Fundamentos da Sanção no Direito Tributário1

Foundations of the Sanction in Tax Law

Simone Cruz Nobre

Mestre em Direito pelo Centro Universitário do Estado do Pará. Auditora Fiscal da Secretaria de Estado de Fazenda do Pará. E-mail: sequecruz@yahoo.com.br

Iracema Teixeira Vieira

Mestranda em Direito pela Universidade Federal do Pará. Analista de Controle Externo Tribunal de Contas dos Municípios do Pará. E-mail: iracema2805@gmail.com

Lise Tupiassu

Doutora em Direito pela Université Toulouse 1 – Capitole. Professora da Universidade Federal do Pará e do Centro Universitário do Estado do Pará. E-mail: lise@ufpa.br.

Recebido em: 21-08-2019

Aprovado em: 25-10-2019

Resumo

O presente artigo tem por objetivo apresentar os fundamentos da sanção no Direito Tributário partindo-se da lógica que o tributo é a principal fonte de recurso financeiro do Estado para implementar direitos fundamentais. No entanto, quando o contribuinte do tributo não cumpre uma obrigação tributária o Estado tem o dever de puni-lo, desde que não ultrapasse os limites da razoabilidade. Assim, objetiva-se tratar dos problemas que surgem em relação à natureza jurídica das penalidades tributárias, buscando-se compreender a legitimidade das sanções tributárias, o fundamento teórico e prático, desenvolvendo-se a partir de uma pesquisa bibliográfica e método dedutivo. Conclui-se que, a depender do campo do Direito que está vinculado o dever jurídico, as consequências impostas pelo seu descumprimento podem sofrer alterações com consequências jurídicas ao destinatário e as sanções tributárias devem ser tratadas e legitimadas, diferentemente das sanções penais, permitindo ao contribuinte fazer valer as limitações intrínsecas ao poder de tributar.

Palavras-chave: Direito Tributário, sanção tributária, poder de tributar.

Abstract

This article aims to present the foundations of the sanction in the Tax Law starting from the logic that the tax is the main source of financial resources of the State to implement fundamental rights. However, when the taxpayer does not fulfill a tax obligation, the State has a duty to punish it provided that it does not exceed the limits of reasonableness. Thus, it aims to address the problems that arise in relation to the legal nature of tax penalties, seeking to understand the legitimacy of tax sanctions, the theoretical and practical basis, developing from a bibliographic research and deductive method. It is concluded that, depending on the field of law that is bound by the legal duty, the consequences imposed by its non-compliance may change with legal consequences to the addressee and the tax sanctions must be treated and legitimated, unlike criminal sanctions, allowing the taxpayer enforce intrinsic limitations on the power to tax.

Keywords: Tax Law, tax sanction, power to tax.

Introdução

“Direitos custam dinheiro”. A frase escrita por Holmes e Sunstein2 traduz a necessidade que o Estado tem de arrecadar recursos para custear as políticas públicas que implementam direitos à sociedade, sendo o tributo a sua principal fonte de receita. Nessa perspectiva, pagar tributo não é opção, mas sim obrigação, porque sem ele o Estado não disporia de meios para financiar nem o mais simples dos direitos.

Nessa perspectiva, o Estado age com soberania política outorgada pela Constituição Federal que lhe confere poderes especiais, dentre eles o de tributar, que envolve a competência constitucional para criar, fiscalizar e cobrar tributos, mediante lei em sentido estrito. Assim, quando um ente estatal cria, mediante lei, um tributo, estabelece também as hipóteses de incidência, a alíquota, sua base de cálculo e as hipóteses de isenção.

Logo, quando um ato do contribuinte se enquadra numa hipótese de incidência descrita na lei ensejadora do tributo, diz-se que ocorreu a subsunção do fato à norma, materializando-se o fato gerador do tributo. E a esse contribuinte surge a obrigação principal de pagar o tributo.

Entretanto, mesmo sendo instrumento necessário à garantia dos direitos fundamentais, a tributação sempre sofreu grande resistência por parte dos indivíduos. Este fato decorre da maneira excessiva e desigual com que foram historicamente submetidas as pessoas sujeitas à incidência tributária, levando muitos a enxergar a tributação como uma interferência indevida do Estado em sua propriedade do indivíduo.

Contudo, essa resistência no cumprimento de obrigações tributárias permite ao Estado se valer da sanção como instrumento de reforço ao cumprimento de suas disposições normativas, face à importância da tributação para a satisfação dos direitos protegidos no texto constitucional. Pagar tributo, porém, não é sanção. A sanção configura o direito do Estado de punir o descumprimento da obrigação tributária por parte do contribuinte ou seu substituto.

Ocorre que, muitas vezes, a intensidade e a forma como são disciplinadas e aplicadas as sanções fiscais acabam por não observar os mesmos preceitos que estas visam garantir, dando origem a críticas e dissenções doutrinárias e jurisprudenciais. Problemas surgem em relação à natureza jurídica das penalidades tributárias. Problemas surgem a respeito dos princípios jurídicos passíveis de guiar tanto a formulação quanto a imposição de tais sanções. Problemas surgem também, e quotidianamente, no mundo prático de cada contribuinte, tendo em vista as espécies de sanções aplicadas, que os fazem, em diversas oportunidades, reféns das discussões teóricas a respeito das penalidades, o que se soma a seu impacto no desenvolvimento das atividades econômicas, implicando, ainda, limitações impostas aos direitos fundamentais. Tudo isso enfraquece sobremaneira a legitimidade das sanções e, por conseguinte, do próprio Estado que as impõe.

Buscando compreender, portanto, a legitimidade das sanções tributárias, este texto questionar-se-á sobre o fundamento teórico e prático de tais sanções, desenvolvendo-se a partir de uma pesquisa bibliográfica e método dedutivo.

O artigo abordará, em um primeiro momento, a concepção teórica positivista da própria noção de sanção e sua relevância para o ordenamento jurídico.

Em um segundo momento, compreender-se-á a importância da sanção no direito tributário para, enfim, estudar suas diferentes funções e as consequências advindas da natureza jurídica tributária das referidas penalidades.

1. A sanção na teoria positivista

O Direito é um sistema de normas que orientam as condutas sociais, impondo ou restringindo certos atos humanos.

Ao qualificar o ato, passando a defini-lo como jurídico, a norma prescreve como este deve ser ou acontecer no mundo dos fatos. A conduta, então, passa a ser exigida, proibida, consentida, permitida ou facultada, produzindo efeitos no mundo jurídico.

No entanto, afirmar que uma norma é válida não significa dizê-la eficaz. Ou seja, uma norma pode ser válida, ter força de, ao menos, ser observada quando da elaboração de outras normas, mas, pode, por outro lado, não ser de fato obedecida ou aplicada, conforme estabelecido pelo legislador.

Nesse momento, como instrumento hábil a garantir eficácia da norma jurídica, muitas vezes, o legislador se vale da sanção.

Segundo Kelsen3, o conceito de sanção compreende tanto o castigo como o prêmio. O castigo é entendido como uma consequência negativa de uma conduta humana contrária à ordem jurídica. Já o prêmio é uma recompensa conferida ao indivíduo quando este atende aos preceitos estabelecidos por esta mesma ordem.

No entanto, este filósofo explica que, usualmente, apenas o castigo é entendido como sinônimo de sanção, pois nas modernas ordens jurídicas, as recompensas têm papel subalterno dentro de um sistema que funciona como ordens de coação4, de modo que apenas podem ser consideradas prescritas as condutas que prevejam uma desvantagem em caso de sua inobservância.

Assim, esta concepção do Direito como uma “ordem de coação”5-6 não admite que existam normas sem sanção. Porém, estabelecendo uma ligação entre a norma prescrita e a conduta oposta a um ato de coerção e, afastando qualquer representação, impulso ou juízo valorativo quanto ao dever jurídico, Kelsen difere a ordem jurídica da ordem moral. Deste modo, repelindo os impulsos ou os juízos valorativos ao dever jurídico, este jusfilósofo traz o princípio jurídico-positivo de que não se pode alegar desconhecimento da lei para eximir-se da sanção.

Ou seja, a ignorância da norma a não retira a responsabilidade por sua observância. Ademais, o indivíduo é tratado como mero destinatário da norma, sendo indiferente identificar se a norma vai ao encontro do que o homem entende como adequado ou justo.

Portanto, não seriam o valor, o conteúdo ou o ato em si preceitos aptos a revelar a ilicitude de uma conduta. Pelo fato de a ação ou omissão ser considerada como pressuposto para um ato de coação, determinado pela ordem jurídica, esta é qualificada como ilícita ou delituosa.

Logo, é irrelevante que a ação ou omissão seja considerada pelo destinatário, ou pela autoridade jurídica como indesejável, prejudicial, ou, por outro lado, até mesmo, útil. Isso porque, a simples definição de uma conduta como contrária ao ordenamento jurídico a qualifica como ilegal.

Desta forma, a sanção não deve ser avaliada pelo juiz. Este deve apenas observar se a conduta é contrária ou não ao estatuído em lei.

Norberto Bobbio7 também entende as sanções como uma resposta à violação do sistema normativo. Contudo, observa que nem todas as sanções, como resposta a essa violação, são iguais. Existem sanções morais e sociais, que possuem uma estrutura diferente da sanção jurídica.

A sanção moral impõe o sentimento de culpa e de angústia, gerando arrependimento no seu transgressor quando este comete uma violação. Contudo, a sanção moral, por ser interna, mostra-se pouco eficaz, uma vez que o sentimento desagradável que provoca no transgressor atua de forma, nitidamente, preventiva, buscando inibir a insatisfação íntima sem maiores repercussões frente aos outros indivíduos.

A sanção social, diferentemente da sanção moral, atua de forma externa, seja por meio de uma simples reprovação ou, até mesmo, pela repugnância da conduta praticada no seio social que, muitas vezes, leva à exclusão ou isolamento do indivíduo do grupo a que pertence8. A sanção social, no entanto, à medida que suscita reprovação da conduta praticada, por meio de reações nem sempre uniforme dos indivíduos que compõem o grupo social, acaba por gerar consequências incertas e desproporcionais à violação praticada.

Por sua vez, a sanção jurídica, embora externada como a sanção social, possui uma “eficácia reforçada”9 por ser institucionalizada. Isto significa que esta traz segurança na sua aplicação, proporcionalidade em sua quantificação e imparcialidade na sua execução.

Logo, o que passa a caracterizar a ordem jurídica é a sanção. Assim, a função da sanção para a ordem jurídica é, efetivamente, provocar uma privação coercitiva de bens jurídicos do indivíduo a fim de que as disposições normativas sejam observadas. A sanção, portanto, teria uma função essencialmente repressiva. Muito embora seja possível atuar sob a forma de coação psicológica, esta não seria a função essencial da sanção jurídica.

Contudo, Bobbio ao aprofundar seus estudos sobre as funções das sanções jurídicas, passa, posteriormente, a conceituar a sanção como sendo uma forma de repressão ao descumprimento por meio da ameaça. Ele observa que é por meio do receio de que o Estado utilize o seu poder, que o indivíduo busca respeitar o ordenamento jurídico e não, efetivamente, por meio da sanção.

Assim, percebendo a necessidade de uma maior aproximação das ciências jurídicas com as ciências sociais, em razão de duas tendências que reduzem a função específica do direito como meio de controle social, Bobbio rompe com a tradição do positivismo jurídico Kelseniano10, que conferia ao Direito uma função essencialmente coativa.

O Direito, segundo Bobbio, não pode ficar imune ao movimento social, devendo se enxergar o sistema jurídico como um corpo de regras abertas, em uma sociedade em transformação. Desta forma, o Direito deve ser visto não como autônomo, mas como um subsistema de um sistema global.

O reflexo dessas mudanças sociais sobre o ordenamento jurídico coincide com a passagem do Estado liberal clássico para o Estado assistencial, onde o Direito, na sociedade contemporânea, deixa de estabelecer apenas regras de conduta e passa à elaboração de normas de organização.

Com efeito, no Estado liberal clássico a ideologia de um Estado guardião da ordem pública, levou o Direito a ser reduzido a um conjunto de normas elaboradas para atingir sua função protetora de direitos e repressora das condutas desviantes. A partir da nova ideologia que surge com o Estado assistencial, a função de garantir divide espaço com a função de promover.

Logo, ao lado das normas de conduta, que visavam o controle social por meio do desencorajamento produzido pela sanção, surgem as normas de organização, mais frequentemente utilizadas as técnicas de encorajamento.

O encorajamento abrange dois tipos de técnicas: o incentivo e o prêmio. A primeira é utilizada para favorecer o exercício de uma determinada atividade econômica. Esta técnica, portanto, precede à ação; já a segunda é uma recompensa posterior à ação, que consiste na sanção positiva.

Embora ambas sejam técnicas de encorajamento, apenas o prêmio se insere na categoria de sanção positiva, uma vez que este é resultado de uma ação boa.

Assim, o prêmio, de um papel subalterno na teoria kelseniana, reaparece como um importante instrumento de direcionamento social.

Esta alteração produz uma nova imagem do Direito, que deixa de ser entendido como ordenamento protetor-repressor, passando o ordenamento jurídico à postura promocional, onde, lentamente, as técnicas de sanções positivas assumem um importante papel.

Neste sentido, destaca Bobbio:

“Com efeito, o papel do Direito na sociedade é comumente considerado do ponto de vista da sua função predominante, que sempre foi aquela, mais passiva que ativa, de proteger determinados interesses mediante a repressão dos atos desviantes. Não há dúvidas de que a técnica das sanções negativas é a mais adequada para desenvolver esta função, a qual é, ao mesmo tempo, protetora em relação aos atos conformes e repressiva em relação aos atos desviantes. Contudo, a partir do momento em que, devido às exigências do estado assistencial contemporâneo, o direito não mais se limita a tutelar atos conformes às próprias normas, mas tende a estimular atos inovadores – e, portanto, a sua função não é mais apenas protetora, mas também promocional –, surge, paralelamente ao emprego quase exclusivo das sanções negativas, as quais constituem a técnica específica da repressão, um emprego, não importa se ainda limitado, de sanções positivas, que dão estímulo e propulsão a atos considerados socialmente úteis, em lugar da repressão de atos considerados socialmente nocivos.”11

Seu entusiasmo pelo uso de sanção positiva deve-se ao fato deste tipo de sanção, também, ser positiva no aspecto da liberdade, uma vez que não restringe o comportamento por meio de coação. Pelo contrário, o incentiva, deixando a critério do indivíduo segui-lo ou não.

O emprego deste tipo de sanção conduz a compreender o cidadão não apenas como o destinatário da norma, mas o seu autor, pois este passa a participar, efetivamente, de sua validade e cumprimento. Nesse sentido, o Estado passa a repensar quem é, de fato, o sujeito de direito.

Com efeito, a partir do emprego de sanções positivas a relação jurídica entre o sujeito ativo (titular do direito) e sujeito passivo (titular da obrigação) passa a ser invertida, pois, agora, a relação direito-obrigação parte daquele que é sancionado para o que sanciona12.

No entanto, embora seja perceptível a transformação na sociedade contemporânea, ainda, hoje, os Estados se valem, quase que com exclusividade, da sanção negativa como se esta fosse a única ferramenta disponível. Essa postura necessita ser alterada, como bem pontua Bobbio:

“A função de um ordenamento jurídico não é somente controlar os comportamentos dos indivíduos, o que pode ser obtido por meio de técnica das sanções negativas, mas também direcionar os comportamentos para certos objetivos preestabelecidos. Isso pode ser obtido, preferivelmente, por meio da técnica das sanções positivas e dos incentivos.”13

Fomentar o cumprimento das normas jurídicas por meio de técnicas de encorajamento, também propicia, do ponto de vista funcional, uma mudança social. Isto porque, enquanto as medidas de desencorajamento, por meio de sanções negativas levam à conservação social, as medidas de encorajamento conduzem à mudança social.

Assim, Bobbio idealiza uma nova sociedade. Esta não deve, necessariamente, ser controlada por sanções negativas. No seu entender, as penas não são os únicos meios de se obter o comportamento desejado e, neste sentido, não apenas com uso de coação direta se obtém a observância da norma. A ideia de sanção como meio coercitivo requer um novo olhar.

É nos apresentado um novo conceito de Estado. Um Estado que não abandona aos indivíduos a condução das atividades econômicas, nem assume totalmente a condução das atividades produtivas, mas sim, um Estado que oriente e encoraje, por meio do direito, as condutas dos indivíduos.

Este jusfilósofo italiano propõe que o Estado não se atenha apenas em um controle estabelecido por normas de conduta por meio de sanção negativas, mas para um controle fundado em normas técnicas, no qual o Estado passa a estabelecer um direito, também, preocupado com o equilíbrio das relações econômicas, encorajando e direcionando a sociedade. Logo, o Direito abandonaria a imagem de apenas ser um instrumento de proteção e repressão.

Portanto, enquanto na concepção tradicional, “o direito como ordenamento coativo funda-se sobre o pressuposto do homem mau, cujas tendências antissociais devem, exatamente, ser controladas”, a teoria da sanção em Bobbio parte da “consideração do Direito como um ordenamento diretivo, do pressuposto de um homem inerte, passivo, indiferente, o qual deve ser estimulado, provocado, solicitado”14. Daí a necessidade de estímulo ao homem inerte, por meio de sanções positivas que o direciona.

Desta forma, a ideia de sanção envolve não apenas a utilização de um instrumento coercitivo que busca punir o transgressor, mas, também, a possibilidade de uso de técnicas de encorajamento, que buscam assegurar o cumprimento do ordenamento jurídico de forma mais participativa.

2. A importância da sanção no direito tributário

O conceito de sanção refere-se, entre outras coisas, a medidas que um ordenamento normativo dispõe no intuito de reforçar o respeito às suas prescrições. Trata-se de uma providência destinada a lidar contra o natural (ou proposital) descumprimento, por parte de alguns membros, de normas convencionadas. Assim, considera-se que, tendo uma norma o caráter prescritivo imperativo, importante a previsão de sanções a fim de garantir sua observância.

As normas que estabelecem obrigações tributárias, a priori, seguem a mesma lógica. Entretanto, ainda que os tributos, por sua própria natureza, constituam obrigações de caráter compulsório, é possível localizar na história episódios em que a norma tributária não se fez acompanhar de sanções em caso de inobservância. Em verdade, dada a importância do tributo para a manutenção das funções estatais, esperava-se, nesses casos, contar com o civismo e o patriotismo dos indivíduos, de modo a prescindir de qualquer ação repressiva a garantir o cumprimento da obrigação tributária.

Na França, por exemplo, diante da crise fiscal tomada como estopim da famosa Revolução de 1789, um tributo patriótico foi “exigido” dos cidadãos, que deveriam contribuir voluntariamente com cerca 1/4 de sua renda, a fim de sanar o gigantesco déficit orçamentário que assombrava o país. Necker, entusiasta da ideia, considerava que os cidadãos contribuiriam felizes para o bem-estar e interesse geral da nação15. Seguindo a mesma lógica, face à grande crise financeira de 1926, novamente recorreu-se à “generosidade” dos contribuintes, imaginando-se que a legitimidade do Estado e da cobrança dos tributos, somada ao patriotismo dos cidadãos, seriam suficientes para instigá-los a colaborar para a redução das dívidas estatais16.

Nas duas ocasiões históricas citadas, foram instituídas obrigações tributárias desprovidas de sanções. Infelizmente, porém, tais experiências foram frustradas. Em ambos os casos, as receitas oriundas dos “tributos” ali criados foram ínfimas, obrigando o Estado, em um curto período de tempo, a estabelecer um sistema de fiscalização e de sanção, antes julgado desnecessário, a fim de constranger os contribuintes a cumprir as obrigações fiscais.

Assim, pautado no binômio detecção e punição, acreditou-se, a partir de então, que a melhor maneira de se elevar a arrecadação seria a Administração investir e aprimorar o seu enforcement. Isso porque, entendia-se que, na medida em que a Administração Tributária elevasse a multa ou se fizesse mais presente por meio de auditorias, o tax compliance ou cumprimento voluntário das obrigações tributárias, também aumentaria17.

No entanto, penalidades severas nem sempre elevam o cumprimento voluntário, haja vista a possibilidade de criação de um modus vivendi, em que se desenvolve um habitat adequado à corrupção e ao suborno, que, ao invés de elevar, acaba por reduzir a arrecadação do governo, prejudicando a confiança e o respeito nas instituições públicas18.

Desta forma, a antiga teoria econômica do crime19, sustentada no “paradigma etimológico do crime”20, vem cedendo lugar ao “paradigma do serviço”, no qual a Administração Tributária passa a compreender a importância das instituições e da política fiscal para motivar o tax compliance.

Isso porque, partindo-se da compreensão de que a tributação é uma relação que vincula tanto o cidadão com a sociedade, como o cidadão com o seu governo, percebe-se que ações fiscais transparentes, cujo intuito não seja o de apenas penalizar duramente quem descumpriu obrigações tributárias, mas, de perceber omissões ou complexidades normativas que necessitam ser revisadas, ajudam a criar um ambiente de segurança, uma vez que o contribuinte passa a ser visto, pelo Estado não como um potencial descumpridor da lei, mas sim, como um cliente.

O Estado, então, começa a perceber a importância de um poder punitivo adequado para com a conduta desviante. Um poder punitivo não apenas necessário a inibir condutas contrárias ao seu ordenamento, mas, também, proporcional à obrigação, pois, mostra-se interessante, ao próprio Estado, que o cumprimento das obrigações tributárias se dê, cada vez mais, de forma voluntária, reduzindo os custos advindos da necessidade de cobrança coercitiva dos tributos21.

Ressalta-se, de imediato, que para se elevar o cumprimento voluntário de obrigações tributárias, necessário, inicialmente, despertar uma conscientização fiscal por parte da sociedade acerca da importância da tributação. É importante estimular a cidadania fiscal, conscientizando a sociedade da importância dos tributos como veículo de concretização de políticas públicas necessárias à promoção e socialização das oportunidades.

Ocorre que disseminar uma consciência fiscal é um processo lento e nem sempre com resultados garantidos ou de fácil mensuração. Isto porque, quantificar até que ponto as obrigações fiscais são cumpridas de forma voluntária ou foram influenciadas pela intimidação presente na sanção não é algo simples, o que acaba por provocar certa descrença no sucesso de qualquer programa de cidadania fiscal.

Ademais, conforme constatado nos exemplos relatados, mister admitir que apenas a crença na boa fé generalizada dos cidadãos não é suficiente para a manutenção de um sistema tributário, tampouco da figura estatal. Isso porque, o tributo, ainda que tenha sua relevância reconhecida, é, na maioria das vezes, visto como uma privação, e pior, uma privação mal suportada por muitos indivíduos.

Portanto, as sanções se fazem necessárias para a manutenção de tal sistema, ainda que representem limitações à liberdade e à propriedade dos contribuintes, pois as regras tributárias são, em grande medida, normas de rejeição social.

Delimitada a importância da sanção para o cumprimento das obrigações tributárias, faz-se necessário ressaltar que nem sempre a sanção é utilizada apenas para reprimir um comportamento desviante.

Assim, conhecer as várias funções que uma sanção pode exercer mostra-se interessante para melhor traçar a sua dosimetria.

2.1. As funções das sanções

Se por um lado, as sanções são prescrições abstratas de que se vale o legislador para garantir a observância do ordenamento jurídico, tais exações apenas se mostram válidas quando, de fato, venham a cumprir a função para a qual foram estatuídas.

Desta forma, as sanções no Direito pressupõem uma função, seja esta preventiva, indenizatória, repressiva, pedagógica e assecuratória, pois as sanções devem estar relacionadas com o direito que visam proteger.

Alguns autores, seguindo a orientação Kelseniana, acrescentam a função incentivadora a este rol, uma vez que a ideia de sanção envolve tanto a pena como o prêmio22.

Costa assinala como exemplos de sanções premiais as imunidades, as isenções, as reduções de base de cálculo23.

As imunidades recíprocas, por exemplo, ao estabelecerem a não incidência qualificada de impostos visa promover o adequado funcionamento e equilíbrio entre as esferas de governo. Ademais, as isenções e reduções de base de cálculo, fundadas no interesse público, podem ser utilizadas como instrumento de modulação do comportamento do sujeito passivo.

No entanto, para outros doutrinadores este entendimento não se mostra o mais acertado24, pois embora a sanção, à semelhança do prêmio, vise estimular a observância do ordenamento jurídico, somente aquela pode ser imposta contra a vontade do infrator, fato que não ocorre com o prêmio.

Esses entendimentos partem da análise da estrutura normativa da sanção que prevê o ilícito na sua hipótese de incidência. Carvalho pontua bem essa estrutura:

“As normas sancionatórias são regras de conduta e ostentam a mesma estrutura lógica da regra matriz de incidência: um antecedente, descritor de classe de fatos do mundo real, e uma consequência prescritora de vínculo jurídico que há de formar-se entre dois sujeitos de direito. [...] A diferença entre essa espécie normativa e as demais regras de comportamento está no antecedente, tendo em vista que a regra sancionatória descreve fato ilícito qualificado pelo descumprimento de dever estipulado no consequente da regra matriz de incidência.”25

Machado, um dos contestadores da função premial das sanções fiscais, sintetiza o ponto que entende frágil nesta visão:

“Talvez por considerarem que a sanção caracteriza-se pela finalidade de atribuir eficácia à norma jurídica, alguns juristas respeitáveis afirmam a existência de uma sanção que não teria o ilícito na hipótese de incidência da norma que a institui, vale dizer, a sanção premial.”26

Não obstante estes entendimentos divergentes, o fato é que, como a sanção premial busca promover ou incentivar mudanças no comportamento dos indivíduos, a função da sanção premial é estimular condutas consideradas econômica, social ou politicamente úteis.

Logo, a função incentivadora, presente em uma sanção premial, busca compensar esforços ou retribuir um comportamento vantajoso do sujeito passivo.

Nas sanções do tipo pena, a função preventiva, como o próprio nome diz, visa prevenir ou desestimular o descumprimento da lei por meio do temor da implacável punição.

A pena ou castigo funciona como uma forma de intimidação àquele que vislumbra a possibilidade de descumprir a norma jurídica.

Silva, comentando a função preventiva, aduz:

“Atuando preventivamente, a sanção tem a virtude de desestimular o rompimento da ordem jurídica, mediante a intimidação de seus possíveis infratores a se sujeitarem aos seus indesejáveis efeitos. Nesse sentido, deve gerar na consciência dos destinatários das normas a convicção da inconveniência de sua infração.”27

Diferentemente das sanções preventivas, a pena na função indenizatória pressupõe um dano. Desta forma, têm caráter compensatório. As sanções indenizatórias devem ser ponderadas segundo critérios objetivos.

Assim, segundo Neves e Campos, se as infrações tributárias visam, de modo direto ou indireto, favorecer o patrimônio do infrator em detrimento do patrimônio do Estado, deverá a multa indenizar os prejuízos sofridos e a sanção ser estabelecida sobre o mesmo patrimônio que lhe favoreceu a infração28.

Villegas destaca que a função de reparação demonstra uma importante diferença entre a multa fiscal e a sanção aplicada no direito penal comum, uma vez que esta última busca impor ao delinquente um castigo, enquanto a primeira visa não apenas aplicar um mal ao infrator, como, também, ressarcir os prejuízos causados ao Fisco29.

A função repressiva atua como uma resposta à infringência praticada.

Krepsky pontua que o objetivo principal da multa fiscal é repreender o não cumprimento de uma obrigação tributária e, neste caso, esta deve ser exemplar:

“A administração pública necessita das receitas tributárias para custear suas despesas, todas de interesse da coletividade, e uma das maneiras – se não a única, ao menos principal – de atingir esse objetivo é punir com rigor quem descumpre suas obrigações tributárias.”30

Contudo, Pontes lembra a necessidade de proporcionalidade entre a sanção e as condições individuais do infrator:

“O princípio da proporcionalidade é regra cogente não apenas para o legislador, no desempenho da tarefa institucional de prever abstratamente as sanções tributárias, mas também para a autoridade administrativa encarregada de concretamente aplicá-las. Desta, aliás, é exigida maior prudência para, considerando as condições individuais do infrator, dentro da moldura traçada legalmente, definir concretamente a sanção a ser imposta.”31

Assim, a gravidade do ilícito deverá graduar a pena atribuída, de forma que os ilícitos mais graves recebam maior punição32.

Em verdade, aos ilícitos penais, por gerarem instabilidade social, face à indignação do mal praticado, o legislador utiliza as sanções em suas funções preventivas e repressivas. Nos ilícitos fiscais, o mesmo sentimento social não se faz presente, daí assumirem funções preventivas, repressivas e, às vezes, ressarcitórias.

A função pedagógica/preventiva visa a correção dos desvios praticados pelo contribuinte, seja em função de uma má interpretação dos dispositivos da legislação tributária, seja por dificuldades presentes nas complexas disposições normativas que requerem um constante controle pelo contribuinte da observância de várias obrigações tributárias.

Silva defende a utilização de sanções pedagógicas nas infrações formais, amenizando os efeitos punitivos da pena, após alterações normativas que tragam novas obrigações ou substanciais modificações nas existentes, por um período suficiente para um adequado esclarecimento do seu conteúdo pelos seus destinatários33.

Na seara tributária, a denúncia espontânea representa um bom exemplo de função pedagógica, na qual o Estado, prestigiando a boa-fé do contribuinte em reconhecer a sua falta, retira a multa de ofício estabelecida pela infringência à legislação.

Na função assecuratória adotam-se mediadas a fim de garantir a satisfação de direitos.

As medidas assecuratórias poderão ser encontradas, por exemplo, na eleição por lei do substituto tributário, na responsabilidade solidária dos pais pelos tributos devidos por seus filhos, do inventariante, dentre outras.

Como é possível observar, as sanções desempenham várias funções e uma mesma sanção pode exercer diferentes funções ao mesmo tempo.

Ademais, uma determinada função não é privativa de uma natureza específica de sanção. Por exemplo, a função repressiva não é exclusiva da sanção penal. Isso porque, tanto uma sanção tributária como uma sanção ambiental podem ter finalidade represssiva para imputar ao transgressor uma pena mais rigorosa, visando que este não volte mais a praticar idêntica conduta.

Desta forma, mostra-se importante definir a natureza jurídica de uma sanção, a fim de ser possível extrair os princípios jurídicos que devem ser observados para a sua correta graduação.

2.2. A natureza jurídica da sanção

O ordenamento jurídico entendido, na visão Kelseniana, como “ordem de coação” possui sua estrutura estabelecida em normas impositivas e normas sancionantes.

A norma impositiva dada pela ordem jurídica prevê um fato em abstrato que, uma vez acontecido in concreto, faz nascer a obrigatoriedade de um determinado comportamento, dando origem a uma relação jurídica obrigacional que impõe direitos e deveres. É em função da não observância deste comportamento prescrito que surge a norma sancionante34, que prevê, como consequência, a sanção. A sanção é, portanto, consequência de um ato violador a um dever legal.

Neste sentido, é pela existência de uma norma, impondo ou restringindo o agir do indivíduo, pelo fato de esta ação ou omissão ser considerada relevante ao interesse público, que a conduta passa a ser entendida como um dever legal.

Em princípio, o descumprimento de um dever jurídico é sempre uma conduta ilícita, independentemente de o dever jurídico ser tributário, civil, penal, dentre outros.

Isso porque, como bem resume Hungria: “A ilicitude jurídica é uma só, do mesmo modo que um só, na sua essência, é o dever jurídico.”35

Com efeito, ontologicamente não há diferença entre as sanções tributárias, civis ou penais, pois todas derivam da mesma causa: a inobservância de um determinado dever jurídico.

Contudo, mesmo reconhecendo a unicidade do dever jurídico, é inegável que este pode e deve ser dividido em substratos menores para uma melhor compreensão e orientação.

Assim o faz a Carta Magna brasileira ao separar os ilícitos tributários dos ilícitos penais, uma vez que estabelece competências diferenciadas36, levando em consideração não apenas a matéria, mas, também, o bem jurídico tutelado.

Pode-se observar que diferentemente do ilícito penal cuja competência legislativa cabe à União, o ilícito tributário deve ser fixado pelo ente competente à instituição legal do referido tributo.

Isso porque o ilícito tributário surge de um ato violador contrário ao prescrito em normas tributárias. Pagar tributos, fazer ou não fazer determinado ato, no interesse da arrecadação ou fiscalização, surge de um dever jurídico estabelecido em lei pelo ente federativo competente para sua instituição.

Por sua vez, o ilícito penal surge de uma ação ou omissão voluntária que lesa ou expõe a perigo o bem jurídico penalmente protegido37.

O Direito utiliza a expressão “infração” para designar um descumprimento ou violação de uma norma prevista no ordenamento jurídico ou celebrada dentro de um acordo de vontades, abrangendo, deste modo, matérias de natureza pública ou privada.

À conduta ilícita na seara penal utiliza-se a expressão crime ou contravenção.

Não obstante, pode ocorrer de uma determinada infringência tributária também estar tipificada como ilícito penal. Logo, sujeitando-se tanto à configuração de um ilícito fiscal, como penal.

Cita-se, como exemplo, a alínea “c” do inciso VIII da Lei n. 5.530/198938 que preceitua ser infração à legislação tributária a omissão ou a indicação de forma incorreta de informações econômicas fiscais. Em igual sentido, o inciso I do art. 1º da Lei n. 8.137/1990, aduz constituir crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, mediante declaração falsa às autoridades fazendárias. Isso significa que uma vez provada na instância administrativo-fiscal a supressão do valor devido ou que o valor recolhido pelo contribuinte foi realizado a menor, o sujeito passivo, ainda, poderá ser responsabilizado criminalmente por lesão à ordem tributária39.

Mister observar que o que é criminalizado na conduta prevista na Lei n. 8.137/1990 não é o descumprimento de um dever previsto na legislação tributária, mas a fraude, contida na conduta consciente e voluntária de enganar e lesar o Fisco.

Portanto, é comum, no direito administrativo-tributário, a separação das sanções penais, utilizando a expressão “direito penal tributário”, das infrações e penalidades de natureza administrativa como “direito tributário penal”, para os ilícitos não criminais40.

Desta forma, o ponto de partida para a definição de uma conduta como ilícita e, portanto, contrária ao direito positivado, deverá levar em consideração a sua natureza.

A natureza da ilicitude irá definir o campo do direito a que está vinculado, podendo esta pertencer ao direito penal ou ao direito tributário.

Neste sentido, a natureza da sanção será definida pelo bem jurídico que o legislador visa proteger e pela ilicitude da conduta que necessita desestimular, estabelecendo, assim, um elo com as consequências a ela atribuídas, ou seja, definirá o tipo de cumprimento, a responsabilidade, o ente competente para legislar e imputar seu cumprimento.

Este entendimento se faz importante, uma vez que a sanção decorre de uma relação jurídica que se forma entre a Administração Pública e o particular devido à transgressão de uma norma. Assim, a definição de uma sanção de natureza tributária passa a sujeitar o legislador ao jus tributandi estatal, o qual delimitará seus limites e princípios norteadores.

Portanto, a definição da natureza jurídica da sanção é importante, pois ela influenciará nos princípios a ela aplicados.

A doutrina, contudo, apresenta divergentes concepções a respeito da natureza jurídica, e, portanto, dos princípios jurídicos a serem aplicados na fixação das multas tributárias.

Machado, por exemplo, entende que:

“O direito de punir, próprio do Estado, é que justifica a imposição de sanções tributárias, do mesmo modo que justifica a imposição de sanções penais. Admitindo-se que o direito de impor sanções administrativas encarta-se no campo do direito de punir, inerente ao Estado, tem-se de admitir que o exercício desse direito submete-se aos mesmos princípios a que se submete o direito de punir do Direito Penal.”41

Silva, porém, aduz serem de natureza penal apenas as sanções fiscais delituosas e, de natureza tributária, as sanções fiscais não delituosas:

“Não se olvide, entretanto, que o ilícito fiscal, em sua acepção lata, comporta duas subespécies, a saber, o ilícito tributário não delituoso (emancipado do ilícito administrativo) e o delituoso (esse, jungido ao Direito Penal). A norma sancionadora do ilícito tributário pode ter natureza meramente tributária ou criminal, porquanto as sanções não são exclusividade do Direito Penal, que, por sua vez, pode tutelar a necessidade arrecadatória do Estado, desde que tipifique infrações dolosas.

Portanto, muito embora seja perfeitamente sustentável e coerente a natureza tributária das sanções aplicadas ao ilícito fiscal, ela haverá de ser reconhecida desde que não seja delituoso, hipótese na qual terão suas sanções induvidosa natureza penal. Com efeito, coexistem no ordenamento jurídico brasileiro duas diferentes espécies de sanção à infração fiscal: aquelas estritamente tributárias; e aquelas penais.”42

Fundamentando a concepção por ele defendida, Silva é enfático quanto a não aplicação do jus puniendi às sanções tributárias:

“Insista-se, não obstante sujeitarem-se aos intitulados princípios comuns de repressão, na feliz expressão de G. Dellis, as sanções estritamente fiscais, diferentemente das sanções penais, são derivativas do ius tributandi do Estado, e, portanto, não consistem em manifestações de seu ius puniendi.

Por esse motivo, as normas tributárias sancionadoras, inseridas no abrangente conceito de legislação tributária, como há muito reconhecido pela doutrina e melhor jurisprudência pátria, sujeitam-se aos diversos princípios e normas que limitam o poder de tributar do Estado [...].”43

O fato é que a sanção visa desestimular o descumprimento de um comando normativo e, neste sentido, alguns doutrinadores entendem que caberia ao legislador a qualificação deste como um ilícito penal, civil ou tributário.

Logo, não estaria na conduta em si a base distintiva do ilícito, mas no grau de reprovação que a sociedade atribui à ação ou omissão, em função dos objetivos traçados ao corpo social.

Este entendimento é defendido por Eduardo Dias e Natercia Siqueira quando afirmam que a definição de um ilícito como penal ou administrativo cinge-se às razões de política legislativa:

“A qualificação de um dado ilícito como penal ou administrativo, por outro lado, decorre mais de razões de política legislativa do que por qualquer fundamento ontológico. Isso porque em termos apriorísticos não é possível determinar-se quais condutas serão ilícitos criminais e quais serão ilícitos administrativos, nem quais situações antijurídicas lesam mais gravemente a coesão do corpo social. Observa-se, no entanto, uma tendência de buscar uma certa subsidiariedade na punição penal, evitando-se sua banalização e somente recorrendo a ela quando não houver meios menos gravosos mais eficazes para evitar a conduta indesejada.”44

Furlan também corrobora com esse mesmo entendimento:

“As principais sanções previstas para o descumprimento da obrigação de pagar tributo têm o traço da prestação pecuniária, embora possam consubstanciar-se em outras formas, como a apreensão de bens, perda de mercadorias e restrição de direitos. São as sanções administrativas. Ocorre que o Estado-legislador pode optar em descrever determinadas condutas contrárias ao direito e a elas imputar uma consequência de natureza penal (restrição de liberdade), qualificando-as, assim, como crimes ou contravenções. São os crimes tributários.”45

Como é possível perceber, algumas infrações tributárias recebem uma atenção especial do legislador que as tipifica como delitos penais, “agregando-lhe um plus46.

O fato é que, de uma forma geral, a doutrina divide a natureza das penalidades pecuniárias, conforme as características da sanção, em civil, tributária ou penal47.

Os defensores da natureza civil às penalidades pecuniárias defendem que estas, diferentemente das sanções de natureza penal, são definidas e aplicadas por autoridades administrativas; visam ressarcir e não garantir a ordem jurídica; não se convertem em pena privativa de liberdade, em caso de inadimplemento; a culpabilidade do agente não é requisito para sua imputação; prescinde da individualidade e da pessoalidade, uma vez que são as únicas transmitidas causa mortis ou inter vivos48.

Por outro lado, uma segunda corrente entende que, independentemente das características punitivas ou de ressarcimento, as sanções possuem natureza tributária.

Esta corrente, defendida por Ives Gandra Martins, parte do entendimento que o tributo não deixa de ser uma penalidade imposta ao contribuinte. Neste sentido, a sanção, quando visa garantir o recolhimento do crédito tributário e não a preservação da ordem ou tranquilidade de uma sociedade, teria natureza tributária, pois as penalidades pecuniárias são impostas em função da competência tributária49.

Tal corrente entende que “a sanção é a penalidade maior que torna desinteressante deixar de atender a penalidade menor que é o tributo”50.

Silva defende uma tese intermediária, pontuando que no Direito pátrio coexistem as infrações tributárias e as penais, de índole fiscal51.

No entanto, uma terceira corrente doutrinária defende possuírem as multas fiscais a natureza jurídica penal.

A corrente que entende a natureza penal às penalidades pecuniárias cinge seu entendimento ao conceito de tributo, definido no art. 3º da Lei n. 5.172/1966 – Código Tributário Nacional – CTN, que assim dispõe:

“Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituído em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.”

Defendem estes que a multa, sendo uma espécie de sanção imputada ao sujeito passivo de uma obrigação tributária como consequência de um ato ilícito, não pode ser confundida com tributo que, conforme conceito definido pelo art. 3º do CTN, não se constitui em sanção de ato ilícito.

Ademais, a finalidade da multa não é arrecadatória, como o é, em regra, a dos tributos52, daí decorrendo, portanto, consequências totalmente diversas.

No Recurso Extraordinário n. 79.625, o voto do Ministro Leitão Abreu, citando a doutrina de Zanonini, é bem elucidativo ao buscar pontuar se a infração tributária teria caráter indenizatório ou repressivo:

“O escopo direto das multas e penas pecuniárias [por descumprimento de dever tributário] não está em produzir para o erário um lucro que o indenize do prejuízo que sofreu, mas o de impor ao transgressor um mal, uma pena, um dano, que seja o correspectivo jurídico de sua conduta ilícita. Se assim não fosse, a lei se limitaria a obrigar o inadimplente a pagar o tributo que não pagou, cujo montante máximo, poderia ser aumentado dos juros.”53

O fato é que dizer que uma multa possui função punitiva ou repressiva não significa afirmar que sua natureza jurídica é penal. As sanções tributárias, muitas vezes, envolvem, ao mesmo tempo, tanto a função preventiva como a repressiva. Contudo, não se pode confundir a função com a sua natureza jurídica.

A natureza jurídica tem relação com sua essência. Com a sua parte mais singular, sem a qual o objeto em análise poderá ser confundido com outra espécie correlata. Portanto, a infração tributária, em função da natureza da ilicitude, da conduta que visa desestimular, da competência para legislar e imputar seu cumprimento, sujeita-se ao jus tributandi estatal e aos princípios norteadores do Direito Tributário.

Conclusão

Quando ocorre um determinado fato, previsto na norma jurídica como apto a ensejar determinada consequência jurídica, a não ocorrência desta consequência enseja a aplicação da sanção, que nada mais é do que uma reprovação por determinado comportamento que não observou a norma jurídica válida. Este entendimento é pertinente a qualquer ramo do Direito. Isto porque, a sanção é elemento intrínseco ao sistema jurídico.

No Direito Tributário, porém, a sanção reveste-se de características particulares.

Muitos doutrinadores relutam em distinguir a natureza jurídica tributária às sanções cominadas aos ilícitos não delituosos, das sanções de natureza jurídica penal. Porém, muitas diferenças surgem em relação às consequências jurídicas nessas duas espécies de sanções daí decorrendo, inclusive, a legitimidade ou não da sanção.

É importante concluir, portanto, que, a depender do campo do Direito que está vinculado o dever jurídico, as consequências impostas pelo seu descumprimento, podem, também, sofrer alterações, importando em diferenças nas consequências jurídicas geradas ao destinatário.

As sanções tributárias, portanto, devem ser tratadas e legitimadas de modo diverso das sanções penais, permitindo ao contribuinte sancionado, inclusive, fazer valer as limitações intrínsecas ao poder de tributar.

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1 O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, no âmbito do Programa Capes/Cofecub e do programa “Investissements d’avenir” da Agence Nationale de la Recherche Française (Ceba, réf. ANR-10-LABX-25-01).

2 HOLMES, Stephen; e SUNSTEIN, Cass. The cost of rights: why liberty depends on taxes. New York: Norton, 1999, p. 15.

3 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 8. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2009, p. 26.

4 Ibidem, p. 37.

5 Ibidem, p. 121.

6 Neste sentido, para Kelsen, se “o Direito é concebido como uma ordem coercitiva, uma conduta apenas pode ser considerada como objetivamente prescrita pelo Direito e, portanto, como conteúdo de um dever jurídico, se uma norma jurídica liga à conduta oposta um ato coercitivo como sanção” (Ibidem, p.129).

7 BOBBIO, Norberto. Teoria da norma jurídica. 5. ed. São Paulo: EDIPRO, 2014, p. 153.

8 Ibidem, p. 157.

9 Ibidem, p. 161.

10 A teoria pura do direito de Hans Kelsen se concentra mais na análise da estrutura do ordenamento jurídico do que na análise de sua função.

11 Ibidem, p. 23-24.

12 Ibidem, p. 19.

13 Ibidem, p. 79.

14 Ibidem, p. 79.

15 HUGES, Pierre. La contribution patriotique. Tese (Doutorado em Direito). Université de Montpellier, 1919, p. 15.

16 DELALANDE, Nicolas. Quand l’Etat mendie: la contribution volontaire de 1926. Genèses, 2010/3, n. 80.

17 BASTOS, Frederico S. Administração Tributária eficiente, democracia e desenvolvimento – contornos de um novo modelo na relação entre Fisco e contribuinte. In: SILVEIRA, Vladmir Oliveira da; e ROVER, Aires José (org.). Direito tributário. 1. ed. Florianópolis: FUNJAB, 2012, p. 175.

18 Ibidem, p. 175-176.

19 A teoria econômica do crime foi estabelecida por Gary Becker no seu estudo Crime and punishment: an economic approach e parte do entendimento de que as pessoas fazem escolhas pautadas nos custos e benefícios ao cometerem um crime (BECKER, Gary S. Crime and punishment: an economic approach. Journal of Political Economy v. 76, n. 2, 1968, p. 169-217).

20 Segundo este paradigma, a causa do crime estaria identificada no próprio criminoso, uma vez que o gênero humano estaria predestinado a cometer crimes, sendo, portanto, identificado, como sugeriu Ferri, um “criminoso nato” (ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Do paradigma etiológico ao paradigma da reação social: mudança e permanência de paradigmas criminológicos na ciência e no senso comum. Seqüência v. 30, 1995, p. 25).

21 NOBRE, Simone Cruz. A dosimetria da multa fiscal no ICMS. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019, p. 19.

22 Paulo Roberto Coimbra Silva explica que a tendência é ser adotada uma concepção mais ampla de sanção, uma vez que esta serve não apenas para desestimular condutas, mas, também, para estimular as condutas desejadas pelo Direito (SILVA, Paulo Roberto Coimbra. Direito tributário sancionador. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 70). Geraldo Ataliba aduz que “A sanção não é sempre e necessariamente um castigo, [...]. Castigo, pena, penalidade é espécie do gênero sanção jurídica. Nem toda sanção é castigo, embora todo castigo (espécie) seja sanção.” (ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 44)

23 COSTA, Regina Helena. Curso de direito tributário: Constituição e Código Tributário Nacional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 302.

24 Carlos César Sousa Cintra mesmo reconhecendo que no direito positivo há casos de retribuições meritórias, afirma que em relação às sanções tributárias de natureza administrativa estas surgem como consequência de um fato infracional (CINTRA, Carlos César Sousa. Reflexões em torno das sanções administrativas tributárias. In: MACHADO, Hugo de Brito (coord.). Sanções administrativas tributárias. São Paulo: Dialética, 2005, p. 56). Luiz Dias Martins Filho enfatiza que o “prêmio não é sanção, é na verdade uma espécie de conduta lícita prevista na endonorma” (MARTINS FILHO, Luiz Dias. Infrações e sanções tributárias. In: MACHADO, Hugo de Brito (coord.). Sanções administrativas tributárias. São Paulo: Dialética, 2005, p. 292).

25 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed. São Paulo, 2009, p. 546.

26 MACHADO, Hugo de Brito. Teoria das sanções tributárias. In: MACHADO, Hugo de Brito (coord.). Sanções administrativas tributárias. São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2005, p. 161.

27 SILVA, Paulo Roberto Coimbra. Direito tributário sancionador. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 61.

28 NEVES, José Carlos de Souza; e CAMPOS, Dejalma. Sanções tributárias. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord.). Caderno de Pesquisas Tributárias n. 4. São Paulo: Resenha Tributária, 1979, p. 16.

29 VILLEGAS, Hector. Direito penal tributário. Trad. de Elisabeth Nazar e outros. São Paulo: Resenha Tributária, EDUC, 1974, p. 334, 335.

30 KREPSKY, Júlio César. Limite das multas por infrações tributárias. Leme: J. H. Mizuno, 2006, p. 106.

31 PONTES, Helenilson Cunha. O princípio da proporcionalidade e o direito tributário. São Paulo: Dialética, 2000, p. 137.

32 Afirma Beccaria que o sábio legislador não aplica os menores castigos a crimes mais graves (BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011, p. 82).

33 SILVA. Op. cit., p. 120.

34 Kelsen entende as normas sancionantes como primárias e autônomas, enquanto as normas impositivas são secundárias e não autônomas, pois estabelece uma classificação baseada na importância da norma dentro do sistema jurídico (KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 8. ed. Trad. de João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 2009, p. 61).

35 HUNGRIA, Nelson. Ilícito administrativo e ilícito penal. Revista de Direito Administrativo. Seleção Histórica. Renovar, 1991, p. 15.

36 Na ADI n. 1.654/AP, Rel. Min. Maurício Corrêa, decisão 03.03.2004, o STF entendeu que o ente competente para instituir é o mesmo para impor a sanção administrativa.

37 TELES, Ney Moura. Direito penal: parte geral. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2006. v. I, p. 211.

38 Lei que institui o ICMS no Estado do Pará.

39 Uma vez tratando-se de crime material, há necessidade de prévio exaurimento da via administrativa antes de intentar a ação penal, pois a consumação é essencial para que seja efetivada a supressão ou a redução do tributo. Neste sentido, a Súmula Vinculante n. 24 estabelece: “não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, inciso I a IV, da Lei n. 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo”.

40 Luciano Amaro ensina que essa classificação é utilizada didaticamente para permitir uma melhor compreensão dos fenômenos jurídicos (AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 424). Sacha Calmon Navarro Coêlho não concorda com esta distinção. Este autor afirma: “As questões de competência legislativa e de política criminal, ao nosso ver, não servem para fecundar distinções e devem ser arredadas [...].” (COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria e prática das multas tributárias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 47)

41 MACHADO, Hugo de Brito. Teoria das sanções tributárias. In: MACHADO, Hugo de Brito (coord.). Sanções administrativas tributárias. São Paulo: Dialética, 2005, p. 186.

42 SILVA, Paulo Roberto Coimbra. Direito tributário sancionador. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 150.

43 Ibidem, p. 228.

44 DIAS, Eduardo Rocha; e SIQUEIRA, Natercia Sampaio. Sanções administrativas tributárias: uma tentativa de enquadramento constitucional. In: MACHADO, Hugo de Brito (coord.). Sanções administrativas tributárias. São Paulo: Dialética, 2005, p. 125.

45 FURLAN. In: MACHADO. Hugo de Brito (coord.). Sanções administrativas tributárias. São Paulo: Dialética; Fortaleza: Instituto Cearense de Estudos Tributários – ICET, 2005, p. 16-17.

46 COÊLHO. Sacha Calmon Navarro. Teoria e prática das multas tributárias. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 25.

47 Existem autores que ainda incluem nesse rol as sanções trabalhistas, comerciais, processual, ambiental, eleitoral, urbanística. É o caso de Paulo Roberto Coimbra Silva, que aduz que a natureza jurídica da sanção é determinada pelo ato ilícito que antecede sua imputação (SILVA, Paulo Roberto Coimbra. Direito tributário sancionador. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 88).

48 TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário – Constituição financeira, sistema tributário e estado fiscal. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2009. v. I, p. 297.

49 MARTINS, Ives Gandra da Silva. Da sanção tributária. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 57.

50 MARTINS. Op. cit., p. 57.

51 SILVA, Paulo Roberto Coimbra. Direito tributário sancionador. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 115.

52 Os tributos podem assumir a finalidade fiscal, extrafiscal e parafiscal. Assumem a função fiscal quando o seu principal objetivo é a arrecadação de recursos para o custeio dos serviços públicos e programas de governo; extrafiscal quando a tributação é utilizada como forma de ordenar as relações econômica e social, passando o tributo a funcionar como meio de intervenção do domínio econômico; parafiscal quando tem por finalidade a arrecadação para o custeio de atividades de entidades específicas, em razão da atividade pública por estas exercidas.

53 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Tribunal Pleno. Acórdão em recurso Extraordinário n. 79.625. Disponível em: <www.stf.jusbrasil.com.br>. Acesso em: 01 nov. 2014.