O Art. 23 da Lei n. 13.655/2018 e o Estabelecimento de Regras de Transição como Imposição do Princípio da Segurança Jurídica no Direito Tributário

Article 23 of Law n. 13.655/2018 and the Establishment of Transition Rules as Imposition of Legal Certainty in Tax Law

Rafael Zanardo Tagliari

Mestrando em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo – USP. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET e em Direito Constitucional pela Academia Brasileira de Direito Constitucional – ABDCONST. Graduado em Direito pela Universidade Comunitária da Região de Chapecó – UNOCHAPECÓ. Associado ao Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT. Advogado em Chapecó/SC. E-mail: tagliari@bedinetagliari.com.

Recebido em: 22-02-2021

Aprovado em: 29-06-2021

Resumo

Trata-se de trabalho que pretende analisar criticamente alteração promovida pela Lei n. 13.655/2018 na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), mais especificamente a inserção do art. 23, que estabelece que a interpretação ou orientação nova quanto à norma de conteúdo indeterminado que for fixada por decisão de esfera administrativa, judicial ou controladora citada deverá vir acompanhada de regime de transição, desde que seja indispensável para seu cumprimento. A análise se dará sob influxo geral do princípio da segurança jurídica e de sua eficácia específica em matéria de Direito Tributário, para que se verifique se o juízo de indispensabilidade posto no artigo para instituição ou não de regime de transição é compatível com o sistema constitucional tributário e os direitos fundamentais.

Palavras-chave: Direito Tributário, Lei n. 13.655/2018, Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), Segurança Jurídica, Segurança Jurídico-Tributária.

Abstract

This paper intends to critically analyze the modifications promoted by Law n. 13.655/2018 on the Introduction to Brazilian Law Act (LINDB), more specifically the insertion of article 23, which establishes that the new interpretation or guidance regarding norm of undetermined content established in ruling by administrative, judicial or controlling courts must be accompanied by a transition regime, as long as it is indispensable for its compliance. The analysis will take place under the general influence of the principle of legal certainty and its specific effectiveness in matters of Tax Law, in order to verify whether the judgement of indispensability established by article 23 for the institution or not of a transition regime is compatible with the constitutional tax system and fundamental rights.

Keywords: Tax Law, Law n. 13.655/2018, Introduction to Brazilian Law Act (LINDB), Legal Certainty.

“Changes aren’t permanent, but change is.”

(Tom Sawyer, Rush, 1981)

1. Introdução

A Lei n. 13.655, de 25 de abril de 2018, promoveu a inserção de diversos dispositivos na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-lei n. 4.657/42), disposições que tratam, na dicção de sua própria ementa, de “segurança jurídica e eficiência na criação e na aplicação do direito público”, consolidando diploma que vem sendo tratado por doutrina e jurisprudência como “nova LINDB”.

Os eminentes publicistas que capitanearam a iniciativa de sua elaboração apontam ter sido exatamente essa a preocupação central dos acréscimos propostos à LINDB original: reforçar a segurança jurídica num quadro de crescente dinamismo normativo1, visando garantir estabilidade às relações jurídicas e, ao mesmo tempo, fornecer mecanismos adequados a uma transição segura quando da promoção de mudanças2.

Entre as alterações promovidas pela Lei n. 13.655/2018 está a inserção na LINDB de dispositivo que toca justamente na ideia de segurança de transição:

Art. 23. A decisão administrativa, controladora ou judicial que estabelecer interpretação ou orientação nova sobre norma de conteúdo indeterminado, impondo novo dever ou novo condicionamento de direito, deverá prever regime de transição quando indispensável para que o novo dever ou condicionamento de direito seja cumprido de modo proporcional, equânime e eficiente e sem prejuízo aos interesses gerais.

Estabelece o texto, portanto, que a interpretação ou orientação nova quanto à norma de conteúdo indeterminado que for fixada por decisão de qualquer das esferas citadas deverá vir acompanhada de regime de transição, desde que esse regime seja indispensável para que a nova formatação normativa seja cumprida a contento, de acordo com os critérios apontados pelo próprio dispositivo.

Verifica-se, a partir dessa análise textual, que há um elemento condicional posto na redação do art. 23 da nova LINDB: o dispositivo não obriga que se estabeleça regime de transição na hipótese, mas tão somente aponta que um regime transitório pode ser estabelecido. Em outras palavras, o estabelecimento de regime de transição resta, pelo texto do artigo, condicionado a um juízo de indispensabilidade daquele que interpreta e aplica a norma.

No entanto, não há no dispositivo (ou mesmo na sua posterior regulamentação por Decreto3) razoável grau de precisão quanto aos critérios que deverão ser adotados e que determinarão, ao fim e ao cabo, se haverá ou não regime de transição.

A questão se mostra especialmente preocupante quando a modificação de interpretação ou orientação normativa se der no âmbito do Direito Tributário, em razão das especificidades na regulação da matéria, especialmente em âmbito constitucional, bem como da necessária consideração das peculiaridades das relações jurídicas nele desenvolvidas em relação a outros ramos do Direito Público, âmbito mais geral no qual a Lei n. 13.655/2018 se pretende aplicável.

É a análise do contido no art. 23 da Lei n. 13.655/2018 sob tal viés o tema central do presente trabalho. Pretende-se, ao fim, responder à seguinte questão: em matéria tributária, a modificação de interpretação ou orientação normativa por decisão administrativa, judicial ou controladora pode prescindir de regime de transição ou o seu estabelecimento é imposição do sistema normativo que regula a matéria?

É o que se passa a investigar.

2. Segurança jurídica e segurança jurídico-tributária: conteúdo geral e conteúdo específico

A resposta à questão colocada demanda que a análise seja iniciada pelo próprio elemento que, como já apontado, motivou a edição da Lei n. 13.655/2018: a segurança jurídica e a preocupação com o seu necessário incremento em um cenário normativo altamente complexo e dinâmico. Mas de que exatamente se está tratando quando se trata de segurança jurídica? A expressão permite diversos ângulos de análise.

Pode-se falar de segurança jurídica como elemento definitório da própria ideia de Direito, no sentido de que a própria existência de um sistema jurídico implica automática e inevitavelmente a noção de segurança das relações por meio de seu regramento pelo Direito4.

Pode-se falar também de segurança jurídica como fato, no sentido de indicar uma situação real tida por juridicamente segura, sendo utilizado o vocábulo para descrevê-la, em concepção de viés jusrealista5.

Ainda se pode falar de segurança jurídica como valor, no sentido de se utilizar a expressão para qualificar o ordenamento de seguro a partir da perspectiva axiológica daquele que o qualifica6. Nesta concepção, muitas vezes a ideia se entrelaça à análise da influência orientadora da segurança jurídica como “vetor valorativo que penetra as demais regras do sistema”7.

A que se coloca como fundamental para esta investigação, todavia, é a concepção de segurança jurídica como norma da espécie princípio, motivo pelo qual é essa a que merece análise mais detida.

2.1. A segurança jurídica como norma da espécie princípio

Apesar das também importantes concepções alternativas já apontadas, fundamental e urgente é a devida compreensão da segurança jurídica enquanto norma.

Isso porque é sob esse enfoque que a segurança jurídica se revela como mecanismo normativo de prescrição de condutas, no sentido de determinar que as consequências jurídicas de atos ou fatos devem ser definidas e estabelecidas sob a perspectiva da segurança.

É essa a perspectiva que torna a segurança jurídica efetivo instrumento do Direito enquanto mecanismo de regulação de condutas, como destaca Machado Derzi:

Dentro da extrema mobilidade do mundo e da alta complexidade das sociedades de risco contemporâneas, o sistema jurídico se presta a fornecer estabilidade, se presta a acolher as expectativas legitimamente criadas e, portanto, a proteger a confiança. Se assim não for, a ordem jurídica confundir-se-á com os elementos do ambiente, sociais, econômicos, morais... enfim, fundir-se-á com os demais sistemas e desaparecerá como instrumento que possibilita a vida, o convívio e a tomada de decisões assentadas em um mínimo de confiança8.

Não se está a sustentar que as demais concepções de segurança jurídica não guardem relação ou não tenham relevância; estão todas elas em correlação. Apenas se quer destacar que, por mais que a dimensão fática e a dimensão axiológica sejam parcela importante da formação da noção de segurança jurídica, o fundamental é que, ao fim e ao cabo, ela seja efetiva enquanto “norma que prescreve que a instituição e a aplicação das normas sejam realizadas de maneira a incrementar a capacidade de o cidadão antecipar efeitos jurídicos futuros de atos presentes”9.

Resta claro, portanto, que a segurança jurídica se constitui em verdadeira norma jurídica. Tanto é assim que a Constituição Federal de 1988 é repleta de disposições que positivam inequivocamente a segurança jurídica no contexto normativo brasileiro.

Ela pode ser construída dedutivamente do próprio sobreprincípio do Estado de Direito10, expresso no art. 1º, bem como é indutivamente identificada pela conjunção de uma série de outras disposições constitucionais, desde a referência expressa à “segurança”, como no caput do art. 5º, até uma série de outras disposições constitucionais que promovem ideais de segurança jurídica, como os direitos fundamentais à legalidade (art. 5º, II) e à proteção do direito adquirido, da coisa julgada e do ato jurídico perfeito (art. 5º, XXXVI). Esses exemplos, de dispositivos constitucionais expressos, permitem que se extraia a tônica de normatividade do texto constitucional de 1988: garantia de “previsibilidade” e “proteção de expectativas legitimamente construídas” em favor dos cidadãos, para que não sejam frustrados direitos fundamentais constitucionalmente erigidos em razão do exercício de poder pelo Estado11.

Nesse sentido, se impõe o reconhecimento da segurança jurídica como verdadeira norma jurídica plenamente vigente, com assento espraiado por todo o texto constitucional, ainda que implicitamente.

A partir de tais premissa, diante da forma pela qual positivada no ordenamento e de sua própria lógica estrutural e eficacial, deve-se reconhecer a segurança jurídica como norma da espécie princípio12.

Isso porque sua compreensão é possível somente a partir da análise de sua estrutura normativa como promotora de um estado de coisas desejado, devendo o intérprete construir os meios e investigar os seus efeitos para aferir a pertinência da conexão entre tais meios e o fim de segurança buscado.

Trata-se, portanto, de norma “imediatamente finalística” que demanda “avaliação de correlação entre o estado de coisas a ser promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessária à sua promoção”, feição normativa típica dos princípios jurídicos. Não é a segurança jurídica uma norma com previsão de hipótese e consequência concreta dela decorrente, formatação típica das regras, inexistindo previsão a priori de comportamentos específicos acompanhados de qualificação deôntica (obrigatório, permitido ou proibido) para sua realização13.

Apesar de sua classificação enquanto princípio, é importante se destacar que é a segurança jurídica princípio sui generis no ordenamento jurídico, com contornos próprios que o credenciam como verdadeira condição estrutural para a interpretação e aplicação das demais normas, sendo seu objeto não a configuração direta da realidade, mas “a configuração do Direito ou de um direito como instrumento para se configurar a realidade”, características que tornam a segurança jurídica uma norma de contornos únicos, “uma espécie de norma-condição ou norma-estrutura” que “estabelece condições de existência, de validade e de eficácia das outras”14.

Para Bandeira de Mello, por se tratar a segurança jurídica de elemento essencial à própria noção de Direito, integrante do “sistema constitucional como um todo”, poderia ser classificada como verdadeiro princípio geral, entendido como “vetor normativo subjacente” ao ordenamento positivo – uma noção inerente a ele, e não um dado externo15.

Nesse sentido, a segurança jurídica funciona como condição estrutural do próprio Direito, à medida em que verte sobre todo o sistema normativo, conformando-o e tornando-o meio de atingimento, sempre no maior grau possível, de seus fins.

Mas quais são, concretamente, os fins que uma norma jurídica de tamanha singularidade determina que sejam promovidos? É o que se passa a responder.

2.2. O princípio da segurança jurídica e o estado de coisas a ser promovido: confiabilidade e calculabilidade do ordenamento por meio de sua cognoscibilidade

Se a segurança jurídica é norma da espécie princípio e, portanto, determina que seja o ordenamento jurídico interpretado e aplicado de forma a concretizar sempre no maior grau possível os fins por ela estabelecidos, é fundamental que se esclareça quais são esses fins, ou ainda, qual é o conteúdo do estado de coisas cuja promoção é prescrita pela segurança jurídica.

Nesse sentido, são apontados, em geral, os ideais de certeza e estabilidade16 – segurança jurídica como instrumento a garantir capacidade de conhecimento das normas jurídicas e garantia de manutenção dos efeitos delas decorrentes, tanto sob perspectiva objetiva, quanto sob perspectiva subjetiva, tudo em homenagem a noções como boa-fé, irretroatividade e proteção a direitos adquiridos17.

Carrazza estabelece de forma bastante elucidativa o raciocínio que permeia a ideia de segurança jurídica: aponta que o Direito é elemento essencial da vida social porque regula o comportamento das pessoas no referido contexto, regulação que tem por fim promover não só proteção eficaz dos direitos dos integrantes do mesmo corpo social, mas também conferir a eles, e esse ponto é fundamental, razoável capacidade de prever as consequências jurídicas de seus comportamentos18.

Em outras palavras, a segurança jurídica também tem por fim garantir que o Direito (ou as normas jurídicas que o compõem) seja produzido, interpretado e aplicado de modo que os que estão a ele submetidos possam compreender quais serão as consequências jurídicas atribuídas aos seus atos ou aos atos de terceiros, ou mesmo a fatos que independem de qualquer elemento volitivo.

Ocorre que o processo de interpretação e aplicação das normas jurídicas é, em regra, trabalho de grande complexidade, cuja natureza não é estritamente intelectual, mas verdadeiramente discursiva. Não consiste em extrair significado previamente dado de disposições, mas de construir significados a partir delas19. Isso significa que o conteúdo prescritivo das normas jurídicas não está contido ou posto a priori na legislação, mas é sempre construído a partir dela pelo trabalho, orientado por determinado “código hermenêutico”, do intérprete20.

Não se está a sustentar, por outro lado, que o processo de interpretação do Direito parte de uma espécie de grau zero de sentido, podendo o intérprete conferir às disposições o conteúdo que bem entender.

É fundamental que se compreenda que as palavras e expressões utilizadas pelo legislador denotam significados e conteúdos preexistentes à interpretação, que, sob esse influxo, consiste em processo de reconstrução dos significados, escolha de sentido promovida pelo intérprete baseada em argumentos e em regras de prevalência entre eles, mas sempre em observância aos limites de significação impostos pelo próprio texto interpretado21.

Conclui-se, portanto, que o Direito deve ser concebido como prática, no sentido de processo de construção de sentidos normativos intersubjetivamente controláveis pelo intérprete e aplicador, em oposição à concepção do Direito como objeto, na qual o intérprete se aproximaria dos textos normativos tão somente para desvelar significados preconcebidos ou preexistentes (num esquema sujeito-objeto).

A afirmação dessas noções é obra de construção teórica desenvolvida no século XX (especialmente em sua segunda metade) que, apesar de não ser inteiramente homogênea, pode ser classificada de forma geral como pós-positivismo, movimento que promoveu a superação da lógica do positivismo jurídico-científico centrado na ideia de aplicação do Direito por subsunção em direção a uma lógica de concretização normativa a partir de produção hermeneuticamente orientada de sentidos pelo intérprete22.

Mas como sustentar a ideia de segurança jurídica como capacidade de conhecimento das consequências jurídico-normativas que serão atribuídas a atos ou fatos se essas consequências não estão previamente dadas, mas são construídas no processo de interpretação e aplicação?

É precisamente por isso que o eixo de análise da segurança jurídica, dado esse paradigma de interpretação e aplicação das normas jurídicas, deve se deslocar da ideia geral de certeza de conteúdo do Direito para a noção de controlabilidade dos processos argumentativos de construção de sentido das normas jurídicas: se ultrapassa a ideia de determinação como certeza quanto ao conteúdo do Direito, substituída pela de cognoscibilidade como capacidade de compreender o processo de construção desse conteúdo; se supera a ideia de imutabilidade como garantia absoluta de não alteração de situações, para adotar-se a de confiabilidade como possibilidade de alteração com garantia de respeito às situações consolidadas; se abandona o ideal de previsibilidade como certeza absoluta de cenário futuro, o substituindo pelo de calculabilidade como razoável e sólida capacidade de antecipação às possíveis alterações de cenário jurídico-normativo com o passar do tempo23.

Segurança jurídica, portanto, passa a significar a capacidade do cidadão de confiar no Direito e na estabilidade das consequências jurídico-normativas que foram a ele aplicadas em decorrência de atos ou fatos passados, bem como de calcular com razoável precisão, no presente, quais poderão ser as futuras consequências jurídico-normativas de suas condutas no presente, tudo isso por meio da razoável capacidade de compreender os possíveis significados jurídico-normativos que podem ser atribuídos às disposições aplicáveis.

Em síntese: pretende a segurança jurídica garantir um estado de confiabilidade e calculabilidade por meio da cognoscibilidade do Direito; significa poder confiar no Direito estabelecido e calcular com razoável precisão o Direito futuro, por ser possível conhecer o procedimento do Direito no presente.

Apesar de as noções até aqui apresentadas – de segurança jurídica como princípio e do estado de coisas que ele determina seja realizado – serem válidas e aplicáveis horizontalmente a todos os ramos do Direito, em se tratando de Direito Tributário, o próprio sistema constitucional conferiu especificidades à matéria, criando um cenário normativo no qual a segurança jurídica deve atuar de forma especialmente intensa.

2.3. Segurança jurídico-tributária e sua proeminência no sistema constitucional brasileiro

Sabe-se que a Constituição Federal de 1988 demonstra nítida preocupação com a garantia de direitos e com a contenção do poder estatal. Tal viés resta explicitado, entre outras peculiaridades, pela característica altamente analítica do texto, singularidade sem paralelo nas Constituições de outros ordenamentos.

Trata-se de texto constitucional que estabelece minuciosamente “o que pode o Estado fazer, como e quando pode atuar e em que medida e com base em que critérios pode exercer seu poder e executar suas tarefas”24.

Apesar de as amarras ao poder tributante do Estado estarem espraiadas por toda a Constituição de 1988, é indispensável que se considere a eloquência com a qual o legislador constituinte tratou da questão no momento a ela reservado especificamente: o rol constitucional das “Limitações do Poder de Tributar”25. Sua centralidade no sistema constitucional tributário é destacada com precisão por Schoueri:

Portanto, as limitações ao poder de tributar demarcam o território assegurado pela Constituição para que o setor privado possa buscar recursos para financiar as tarefas que a Constituição lhe impõe, inclusive a de pagar tributos. Revela-se, pois, dever do Estado assegurar um ambiente propício para que os agentes privados possam atuar e crescer. Este ambiente caracteriza-se pela segurança jurídica que o respeito às “limitações” propicia26.

Importante notar que as limitações constitucionais ao poder de tributar não devem ser lidas de forma isolada no sistema constitucional. Constituem uma espécie de centro gravitacional de um sistema aberto de normas constitucionais de viés protetivo dos direitos e garantias fundamentais em face do poder estatal de tributar, rol que não se esgota no conteúdo ali posto por expressas disposições do próprio texto da Constituição de 198827.

Essa percepção é de fundamental importância: se a Constituição estabeleceu o princípio da segurança jurídica como fundamento central do sistema constitucional, derivado diretamente da própria ideia de Estado de Direito e fundado em diversas disposições constitucionais, em matéria tributária a sua normatividade vem reforçada por disposições setoriais específicas, que não se esgotam em si, mas se entrelaçam às demais disposições constitucionais para formar um espectro de normatividade especialmente protetivo dos contribuintes.

Essa proeminência normativa do princípio da segurança jurídica em matéria tributária se justifica pela própria natureza da relação obrigacional tributária e a restrição por ela causada, invariavelmente, nos direitos fundamentais do contribuinte (notadamente os de liberdade, propriedade e igualdade). É nessa regra que se identifica no Direito Tributário função primordial de exatamente limitar o poder do Estado na restrição de direitos do particular, restrição que é inerente à tributação28.

Portanto, o princípio da segurança jurídico-tributária, apesar de não ostentar diferença estrutural em relação ao princípio geral da segurança jurídica, detém especiais fundamentos e eficácia, o que se justifica pela sujeição do particular, em matéria de Direito Tributário, a “heterorrestrições aos seus direitos fundamentais”29.

Nesse sentido, o estado de confiabilidade e calculabilidade por meio da cognoscibilidade, que já é exigência do princípio da segurança jurídica geral, deve ser garantido em maior intensidade quando se trata de segurança jurídico-tributária. Em razão dele, os contribuintes devem ter condições de “sem engano, frustração, surpresa ou arbitrariedade, plasmar digna e responsavelmente o seu presente e fazer um planejamento estratégico juridicamente informado do seu futuro”30.

Para o escopo deste trabalho, tem especial relevância o aspecto de calculabilidade da segurança jurídica e, mais especificamente, da segurança jurídico-tributária. Isso porque é nele que está contemplada a noção de segurança de mudança, que é exatamente a ideia subjacente ao estabelecimento de normas de transição quando alterada interpretação ou orientação consolidada quanto a determinada norma jurídica, hipótese do art. 23 da Lei n. 13.655/2018.

É por isso que a calculabilidade enquanto segurança de transição e os seus instrumentos e fundamentos no contexto do Direito Tributário serão mais detidamente analisados.

3. Calculabilidade normativa e segurança jurídico-tributária: segurança de transição por meio de anterioridade e continuidade normativas

Como já visto, segurança jurídica não é garantia de imutabilidade do Direito posto, ou mesmo certeza quanto ao conteúdo normativo que será a partir dele definido.

Tais percepções não se coadunam com o paradigma pós-positivista do Direito, no qual se supera a ideia de revelação de sentido normativo preexistente nos textos pela compreensão de que a normatividade das disposições decorre de trabalho de construção de sentido pelo intérprete e aplicador.

Isso não significa que a segurança jurídica não tenha qualquer espaço de eficácia quando operadas mudanças no Direito. Pelo contrário: enquanto princípio estabelecido que é, seu conteúdo prescritivo deve ser reconcebido, passando a exigir que se busque em máxima intensidade um estado de calculabilidade do ordenamento como razoável e sólida capacidade de o cidadão antecipar as possíveis alterações no cenário jurídico-normativo (e agir se antecipando a elas, se for o caso).

A calculabilidade normativa pode ser entendida, sob esse influxo, como segurança de transição, se decompondo em 3 (três) aspectos que, concomitantemente, são capazes de produzir o estado de coisas demandado pela segurança jurídica: anterioridade, continuidade e vinculatividade normativas, elementos cuja presença concomitante conduz ao estado de calculabilidade adequado à noção de segurança jurídica31.

Para os fins deste trabalho, ressaem como mais relevantes a anterioridade e a continuidade normativas, adiante analisadas.

3.1. Anterioridade normativa: a postergação de eficácia como elemento de segurança jurídica

A postergação de eficácia na hipótese de mudança no cenário jurídico normativo é elemento fundamental da noção de segurança jurídica. Ela permite que o cidadão não seja bruscamente surpreendido pela superveniência de norma jurídica imediatamente eficaz que, exatamente por isso, impeça aquele submetido a seus efeitos de se antecipar a ela.

Verifica-se, portanto, que a ideia de anterioridade está vinculada a um determinado intervalo de tempo que permita ao cidadão navegar do presente ao futuro jurídico-normativo com estabilidade e segurança. O Direito tem essa capacidade: secciona o tempo normativo do tempo cronológico, permitindo ao sujeito que conheça o futuro e, conhecendo-o, a ele se antecipe32.

Em matéria tributária, a anterioridade normativa estabelece “segurança de eficácia” por meio de postergação da eficácia de alterações normativas no tempo e se decompõe em 3 (três) partes: a anterioridade de exercício, a anterioridade nonagesimal e a anterioridade razoável33.

Tem assento constitucional expresso na Constituição Federal de 1988, mais especificamente em seu art. 150, inciso III, alíneas “b” e “c”, estando espelhada também como norma geral de Direito Tributário no art. 104 do Código Tributário Nacional.

A disposição contida na alínea “b” veicula a regra clássica da anterioridade tributária constitucional, pela qual não se pode exigir tributo ou majorar o conteúdo de obrigação tributária principal dentro do mesmo exercício no qual instituída a lei que veicula a respectiva exigência ou majoração.

Trata-se da anterioridade de exercício, regra voltada ao futuro, conferindo possibilidade de previsão ao contribuinte quanto às obrigações que serão dele exigidas em matéria tributária em exercício vindouro, conferindo a ele “condições objetivas de se programar e preparar para bem cumprir as novas exigências fiscais”34.

O conteúdo da alínea “c” é produto da Emenda Constitucional n. 42, promulgada em 19 de dezembro de 2003, acrescentando ao texto constitucional regra que proíbe exigência ou majoração de obrigação tributária principal antes de decorridos 90 (noventa) dias da instituição da respectiva lei.

Trata-se da anterioridade nonagesimal, acrescida ao texto constitucional em razão de sistemática atuação do legislador brasileiro no sentido de promover profundas alterações em matéria tributária já no apagar das luzes do ano legislativo, respeitando em termos literais a regra clássica da anterioridade pela efetiva transição de exercício, mas esvaziando-a teleologicamente por conduzir à vigência das alterações em prazo absolutamente exíguo35.

Para preservar a flexibilidade necessária em hipóteses tidas pelo constituinte como de importância para atuação indutora do Estado, foram instituídas também pelo texto constitucional exceções às regras de anterioridade36. O fato de existir tal rol excepcional, taxativamente posto pela Constituição, reforça a noção de que a obediência à anterioridade é imposição constitucional em todas as hipóteses não expressamente excepcionadas, sob pena de ilegítima tentativa de alteração do conteúdo constitucional37.

A anterioridade razoável, por fim, não é decorrente de disposição expressa, mas é resultado da “eficácia direta integrativa do princípio da segurança jurídica”, implicando a aplicabilidade da regra de anterioridade mesmo quando não haja determinação legal ou constitucional expressa, e mesmo que se trate de tributos constantes do rol constitucional de exceções. Desde que presente situação de violação da segurança jurídica por abrupta e intensa modificação normativa, será imposição constitucional a dilação de eficácia dessa alteração de modo a conferir ao contribuinte espectro de tempo para a devida preparação38.

A partir da identificação desses aspectos complementares, se entende aqui que a anterioridade normativa propriamente dita configura verdadeira regra jurídica. Apesar de percepções diversas no âmbito da doutrina39, parece que a sua dimensão de princípio se trata verdadeiramente da incidência do próprio princípio da segurança jurídica, operacionalizado por meio da anterioridade. Em outras palavras, é a incidência normativa do princípio da segurança jurídica que determina “garantia ou manutenção dos ideais de previsibilidade, de controlabilidade, de inteligibilidade e de mensurabilidade”40, ideais que são instrumentalizados por meio de uma regra, a anterioridade, a ser aplicada in concreto.

A anterioridade conforma-se, portanto, como verdadeiro instrumento de segurança jurídico-tributária no contexto da Constituição Federal de 1988; ao mesmo tempo, é a segurança jurídica o princípio que “lhe serve de apoio e lhe revela as reais dimensões”41.

Independentemente da concepção quanto à sua espécie normativa, a importância e a função da anterioridade constitucional restam claras: trata-se de limitação formal temporal ao poder de tributar que confere contribuição fundamental à segurança jurídico-tributária por incrementar o grau de calculabilidade do contribuinte em relação aos efeitos de futuras modificações da norma tributária.

Importante referir que a anterioridade constitui direito fundamental dos contribuintes, conforme já reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, razão pela qual é também cláusula pétrea do sistema constitucional (art. 60, § 4º, CF/88). Destacou o ministro Celso de Mello na ocasião que “a eficácia do princípio da anterioridade não pode ser comprometida por normas de direito positivo de discutível validade jurídica”, conclusão derivada do raciocínio de se tratar de direito fundamental protetivo do contribuinte em face do poder estatal de tributar:

O princípio da anterioridade da lei tributária, além de constituir limitação ao poder impositivo do Estado, representa um dos direitos fundamentais mais importantes outorgados pela Carta da República ao universo dos contribuintes [...]. Desde que existam para impor limitações ao poder de tributar, esses postulados têm por destinatário exclusivo o poder estatal, que se submete, quaisquer que sejam os contribuintes, à imperatividade de suas restrições42.

Infelizmente a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal vem oscilando na proteção do direito fundamental à anterioridade tributária43, restringindo demasiadamente seu âmbito de aplicação e eficácia, a exemplo do entendimento de inaplicabilidade da garantia à hipótese de alteração de prazo de recolhimento de tributo44, o que faz baseado num entendimento restritivo vinculado a interpretação literal da redação constitucional (“instituição ou majoração de tributo”).

A reticência com a qual o tribunal vem tratando o espectro de eficácia da anterioridade, reconhecida por ele mesmo como direito fundamental dos contribuintes, é forte indicativo do acerto de críticas doutrinárias recentes à ciência do Direito Tributário. Apesar dos avanços conquistados nas últimas décadas, aponta--se que deve ser superado o foco de análise primordialmente sintático-semântico para abarcar também um enfoque pragmático do fenômeno normativo45. Importante destacar que a crítica de forma alguma implica que se abandone o legado dogmático construído sob o influxo do rigor na compreensão da linguagem jurídica; o que se busca é a complementação dos métodos na busca de concretude dos desígnios constitucionais tributários46.

Nesse sentido, se deve compreender, conforme ensina Carrazza, que a regra constitucional de anterioridade tributária “não veicula uma formalidade meramente sacramental, sem qualquer vantagem prática”, sendo seu escopo fundamental promover ao contribuinte “garantia efetiva de que ele só deverá pagar o tributo nos termos, prazos e nas formas” previstos na legislação vigente no exercício corrente. Arremata o autor:

Em última análise, o que interessa ao contribuinte é saber, de antemão, com base em que critérios vai pagar o tributo e de que modo poderá fazê-lo (se à vista ou a prazo, se com juros ou sem juros, se com correção monetária ou sem correção monetária etc.).47

Como já referido, porém, mesmo a anterioridade tributária interpretada e aplicada com a eficácia que o princípio da segurança jurídico-tributária demanda não é suficiente por si só para que se garanta calculabilidade normativa. É necessário também que a mudança antecipada não seja demasiadamente intensa e brusca.

3.2. Continuidade normativa: a suavização na intensidade da mudança normativa como elemento de segurança jurídica

É também inerente ao Direito e, portanto, atrelada à noção de segurança jurídica, a percepção de que não haverá mudança brusca no contexto jurídico--normativo ao qual submetidos os cidadãos.

Espera-se do Direito que ele forneça estabilidade suficiente para que os a ele submetidos sintam-se em “ambiente favorável” ao exercício de seus direitos e de suas liberdades.

Sob o ponto de vista normativo, portanto, é fundamental à segurança jurídica em seu aspecto de calculabilidade que haja continuidade normativa, qualificada como “segurança rítmica”, no sentido de que as (inevitáveis) mudanças sejam promovidas de maneira que não restem demasiadamente bruscas ou drásticas aos destinatários. A exigência é de graduabilidade de mudança, ou seja, admitindo--se que a mudança no Direito é contingente, deve ela ser gradual e suave48.

A obrigação dela decorrente é, como não poderia deixar de ser por se tratar de aspecto do princípio da segurança jurídica, aplicável em todas as esferas normativas: alterações legislativas, alterações de regulamentos e atos administrativos ou mesmo mudança de orientação jurisprudencial, todas estão atreladas ao dever de continuidade normativa.

Para reforçar o estado de segurança jurídica como calculabilidade, a continuidade normativa se faz por meio de “instituição de prazo razoável” entre a publicação da inovação normativa e sua eficácia, bem como pelo “estabelecimento de regras de transição” entre os regimes modificado e modificador, para que, “de um lado, se preservem atos já praticados sob a orientação abandonada e, de outro, que ela seja efetivada de maneira suave ou moderada”49.

A noção de instituição de prazo prévio à eficácia de legislação nova é prática consolidada no Direito brasileiro, a chamada vacatio legis. Trata-se inclusive de decorrência de regra geral estabelecida pela própria LINDB desde sua redação original, no sentido de que, salvo disposição em contrário, a lei passará a vigorar em todo o território nacional depois de decorridos 45 (quarenta e cinco) dias de sua publicação em veículo oficial50.

Apesar da disposição, é recorrente em matéria tributária previsão expressa de vigência da lei ou de ato normativo executivo a partir da data de publicação, o que consequentemente gera dificuldade aos contribuintes atingidos pela alteração ali veiculada, dada sua imprevisibilidade.

Já a ideia de estabelecimento de regras de transição ou regime de transição consiste na edição de normas específicas que promovam suavidade na troca de disposições vigentes, de modo que os cidadãos possam promover a mudança de forma orientada e sem alterações drásticas e repentinas de direitos e obrigações.

A extensão ou complexidade do regramento de transição deve ser proporcional à própria carga da mudança.

Pode-se promover transição de alteração singela com regra simples, que estabeleça medida de dilação de eficácia da alteração para momento futuro, por exemplo. Uma transição de maior abrangência demanda um conjunto de regras, um regime de transição, portanto, a exemplo do Regime Tributário de Transição (RTT), um conjunto de leis e medidas normativas progressivamente adotadas para adequar as normas contábeis brasileiras ao padrão internacional, o que promoveu inevitáveis alterações também nos seus efeitos fiscais, o que o regime de transição também procurou mitigar51.

Independentemente do instrumento utilizado e de sua extensão ou complexidade, o fundamental é que se compreenda que a norma de transição deve promover a condução segura do cidadão de um cenário jurídico-normativo a outro, temperando a mudança de forma a conferir a ele condições plenas de adaptação ao novo acervo de direitos e obrigações resultante da alteração.

As normas de transição configuram exatamente a prescrição central do art. 23 da Lei n. 13.655/2018, que é o tema central deste trabalho. Assentadas as premissas fundamentais à compreensão do princípio da segurança jurídica, sua eficácia e fundamento reforçados em sede de Direito Tributário e as especificidades de seu aspecto de calculabilidade como transição segura do presente ao futuro normativo, se passa à análise do dispositivo a partir das premissas postas.

4. O art. 23 da Lei n. 13.655/2018 e as regras de transição em matéria tributária como imposição constitucional

4.1. Análise geral do dispositivo

Devidamente assentadas as bases para a compreensão da segurança jurídica enquanto norma da espécie princípio, sua excepcional importância em matéria tributária e a instrumentalidade normativa de seu aspecto de calculabilidade, se volta este trabalho à análise, sob esse influxo, do art. 23 inserido na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) pela aprovação da Lei n. 13.655/2018.

Inicialmente, cumpre anotar algumas questões quanto à redação do dispositivo, que tem o seguinte conteúdo:

Art. 23. A decisão administrativa, controladora ou judicial que estabelecer interpretação ou orientação nova sobre norma de conteúdo indeterminado, impondo novo dever ou novo condicionamento de direito, deverá prever regime de transição quando indispensável para que o novo dever ou condicionamento de direito seja cumprido de modo proporcional, equânime e eficiente e sem prejuízo aos interesses gerais.

Sendo assim, em reconstrução de sua prescrição normativa, determina o texto que a “interpretação ou orientação nova” quanto a “norma de conteúdo indeterminado” que for fixada por decisão de qualquer das esferas citadas (“administrativa, controladora ou judicial”) deverá vir acompanhada de regime de transição, desde que esse regime seja “indispensável” para que a nova formatação normativa seja cumprida a contento, de acordo com os critérios apontados pelo próprio dispositivo (“modo proporcional, equânime e eficiente e sem prejuízo aos interesses gerais”).

Um dos idealizadores do projeto que deu origem à Lei n. 13.655/2018, Marques Neto aponta que o dispositivo foi pensado para “conferir maior racionalidade à aplicação da boa-fé nas relações das quais a administração é parte”. Isso porque a revisão de posicionamentos jurisprudenciais ou administrativos em matéria de Direito Público é constante, e a disposição constitucional que veda a retroatividade de lei (art. 5º, XXXVI) deixa margem para efeito retroativo em normas decorrentes de atos administrativos e de interpretação da legislação, desconsiderando o que estava (ou parecia estar) juridicamente estabelecido52.

Esse efeito é incompatível com a segurança jurídica e a noção de boa-fé que é dela parcela indissociável53.

Assim é porque a formação de entendimento quanto ao conteúdo normativo construído a partir de determinado conjunto de disposições promove um fechamento interpretativo quanto às demais possibilidades de sentido, gerando legítima expectativa de aplicação uniforme e segura daquela norma:

[...] no momento em que se firma em uma das alternativas possíveis de sentido (a melhor) dos enunciados legislativos (inclusive da Constituição), criando a norma específica e determinada do caso, e repetível para o mesmo grupo de casos, norma cabível dentro da norma legal, ela [a decisão] fecha as demais alternativas – antes possíveis. [...] Desde o momento em que tal fechamento ocorra, o espaço, discricionariamente deixado pelo legislador e possibilidade por uma cadeia de signos e significados inúmeros, concretiza-se e fixa-se em certo sentido único, criando-se verdadeira expectativa normativa de comportamento para todos, integrantes do mesmo grupo de casos54.

Pode-se dizer, portanto, que o dispositivo de certa forma positivou no ordenamento o paradigma pós-positivista da Teoria do Direito, pelo qual, conforme já mencionado, o conteúdo da norma jurídica não resta contido a priori no texto da disposição, mas é reconstruído a partir dele por processos de interpretação e integração dos textos normativos.

Essa dinâmica faz com que a mudança de interpretação firmada equivalha à edição de nova lei sobre a questão, dado que, mesmo permanecendo inalterada a legislação sob o ponto de vista formal, seu conteúdo normativo resta alterado. Eventual alteração posterior, portanto, equivaleria a verdadeira mudança de legislação, devendo vir acompanhada de medidas que assegurem a segurança de transição que exige o princípio da segurança jurídica.

A preocupação que inspirou o art. 23 da Lei n. 13.655/2018, portanto, é válida e de fato merece ser endereçada no contexto do Direito brasileiro.

No entanto, apesar de inserir a importante noção de transição segura no Direito brasileiro nas hipóteses de alteração de entendimento normativo consolidado, a redação do dispositivo traz problemas que têm o potencial de minar a correta teleologia sob a qual editado55.

A primeira dificuldade que exsurge da disposição é a utilização de grande quantidade de expressões para as quais não há razoável definição de sentido, dado que não estabelecidos parâmetros pela redação do artigo, questão que também não foi endereçada em sede de sua regulamentação pelo Decreto n. 9.830/2019:

Motivação e decisão na nova interpretação de norma de conteúdo indeterminado

Art. 6º A decisão administrativa que estabelecer interpretação ou orientação nova sobre norma de conteúdo indeterminado e impuser novo dever ou novo condicionamento de direito, preverá regime de transição, quando indispensável para que o novo dever ou o novo condicionamento de direito seja cumprido de modo proporcional, equânime e eficiente e sem prejuízo aos interesses gerais.

§ 1º A instituição do regime de transição será motivada na forma do disposto nos art. 2º, art. 3º ou art. 4º.

§ 2º A motivação considerará as condições e o tempo necessário para o cumprimento proporcional, equânime e eficiente do novo dever ou do novo condicionamento de direito e os eventuais prejuízos aos interesses gerais.

§ 3º Considera-se nova interpretação ou nova orientação aquela que altera o entendimento anterior consolidado. 

Regime de transição

Art. 7º Quando cabível, o regime de transição preverá:

I – os órgãos e as entidades da administração pública e os terceiros destinatários;

II – as medidas administrativas a serem adotadas para adequação à interpretação ou à nova orientação sobre norma de conteúdo indeterminado; e

III – o prazo e o modo para que o novo dever ou novo condicionamento de direito seja cumprido.

Desse modo, se verifica que conceitos-chave para a compreensão do comando normativo não estão minimamente significados pelo dispositivo ou seu regulamento.

Não há definição mínima, por exemplo, quanto ao significado de “norma de conteúdo indeterminado” para efeito de aplicabilidade do dispositivo. Reconhece Marques Neto que a questão gera debate, mas aponta que o conceito não guarda grandes dificuldades56; por outro lado, Ávila aponta que a abertura na definição do conceito tem potencial para gerar problemas de aplicação57.

Também não há parâmetro para que se identifique quando há superação de entendimento para efeito de estabelecimento de “interpretação ou orientação nova”: o regulamento refere que consiste “[n]aquela que altera o entendimento anterior consolidado” (art. 6º, § 3º), mas também não há parâmetro de definição quanto ao que efetivamente configura entendimento consolidado.

Da mesma forma não há no art. 23 ou em seu regulamento qualquer indicativo do conteúdo de significado em relação ao que seria o cumprimento de novo dever ou condicionamento de direito de “modo proporcional, equânime e eficiente e sem prejuízo aos interesses gerais”, que são os critérios que devem, conforme o dispositivo, orientar a conformação do regime de transição, se for o caso.

De forma geral, portanto, se verifica que o art. 23 da Lei n. 13.655/2018 e os arts. 6º e 7º de seu regulamento (Decreto n. 9.830/2019), que são a ele referentes, não se mostram claros quanto à definição, ainda que geral, de conceitos-chave para a compreensão de seu conteúdo normativo.

Ainda assim é possível concluir que o dispositivo tal qual redigido revela caráter expletivo, se comparado ao princípio da segurança jurídica, que é admitidamente sua inspiração, porque apenas explicita uma das hipóteses nas quais a segurança jurídica demanda transição segura, mas não esgota as demais, razão pela qual não admite interpretação a contrário (se não presente a hipótese do dispositivo, então desnecessária regra de transição)58.

O ponto se mostra especialmente importante quando se verifica a redação do art. 23, que não há ali determinação ao estabelecimento de regime de transição quando dada a hipótese de superação de entendimento ou interpretação consolidada sob quaisquer condições.

O dispositivo condiciona a obrigatoriedade de efetivo estabelecimento de regime transitório a um juízo de indispensabilidade do próprio decisor que promove a inovação normativa: somente estará ele obrigado a estabelecer regime de transição se entender que ele é necessário para cumprimento “proporcional, equânime e eficiente e sem prejuízo aos interesses gerais” de novos deveres ou condicionamentos decorrentes da inovação59.

Ocorre que, no âmbito do Direito Tributário, não se pode admitir que juízo discricionário determine se haverá ou não regime de transição, não importa sob qual critério. Em matéria tributária, o estabelecimento de instrumento de transição é imposição do sistema constitucional.

4.2. O estabelecimento de regras de transição como imposição de segurança jurídico-tributária: a anterioridade constitucional como regra geral mínima de transição normativa

Conforme já estabelecido, o princípio da segurança jurídica é norma onipresente e de excepcional relevância no sistema jurídico brasileiro, derivada do próprio sobreprincípio do Estado de Direito e fundamentada em diversos dispositivos espraiados pelo texto da Constituição Federal de 1988.

Em matéria tributária, tem sua eficácia potencializada em razão do notório reforço de seus fundamentos em âmbito constitucional e do fato de que a relação obrigacional tributária, por sua natureza, implica restrição a direitos fundamentais dos contribuintes que estão a ela submetidos, motivo pelo qual o estado de coisas de confiabilidade, calculabilidade e cognoscibilidade do Direito que o princípio determina seja buscado deve ser mais intensamente proporcionado quando se trata de Direito Tributário.

Essa peculiaridade setorial gera irradiação de efeitos por todas as normas tributárias, como não poderia deixar de ser em se tratando de um princípio estruturante como o da segurança jurídico-tributária, influxo sob o qual também a Lei n. 13.655/2018 deve ser interpretada e aplicada60.

É nesse sentido que desponta a preocupação com a margem de discricionariedade aberta ao decisor pelo art. 23 da Lei n. 13.655/2018 para que estabeleça regime de transição apenas se, na sua própria percepção subjetiva, ele for indispensável.

A questão é bem posta por Barbosa e Bellan:

Ocorre que referida ponderação é extremamente delicada, especialmente pelo fato de as autoridades fiscais, bem como os próprios órgãos julgadores administrativos exercerem funções plenamente vinculadas à legislação tributária. Por esse motivo, tamanha subjetividade na aplicação do dispositivo em questão pode vir a contrariar seus próprios fundamentos de salvaguarda à confiabilidade e à calculabilidade do ordenamento jurídico. Isso porque, a depender da interpretação adotada pelo julgador, a aplicação do mecanismo do artigo 23 da LINDB pode ser concebida ora com maior amplitude, em favor do contribuinte, ora com menor amplitude, esvaziando-se suas pretensões de amplitude61.

Se o ponto parece tormentoso à primeira vista, uma leitura do problema pelas lentes do princípio da segurança jurídico-tributária indica o caminho para a construção normativa.

O enfoque nem poderia ser diferente, dado que o intérprete deve sempre buscar, entre as alternativas de sentido possíveis de um dispositivo ou de conjunto de disposições, aquela que for “mais suportada pelos princípios fundamentais do subsistema de Direito Tributário”62.

Afinal, tanto a legislação quanto o processo de construção normativa a partir dela estão condicionados pela Constituição: legislador e julgador não podem escolher os fins a serem perseguidos livremente, tendo o dever de pinçar, dentre as alternativas possíveis, aquelas que mais privilegiem o programa constitucional63.

Nesse sentido, havendo imposição aos contribuintes de novo dever ou condicionamento de direito decorrente de nova interpretação normativa, hipótese do art. 23 da Lei n. 13.655/2018, o estabelecimento de regras de transição não pode ficar condicionado ao juízo de indispensabilidade do decisor, referido no dispositivo.

Seu estabelecimento pelo decisor é obrigatório em razão de o princípio da segurança jurídico-tributária exigir, em seu aspecto de calculabilidade normativa, que seja conferido aos contribuintes espaço de adaptação ao novo cenário que decorre da interpretação nova, conferindo suavidade à implementação da mudança imposta pelo novo entendimento firmado.

Essa obrigatoriedade em matéria tributária não depende de qualquer apreciação subjetiva do decisor quanto ao objeto ou extensão da alteração; havendo imposição ao contribuinte de novo dever ou condicionamento, isto é, havendo alteração de qualquer natureza (forma ou conteúdo) que torne a obrigação tributária mais gravosa ao contribuinte, deverá haver transição temperada por regras que permitam sua adaptação ao novo cenário.

Essa conclusão decorre não só da eficácia do princípio da segurança jurídico-tributária, mas também diretamente de um de seus fundamentos específicos e instrumento de realização: a regra da anterioridade constitucional, que configura ela própria instrumento de transição por dilação temporal de eficácia e que, conforme já apontado, é reconhecida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal como direito fundamental dos contribuintes e cláusula pétrea do sistema estabelecido a partir da Constituição Federal de 1988.

Isso não significa que inexista espaço de discricionariedade na aplicação do art. 23 da Lei n. 13.655/2018 em matéria tributária.

Caso entenda o decisor que a alteração de entendimento e os novos condicionamentos ou deveres dela decorrentes justifiquem regras específicas de transição (ou mesmo um conjunto de regras que forme regime transitório) de modo a conferir maior espaço de adaptação ao contribuinte, o art. 23 permite que tal regime seja estabelecido na própria decisão, em incremento ao ideal de calculabilidade normativa.

O que não se admite, sob influxo da segurança jurídico-tributária, é a interpretação do dispositivo para que se entenda possível o estabelecimento de menos ou mesmo nenhum espaço de adaptação aos contribuintes atingidos pela alteração de entendimento. Estar-se-ia, nesse caso, restringindo por interpretação de disposição infraconstitucional (o art. 23 da Lei n. 13.655/2018) um ideal (calculabilidade normativa) derivado diretamente de um princípio constitucional (segurança jurídico-tributária), implicando inadmissível supressão de eficácia de mandamento hierarquicamente superior.

É por tudo isso que se aponta que a anterioridade constitucional configura regra geral mínima de transição em matéria tributária.

É geral porque deve ser aplicada a qualquer alteração de qualquer natureza (forma ou conteúdo) que torne o cumprimento de obrigação tributária mais gravosa ao contribuinte; é mínima porque estabelece parâmetro específico que não pode ser diminuído, mas pode ser aumentado com vistas a incrementar a calculabilidade diante de cenário de transição mais complexa.

Sendo assim, a norma suportada pelo art. 23 da Lei n. 13.655/2018, em reconstrução conforme ao arcabouço constitucional de segurança jurídico-tributária, pode ser assim representada: se novo dever ou condicionamento de direito dos contribuintes decorrer de alteração de interpretação normativa em matéria tributária, então será obrigatório o estabelecimento de regra de transição mínima, equivalente ao menos à regra da anterioridade constitucional, sendo permitido o estabelecimento de regime de transição específico pela própria decisão, desde que fixe condições de tempo e modo mais favoráveis aos contribuintes em relação à regra geral mínima.

Tudo analisado, se pode dizer que o art. 23 inserido à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro pela Lei n. 13.655/2018 tem potencial de incrementar a segurança jurídica no aspecto que nela toca, de calculabilidade como transição normativa segura. Sua realização depende, porém, de uma reconstrução normativa de seu conteúdo alinhada às exigências da segurança jurídico-tributária tal qual estabelecida na Constituição Federal de 1988.

5. Considerações finais

Se nenhuma mudança é permanente, mas a mudança é, ressai o Direito como mecanismo de garantia aos cidadãos de que a mudança se dará de forma segura, estável e orientada.

Mais do que uma expectativa, no sistema da Constituição Federal de 1988, a segurança de transição é imposição constitucional do princípio da segurança jurídica, que prescreve a busca de um estado de coisas no qual o cidadão possa conhecer e confiar nas consequências jurídicas que o ordenamento estabelece aos atos ou fatos que o envolvem, além de calcular como eventuais mudanças de cenário poderão impactá-lo sob o ponto de vista jurídico-normativo.

Em matéria de Direito Tributário, conforme visto, a eficácia da segurança jurídica é ainda mais intensa, em razão do reforço de fundamentos constitucionais representado pelo sistema de limitações constitucionais ao poder de tributar, reflexo da própria peculiaridade da relação obrigacional tributária e seu impacto de heterorrestrição sobre os direitos fundamentais dos contribuintes.

Portanto, as alterações promovidas pela Lei n. 13.655/2018 na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), aprovadas justamente sob o influxo de reforço da segurança jurídica na interpretação e aplicação do Direito Público brasileiro, não podem ser lidas sem que se considere que, quando incidem sobre relações de Direito Tributário, estão condicionadas pela normatividade especial do sistema constitucional pertinente.

Sendo assim, em resposta à indagação que motivou o presente trabalho, deve-se concluir que, em se tratando de hipótese de aplicação do art. 23 inserido na LINDB pela Lei n. 13.655/2018 em matéria tributária, o estabelecimento de regra ou regime de transição é imprescindível.

Trata-se de imposição normativa do sistema constitucional tributário que, ao alçar a anterioridade constitucional ao patamar de direito fundamental, estabeleceu-a como regra geral mínima de transição, de modo que inexiste espaço de interpretação que permita suprimi-la ou mesmo minorá-la diante de alteração em norma tributária que afete o conteúdo obrigacional dos contribuintes.

Nesse sentido, a discricionariedade prevista no art. 23, que permite ao decisor juízo de indispensabilidade quanto ao estabelecimento de regime de transição na hipótese, permanece de exercício válido quando se tratar de matéria tributária, desde que seja para promover incremento de segurança por meio de fixação de condições de tempo e modo mais favoráveis aos contribuintes do que a regra geral mínima estabelecida pela anterioridade.

Conclui-se, portanto, que o art. 23 inserido pela Lei n. 13.655/2018 à LINDB tem potencial para atingir a teleologia de incremento de segurança jurídica que orientou sua elaboração e aprovação, o que depende, em matéria tributária, de construção de seu sentido normativo em interpretação sistemática orientada pelo conteúdo prescritivo específico do princípio da segurança jurídico-tributária.

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1 MARQUES NETO, Floriano de Azevedo; FREITAS, Rafael Verás. Comentários à Lei n. 13.655/2018 (Lei da Segurança para a Inovação Pública). Belo Horizonte: Fórum, 2019, p. 17.

2 SUNDFELD, Carlos Ari. A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro e sua renovação. In: CUNHA FILHO, Alexandre Jorge Carneiro da; ISSA, Rafael Hamze; SCHWIND, Rafael Wallbach. Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – Anotada. São Paulo: Quartier Latin, 2019. v. I, p. 35.

3 A regulamentação dos dispositivos inseridos à LINDB pela Lei n. 13.655/2018 é obra do Decreto n. 9.830, de 10 de junho de 2019.

4 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 124-125.

5 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 126.

6 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 126-127.

7 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 5. ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 278.

8 DERZI, Misabel Abreu Machado. Modificações da jurisprudência no direito tributário. São Paulo: Noeses, 2009, p. 316.

9 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 128.

10 Sobre a indissociabilidade entre Estado de Direito e segurança jurídica: CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003, p. 257.

11 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 370.

12 Não se ignora que a dissociação entre regras e princípios é assunto extremamente controverso e extenso, sendo adotado aqui critério de diferenciação específico, mas não necessariamente definitivo ou exclusivo. Para estudo abrangente da discussão, ver: FELLET, André. Regras e princípios, valores e normas. São Paulo: Saraiva, 2014. (Série IDP: pesquisa acadêmica).

13 ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 15. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 102.

14 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 138, 696-697.

15 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 126.

16 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 36.

17 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. O princípio da segurança jurídica diante do princípio da legalidade. In: MARRARA, Thiago (org.). Princípios de direito administrativo. São Paulo: Atlas, 2012, p. 11-15.

18 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 343-344.

19 GUASTINI, Riccardo. Das fontes às normas. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 24-25.

20 CHIASSONI, Pierluigi. Técnica da interpretação jurídica: breviário para juristas. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020, p. 222.

21 ÁVILA, Humberto. Constituição, liberdade e interpretação. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 34.

22 VESTING, Thomas. Teoria do direito: uma introdução. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 211-215. (Série IDP: linha direito comparado).

23 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 284-286.

24 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 256.

25 Arts. 150 a 152, Seção II do Título VI do Capítulo I da Constituição Federal de 1988.

26 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2019, p. 293.

27 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 162.

28 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 35. ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 6.

29 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 301.

30 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 300-301.

31 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 633.

32 FERRAZ JR., Tercio Sampaio. O direito, entre o futuro e o passado. São Paulo: Noeses, 2014, p. 19.

33 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 634-640.

34 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 163.

35 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2019, p. 333.

36 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 253.

37 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 178.

38 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 639.

39 Para Ricardo Lobo Torres, p. ex., “a anterioridade exibe simultaneamente as características dos princípios e regras, conf.: TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário: valores e princípios constitucionais tributários. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2014. v. II, p. 570. No mesmo sentido, identificando na anterioridade dimensões tanto de princípio quanto de regra: ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 212.

40 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 212.

41 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 163.

42 Medida Cautelar na ADI n. 939-7/DF, rel. Min. Sydney Sanches, j. 15.09.1993, publicado no DJ 17.12.1993.

43 Nesse sentido, o estudo detalhado de: FUCK, Luciano Felício. Estado fiscal e Supremo Tribunal Federal. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 308-315.

44 Súmula Vinculante n. 50. Norma legal que altera o prazo de recolhimento de obrigação tributária não se sujeita ao princípio da anterioridade.

45 BORGES, José Souto Maior. Um ensaio interdisciplinar em direito tributário: superação da dogmática. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo, n. 211, abr. 2013, p. 106-121.

46 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 641.

47 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 181.

48 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 640-641.

49 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 642-643.

50 Decreto-lei n. 4.657/42. “Art. 1º Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada.”

51 O histórico de alterações e suas repercussões é bem sintetizado em: OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Lei n. 12.973/2014: efeitos tributários das modificações contábeis (escrituração x realismo jurídico). In: MARTINS, Natanael; RODRIGUES, Daniele Souto (coord.). Tributação atual da renda. São Paulo: Noeses, 2015, p. 329-346.

52 MARQUES NETO, Floriano de Azevedo; FREITAS, Rafael Verás. Comentários à Lei n. 13.655/2018 (Lei da Segurança para a Inovação Pública). Belo Horizonte: Fórum, 2019, p. 71.

53 DERZI, Misabel Abreu Machado. Modificações da jurisprudência no direito tributário. São Paulo: Noeses, 2009, p. 600-604.

54 DERZI, Misabel Abreu Machado. Modificações da jurisprudência no direito tributário. São Paulo: Noeses, 2009, p. 580-581. A lição é de contexto no qual discutida especificamente a formação de entendimento jurisprudencial, mas perfeitamente extensível aos demais casos contemplados na hipótese do dispositivo ora analisado.

55 A redação poderia ser “mais clara, sucinta e objetiva”, como, por exemplo, estabelecer exigência de regime de transição “sempre que necessário à garantia da segurança jurídica”, em oposição ao estilo “mais longo e confuso”, no qual efetivamente redigido e aprovado o dispositivo (MARRARA, Thiago. Comentário gerais ao dispositivo – artigo 23 da LINDB. In: CUNHA FILHO, Alexandre Jorge Carneiro da; ISSA, Rafael Hamze; SCHWIND, Rafael Wallbach. Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – Anotada. São Paulo: Quartier Latin, 2019. v. II, p. 229-234).

56 “São de conteúdo indeterminado todas aquelas que, para o processo de extração de um conteúdo normativo da sua prescrição, demandam o preenchimento de conteúdo subjetivo por parte do intérprete.” (MARQUES NETO, Floriano de Azevedo; FREITAS, Rafael Verás. Comentários à Lei n. 13.655/2018 (Lei da Segurança para a Inovação Pública). Belo Horizonte: Fórum, 2019, p. 81).

57 “[...] a nova norma deixa em aberto várias questões, como definir o que significa uma ‘norma de conteúdo indeterminado’, haja a vista a discussão de que toda a norma, em maior ou menor medida, padece de algum grau de indeterminação em face de suas potenciais ambiguidade e equivocidade. [...] Tais considerações não são desprovidas de efeitos práticos. Por exemplo, o princípio da segurança jurídica exige a previsão de um regime de transição quando uma norma veiculada por decreto altere drasticamente a alíquota de um imposto, embora seja uma norma (e não uma decisão) e tenha antecedente fechado e consequência determinada (e não possa ser qualificada como norma com conteúdo indeterminado).” (ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 644-645).

58 ÁVILA, Humberto. Teoria da segurança jurídica. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2019, p. 645.

59 BARBOSA, Felipe Carreira; BELLAN, Daniel Vitor. O artigo 23 do Decreto-lei n. 4.657/42 e os princípios da segurança jurídica e da boa-fé nas relações tributárias. In: CUNHA FILHO, Alexandre Jorge Carneiro da; ISSA, Rafael Hamze; SCHWIND, Rafael Wallbach. Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – Anotada. São Paulo: Quartier Latin, 2019. v. II, p. 262.

60 A aplicabilidade da Lei n. 13.655/2018 ao Direito Tributário é questão que tem sido discutida desde a edição da lei, dada a reserva constitucional de lei complementar para o estabelecimento de normas gerais em matéria tributária (art. 146, CF/88). Em razão do escopo mais restrito deste trabalho, o ponto não será profundamente discutido, sendo admitida a aplicabilidade da lei ao Direito Tributário sob entendimento de se tratar de norma de “sobredireito” aplicável a todo o Direito Público, sendo que a reserva constitucional de lei complementar não impede a “repercussão tributária de normas gerais de Direito”. Nesse sentido: ISSA, Rafael Hamze. Âmbito de Aplicabilidade da LINDB: fundamento constitucional e aspectos federativos. In: CUNHA FILHO, Alexandre Jorge Carneiro da; ISSA, Rafael Hamze; SCHWIND, Rafael Wallbach. Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – Anotada. Vol. I. São Paulo: Quartier Latin, 2019, p. 50-59, e SUNDFELD, Carlos Ari. LINDB: Direito Tributário está sujeito à Lei de Introdução Reformada. Jota, 2018. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/lindb-direito-tributario-esta-sujeito-a-lei-de-introducao-reformada-10082018. Acesso em: 1º abr. 2020.

61 BARBOSA, Felipe Carreira; BELLAN, Daniel Vitor. O artigo 23 do Decreto-lei n. 4.657/42 e os princípios da segurança jurídica e da boa-fé nas relações tributárias. In: CUNHA FILHO, Alexandre Jorge Carneiro da; ISSA, Rafael Hamze; SCHWIND, Rafael Wallbach. Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – Anotada. São Paulo: Quartier Latin, 2019. v. II, p. 262.

62 ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 268.

63 GUASTINI, Riccardo. Interpretar e argumentar. Belo Horizonte: D’Plácido, 2019, p. 317.