Repercussões do Recurso Extraordinário n. 593.849/MG: A (In)admissibilidade da Cobrança de ICMS-ST Complementar

Impacts of Extraordinary Appeal n. 593.849/MG: The (In)admissibility of the Complementary State Value Added Tax on the Substitution Regime

Arthur Leite da Cruz Pitman

Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT. MBA em Gestão Tributária pela FIPECAFI. Advogado em São Paulo. E-mail: arthur@tpa.adv.br.

Recebido em: 20-08-2019

Aprovado em: 14-11-2019

Resumo

Neste artigo, o autor pretende analisar os fundamentos que embasaram a decisão proferida no julgamento do RE n. 593.849/MG, a fim de determinar se suas premissas confirmam ou infirmam a conclusão dos Estados, no sentido de que o art. 150, § 7º, da Constituição ampara a possibilidade de cobrança de ICMS complementar àquele imposto já recolhido em regime de substituição tributária quando o valor do fato gerador presumido é inferior ao real. Para tanto, serão considerados os principais fundamentos surgidos no julgamento RE n. 593.849/MG utilizados como argumento em prol da cobrança de “ICMS-ST complementar”, especialmente: (i) o argumento de vedação ao enriquecimento sem causa do contribuinte; (ii) os limites da coisa julgada do acórdão do RE n. 593.849/MG; e (iii) a ponderação entre os princípios da praticabilidade e da capacidade contributiva como solução para questão. Por fim, será evidenciado que nenhuma das razões mencionadas é capaz de sustentar a validade da cobrança de “ICMS-ST complementar”.

Palavras-chave: ICMS, substituição tributária, fato gerador, presumido, complementação.

Abstract

In this paper, the author aims to analyze the fundamentals that support the decision handed down on the RE no. 593.849/MG judgment, in order to determine if their assumptions validate or refute State’s conclusions, in the sense that the article 150, paragraph 7º, of the Brazilian Constitution sustains the chance of charging ICMS (Brazilian Sales Tax) by compensating the tax already gathered on the “tax substitution method” when the value of the presumed triggering event is lower than the real one. For this purpose, it will consider the main reasons arisen from the RE no. 593.849/MG used as arguments on behalf of charging “compensatory ICMS-ST” (Brazilian Sales Tax on the “tax substitution method”), especially: (i) the argument of prohibition on unjustified enrichment of taxpayers; (ii) the limits of res judicata on the RE no. 593.849/MG decision; and (iii) the balancing of the tax practicability principle and the “ability to pay” principle as a solution for the issue. Finally, it will be made clear that none of the mentioned reasons is capable of maintaining the validity of the “compensatory ICMS-ST” charging.

Keywords: ICMS, tax substitution, triggering event, presumed, compensation.

1. Introdução

O julgamento do Recurso Extraordinário n. 593.849/MG, em sede de repercussão geral, pelo Supremo Tribunal Federal marcou a mudança abrupta de jurisprudência pacífica em relação ao regime de substituição tributária com cobrança sobre “fato gerador presumido”: na ocasião, os ministros da Corte fixaram, por maioria de votos, que caso a base de cálculo presumida resultasse em valor superior àquela efetivamente praticada, o contribuinte teria direito de restituição preferencial e imediata, nos termos do art. 150, § 7º, da Constituição de 1988.

Esse posicionamento suscitou dúvidas acerca do caráter definitivo da sistemática de substituição tributária – predominante desde o julgamento do STF na ADI n. 1.851-4/AL – e motivou os Estados a reclamar seu suposto direito de cobrança de “imposto complementar” àquele já cobrado em regime de substituição tributária de ICMS, nos casos em que o fato gerador real ocorresse em montante superior àquele presumido.

Diversos Estados que já possuíam a previsão de cobrança do chamado “ICMS-ST Complementar” em suas legislações estaduais, como São Paulo1 e Minas Gerais2, ao cobrarem imposto a título de complementação ao ICMS-ST já exigido do substituto tributário, geraram significativos questionamentos acerca da validade da cobrança e levaram os contribuintes aos tribunais, a fim de ter reconhecida a invalidade da exigência.

O Supremo Tribunal Federal, ao ser provocado para se manifestar sobre a questão, surpreendeu novamente: no AgRE n. 1.097.998/MG3, o Ministro Relator Dias Toffoli, em seu voto vencedor, determinou que “deve-se complementar o ICMS diante da existência de diferença entre o valor do tributo designado no momento do cálculo do ICMS/ST e o montante efetivamente praticado na relação jurídica tributária, conforme orientação firmada no julgamento do RE nº 593.849/MG”.

Conquanto seja questionável a conclusão do acórdão, os Estados costumam argumentar que o dever de complementação do ICMS-ST exigido do substituto tributário decorre da interpretação a contrario sensu dos fundamentos do julgamento do RE n. 593.849/MG. Isto é, pela lógica das Fazendas Estaduais, se o contribuinte tem direito à restituição quando o fato gerador real ocorre em valor inferior àquele presumido, também o Estado deveria poder cobrar imposto complementar nos casos em que o fato gerador real se efetiva em montante superior à base de cálculo presumida.

Assim, neste artigo, serão analisados os fundamentos que embasaram a decisão proferida no julgamento do RE n. 593.849/MG, a fim de determinar se suas premissas confirmam ou infirmam a conclusão dos Estados, no sentido de que o art. 150, § 7º, da Constituição ampara a possibilidade de cobrança de ICMS complementar àquele imposto já recolhido em regime de substituição tributária quando o fato gerador presumido é inferior ao real.

Inicialmente, faremos breve histórico doutrinário, legislativo e jurisprudencial do regime de tributação por fato gerador presumido (substituição tributária com antecipação do recolhimento), a fim de determinar se a cobrança possui natureza definitiva ou provisória. Em seguida, analisaremos os principais argumentos surgidos no julgamento do RE n. 593.849/MG e utilizados como fundamentos para a possibilidade de cobrança do “ICMS-ST” complementar, especialmente os seguintes: (i) o enriquecimento sem causa do contribuinte como justificativa da cobrança de ICMS-ST complementar; (ii) a interpretação a contrario sensu da ratio decidendi do RE n. 593.849/MG, deduzindo-se que, se cabe restituição em um caso, caberia complementação em outro; (iii) a prevalência do princípio da capacidade contributiva em detrimento da praticabilidade como fundamento da exigência da complementação do ICMS-ST.

2. A tributação por fato gerador presumido: cobrança definitiva ou provisória?

Ainda que de forma independente, a cobrança de tributos por meio de antecipação (sem substituição tributária) ou por substituição tributária (sem antecipação) sempre existiu no ordenamento jurídico brasileiro, assim como sempre gerou polêmicas e dúvidas. Quando consideradas em conjunto, isto é, nos casos de cobrança de tributos antecipadamente por meio de substitutos tributários, intensificam-se as discussões sobre a legalidade e constitucionalidade do regime tributário, seja por subverter a lógica das categorias tradicionais do Direito Tributário, como a obrigação tributária e o fato gerador, seja pelo potencial de lesar direitos e garantias individuais dos contribuintes, como o princípio da capacidade contributiva4.

Em termos genéricos, a substituição tributária é uma das formas pelas quais o legislador tributário escolhe terceiros, e não aqueles que efetivamente praticaram o fato gerador do tributo, como responsáveis pela apuração, recolhimento e pagamento de tributo devido por outrem.

Ao prever hipóteses de atribuição de responsabilidade tributária a terceiros, o Código Tributário Nacional (Lei n. 5.172/1966) não destaca as figuras do “substituto” e do “responsável stricto sensu de forma expressa. Contudo, o art. 128 do CTN5 permite a leitura de que, no caso de substituição, haja dispositivo “excluindo a responsabilidade do contribuinte”, já que a sujeição passiva já nasce atribuída a “terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação”6.

Conforme ensina Alcides Jorge Costa7, o art. 128 do CTN inaugura hipótese de “dissociação absoluta entre dever e responsabilidade”. Não obstante o contribuinte seja aquela pessoa que tem relação “pessoal e direta” com o fato gerador (Schuld), a que se refere o art. 121, inciso I, do CTN8, o legislador indica terceiro para substituí-lo no polo passivo da obrigação (Haftung).

Na tributação sobre o consumo de cadeias produtivas, especialmente no caso do ICMS, a eleição de substituto tributário como responsável pelo recolhimento do imposto devido por outros comerciantes pertencentes ao segmento econômico é costumeira e pode ser operacionalizada de formas distintas, isto é, progressivamente (“para frente”) ou regressivamente (“para trás”). Para os fins propostos neste artigo, nos limitaremos à análise da hipótese da substituição tributária progressiva.

Em termos normativos, o instituto da substituição tributária progressiva (ou “para frente”) é juridicamente viável pois, conforme exposto, no Direito Tributário brasileiro, nem sempre o contribuinte será sujeito passivo da obrigação tributária, já que a lei pode atribuir a terceiro tal condição, nos termos do art. 121, parágrafo único, inciso II, do Código Tributário Nacional9, denominando-se de “responsável tributário lato sensu”. Assim, segundo a classificação mais conhecida, de autoria de Rubens Gomes de Sousa10, após a distinção da sujeição passiva direta (contribuinte) da sujeição passiva indireta (responsável), sustenta que esta última apresenta duas modalidades: substituição e transferência.

A transferência seria verificada quando “a obrigação do sujeito passivo direto fosse atribuída ao sujeito passivo indireto em virtude de algum evento posterior à ocorrência do fato gerador da obrigação tributária”, seja na hipótese de solidariedade, sucessão ou responsabilidade (a análise detida de cada uma destas fugiria ao escopo deste trabalho). Por outro lado, haveria substituição quando “a obrigação tributária surgisse desde logo contra o sujeito passivo indireto, que ocuparia o polo passivo, no lugar do sujeito passivo direto, a partir do momento da realização do fato gerador”11.

É neste cenário normativo que a utilização da substituição tributária progressiva (“para frente”) se torna método de atribuição de responsabilidade a terceiros, pelo qual se pretende simplificar a fiscalização e combater a evasão fiscal em segmentos econômicos de produtos que, apesar de terem sua fabricação ou captação concentrada em poucos contribuintes produtores ou importadores, possuem uma cadeia mercantil extensa e capilarizada em diversos atacadistas e varejistas, como cervejas, cigarros, cosméticos, fármacos etc. Assim, como solução, o substituto promove o recolhimento de tributo referente a fato jurídico tributário a ser presumidamente realizado, no futuro, pelo substituído12.

No entanto, ressalta-se que, ao conceber a sistemática da tributação antecipada por meio de fato gerador presumido, o legislador precisa eleger base de cálculo que vislumbre a capacidade contributiva dos substituídos que praticarão as operações subsequentes da cadeia produtiva e, em última instância, represente o preço final do produto na venda ocorrida entre o varejista e o consumidor final.

Portanto, o fato gerador antecipadamente cobrado a que se refere o art. 150, § 7º, da Constituição se refere à “substituição que se dá em relação a todos os fatos geradores subsequentes que vierem a ocorrer até que a mercadoria chegue ao consumidor final”, e não a eventual fato gerador “criado” por lei ou o fato gerador subsequente à aquisição da mercadoria do industrial13. Eis, portanto, a lógica do regime de substituição tributária em matéria de ICMS.

Concordamos com a lição de Marco Aurélio Greco14 ao afirmar que “o interesse arrecadatório do Fisco é o de receber o ICMS sobre o ciclo econômico inteiro – portanto, sobre o preço de ponta, na última operação realizada com aquela mercadoria, o consumidor final. É este o preço que vai definir o interesse arrecadatório do Estado”.

Geraldo Ataliba e Aires Fernandino Barreto15 consignam, em clássico parecer, que no ICMS-ST “a obrigação é estruturada tendo em consideração as características objetivas do fato imponível implementado pelo contribuinte”, enquanto que “o responsável, na verdade, não realiza fato relevante para determinar o surgimento da obrigação [...] tão só é posto, pela lei, no dever de prover o recolhimento de tributo decorrente de fato provocado ou produzido por outrem”.

O tema da substituição tributária obteve status constitucional após a Emenda Constitucional n. 03/1993, quando foi inserido o art. 150, § 7º, da Constituição de 1988, dispondo que ao produtor, ao fabricante, ao atacadista, ou a outro contribuinte situado no início da cadeia produtiva poderia ser atribuída a condição de substituto tributário pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, desde que reste garantido seu direito de ser restituído de forma imediata e preferencial nos casos em que o fato gerador presumido não se realizar.

Mesmo após o processo de “constitucionalização” do instituto, a veiculação da substituição tributária progressiva pela EC n. 03/1993 continuou sendo questionada16. Por esse motivo, o STF foi provocado a se manifestar sobre o tema e, ao final de 2002, no julgamento da ADI n. 1.851-4/AL, restou consignado que “a competência outorgada pelo artigo 150, § 7º da Constituição, autoriza o regime de tributação indireta com incidência no começo dos ciclos econômicos de forma definitiva, não se tratando de mera antecipação”17, não havendo direito de restituição ao contribuinte quando o “fato gerador real” tivesse valores menores que o “fato gerador presumido”.

Supreendentemente, 14 anos após o julgamento da ADI n. 1.851-4/AL, o STF revisitou o tema no julgamento do RE n. 593.849/MG, apreciado em conjunto com as ADIs n. 2.777/SP e n. 2.675/PE, e, em sede de repercussão geral, fixou a tese de que “é devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) pago a mais no regime de substituição tributária para a frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida”, em sentido diametralmente oposto ao até então acolhido pela Suprema Corte, determinando que o regime de substituição tributária trata de mera antecipação do substituto tributário de imposto devido pelos substituídos na cadeia comercial.

Incidentalmente, diversos ministros suscitaram que, uma vez que tenha sido superado o precedente (overruling) da ADI n. 1.851-4/AL, a partir de então, a substituição tributária seria mera antecipação do imposto devido por ocasião da realização efetiva da operação tributada. Portanto, caberia ao contribuinte a restituição, caso o fato gerador real ocorresse em valor inferior ao “fato gerador presumido” e, por outro lado, caberia a complementação ao Estado, quando o fato gerador real ocorresse em montante superior ao “fato gerador presumido”.

Por mais convincente que o argumento aparente ser, é necessário ressaltar que a hipótese de cobrança de imposto a título de complementação não foi objeto de questionamento das ações diretas de inconstitucionalidade julgadas pelo STF. Ademais, mesmo considerando os fundamentos sustentados pelos ministros que, em tese, poderiam conduzir à conclusão de que os Estados poderiam cobrar “ICMS-ST complementar”, será demonstrado que a fundamentação não se aplica e nem se presta à confirmação da assertiva.

Neste breve estudo, passaremos a analisar a eventual (im)procedência dos principais argumentos surgidos nos debates do julgamento do RE n. 593.849/MG quanto à possibilidade da cobrança de imposto a título de complementação do ICMS-ST devido na cadeia produtiva.

3. Análise da (in)admissibilidade da cobrança de ICMS-ST complementar

A fim de analisar os principais argumentos levantados no julgamento do RE n. 593.849/MG, que potencialmente sustentariam a possibilidade de cobrança de ICMS-ST complementar, nos casos em que o fato gerador real ocorrer em valor superior ao “fato gerador presumido”, delimitaremos o escopo da análise nos seguintes pontos: (i) o enriquecimento sem causa do contribuinte como justificativa da cobrança de ICMS-ST complementar; (ii) a interpretação a contrario sensu da ratio decidendi do RE n. 593.849/MG, deduzindo-se que, se cabe restituição em um caso, caberia complementação em outro; (iii) a prevalência do princípio da capacidade contributiva em detrimento da praticabilidade como fundamento da exigência da complementação do ICMS-ST. Assim, passaremos a analisar os argumentos do acórdão do RE n. 593.849/MG pormenorizadamente.

3.1. Complementação do ICMS-ST por vedação ao enriquecimento sem causa do contribuinte

Em diversas passagens do acórdão, a vedação ao enriquecimento sem causa do contribuinte é apontada como justificativa para que lhe seja cobrado imposto complementar ao ICMS-ST já exigido do substituto tributário. Isto é, caso não fosse cobrado imposto do contribuinte que realiza fato gerador em valor maior do que o montante do “fato gerador presumido”, estar-se-ia desonerando parcialmente a operação por ele praticada sem justificativa ou fundamento suficiente.

Nesse sentido, o Ministro Relator Edson Fachin afirma em seu voto que “o próprio sentido do parágrafo 7º do art. 150, quando se refere ao fato gerador que não vai ocorrer, há, no fato gerador – ainda que seja um debate doutrinário – uma dimensão material, em que, essa dimensão material, não se verificando, de algum modo, é possível extrair desse próprio comando constitucional que não se pode chancelar um enriquecimento sem causa, quer seja do Estado, quer seja do contribuinte. Aqui há uma razão simétrica, não há enriquecimento ilícito a ser preservado nem aqui, nem acolá; nem da parte do fisco, nem da parte do contribuinte”18. No mesmo sentido, a assertiva do Ministro Marco Aurélio: “a Carta da República não encerra o enriquecimento ilícito, quer por parte do contribuinte, quer, muito menos, por parte do Estado”19.

Por mais engenhoso que seja o argumento, o legislador tributário não atribuiu nenhum sentido específico da norma tributária para o instituto do “enriquecimento sem causa”, forçando o intérprete a buscar, em sua origem advinda do Direito Privado, o conceito técnico-jurídico conferido ao termo, para aplicá-lo ao contexto. Lembram-nos Karl Larenz20 e Riccardo Guastini21 que os termos que possuem significado específico na linguagem jurídica devem ser utilizados, no discurso jurídico, com as significações que lhes são próprias, obtidas a partir do regime normativo que lhe é aplicável originariamente.

Esse entendimento se coaduna com a função do art. 109 do Código Tributário Nacional no sistema tributário brasileiro, que aponta no sentido de que o legislador tributário, ao utilizar institutos, formas e conceitos de Direito Privado, mantém os seus sentidos originais, a menos que os modifique de forma expressa ou que forneça ao intérprete indícios significativos dessa conclusão, em prol da unidade do ordenamento jurídico, da autonomia conceitual e do postulado do legislador coerente22.

O instituto do “enriquecimento sem causa” se encontra disciplinado nos arts. 884, 885 e 886 do Código Civil de 200223, portanto, o intérprete da legislação tributária está vinculado ao seu sentido e a sua significação. Embora não seja o escopo deste trabalho24 uma investigação pormenorizada do enriquecimento sem causa, ou ainda que não haja perfeita uniformidade de opiniões entre os civilistas, recorrendo às lições de Agostinho Alvim25 e Sílvio Venosa26, identificam-se os seguintes requisitos para a sua configuração: (i) o enriquecimento, entendido em sentido amplo, isto é, pela realização de aumento patrimonial, independentemente de seu recebimento em pecúnia; (ii) o empobrecimento correlato de outrem, também em sentido amplo; (iii) a ausência de causa jurídica que justifique o binômio “enriquecimento/empobrecimento”; (iv) a subsidiariedade, ou seja, caso a lei confira às partes lesadas outros meios para ressarcir o prejuízo sofrido, não é aplicável o instituto do enriquecimento sem causa.

Evidencia-se, portanto, que a incorporação do “enriquecimento sem causa” pelo Direito Tributário enfrenta diversos empecilhos: rigorosamente, não cabe falar de “enriquecimento” ou “empobrecimento” do contribuinte ou do Estado, respectivamente, nos casos em que a base de cálculo do fato gerador real ocorrer em valor superior ou inferior ao valor do “fato gerador presumido”.

Enquanto as bases de cálculo possíveis do ICMS-ST são matérias de origem ex lege – de lei complementar, inclusive, conforme o art. 146, inciso III, alínea a, da CF –, sendo “uma das grandezas, possíveis do fato gerador, mas não a grandeza dele, o que significa dizer que, dentre as grandezas possíveis, a base de cálculo é a grandeza legalmente escolhida e adotada para a quantificação da respectiva obrigação tributária”27-28; de outro lado, “não há apenas o poder de devolver a diferença” em favor dos contribuintes que recolheram impostos a maior, pois “qualquer modelo de substituição tributária deve, necessariamente, envolver a devolução das diferenças que sejam significativas e, por isso mesmo, causem gravames que comprometam a eficácia mínima de princípios fundamentais”29.

Quer-se dizer que o fato de a base de cálculo do “fato gerador presumido” ter valor maior ou menor do que o fato gerador real não implica a conclusão imediata de que a antecipação deva ser reajustada em favor da complementação do imposto pago pelo substituto tributário. O direito de restituição imediata e preferencial do contribuinte – e tão somente este – é decorrência expressa do art. 150, § 7º, da Constituição, não podendo ser interpretado a contrario sensu.

Assim, também não se pode falar em “ausência de causa jurídica” que justifique enriquecimento do contribuinte. Por mais que a “causa” tenha relevante papel no estudo da teoria da obrigação tributária30 ou mesmo que as obrigações privadas e tributárias sejam estruturalmente equiparadas31, são distintas em relação à origem (da vontade à ex lege) e ao regime jurídico aplicável (do Direito Privado ao Direito Público)32. Assim, independentemente da vontade do contribuinte, a função do recolhimento de imposto por substituição tributária busca atender à eficiência administrativa33 e proteger a livre concorrência de distorções econômicas setoriais geradas pela sonegação fiscal34, isto é, “visa atender interesse do próprio Fisco”35.

Quanto ao caráter subsidiário do “enriquecimento ilícito”, é importante lembrar que, no Direito Privado, os atos ou negócios jurídicos ilícitos podem ser classificados entre ilícitos típicos e ilícitos atípicos36. Nesse viés, quando for praticado comportamento contrário a um comando obrigatório, consubstanciado em norma jurídica, dotado de relações jurídicas circunscritas nos modais deônticos “obrigatório” ou “proibido” e prescritivo de sanção correlata, este seria classificado como um ilícito típico37.

Por sua vez, os ilícitos atípicos baseiam-se na ideia – bastante controversa, diga-se – de que, se as condutas contrárias a regras estariam no plano das ilicitudes, seriam também ilícitas as condutas que contrariassem princípios38. Heleno Taveira Tôrres define os ilícitos atípicos como comportamentos que não caracterizam violação a um comando normativo imperativo, mas cujo resultado ou efeito afronta um princípio do sistema jurídico ou uma regra geral que contém uma diretiva ou critério genérico ou abstrato39.

Conquanto tal concepção não gere maiores problemas no Direito Privado, no qual o dogma da completude do Direito é aceito e defendido com vigor, não se pode falar o mesmo quanto a sua aplicação no Direito Tributário. Ao contrário, como ensina Misabel Derzi, no Direito Tributário vigora o dogma da incompletude do Direito, em homenagem à estrita legalidade e à vedação à analogia, razão pela qual não pode o intérprete/aplicador estender hipóteses normativas para além do quadro de sentidos possíveis40.

3.2. Limites objetivos da coisa julgada do RE n. 593.849/MG

Os defensores da possibilidade de cobrança de “ICMS-ST complementar” sustentam que a ratio decidendi fixada no julgamento RE n. 593.849/MG, no sentido de que “é devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) pago a mais no regime de substituição tributária para a frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida”, poderia ser interpretada a contrario sensu, autorizando os Estados a cobrarem a complementação de imposto quando a base de cálculo efetiva da operação fosse superior à presumida. Ou, nos dizeres do Ministro Luiz Fux, “[...] concordo que o vento que venta lá venta cá, se tiver o Estado de receber aquilo que lhe é devido, porque o fato presumido foi prejudicial à realidade imaginada pelo Estado, o Estado também pode cobrar”41.

Ocorre, no entanto, que a questão debatida por ocasião do julgamento do RE n. 593.849/MG, julgado em conjunto com as ADIs n. 2.777 e n. 2.675, tratava apenas da hipótese de restituição do imposto pago a maior nos casos em que a base de cálculo do fato gerador real ocorrer em montante menor que a do “fato gerador presumido”, como inclusive foi ressaltado no relatório do voto do Ministro Relator Edson Fachin, seja pela evidenciação da questão tratada pelo juízo a quo ou pelas razões recursais do contribuinte que prequestionaram a matéria42.

Como se sabe, o processo, enquanto ferramenta concebida para instrumentalizar a prestação de tutela jurisdicional, necessita de provocação de parte interessada, que deve dar impulso inicial à jurisdição, que é inerte por natureza. É o que prevê o art. 2º do atual Código de Processo Civil43, bem como o dispositivo de mesmo número do antigo “Código Buzaid” de 197344. Portanto, se o processo, para que se inicie, exige manifestação de vontade da parte interessada – parte autora –, a ela cabe dispor, ou optar, por aquilo que será levado a juízo e o que não será objeto de deliberação judicial45.

Ainda que essa dualidade de questões – as que necessitam de provocação da parte e as cognoscíveis ex officio – seja informada por diferentes princípios do processo civil – princípio do dispositivo e princípio inquisitório –, bem verdade é que em ambos os casos o juiz somente poderá se manifestar sobre questões em processos já iniciados.

Celso Agrícola Barbi, ao reconhecer íntima ligação entre os limites da atuação jurisdicional, a dualidade “dispositivo/inquisitório” e a vedação ao julgamento incongruente com aquilo que foi pedido pela parte, ensina que “o juiz não pode decidir além do que foi pedido pelo autor, nem considerar questões não apresentadas pelas partes para as quais a lei exigir iniciativa dos litigantes [...]”46. Da mesma forma, Nelson Nery Jr. identifica que a vinculação entre o que foi pedido e o que deve ser decidido decorre do princípio da adstrição do juiz ao pedido ou congruência, e adiciona ainda que “o juízo destinatário do recurso somente poderá julgar o que o recorrente tiver requerido nas suas razões de recurso, encerradas com o pedido de nova decisão”47.

Portanto, se houver pedido da parte, cabe ao órgão julgador apreciar exatamente aquilo que foi requerido, não podendo decidir menos, mais ou fora do objeto, o que caracterizaria vício de decisão por ser citra, ultra ou extra petita, respectivamente, conforme os arts. 141 e 492 do Código de Processo Civil.

No julgamento do RE n. 593.849/MG, houve delimitação do que seria decidido em conformidade com os pedidos formulados (relatório do voto do Ministro Relator que delimitou a decisão ao direito de restituição do contribuinte), houve fundamentação (o sentido de “não ocorrência” do art. 150, § 7º, da Constituição, também se aplica nos casos em que a base de cálculo do fato gerador real ocorrer em valor inferior ao “fato gerador presumido”) e houve decisão (julgou-se procedente a ação, dado o provimento do recurso extraordinário), razão pela qual não há que se falar que o STF teria avalizado, ainda que de forma indireta ou por interpretação a contrario sensu, a possibilidade de cobrança de “ICMS complementar”.

Esse entendimento é corroborado pela decisão proferida posteriormente pelo Ministro Edson Fachin, rejeitando os embargos de declaração apresentados pelo Estado de Minas Gerais, na qual afirmou que “não há omissão na súmula da decisão, por não abarcar os casos em que a base presumida é menor do que a base real, porquanto se trata de inovação processual posterior ao julgamento, não requerida ou aventada no curso do processo”48. Mesmo o próprio Ministro Teori Zavascki, que proferiu voto divergente e ressalvou que, uma vez superado o precedente fixado na ADI n. 1.851-4/AL, para entender que o ICMS-ST é mera antecipação, decorreria logicamente a consequência de que o “ICMS-ST complementar” seria admissível, o fez em caráter incidental e ressaltou que se tratava de mero obter dictum em relação à ratio decidendi do RE n. 593.849/MG49.

Ademais, a decisão do STF transitou em julgado em 22 de fevereiro de 2018, sendo, portanto, irrecorrível e imutável e, por ter sido julgada em sede de repercussão geral, produziu efeitos erga omnes para todo o ordenamento jurídico brasileiro.

Oportuno lembrar que, de acordo com o art. 504 do Código de Processo Civil, a coisa julgada não recai sobre “os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença” (art. 504, inciso I) e “a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença” (art. 504, inciso II). Sobre o tema, ensinava José Carlos Barbosa Moreira que “por ‘motivos’ não se podem deixar de entender aí as razões de decidir, os ‘fundamentos’ da sentença a que se refere [...]. Esses motivos, razões ou fundamentos hão de resultar, necessariamente, do exame das questões – suscitadas pelas partes ou apreciadas ex officio – cujo desate constitua pressuposto lógico da solução do litígio: puras questões de direito, puras questões de fato e questões que já envolvam aplicação do direito a fato ou fatos, mas situadas ainda no campo das premissas, e não no da conclusão (prejudiciais)”50.

Trata-se, pois, do limite objetivo da coisa julgada, ou seja, a delimitação daquilo que efetivamente se torna imutável na decisão judicial. Conforme exposto, somente a parte dispositiva da decisão de mérito é que resta acobertada pela coisa julgada. Por mais relevantes que sejam os fundamentos do RE n. 593.849/MG para que se alcance a conclusão de que a cobrança de ICMS-ST complementar pelo Fisco pode ser admitida, bem verdade é que essa questão não foi objeto de análise do STF, tampouco transitou em julgado.

Assim, do ponto de vista estritamente processual, haveria necessidade de que o STF apreciasse especificamente a questão do “ICMS-ST complementar”, a partir do manejo de via processual adequada e provocada por parte interessada, isto é, os Estados competentes para cobrança de ICMS em regime de substituição tributária.

3.3. Ponderação de princípios diante do art. 150, § 7º, da Constituição de 1988

A possibilidade de cobrança de imposto complementar pelo Fisco ou de restituição do imposto pago a maior pelo contribuinte nos casos de recolhimento de ICMS em regime de substituição tributária tem sido enfrentada pela doutrina como uma questão de ponderação de princípios, notadamente do conflito entre praticabilidade e capacidade contributiva51, usualmente decorrente da utilização de métodos de simplificação da tributação que, ao se aproximarem da justiça geral, distanciam-se da justiça individual52. Da mesma forma, o Supremo Tribunal Federal, ainda que implicitamente, sempre enfrentou a questão a partir da ponderação dos princípios da praticabilidade e capacidade contributiva53.

No julgamento da ADI n. 1851-4/AL, o STF entendeu que a restrição ao princípio da capacidade contributiva em prol da praticabilidade da tributação por meio do uso de tributação por fato gerador presumido e estimado é admissível, ainda que de forma definitiva, vez que a capacidade contributiva do contribuinte estava assegurada “na maior medida possível”, desde que as margens estimadas não se convertessem em valores arbitrários, mas sim em uma média ponderada dos preços de mercado54.

Não obstante, o entendimento de outrora não impediu a Corte Suprema de, por ocasião do julgamento do RE n. 593.849/MG, superar (overruling) o precedente antigo e entender que não mais se justificava a restrição à capacidade contributiva dos contribuintes pela tributação definitiva “por fato gerador presumido” sob o argumento de praticabilidade, razão pela qual o contribuinte teria direito à restituição do valor pago a maior quando a base de cálculo do fato gerador real fosse menor que a do “fato gerador presumido”.

A análise foi circunstancial, pois, afinal, o exame de proporcionalidade, em suas três etapas (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito), consiste em uma avaliação que não se faz apenas quando da edição da norma a ser avaliada, mas mediante cada caso concreto em que o intérprete/aplicador faz seu uso. Ainda que em certas circunstâncias se afirme ser proporcional determinada medida, pode-se, em outra oportunidade, alcançar conclusão diversa, à luz de novos fatos.

Como ensina Paulo Victor Vieira da Rocha, “assumida a premissa de que os princípios constitucionais podem ser cumpridos em diferentes graus, sua interpretação e aplicação se baseia nas circunstâncias que envolvem, em cada caso, sua relação com outros princípios”55. Assim ocorreu no julgamento do RE n. 593.849/MG: tendo a substituição tributária surgido a partir da inspiração na praticabilidade, naquele momento, a medida já não poderia ser aprovada no teste de necessidade, porquanto, com o aprimoramento dos meios eletrônicos de fiscalização e alargamento dos limites dos poderes investigativos do Fisco, não foi considerada proporcional quando considerada a restrição ao princípio da capacidade contributiva56.

De qualquer modo, não é possível extrair da ponderação dos princípios da capacidade contributiva e da praticabilidade uma resposta adequada para o caso de cobrança de ICMS a título de complementação ao imposto cobrado em regime de substituição tributária.

É verdade que a Constituição de 1988 não permitiu o abandono total do fato gerador real no regime de substituição tributária, mas, ao contrário, instituiu a obrigação tributária “cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente”, devendo assegurar a restituição imediata e preferencial ao contribuinte, caso não se realize “o fato gerador presumido”. Ressalte-se: o art. 150, § 7º, da Constituição estipulou “cláusula de vinculação” ao fato gerador real tão somente para os casos de restituição imediata e preferencial do contribuinte que pagou imposto a maior57. Nada se fala para os casos em que o fato gerador real ocorre em valor superior ao “fato gerador presumido”.

O art. 150, § 7º, da Constituição é norma de atribuição de competência tributária para que os entes federativos arrecadem tributos em regime de substituição tributária, ou seja, sem sua previsão expressa no texto constitucional e a (questionável) confirmação de sua constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, sequer haveria a possibilidade de instituição do regime.

Quando o constituinte opta pela positivação de enunciados mais precisos e objetivos e com menor amplitude como forma de limitar o poder de tributar dos entes federativos, ele evidencia sua intenção de controlar o espectro de atuação desses entes, já que, ao se deparar com tais disposições, o intérprete/aplicador, inevitavelmente, construirá regras. Estas, ao selecionarem termos, expressões e palavras efetivamente relevantes, deixando outros de fora, acabam limitando as razões envolvidas na aplicação da norma.

Nesse sentido, como ensina Frederick Schauer, nesse caso, as generalizações preexistentes às regras ficariam “entrincheiradas”58. Por sua vez, Humberto Ávila entende que, se houve a positivação de uma regra para determinar o meio específico de atuação do poder público, não cabe ao Poder Legislativo ou Poder Executivo, arbitrariamente, escolher outro meio para atuar, por melhor que possa lhe parecer. O conflito moral que surgiria diante da inexistência de uma regra deixa de surgir em razão do efeito decisório da regra positiva59.

Sobre o tema, Mauro Barberis60 lembra que a ponderação não é apenas a última passagem do controle de proporcionalidade – isto é, a chamada “proporcionalidade em sentido estrito” –, mas também é uma técnica de resolução de conflitos entre princípios constitucionais, (independentemente do controle de proporcionalidade), que consiste no balanceamento legal de conflitos éticos subjacentes, considerando todas as razões favoráveis ou contrárias a determinada solução.

No Estado de Direito, é clara a comparação entre valores implicitamente considerados pelo legislador constituinte, formulando-os como princípios ou regras no texto constitucional. Assim, este seleciona os valores disseminados em uma determinada sociedade e converte-os em normas constitucionais, e, assim fazendo, também pode equilibrá-los explicitamente: por exemplo, distinguindo, na sistemática dos textos constitucionais, os princípios supremos ou fundamentais de todos os outros. De outro modo, em relação aos temas em que o legislador constituinte entendeu necessário “amarrar” o legislador ordinário/complementar com mais força, prossegue ele mesmo para especificar regras61.

Assim parece ter sido o caso da Emenda Constitucional n. 03/1993, ao introduzir a redação do art. 150, § 7º, da Constituição de 1988: ao prever expressamente a possibilidade de restituição do contribuinte que praticasse fato gerador real em valor inferior àquele presumido, mas sendo omisso quanto à possibilidade de cobrança de imposto complementar ao ICMS-ST cobrado do substituto tributário, limitou a possibilidade de os Estados instituírem leis ordinárias prevendo a cobrança da complementação quando o fato gerador real ocorrer em valor superior ao presumido.

Diante da objetividade da regra disciplinada no art. 150, § 7º, da Constituição – que trata apenas do direito de restituição imediata e preferencial contribuinte nos casos em que o fato gerador real ocorrer em valor inferior ao “fato gerador presumido” –, tal norma careceria de ponderação entre princípios conflitantes, pois o legislador constituinte “entrincheirou” quaisquer razões ou valores subjacentes à norma quando silenciou de forma eloquente quanto à possibilidade de cobrança de ICMS-ST a título complementar.

Para melhor compreensão das razões pelas quais o legislador constituinte não previu expressamente a hipótese de complementação do imposto cobrado do substituto tributário a título de ICMS-ST na redação do art. 150, § 7º, da Constituição, é necessário compreender as diferenças entre lacunas e silêncio eloquente na interpretação das normas jurídicas.

Com base nas lições de Karl Larenz62, em relação às lacunas normativas, pode-se dizer que existem situações em que a lei dispõe uma regra aplicável ainda dentro dos sentidos literais possíveis da lei e, ao mesmo tempo, há situações em que a regra não se ajusta ao sentido e escopo da lei. Assim, as lacunas normativas implicam a ausência de regra expressa, positiva ou negativa, que confirme ou infirme o escopo de aplicação da lei a determinada situação. Já em relação ao silêncio eloquente da lei, não há que se falar em lacuna, mas, ao contrário, a norma jurídica é suficiente para regular o objeto em conformidade com a vontade do legislador, razão pela qual qualquer situação não incluída nos sentidos literais possíveis da lei estará relegada ao “espaço livre do Direito”, isto é, uma situação que a ordem jurídica deixou de regular expressamente.

Na interpretação das normas jurídico-tributárias, foi Ricardo Mariz de Oliveira que ressaltou, em brilhante lição, que enquanto “a lacuna requer preenchimento, tal como previsto no art. 108 do CTN ao mencionar os meios de integração – não de interpretação – da lei, a qual ocorre exatamente quando haja lacuna da lei” 63, por sua vez, “o silêncio eloquente não comporta analogia porque não significa a ausência de norma, mas, pelo contrário, existência de norma inserida no silêncio da lei sobre determinada situação que deveria estar abarcada expressamente por alguma norma”64. Ainda, adicionaríamos à lição do autor que, nos casos de silêncio eloquente da lei, sequer seria cabível integração ou interpretação a contrario sensu.

Com base nessas lições, ao interpretar a regra prevista no texto do art. 150, § 7º, da Constituição, as seguintes conclusões podem ser alcançadas: (i) a atribuição do sentido de “não ocorrência”, previsto no dispositivo constitucional, para fins da determinação do direito de restituição do imposto pago a maior nos casos em que o fato gerador real ocorrer em montante inferior ao presumido, deve ser feito a partir da ponderação de princípios (capacidade contributiva x praticabilidade/proteção à livre concorrência), à luz das circunstâncias jurídicas e fáticas do caso concreto, isto é, de forma dinâmica; (ii) apesar de o legislador constituinte ter previsto de forma expressa o direito de restituição do contribuinte quando o fato gerador real ocorrer em montante inferior àquele presumido, não previu, direta ou indiretamente, a possibilidade de cobrança de imposto complementar ao ICMS-ST já cobrado do substituto tributário, nos casos em que o valor do fato gerador real for superior ao presumido; (iii) diante do potencial conflito de interesses entre Fisco e contribuinte nos casos em que o fato gerador real ocorrer em montante superior àquele presumido, ao instituir o regime de substituição tributária, o legislador constituinte “entrincheirou” razões subjacentes e instituiu regra de competência tributária no art. 150, § 7º, da Constituição, afastando qualquer discussão subjacente de cobrança de encargo tributário complementar; (iv) o art. 150, § 7º, da Constituição não traz hipótese de lacuna, mas sim de silêncio eloquente da lei, pois, ao instituir o regime de substituição tributária, o legislador constituinte vislumbrou (ou poderia ter vislumbrado) que o fato gerador real ocorreria em valor (maior ou menor) distinto daquele presumido, no entanto, previu apenas o direito de restituição do contribuinte, mas não o dever de complementação do imposto pago.

4. Conclusão

Os debates realizados durante o julgamento do RE n. 593.849/MG trouxeram à tona uma série de argumentos que apontaram no sentido da admissibilidade – ou, no mínimo, suscitaram dúvidas – da cobrança de ICMS a título de complementação ao imposto já pago em regime de substituição tributária. Não obstante, a análise jurídica, técnica e rigorosa demonstra que os fundamentos defendidos não amparam tal conclusão.

O instituto do enriquecimento sem causa não tem aplicabilidade no Direito Tributário, onde a relação jurídica entre Fisco e contribuinte é pautada pelo princípio da legalidade, e não pela vontade das partes, não sendo possível se falar em “enriquecimento” ou “empobrecimento” de um ou de outro, quando obedecida expressamente a disposição legal.

Processualmente, a ratio decidendi fixada pelo RE n. 593.849/MG não abrange os casos em que a base de cálculo do fato gerador real ocorrer em valor superior ao “fato gerador presumido”, ocasião em que o Fisco poderia, em tese, cobrar “ICMS-ST complementar”, como restou bem demonstrado pelos debates entre os ministros – que ressaltaram o caráter incidental dessa questão (obter dictum) –, e pela posterior rejeição dos embargos de declaração do Estado de Minas Gerais que tentaram provocar a análise da questão sob o risco de inovação processual expressamente vedada.

Por fim, não cabe falar em ponderação de princípios conflitantes de praticabilidade e capacidade contributiva do contribuinte quando a objetividade do art. 150, § 7º, da Constituição “entrincheirou” as razões subjacentes à aplicação da norma e não fez referência expressa à possibilidade de complementação de imposto quando o fato gerador real ocorrer em valor superior ao “fato gerador presumido”, isto é, o texto do dispositivo constitucional silenciou de forma eloquente.

5. Referências bibliográficas

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1 Nesse sentido, o art. 265 do Regulamento do ICMS do Estado de São Paulo (Decreto n. 45.490 de 2000) dispõe que “retenção do imposto na forma deste capítulo não exclui o pagamento de complemento, pelo contribuinte substituído, na hipótese de o valor da operação ou prestação final com a mercadoria ou serviço ter sido maior que o da base de cálculo utilizada para a retenção, observada a disciplina estabelecida pela Secretaria da Fazenda”.

2 No caso, o art. 31-A do Regulamento do ICMS do Estado de Minas Gerais (Decreto n. 43.080/2002) dispõe que “o contribuinte substituído deverá recolher o valor relativo à complementação do ICMS ST quando promover operação interna de circulação de mercadoria a consumidor final em montante superior à base de cálculo presumida utilizada para o cálculo do ICMS ST da mesma mercadoria”.

3 RE n. 1.097.998 AgR, Relator(a): Min. Dias Toffoli, Segunda Turma, j. 07.08.2018, Processo Eletrônico DJe 185, divulgado em 04.09.2018, publicado em 05.09.2018.

4 Cf. GRECO, Marco Aurélio. Substituição tributária: ICMS, IPI, PIS e COFINS. São Paulo: IOB, s.d. p. 19.

5 “Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação.”

6 Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 595.

7 Cf. COSTA, Alcides Jorge. Contribuição ao estudo da obrigação tributária. São Paulo: IBDT, 2003. p. 61.

8 “Art. 121. [...]

I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;”

9 “Art. 121. [...]

II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.”

10 SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. São Paulo: IBET, Resenha Tributária, 1975. p. 92-94.

11 FUNARO, Hugo. Sujeição passiva indireta no direito tributário brasileiro: as hipóteses de responsabilidade pelo crédito tributário previstas no Código Tributário Nacional. São Paulo: Quartier Latin/IBDT, 2013. p. 63.

12 PINTO JÚNIOR, Paulo Carvalho Engler. A substituição tributária “para frente” e os princípios constitucionais tributários. In: CARRAZZA, Elizabeth (coord.). ICMS: questões atuais. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 159-161.

13 GRECO, Marco Aurélio. Legitimação ativa e o direito à restituição na substituição tributária. In: FERREIRA NETO, Arthur M.; e NICHELE, Rafael (Coord.). Curso avançado de substituição tributária: modalidades e direitos do contribuinte. 2. ed. rev. aum. São Paulo: Livraria do Advogado: IET, 2016. p. 430-432.

14 GRECO, Marco Aurélio. Substituição tributária: antecipação do fato gerador. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 111.

15 ATALIBA, Geraldo; e BARRETO, Aires F. Substituição e responsabilidade tributária, Revista de Direito Tributário v. 49, n. 13. São Paulo: RT, 1989. p. 83.

16 MELO, José Eduardo Soares de. Substituição tributária progressiva e Emenda Constitucional 3/93, Revista de Direito Tributário v. 63, p. 253-263. São Paulo: Malheiros.

17 Cf. ADI n. 1.851/AL, Rel. Min. Ilmar Galvão, Tribunal Pleno, j. 08.05.2002, DJe 22.11.2002.

18 Recurso Extraordinário n. 593.849, Relator(a): Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, j. 19.10.2016, Acórdão Eletrônico Repercussão Geral – Mérito DJe 65, divulgado em 30.03.2017, publicado em 31.03.2017. Republicação: DJe 68, divulgado em 04.04.2017, publicado em 05.04.2017, p. 57.

19 Recurso Extraordinário n. 593.849, Relator(a): Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, j. 19.10.2016, Acórdão Eletrônico Repercussão Geral – Mérito DJe 65, divulgado em 30.03.2017, publicado em 31.03.2017. Republicação: DJe 068, divulgado em 04.04.2017, publicado em 05.04.2017, p. 78.

20 LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 8. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2019. p. 452.

21 GUASTINI, Riccardo. Distinguiendo: estudios de teoría y metateoría del derecho. Barcelo: Gedisa Editorial, 1999. p. 229.

22 BARRETO, Paulo Ayres; FONSECA, Fernando Daniel de Moura. Os limites à autonomia conceitual em matéria tributária: uma análise dos arts. 109 e 110 do Código Tributário Nacional. In: MENDES, Gilmar Ferreira; e COELHO, Sacha Calmon Navarro (Org.). Direito tributário contemporâneo. São Paulo: RT, 2016. p. 304-305.

23 “Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.

Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido.

Art. 885. A restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que justifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir.

Art. 886. Não caberá a restituição por enriquecimento, se a lei conferir ao lesado outros meios para se ressarcir do prejuízo sofrido.”

24 Sobre o tema: AMERICANO, Jorge. Ensaio sobre o enriquecimento sem causa. São Paulo: Acadêmica, 1933; VIEIRA GOMES, Júlio. O conceito de enriquecimento, o enriquecimento forçado e os vários paradigmas do enriquecimento sem causa. Coimbra: Universidade Católica Portuguesa, 1998.

25 ALVIM, Agostinho. Do enriquecimento sem causa. São Paulo: RT, 1957. p. 18-34.

26 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 220-225.

27 OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Fundamentos do imposto de renda. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2008. p. 397.

28 Na mesma linha, Luís Eduardo Schoueri fala de “relação de inerência” entre os tributos e uma ou mais bases de cálculos, sendo “inerente a todo tributo qualquer base que meça a materialidade de sua hipótese de incidência”. Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Fato gerador da obrigação tributária. In: _____ (coord.). Direito tributário: homenagem a Alcides Jorge Costa. São Paulo: Quartier Latin, 2003. v. 1. p. 160.

29 ÁVILA, Humberto. ICMS. Substituição tributária no Estado de São Paulo. Base de cálculo. Pauta fiscal. Competência legislativa estadual para devolver a diferença constante entre o preço usualmente praticado e o preço constante da pauta. Exame de constitucionalidade, Revista Dialética de Direito Tributário n. 124. São Paulo: Dialética, p. 102.

30 Luís Eduardo Schoueri ressalta que, uma vez entendida a “causa” como a justificativa (função) da lei, já não seria possível admitir que uma obrigação – ainda que ex lege, como a obrigação tributária – tenha por causa a própria lei. Daí surgir a importância de estudar as “causas” das obrigações tributárias como a justificativa ou função da regulamentação legal da matéria. Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 180.

31 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 562.

32 ULHÔA CANTO, Gilberto. Causas das obrigações fiscais. In: SANTOS, J. M. de Carvalho; e DIAS, José de Aguiar. Repertório enciclopédico do direito brasileiro. Rio de Janeiro: Borsoi, s./d. v. 8. p. 3-25.

33 ÁVILA, Humberto. Presunções e pautas fiscais à eficiência administrativa. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Grandes questões atuais do direito tributário. São Paulo: Dialética, 2005. p. 277-288.

34 FERRAZ, Roberto. O consumo, a concorrência, o mercado e as distorções da substituição tributária (para frente). In: ROCHA, Valdir de Oliveira (coord.). Grandes questões atuais do direito tributário. São Paulo: Dialética, 2007. v. 2. p. 363.

35 GRECO, Marco Aurélio. Substituição tributária: ICMS, IPI, PIS e COFINS. São Paulo: IOB, s./d. p. 26.

36 MIRAGEM, Bruno. Abuso de direito. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 51.

37 TÔRRES, Heleno Taveira. Direito tributário e direito privado: autonomia privada, simulação, elusão tributária. São Paulo: RT, 2003. p. 197.

38 YAMASHITA, Douglas. Elisão e evasão de tributos: planejamento tributário à luz do abuso de direito e da fraude à lei. São Paulo: Lex, 2005. p. 61.

39 TÔRRES, Heleno Taveira. Op. cit., p. 197.

40 DERZI, Misabel Abreu Machado. O planejamento tributário e o buraco do real. Contraste entre a completabilidade do Direito Civil e a vedação da completude no Direito Tributário. In: FERREIRA, Eduardo Paz; TORRES, Heleno Taveira; e PALMA, Clotilde Celorico (org.). Estudos em homenagem ao Professor Doutor Alberto Xavier: economia, finanças públicas e direito fiscal. Coimbra: Almedina, 2013. v. 2. p. 399-414.

41 Recurso Extraordinário n. 593.849, Relator(a): Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, j. 19.10.2016, Acórdão Eletrônico Repercussão Geral – Mérito DJe 65, divulgado em 30.03.2017, publicado em 31.03.2017. Republicação: DJe 68, divulgado em 04.04.2017, publicado em 05.04.2017, p. 66.

42 Recurso Extraordinário n. 593.849, Relator(a): Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, j. 19.10.2016, Acórdão Eletrônico Repercussão Geral – Mérito DJe 65, divulgado em 30.03.2017, publicado em 31.03.2017. Republicação: DJe 68, divulgado em 04.04.2017, publicado em 05.04.2017, p. 6-7.

43 “Art. 2º. O processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei.”

44 “Art. 2º. Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e forma legais.”

45 É evidente que existem matérias que escapam a essa regra, o que só ocorre em casos nos quais a lei expressamente ressalva haver exceção. São as chamadas “questões cognoscíveis ex officio”, cujo principal exemplo são as matérias de ordem pública.

46 BARBI, Celso Agrícola. Comentários ao Código de Processo Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981. v. 1. p. 22.

47 NERY JÚNIOR, Nelson. Teoria geral dos recursos. 7. ed. São Paulo: RT, 2014. p. 401.

48 Recurso Extraordinário n. 593.849 ED-segundos, Relator(a): Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, j. 08.11.2017, Processo Eletrônico DJe 263, divulgado em 20.11.2017, publicado em 21.11.2017.

49 Recurso Extraordinário n. 593.849, Relator(a): Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, j. 19.10.2016, Acórdão Eletrônico Repercussão Geral – Mérito DJe 65, divulgado em 30.03.2017, publicado em 31.03.2017. Republicação: DJe 68, divulgado em 04.04.2017, publicado em 05.04.2017, p. 58.

50 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1988. p. 92.

51 Sobre o tema: VIEIRA DA ROCHA, Paulo Victor. Substituição tributária e proporcionalidade: entre capacidade contributiva e praticabilidade. São Paulo: Quartier Latin, 2012.

52 ÁVILA, Humberto. ICMS. Substituição tributária no Estado de São Paulo. Base de cálculo. Pauta fiscal. Competência legislativa estadual para devolver a diferença constante entre o preço usualmente praticado e o preço constante da pauta. Exame de constitucionalidade, Revista Dialética de Direito Tributário n. 124. São Paulo: Dialética, p. 96-98.

53 Paulo Victor Vieira da Rocha ressalva que o controle de proporcionalidade de normas que mitigam direitos fundamentais pode ser encarado como ferramenta metodológica a ser utilizada não apenas por órgãos julgadores, mas também por aqueles que pretendam analisar e reconstruir argumentativamente tais decisões. Assim que, embora não tenha sido feita expressa referência ao controle de proporcionalidade, ele ainda pode ser reconstruído por tais pressupostos metodológicos. Cf. VIEIRA DA ROCHA, Paulo Victor. O fato gerador presumido na substituição tributária “para frente” e o sentido de sua não ocorrência: uma guinada na interpretação constitucional reconstruída metodicamente pelo controle de proporcionalidade. In: BUISSA, Leonardo; RIEMANN, Simon; e MARTINS, Rafael Lara (org.). Direito e finanças públicas nos 30 anos da constituição: experiências e desafios nos campos do direito tributário e financeiro. 1. ed. Florianópolis: Tirant lo Blanch, 2018. v. 1. p. 219-220.

54 VIEIRA DA ROCHA, Paulo Victor. O fato gerador presumido na substituição tributária “para frente” e o sentido de sua não ocorrência: uma guinada na interpretação constitucional reconstruída metodicamente pelo controle de proporcionalidade. In: BUISSA, Leonardo; RIEMANN, Simon; e MARTINS, Rafael Lara (org.). Direito e finanças públicas nos 30 anos da constituição: experiências e desafios nos campos do direito tributário e financeiro. 1. ed. Florianópolis: Tirant lo Blanch, 2018. v. 1. p. 220.

55 Idem, p. 221-222.

56 VIEIRA DA ROCHA, Paulo Victor. O fato gerador presumido na substituição tributária “para frente” e o sentido de sua não ocorrência: uma guinada na interpretação constitucional reconstruída metodicamente pelo controle de proporcionalidade. In: BUISSA, Leonardo; RIEMANN, Simon; e MARTINS, Rafael Lara (Org.). Direito e finanças públicas nos 30 anos da constituição: experiências e desafios nos campos do direito tributário e financeiro. 1. ed. Florianópolis: Tirant lo Blanch, 2018. v. 1. p. 223-224.

57 ÁVILA, Humberto. ICMS. Substituição tributária no Estado de São Paulo. Base de cálculo. Pauta fiscal. Competência legislativa estadual para devolver a diferença constante entre o preço usualmente praticado e o preço constante da pauta. Exame de constitucionalidade, Revista Dialética de Direito Tributário n. 124. São Paulo: Dialética, p. 123.

58 SCHAUER, Frederick. Playing by the rules: a philosophical examination of rule-based decision-making in law and in life. Oxford: Clarendon Law Series, 1991. p. 49.

59 ÁVILA, Humberto. Princípios e regras e a segurança jurídica, Revista de Direito do Estado n. 1. Rio de Janeiro: Renovar, jan./mar. 2006, p. 198.

60 BARBERIS, Mauro. Una filosofia del diritto per lo stato costituzionale. Torino: G. Giappichelli Edditore, 2017. p. 216-217.

61 Idem, p. 217-218.

62 LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 8. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2019. p. 524-525.

64 Idem, p. 156.