa mudança no resultado do julgamento, não é tão simples falar em alteração de jurisprudência do CARF sobre o tema. Isto porque, analisando detidamente os Acórdãos n. 3403-002.519 e n. 3201-003.930, podemos afirmar que em grande medida a questão paira na motivação do auto de infração e das provas apresentadas dos autos.

Com efeito, o nível de detalhamento dos fatos, bem como a precisão no momento qualificar juridicamente a conduta do contribuinte pela fiscalização foi muito maior nesse segundo momento (Acórdão n. 3201-003.930), o que pode explicar o novo resultado do julgamento pelo CARF, o qual em nenhum momento afirmou que o split de operações per se é considerado como inválido. Não por outra razão, inclusive, no julgamento anterior (Acórdão n. 3403-002.519) o relator falou expressamente em erro de motivação no lançamento tributário.

Pois bem. Neste novo cenário da jurisprudência do Conselho (a partir de 2018), em poucas palavras, os julgadores entenderam que: (i) no Acórdão n. 3201-003.930, inexistia bilateralidade na estipulação dos preços praticados entre a pessoa jurídica industrial e a comercial, sendo que esse é elemento essencial do contrato de compra e venda, cuja ausência torna nulo o negócio, nos termos do art. 489 do Código Civil; (ii) no Acórdão n. 3201-004.699, que inexistiam motivos econômicos e financeiros na formatação empresarial que excedam a mera redução da carga tributária, de modo que a segregação de atividades deveria ser desconsiderada para fins de incidência da Contribuição ao PIS e da COFINS.

4.2. No âmbito do IPI

Já no que tange ao IPI incidente sobre a mesma operação com produtos farmacêuticos, de perfumaria, higiene e toucador, em que a empresa opera por meio do split de operações em duas pessoas jurídicas distintas, analisamos os seguintes acórdãos:

Acórdão

Data

Resultado

Composição

1

204-02.707

15.08.2007

Negado provimento ao recurso de ofício

Unanimidade

2

3201-001.204

25.02.2013

Negado provimento ao recurso voluntário

Qualidade

3

3403-002.285

16.07.2013

Dado provimento ao recurso voluntário

Maioria

4

3802-002.366

25.02.2014

Negado provimento ao recurso voluntário

Unanimidade

5

3301-003.169

26.01.2017

Negado provimento ao recurso voluntário

Maioria

6

3401-003.955

29.08.2017

Negado provimento ao recurso voluntário

Maioria

7

3402-004.341

29.09.2017

Dado provimento ao recurso voluntário

Maioria

8

3301-004.126

25.10.2017

Negado provimento ao recurso voluntário

Unanimidade

9

3201-003.444

26.02.2018

Negado provimento ao recurso voluntário

Maioria

10

3301-004.363

21.03.2018

Negado provimento ao recurso voluntário

Maioria

11

3302-005.598

23.07.2018

Negado provimento ao recurso voluntário

Unanimidade

12

3302-006.111

27.11.2018

Negado provimento ao recurso voluntário

Maioria

13

3402-005.599

26.09.2018

Dado provimento ao recurso voluntário

Maioria

14

3301-005.609

29.01.2019

Parcial provimento ao recurso voluntário

Maioria

15

3301-005.708

25.02.2019

Negado provimento ao recurso voluntário

Maioria

16

3301-005.707

25.02.2019

Negado provimento ao recurso voluntário

Maioria

17

9303-008.546

14.09.2019

Dado provimento ao recurso especial da PFN

Qualidade

No que tange aos fatos apurados pela Fiscalização para proceder à lavratura dos autos de infração, percebemos que se resumem à inobservância das regras do VTM estabelecidas pela legislação do IPI, vale dizer, à norma específica antielisiva da matéria.

Assim, discussões sobre o conceito de praça (e.g. Acórdãos n. 3403-002.285, n. 3401-003.955, n. 3402-004.341, n. 3301-004.363, n. 3402-005.599, n. 3301-005.708) de firmas interdependentes (e.g. Acórdãos n. 3302-005.598 e 3201-003.444), da existência de mercado monopolista (e.g. Acórdãos n. 3301-004.126 e n. 3301-004.363), entre outras, tomam conta da atenção dos Conselheiros do CARF em suas apreciações.

Excetua-se desse cenário o Acórdão n. 3301-003.169. Neste caso, a autoridade fiscal motivou a autuação na existência de simulação, com fulcro no art. 167, inciso II, do Código Civil, afirmando que a segregação de atividades pela empresa autuada não era verdadeira, sendo as vendas praticadas entre ambas fictícias, pautadas em preços irreais; além de as pessoas jurídicas – industrial e comercial – possuírem os mesmos funcionários, gestores etc.

Vemos aqui um processo administrativo muito mais próximo àqueles atinentes ao PIS/COFINS, tanto em termos do que foi objeto de autuação, como objeto de julgamento. Ou seja, nesse caso, afastando-se da disciplina estabelecida pelo regime de VTM, o caso foi conduzido à margem do que dispõe a norma antielisiva específica, recaindo na vala comum de desconsideração dos negócios jurídicos praticados pelos contribuintes sob o argumento da existência de evasão fiscal (GAAR).

5. Síntese conclusiva

Como pontuado no texto, o regime constitucional tributário estabelecido pela CF/1988 consagrou expressamente a estrita legalidade tributária, em seu art. 150, I, vedando a possibilidade de o aplicador estender a hipótese de incidência tributária por meio de analogia, mesmo que buscando atingir o contribuinte que fez uso de lacunas da legislação para obter uma menor carga tributária sobre seus negócios.

A forma adequada, à luz do sistema tributário pátrio, de fechamento dessas lacunas é a utilização de regras antielisivas, que podem ser gerais (GAAR) ou específicas (SAAR): as primeiras são dotadas de pressupostos abertos e previstas para serem aplicadas em um número indefinido de casos; as últimas são voltadas a tutelar negócios e situações específicos, utilizando-se de presunções ou ficções em torno da aplicação da regra de tributação, com hipóteses taxativas e restritas.

Enquanto as regras gerais antielisivas são passíveis de interpretação extensiva, em razão da indeterminação de seu pressuposto fático, visando implementar a igualdade tributária, as regras específicas antielisivas devem ser interpretadas sempre de forma literal, por conta de sua hipótese taxativa, que buscam o fechamento da lacuna legislativa sem prejuízo da segurança jurídica do contribuinte.

Da mesma forma, havendo uma regra específica antielisiva regulando determinada situação, não há que se cogitar da aplicação simultânea ou superposta da regra geral, pois o tratamento da lacuna já foi feito de forma particular para o caso.

A respeito da constatação da existência de regras específicas antielisivas para o IPI, mas a sua inexistência para o PIS/COFINS, e considerando a posição preponderante no CARF pela aplicação do parágrafo único do art. 116 do CTN (com a qual não concordamos), podemos afirmar, com base nas regras de interação entre a GAAR e as SAARs:

i) A existência de SAAR para o IPI (VTM) elimina as lacunas existentes, e permite que o contribuinte utilize esse regramento para organizar suas operações;

ii) Outros arranjos operacionais vantajosos, construídos a partir da regra de VTM, não poderão ser contestados com base em GAAR, pois essa lacuna já fora tratada de forma específica pelo legislador, restringindo o alcance de regras gerais;

iii) A regra específica antielisiva do IPI não pode ser interpretada extensiva ou analogicamente, por se tratar de uma hipótese de incidência fechada e restrita;

iv) Em relação ao PIS/COFINS, a operação poderia ser confrontada à luz da GAAR, pela inexistência de regra específica (com nossa ressalva quanto a eficácia do art. 116, parágrafo único, do CTN);

v) Tanto no caso do IPI, quanto do PIS/COFINS, a operação poderia ser confrontada nas hipóteses de simulação, dolo ou fraude, com fundamento no art. 149 do CTN.

Tendo em vista as conclusões (iv) e (v), compreende-se porque, na prática, as autuações fiscais relativas à contribuição ao PIS e à COFINS apresentam motivações variadas no que tange aos elementos de direito (simulação, abuso de direito, ausência de propósito negocial etc.), incluindo-se nas discussões gerais de planejamento tributário no CARF submetidas à GAAR (art. 116, parágrafo único, do CTN) e simulação, dolo ou fraude, com fundamento no art. 149 do CTN.

Ainda com relação aos casos julgados pelo CARF sobre a tributação do PIS/COFINS monofásicos sobre o split de operações, o afastamento pelo ordenamento jurídico de uma SAAR (art. 22 da Medida Provisória n. 497/2010) foi razão de decidir dos julgadores até 2018, em favor da estrutura negocial adotada pelos contribuintes. A partir do citado ano, no entanto, o Conselho manteve as autuações fiscais sobre o tema, não por julgar que a operação per se é ilegal, mas sim por questões relativas à motivação do lançamento tributário e das provas apresentadas pelos contribuintes.

Por fim, com relação ao PIS/COFINS monofásicos no split de operações, podemos perceber que até 2018 a matéria subia para a apreciação do CARF inclusive via recurso de ofício e a composição dos julgamentos no Conselho era mais pacífica (prevalência da unanimidade) em favor dos contribuintes. No universo de decisões encontrados sobre o tema, proporcionalmente, as autuações são na maioria canceladas (seis em oito casos analisados).

De outro lado, nos autos de infração lavrados para a cobrança do IPI podemos observar que o fundo dos litígios é completamente distinto. Por conseguinte, também o é a jurisprudência desenvolvida no CARF.

Aqui, a existência de norma antielisiva específica implicou um número expressivamente maior de lançamentos tributários, os quais não desconsideram os negócios jurídicos praticados pelas empresas sob o fundamento da utilização de planejamentos tributários abusivos, mas sim ficam adstritos aos requisitos de aplicação da SAAR, vale dizer, das regras de VTM. Também nesse sentido, as imputações de fraude e sonegação, implicando multa qualificada e responsabilidade solidária, são raras. Fica assim também verificada, na jurisprudência do CARF, as conclusões expostas nos itens (i), (ii) e (iii) acima mencionados.

Porém, duas situações encontram-se em descompasso com a teoria e a prática acima apuradas.

A primeira delas é aquela apresentada no Acórdão n. 3301-003.169. Isto porque, saindo do âmbito de aplicação das regras do VTM do IPI (lembremos, a SAAR relativa ao IPI), a autuação fiscal mantida pelo CARF, nesse caso, imputa a conduta ilegal de simulação (com fulcro no art. 167, inciso II, do Código Civil) à segregação de atividades adotada pelo contribuinte. Para tanto, falou-se da existência de vendas fictícias entre as empresas relacionadas; preços irreais por elas praticados; além da utilização de mesmos funcionários, gestores, dentre outros elementos de fato.

Já a segunda situação que chama a atenção é a orientação firmada pela CSRF no Acórdão n. 9303-008.546, ao estender o conceito de praça constante na legislação do IPI para fins de apuração do VTM, em contrariedade da almejada interpretação literal da SAAR, segundo a conclusão (iii) acima.

Outrossim, nos casos relativos ao IPI, a jurisprudência sempre foi mais oscilante quanto ao resultado (pela manutenção ou não dos lançamentos), bem como na composição dos julgamentos, que muito variaram entre maioria, qualidade ou unanimidade dos julgadores. Em termos proporcionais, as autuações foram majoritariamente mantidas (12 em 17 casos analisados).

Essas últimas observações nos permitem apontar uma situação absolutamente contraintuitiva: (i) nos casos relativos ao IPI, onde há uma regra específica antielisiva que deveria trazer mais segurança para os contribuintes, o que se vê é um cenário de incerteza sobre como cada caso será abordado pela fiscalização – inclusive num número muito mais expressivo de autuações fiscais – e pelos julgados administrativos; (ii) ao passo que no PIS/COFINS monofásico, para o qual não há regra antielisiva específica – o que deveria, pelo menos a priori, denotar maior insegurança –, se verifica uma homogeneidade maior nas decisões e nos critérios utilizados pelo CARF.

Em outras palavras, a utilização, pelo legislador, de um instrumento de proteção da segurança jurídica no combate ao planejamento tributário foi nesses casos subvertida em fonte de incerteza.

Com essas conclusões esperamos trazer nossa contribuição sobre o estudo da jurisprudência do CARF, tão merecedora de nosso atento olhar, crítico e evolutivo, de maneira a auxiliar a tão digna função do órgão: apresentar o mais acurado entendimento sobre o direito tributário nacional, em especial sobre casos de elevada complexidade teórica e pragmática, como o examinado nesta oportunidade.

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1 BERGAMINI, Adolpho et alii. Manual do PIS e da COFINS. São Paulo: Fiscosoft, 2013, p. 367-369.

2 Para uma exposição extensiva sobre as razões econômicas que justificam a segregação das atividades industriais e atacadistas, v. DE SANTI, Eurico Marcos; PRADO, Lucilene Silva; e ZOCKUN, Maria Helena (coord.). IPI e Valor Tributável Mínimo: análise econômica, evolução histórica da legislação abstrata, da jurisprudência e da prática. São Paulo: Max Limonad, 2019, p. 145-161.

3 CAMPOS, Diogo Leite de; e ANDRADE, João Costa. Autonomia contratual e direito tributário: a norma geral anti-elisão. Coimbra: Almedina, 2008, p. 52.

4 “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; [...]

§ 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2º, XII, g.”

5 A competência tributária é a aptidão em abstrato para a introdução de normas gerais e abstratas em matéria tributária, com caráter inaugural, não expletivo, no ordenamento jurídico.

6 TIPKE, Klaus. Steuerrecht (direito tributário). Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2008. v. I, p. 312.

7 Como defende Tipke, a colmatação de lacunas mediante analogia corresponde ao Princípio da Democracia, realizando a vontade expressa, verbalmente incompleta, do legislador democrático – trata-se de uma atividade de aperfeiçoamento da lei incompleta, a ser realizado pelo aplicador (cf. TIPKE, Klaus. Steuerrecht (direito tributário). Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2008. v. I, p. 313-314). Sobre o tema, de maneira mais ampla, v. BEAUCAMP, GUY. Zum Analogieverbot Im Öffentlichen Recht. Archiv Des Öffentlichen Rechts v. 134, n. 1, 2009, p. 83-105. Disponível em: <www.jstor.org/stable/44317721>.

8 NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Fato gerador e integração por analogia. Revista Direito Tributário Atual v. 3. São Paulo: IBDT e Resenha Tributária, 1983, p. 505-522. No mesmo artigo, Nogueira frisa que as conclusões alcançadas pelos estudiosos alemães se pautaram em disposições específicas do Código Tributário daquele país, portanto, em direito positivo completamente distinto do brasileiro, que não admitia tal integração.

9 KIRCHHOF, Paul. Steuerumgehung und Auslegungsmethoden. Steuer um Wirtschaft 60, 1983, p. 175 (173-183).

10 Sobre o tema da admissibilidade da analogia como uma questão constitucional, e não metódica, v. BARTH, Rainer. Richterliche Rechtsfortbildung im Steuerrecht. Berlin: Duncker & Humblot, 1996, p. 341.

11 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 783.

12 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 781-782. No mesmo sentido, ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 451-454.

13 Como pontua Luís Eduardo Schoueri, “o relaxamento que se faz no princípio da legalidade, quando o Legislativo deixa ao Executivo a prerrogativa de fixar os casos de isenção, mais que a segurança jurídica, afeta a própria liberdade do contribuinte.” (SCHOUERI, Luís Eduardo. Tributação e liberdade. In: FRANÇA, Vladimir da Rocha et ali (org.). Novas tendências do direito constitucional. Curitiba: Juruá, 2011, p. 497)

14 Nesse sentido, Cf. ÁVILA, Humberto. Planejamento tributário. Revista de Direito Tributário v. 98. São Paulo, 2006, p. 78-83. Sobre o formalismo decorrente do direito tributário brasileiro v. LEÃO, Martha Toribio. O direito fundamental de economizar tributos – entre legalidade, liberdade e solidariedade. São Paulo: Malheiros, 2018, p. 112-114.

15 TÔRRES, Heleno Taveira. Direito constitucional tributário e segurança jurídica. São Paulo: RT, 2011, p. 18.

16 Define-as García Novoa como “estructuras normativas cuyo presupuesto de hecho aparece formulado con mayor o menor grado de amplitud, y al cual se ligan unas consecuencias jurídicas, que, en suma, consistirán en la asignación a la Administración de unas potestades consistentes em desconocer el acto o negocio realizado com ánimo elusorio o a aplicar el régimen jurídico-fiscal que se há tratado de eludir” (GARCÍA NOVOA, César. La cláusula antielusiva en la nueva ley general tributaria. Madrid: Marcial Pons, 2004, p. 259).

17 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Norma geral antielusão. Revista Direito Tributário Atual v. 25. São Paulo: IBDT, 2011, p. 132 e 136.

18 CAMPOS, Diogo Leite de; e ANDRADE, João Costa. Autonomia contratual e direito tributário: a norma geral anti-elisão. Coimbra: Almedina, 2008, p. 58.

19 GARCÍA NOVOA, César. La cláusula antielusiva en la nueva ley general tributaria. Madrid: Marcial Pons, 2004, p. 262.

20 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Evasão e elisão fiscal: o parágrafo único do art. 116, CTN, e o direito comparado. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 64-66.

21 No original, “Durch Missbrauch von Formen und Gestaltungsmöglichkeiten des bürgerlichen Rechts kann die Steuerpflicht nicht umgangen oder gemindertwerden.”

22 PISTONE, Pasquale. Abuso del diritto ed elusione fiscale. Padova: CEDAM, 1996, p. 21.

23 KRUSE apud GARCÍA NOVOA, César. La cláusula antielusiva en la nueva ley general tributaria. Madrid: Marcial Pons, 2004, p. 264.

24 PISTONE, Pasquale. Abuso del diritto ed elusione fiscale. Padova: CEDAM, 1996, p. 20-21.

25 GARCÍA NOVOA, César. La cláusula antielusiva en la nueva ley general tributaria. Madrid: Marcial Pons, 2004, p. 269.

26 “Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários.”

27 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Evasão e elisão fiscal: o parágrafo único do art. 116, CTN, e o direito comparado. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 62.

28 XAVIER, Alberto. Tipicidade da tributação, simulação e norma antielisiva. São Paulo: Dialética, 2001, p. 85.

29 TÔRRES, Heleno Taveira. Direito tributário e direito privado: autonomia privada: simulação: elusão tributária. São Paulo: RT, 2003, p. 276-278.

30 BARRETO, Paulo Ayres. Planejamento tributário – limites normativos. São Paulo: Noeses, 2016, p. 234.

31 MOLINA, Pedro Herrera. Nuevas perspectivas sobre el fraude de ley en materia tributaria. Quincena Fiscal n. 13, 2003, p. 14.

32 GARCÍA NOVOA, César. La cláusula antielusiva en la nueva ley general tributaria. Madrid: Marcial Pons, 2004, p. 274.

33 DANIEL NETO, Carlos Augusto; e RIBEIRO, Diego Diniz. O Valor Tributável Mínimo (VTM) e o conceito de “praça” na sua apuração. Revista Direito Tributário Atual v. 39. São Paulo: IBDT, 2018, p. 40-41.

34 ZIMMER, Frederik. IFA Branch Report Norway v. LXXXVIIa, Oslo, 2002, p. 49-50.

35 ZIMMER, Frederik. IFA Branch Report Norway v. LXXXVIIa, Oslo, 2002, p. 51.

36 BROE, Luc De; e LUTS, Joris. BEPS Action 6: tax treaty abuse. 43 Intertax, Issue 2, 2015, p. 133. No mesmo sentido, DANON, Robert J. Treaty abuse in the post-BEPS world: analysis of the policy shift and impact of the principal purpose test for MNE groups. Bulletin for International Taxation v. 72, n. 1, 2018, p. 38.

37 OECD. Commentary on article 1. Model tax convention on income and on capital. OECD Publishing, 2010, p. 61.

38 TABOADA, Carlos Palao. OECD base erosion and profit shifting Action 6: the general anti-abuse rule. Bulletin for International Taxation v. 69, n. 10, 2015, p. 605.

39 “Art. 612. Considerar-se-ão interdependentes duas firmas: I – quando uma delas tiver participação na outra de quinze por cento ou mais do capital social, por si, seus sócios ou acionistas, bem como por intermédio de parentes destes até o segundo grau e respectivos cônjuges, se a participação societária for de pessoa física; II – quando, de ambas, uma mesma pessoa fizer parte, na qualidade de diretor, ou sócio com funções de gerência, ainda que exercidas sob outra denominação; III – quando uma tiver vendido ou consignado à outra, no ano anterior, mais de vinte por cento no caso de distribuição com exclusividade em determinada área do território nacional, e mais de cinquenta por cento, nos demais casos, do volume das vendas dos produtos tributados, de sua fabricação ou importação; IV – quando uma delas, por qualquer forma ou título, for a única adquirente, de um ou de mais de um dos produtos industrializados ou importados pela outra, ainda quando a exclusividade se refira à padronagem, marca ou tipo do produto; ou V – quando uma vender à outra, mediante contrato de participação ou ajuste semelhante, produto tributado que tenha fabricado ou importado.”

40 DANIEL NETO, Carlos Augusto; e RIBEIRO, Diego Diniz. O Valor Tributável Mínimo (VTM) e o conceito de “praça” na sua apuração. Revista Direito Tributário Atual v. 39. São Paulo: IBDT, 2018, p. 41.

41 Sobre o conceito de “praça” na legislação e na jurisprudência, e a sua limitação à circunscrição municipal, v. DANIEL NETO, Carlos Augusto; e RIBEIRO, Diego Diniz. O Valor Tributável Mínimo (VTM) e o conceito de “praça” na sua apuração. Revista Direito Tributário Atual v. 39. São Paulo: IBDT, 2018, p. 42-48; DE SANTI, Eurico Marcos; PRADO, Lucilene Silva; e ZOCKUN, Maria Helena (coord.). IPI e Valor Tributável Mínimo: análise econômica, evolução histórica da legislação abstrata, da jurisprudência e da prática. São Paulo: Max Limonad, 2019, p. 69-75.

42 “Art. 196. Para efeito de aplicação do disposto nos incisos I e II do art. 195, será considerada a média ponderada dos preços de cada produto, em vigor no mês precedente ao da saída do estabelecimento remetente, ou, na sua falta, a correspondente ao mês imediatamente anterior àquele.”

43 “Art. 195. O valor tributável não poderá ser inferior: III – ao custo de fabricação do produto, acrescido dos custos financeiros e dos de venda, administração e publicidade, bem como do seu lucro normal e das demais parcelas que devam ser adicionadas ao preço da operação, no caso de produtos saídos do estabelecimento industrial, ou equiparado a industrial, com destino a comerciante autônomo, ambulante ou não, para venda direta a consumidor.”

44 “Art. 7º Equiparam-se a estabelecimento industrial os estabelecimentos atacadistas que adquirirem os produtos relacionados no Anexo III, de estabelecimentos industriais ou dos seguintes estabelecimentos equiparados a industrial: [...].”

45 “Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos: [...] Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.”

46 BARRETO, Paulo Ayres. Planejamento tributário – limites normativos. São Paulo: Noeses, 2016, p. 224-225.

47 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário – fundamentos jurídicos da incidência. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 100.

48 Em alguns casos, a autoridade fiscal cita mais de um ilícito para qualificar juridicamente a prática efetuada pela empresa autuada, como no Acórdão n. 3201-004.699, em que podemos observar a menção tanto a planejamento tributário abusivo, como a simulação, subfaturamento e fraude.

49 O relator coloca que cisão parcial, através da qual a Recorrente desmembrou suas atividades em várias empresas do mesmo grupo, por estar autorizada pela Lei, não pode ser considerada como ato ilícito ou simulação, pelo só fato de gerar economia tributária.

50 Segundo o voto do relator Ivan Alegretti, a monofasia afeta a neutralidade e agentes são “compelidos” a se organizar na verticalização de suas atividades.