TRIBUTAÇÃO DOS INSTRUMENTOS FINANCEIROS HÍBRIDOS – DESAFIOS À IMPLEMENTAÇÃO DA AÇÃO 2 DO PROJETO BEPS
Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Bacharel em Administração de Empresas pela Fundação Getulio Vargas (FGV). Especialista em Direito Tributário e Direito Tributário Internacional pelo IBDT. Mestrando em Direito Tributário pela Universidade de Direito de São Paulo.
Advogado em São Paulo. E-mail: bruno.oyamada@mattosfilho.com.br
Recebido em: 03-04-2020
Aprovado em: 05-06-2020
DOI: http://dx.doi.org/10.46801/2595-7155-rdtia-n7-4
Ao longo dos últimos anos, o tema dos instrumentos financeiros híbridos tem recebido especial atenção, tanto na doutrina brasileira quanto na estrangeira, em especial após a OCDE ter dedicado, no âmbito do Projeto BEPS, uma ação específica para tratar dessa matéria, a Ação 2 (Neutralising the Effects of Hybrid Mismatch Arrangements). Desse modo, no presente artigo, busca-se analisar as justificativas apresentadas pela OCDE para defender o combate irrestrito às oportunidades de arbitragem fiscal mediante a utilização desses instrumentos financeiros, bem como a compatibilidade das medidas sugeridas no âmbito dessa ação com os princípios e garantias que norteiam a tributação da renda no Brasil. Por fim, analisa-se a viabilidade de serem adotados, para fins fiscais, os padrões contábeis internacionais de classificação desses instrumentos, com vistas a reduzir os cenários de assimetria na sua qualificação pelos Estados.
important topic in the debates between scholars, especially after the OECD launched the BEPS Project, which contains a specific action that aims to deal with these transactions, the Action 2 (Neutralising the Effects of Hybrid Mismatch Arrangements). In this article, we analyze the grounds of this action, in which the OECD intends to mobilize the states to a battle against the tax arbitrage through the usage of these instruments, as well as the compatibility of its recommendations with the principles that drive the income taxation in Brazil. At last, we investigate whether is feasible the usage, for tax purposes, of the accounting standards in regard to the classification of these financial instruments, as a measure to reduce the mismatches in their qualification.
INTRODUÇÃO
Ao longo dos últimos anos, muito tem sido discutido acerca dos impactos fiscais decorrentes da utilização de instrumentos financeiros híbridos por grupos econômicos com atuação internacional. De modo geral, as discussões estão relacionadas ao fato de que tais instrumentos, por estarem em uma zona cinzenta entre os instrumentos de capital, de um lado, e de dívida, de outro, são, muitas vezes, qualificados de formas distintas pelos Estados, criando, assim, oportunidades de arbitragem fiscal.
O tema ganhou tamanha relevância que a utilização dos instrumentos financeiros híbridos por partes relacionadas foi objeto de ação específica do Projeto BEPS, a Ação 2 (Neutralising the Effects of Hybrid Mismatch Arrangements), na qual a OCDE sugeriu aos Estados a adoção de determinadas medidas com vistas a neutralizar os efeitos fiscais decorrentes de divergências na qualificação, por dois ou mais Estados, de operações envolvendo entidades1 ou instrumentos financeiros híbridos.
Em linhas gerais, as medidas sugeridas pela OCDE consistem, dentre outras, na alteração das legislações domésticas com vistas à inclusão de regras que determinem: (i) a não dedutibilidade da remuneração atrelada a um instrumento financeiro híbrido na hipótese de o rendimento não ser tributado pelo Estado do beneficiário (regra primária/primary rule); e (ii) a tributação da remuneração atrelada a um instrumento financeiro híbrido na hipótese ter sido admitida a sua dedutibilidade pela sociedade emissora e não aplicada, pelo Estado da Fonte, a primeira regra (regra secundária/secundary rule).
É evidente, no entanto, que a implementação dessas medidas por cada Estado deve ser precedida de uma análise de sua compatibilidade com as garantias e princípios que norteiam a tributação da renda nessas jurisdições, sob pena de se incluir regra que, no
futuro, poderá ser declarada inconstitucional pelos respectivos Poderes Judiciários, comprometendo, assim, a segurança jurídica nesses ordenamentos.
Desse modo, no presente artigo, busca-se analisar as seguintes questões: (i) a legitimidade das justificativas apresentadas pela OCDE para combater a utilização dos instrumentos híbridos; (ii) a compatibilidade das medidas sugeridas pela OCDE na Ação 2 do BEPS com as garantias e princípios que norteiam a tributação sobre a renda da pessoa jurídica no Brasil; e, por fim, (iii) a viabilidade dos países adotarem, para fins fiscais, como medida alternativa, os padrões contábeis internacionais de classificação desses instrumentos com base na orientação de prevalência da substância econômica sob a forma jurídica.
INSTRUMENTOS FINANCEIROS DE CAPITAL E DÍVIDA
As fontes de financiamento da atividade empresarial representam um dos pilares do sistema capitalista e, por isso, desde o surgimento desse sistema de produção, têm recebido atenção ímpar, em especial pelos investidores e operadores do direito e contabilidade.
Realmente, a partir da necessidade dos agentes econômicos de estabelecer uma relação de proporcionalidade entre risco e retorno financeiro sobre os seus investimentos, ponto central de um sistema de produção baseado no capital, foram desenvolvidas, ao longo dos anos, pelos operadores do direito, diversas figuras jurídicas com o objetivo de codificar o capital2, (e.g., sociedade, ações, mútuo, debêntures, fundos de investimento, derivativos), garantindo, assim, uma clara identificação dos riscos e dos retornos associados às diferentes formas de investimento do capital.
Nesse contexto, as figuras dos instrumentos de capital (equity) e instrumentos de dívida (debt), cujos contornos foram traçados há tempos nesse processo de codificação do capital, são amplamente conhecidas pelos agentes econômicos, podendo ser diferenciadas, em síntese, da seguinte forma:
Instrumentos de capital – instrumentos financeiros por meio dos quais os investidores assumem os riscos associados ao negócio, não tendo, assim, qualquer garantia do recebimento do capital investido e da rentabilidade sobre a importância transferida à sociedade. Por outro lado, a rentabilidade sobre o capital investido também não está sujeita a qualquer limitação, sendo que, havendo a dissolução da sociedade, o seu detentor tem direito a receber os ativos após dedução de todos os valores exigíveis por terceiros (passivos)3; e
Instrumentos de dívida – instrumentos financeiros que garantem ao investidor o recebimento do capital investido somado a um retorno já dimensionável na data da aplicação dos recursos financeiros.
Desse modo, com base nas definições acima expostas, pode-se afirmar que, de modo geral,
(i) instrumentos de capital são aqueles em que o capital investido não é exigível e cujo retorno financeiro é apenas uma expectativa, e (ii) instrumentos de dívida são aqueles em que o capital investido é exigível e o retorno financeiro pode ser dimensionado na data da aplicação4.
Assim, por esse motivo, os instrumentos de capital são identificados pela ciência contábil como elementos do patrimônio líquido, enquanto os instrumentos de dívida ocupam lugar no passivo da companhia, indicando, assim, que os recursos disponíveis para o exercício da atividade empresarial, isto é, os ativos, foram financiados por: (i) capital próprio (patrimônio líquido), não exigível; e (ii) de terceiros (passivo), exigível.
Tal identificação permite que os usuários da contabilidade, tais como investidores, parceiros comerciais, instituições financeiras e outros, identifiquem a situação financeira da companhia e apurem, de forma mais precisa, os riscos financeiros a que estão sujeitos ao transacionar com a companhia. Já para o Direito Tributário, a classificação dos instrumentos como patrimoniais ou de dívida tem sido utilizada, há tempos, por grande parte dos ordenamentos jurídicos para fins de fixação do tratamento fiscal a ser dado aos rendimentos financeiros decorrentes dessas relações econômicas.
Nesse sentido, no Brasil, assim como em muitos outros países5, os dividendos, rendimentos decorrentes da participação nos lucros a que fazem jus os detentores de instrumentos de capital, são, da perspectiva do seu beneficiário, isentos do Imposto sobre a Renda (“IR”). Por outro lado, para a pessoa jurídica que distribui tais valores, não é assegurada a dedutibilidade de tais importâncias na apuração da base de cálculo desse tributo.
Já no caso dos rendimentos decorrentes de instrumentos de dívida, isto é, os juros, esses devem ser tributados pelo seu beneficiário, sendo, no entanto, assegurada a sua dedutibilidade, pela sociedade devedora, na apuração do lucro real. Essa política fiscal tem como objetivo evitar uma dupla tributação econômica sobre o mesmo rendimento, embora isso não encontre óbice no ordenamento jurídico brasileiro, que veda, tão somente, a bitributação jurídica.
Sendo assim, pode-se afirmar que a classificação de instrumentos financeiros em instrumentos de capital, de um lado, e instrumentos de dívida, de outro, tem servido, ao
longo dos anos, dentre outras finalidades, para (a) fixação e identificação, pelos agentes econômicos, dos riscos e retornos associados ao investimento; (b) identificação, pela ciência contábil, da situação econômica da sociedade empresária; e (c) estabelecimento do tratamento tributário dispensado ao rendimentos decorrente do capital investido.
Todavia, com o desenvolvimento do sistema capitalista, a clássica divisão de (i) instrumentos de capital, de um lado, e (ii) instrumentos de dívida, de outro, tem se mostrado insuficiente para identificar a ampla gama de instrumentos financeiros hoje existentes6.
E como consequência, tendo em vista que os regimes tributários estão pautados nessa clássica divisão dicotômica dos instrumentos financeiros, novas discussões no campo tributário têm surgido, em especial no que diz respeito ao tratamento a ser dispensado aos rendimentos associados a instrumentos financeiros que não se enquadram como instrumentos de capital ou de dívida, os geralmente denominados instrumentos financeiros híbridos.
INSTRUMENTOS FINANCEIROS HÍBRIDOS
Como mencionado, com o desenvolvimento do sistema capitalista, novos instrumentos de financiamento da atividade empresarial têm surgido, desafiando, assim, a clássica divisão dos instrumentos financeiros em instrumentos de capital, de um lado, e instrumentos de dívida, de outro.
O desafio decorre do fato de que esses instrumentos, muitas vezes denominados instrumentos híbridos ou instrumentos financeiros compostos, neste último caso pela ciência contábil7, possuem, simultaneamente, características próprias de instrumentos de capital e instrumentos de dívida8.
Em termos econômicos, a existência de instrumentos financeiros híbridos pode ser explicada pela sua capacidade de: (i) oferecer relações de risco versus retorno do capital investido, que não poderiam ser alcançadas pelos instrumentos financeiros tradicionais (plain vanilla); (ii) equilibrar a estrutura de capital da companhia e melhorar os seus índices financeiros (e.g., índices de endividamento, rentabilidade sobre o capital investido etc.); e
(iii) reduzir os riscos de inadimplemento a que estão sujeitos os investidores9.
Para fins tributários, o desafio atrelado aos instrumentos financeiros híbridos decorre do fato de que, por estarem situados em uma zona cinzenta, a sua qualificação, como instrumentos de capital ou de dívida, acaba, muitas vezes, por ser realizada de forma díspar em diferentes Estados, criando situações de arbitragem fiscal.
Nesse sentido, ao analisar o tema, Roberto Quiroga e Matheus Bertholo10 apontam que, de modo, geral, para qualificar esses instrumentos híbridos como instrumentos de capital ou de dívida, os Estados utilizam “testes”, levando-se em consideração: (a) para instrumentos financeiros constituídos sob a forma jurídica de instrumentos de dívida, fatores como a existência de direito do detentor do título de o converter em instrumento de capital e de participar nos lucros da companhia, os prazos de pagamento de juros e principal, a relação de subordinação com outros passivos assumidos pela sociedade, o prazo e vencimento do título, a possibilidade de ser liquidado mediante entrega de ações etc.; e (b) para instrumentos financeiros constituídos sob a forma jurídica de instrumento de capital, fatores como a existência de direito do detentor do instrumento de capital de receber rendimentos não atrelados ao lucro, o direito da entidade emissora de resgatar o instrumento em um curto prazo e a qualidade do crédito.
No entanto, embora exista certa aproximação entre os fatores que são levados em consideração pelos Estados, fato é que não há uniformidade na qualificação de instrumentos híbridos entre as diferentes jurisdições, já que, como explica Luís Eduardo Schoueri11, cada Estado tem competência para fixar, de forma autônoma, os critérios que deverão ser utilizados para se qualificar e tributar determinado instrumento financeiro e os rendimentos a esse atrelados.
Nesse sentido, pode-se citar o caso do Brasil, onde, embora os aspectos econômicos dos instrumentos financeiros sejam levados em consideração para fins de determinação de seu tratamento contábil, para fins fiscais, o legislador optou por preservar a natureza jurídica do ativo em detrimento à sua essência econômica, o que será adiante abordado.
Por esse motivo, é possível que os Estados de Fonte e de Residência atribuam a um mesmo instrumento financeiro híbrido diferentes qualificações, criando, assim, cenários em que os contribuintes podem explorar as diferenças entre as regras tributárias de diferentes jurisdições com o objetivo de alcançar carga tributária inferior àquela que seria obtida caso a operação fosse realizada dentro de apenas um Estado, fenômeno que é comumente denominado arbitragem fiscal12.
A título exemplificativo, pode-se citar o caso das debêntures perpétuas, que podem no país da fonte ser qualificadas como instrumentos financeiros de dívida e no Estado de Residência do beneficiário como instrumentos de capital. Nesse cenário, tendo em vista que os Estados, como visto, preveem, de modo geral, a isenção sobre dividendos e a dedutibilidade de juros, é possível que haja uma situação de (i) isenção, de um lado, e (ii) dedução, de outro, isto é, de “dupla não tributação”. Veja-se:
Como se vê, no exemplo acima apontado, as diferentes qualificações atribuídas pelos Estados de Fonte e Residência às debêntures perpétuas permitem que os agentes econômicos alcancem uma situação ótima de tributação, na medida em que a remuneração atrelada a esse instrumento financeiro híbrido será (i) deduzida, para fins de apuração da base de cálculo do IR pela Entidade B, e (ii) isenta na apuração do IR pela Entidade A.
E é exatamente por permitir cenários de dedução/não incidência que a utilização de instrumentos financeiros híbridos entre partes relacionadas deve, na visão da OCDE, ser combatida pelos Estados, conforme se passa a analisar.
PROJETO BEPS
Ação 2 – É legítimo um combate indiscriminado aos instrumentos financeiros híbridos?
Com o objetivo de combater a erosão das bases tributáveis e a transferência artificial do lucros em operações envolvendo duas ou mais jurisdições, a OCDE lançou mão do Projeto BEPS, iniciativa cujas medidas visam (i) suprir as lacunas nas leis internas dos Estados, (ii) eliminar a possibilidade de se explorar as assimetrias entre diferentes sistemas tributários com o objetivo de alcançar situações de redução da carga tributária ou dupla não tributação, (iii) impedir o uso abusivo dos acordos de bitributação e (iv) aumentar o acesso dos Estados às informações dos contribuintes.
De forma resumida, pode-se afirmar que o projeto BEPS decorre da diretriz adotada pela OCDE, no sentido de que, no plano internacional, deve ser combatida não apenas a dupla tributação da renda, mas também a sua “dupla não tributação” alcançada através da transferência artificial de lucro entre partes relacionadas.
Nesse contexto, dentre as ações apresentadas no Projeto BEPS, há uma dedicada, especificamente, ao combate da arbitragem fiscal realizada por meio negócios híbridos, a já mencionada Ação 2, que recomenda que sejam introduzidas regras de coordenação nas legislações domésticas com vistas a neutralizar os efeitos fiscais decorrentes de divergências na qualificação, por dois ou mais Estados, de operações envolvendo entidades ou instrumentos financeiros híbridos13.
Em linhas gerais, analisando-se o relatório da Ação 2, é possível verificar que as sugestões da OCDE, no que diz respeito à alteração das legislações domésticas, se referem à inclusão de duas regras gerais, já citadas, quais sejam: (i) Regra Primária (Primary Rule) – o Estado em que está situada a sociedade emissora do instrumento financeiro híbrido deverá negar a dedutibilidade da remuneração atrelada a esse instrumento se a o país em que está situado o beneficiário não determinar a tributação desse rendimento; (ii) Regra Secundária (Secundary Rule) – caso não seja aplicada a regra primária, o Estado em que está situado o beneficiário deverá determinar a tributação do rendimento atrelado ao instrumento híbrido.
Contudo, como bem apontado por Ramon Tomazela Santos14, os fundamentos que sustentam a Ação 2 são questionáveis, pelos seguintes motivos:
Perda de Arrecadação: a OCDE sustenta que a utilização de entidades e instrumentos financeiros híbridos teria o potencial de gerar perdas à arrecadação dos Estados envolvidos, obrigando esses a reduzir as despesas públicas ou encontrar fontes alternativas de financiamento. Contudo, como aponta o autor, a perda de arrecadação somente existe quando o contribuinte deixa de arrecadar importância que é devida ao Estado, o que não ocorre no caso dos instrumentos financeiros híbridos, já que nessa situação são cumpridas as legislações tributárias de todas as jurisdições envolvidas.
Distorção da Livre Concorrência: assumindo que somente as sociedades que
atuam no cenário internacional teriam a capacidade de realizar uma arbitragem fiscal mediante o uso de entidades e instrumentos financeiros, a OCDE defende que essas operações teriam a capacidade de distorcer a livre concorrência. Todavia, conforme esclarecido pelo autor, não foram apresentados, até o momento, dados concretos sobre a existência prejuízo nesse sentido, devendo-se destacar, ainda, que a economia fiscal gerada nessas operações não difere de outras obtidas pelos agentes econômicos em outras transações realizadas com o objetivo de reduzir o custo fiscal incidente sobre as suas operações.
Ameaça à Neutralidade do Sistema Tributário: tendo em vista que os instrumentos financeiros híbridos, quando utilizados em operações cross-border, reduzem o custo de capital da companhia, a OCDE aponta que a alocação de recursos dentro da economia global, que deveria ser pautada em aspectos econômicos e geográficos, passa a ser influenciada por questões fiscais. Entretanto, como aponta o autor, com base nas lições de Luís Eduardo Schoueri, a incidência tributária é sempre um elemento considerado nas decisões de investimento, não algo exclusivo dos negócios híbridos.
Justiça Tributária: a OCDE aponta, por fim, que as entidades e instrumentos financeiros híbridos, por reduzirem a tributação efetiva sobre rendimentos de natureza financeira, beneficiam os proprietários do capital, em detrimento aos contribuintes cuja renda advém do trabalho. Contudo, como bem apontado pelo autor e também por João Victor Guedes15, existe uma tendência dos Estados em onerarem menos a renda auferida no mercado financeiro e de capitais, tendo em vista a sua alta mobilidade. Desse modo, não parece que o combate específico aos negócios híbridos contribuiria para aumentar a justiça tributária.
Portanto, com base nesses apontamentos, pode-se concluir que as próprias justificativas apresentadas pela OCDE para mobilizar os Estados a um combate indiscriminado à utilização de instrumentos financeiros híbridos por partes relacionadas são questionáveis.
Realmente, não se pode perder de vista que os instrumentos financeiros híbridos não representam, em si, ferramentas de evasão fiscal16, motivo pelo qual nos parece que a sua utilização por conglomerados multinacionais não deveria ser taxada, de forma indiscriminada, como uma prática a ser necessariamente combatida pelos Estados.
É exatamente por esse motivo que Gustavo Brigagão e Flávia Cavalcanti Pepe17 apontam que melhor teria sido se a OCDE tivesse, de forma explícita, direcionado a Ação 2 ao combate da utilização de instrumentos financeiros híbridos em operações que tenham como objetivo a erosão das bases tributáveis e o deslocamento artificial do lucro (“base erosion and profit shifting”).
Todavia, não tendo assim o feito, pode-se afirmar que é, no mínimo, questionável a própria legitimidade do combate indiscriminado à utilização dos instrumentos financeiros híbridos que a OCDE propõe aos Estados na Ação 2 do Projeto BEPS.
OBSTÁCULOS PARA IMPLEMENTAÇÃO DA AÇÃO 2 DO BEPS NO BRASIL Como visto, as justificativas apresentadas pela OCDE para mobilizar um combate pelos Estados à utilização de instrumentos financeiros híbridos são, em si, questionáveis, motivo
pelo qual a Ação 2 tem sido, nos últimos anos, objeto de forte questionamento na doutrina.
Mas, além disso, existe uma outra questão que parece ainda não ter sido explorada de forma tão ampla, qual seja a (in)compatibilidade das próprias medidas sugeridas pela OCDE na Ação 2, em especial, a regra primária, com as garantias e princípios que norteiam a tributação da renda no Brasil. É essa questão que se passa a investigar.
Princípios e garantias norteadores da tributação da renda
Para que se possa verificar a compatibilidade da proposta contida na Ação 2 com o ordenamento jurídico brasileiro, devem ser antes analisadas as garantias e os princípios que delimitam a tributação da renda no Brasil, para que se verifique, assim, os limites que devem ser observados pelo legislador ao tratar dessa matéria.
Nesse sentido, um primeiro apontamento que deve ser feito acerca da tributação da renda no ordenamento jurídico brasileiro se refere ao fato de que, no Brasil, o constituinte, ao atribuir competências tributárias aos entes federativos, estabeleceu, no art. 146, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal (“CF”), que caberia ao legislador complementar definir os fatos geradores dos impostos discriminados no texto constitucional, dentre esses o tributo sobre a “renda e proventos de qualquer natureza”, previsto no art. 153, inciso III, da CF.
E nesse contexto, em relação ao imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, pode-se encontrar a definição de seu fato gerador no art. 43 Código Tributário Nacional (“CTN”) que, recepcionado como lei complementar, estabelece que esse se identifica com a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica (i) de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos, e (ii) de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.
Em relação ao fato gerador do imposto sobre a renda, sabe-se que a doutrina diverge sobre a matéria: enquanto parte dessa entende que tanto o inciso I quanto o inciso II do CTN veiculam hipóteses de acréscimo de patrimonial18, outros enxergam no inciso I a adoção, pelo legislador, da teoria da “renda-produto” e, assim, a possibilidade de existir uma tributação pelo IR mesmo sem a verificação de um efetivo acréscimo patrimonial. Exemplo dessa última situação seria a tributação exclusiva na fonte dos rendimentos auferidos por não residentes no país19.
Não é este, no entanto, o espaço adequado para analisarmos a matéria, cabendo a nós apenas destacar que, a despeito da divergência em relação ao conceito de renda adotado pelo legislador, a doutrina é praticamente uníssona ao reconhecer que no ordenamento jurídico brasileiro a tributação da renda deve observar o princípio da renda líquida.
Nesse sentido, Luís Eduardo Schoueri explica que o legislador complementar, ao determinar, no art. 43 do CTN, que o IR somente poderá alcançar a renda disponível, adotou tal princípio como norteador da tributação da renda no Brasil, limitando assim a liberdade do legislador de dispor sobre as hipóteses de indedutibilidade de despesas20. Victor Borges Polizelli, por outro lado, extrai do próprio texto constitucional este princípio, explicando que o termo “renda” empregado pelo constituinte carrega princípios elementares, dentre esses o da renda líquida (subjetiva e objetiva), garantindo, assim, a plena dedutibilidade das despesas relacionadas com a obtenção de rendimentos21.
Humberto Ávila e Ricardo Mariz de Oliveira enxergam ainda no princípio da universalidade, esculpido no art. 153, § 2º, inciso I, da CF, a exigência de que na apuração do imposto sobre a renda sejam considerados todos os fatores positivos e negativos que influenciam a determinação do acréscimo patrimonial, tributando-se, assim, a renda líquida22.
Portanto, a despeito da divergência, na doutrina, em relação ao conceito de renda adotado pelo legislador, pode-se afirmar com segurança que a materialidade do IR se refere à aquisição de disponibilidade de uma renda líquida e que, por esse motivo, em relação à pessoa jurídica, a regra geral que norteia a apuração da sua base de cálculo é de que todas as despesas incorridas e que estão associadas de forma direta ou indireta à atividade empresarial são dedutíveis.
Realmente, somente há que se falar em renda disponível, isto é, renda líquida, após a dedução de todos os custos e despesas registrados na condução da atividade empresarial. E é nesse contexto que, no plano da legislação ordinária, o art. 47 da Lei n. 4.506/196423 preceitua que são dedutíveis as despesas consideradas normais, usuais e necessárias à
atividade empresarial, o que significa, em outras palavras, que são dedutíveis as despesas incorridas no exercício regular das atividades empresariais, não havendo que se confundir, pois, “necessidade” com “obrigatoriedade” e “usualidade/normalidade” com “recorrência”, sob pena de se ver desvirtuada a própria materialidade desse tributo24.
Tal interpretação decorre também do princípio da liberdade do exercício da atividade econômica, que garante que o contribuinte possa tomar decisões empresariais sem que essas possam ser desconsideradas questionadas ou ter seus efeitos fiscais desconsiderados de forma arbitrária pelo legislador ou pelo Fisco.
Assim, com base nessas considerações, pode-se concluir que, por fundamentos legais e constitucionais, o único critério legítimo para se negar a dedutibilidade de uma despesa no ordenamento jurídico brasileiro é o da ausência de sua relação com a atividade econômica desempenhada pelo contribuinte25.
Por esse motivo não nos parece que seria possível a alteração da legislação brasileira, tal como sugerido pela OCDE, para determinar que uma despesa financeira, atrelada a um instrumento financeiro híbrido, deveria ter a sua dedutibilidade negada, para fins de composição da base de cálculo do IR, na hipótese de o Estado da Residência do beneficiário não prever a tributação do rendimento pelo beneficiário.
Realmente, a não tributação do rendimento pelo beneficiário, em decorrência da legislação a que está sujeito, não é, à luz dos princípios e garantias que norteiam a tributação da renda, um critério legítimo para estabelecer o regime fiscal aplicável às despesas financeiras registradas pelos contribuintes no Brasil, o que foi apontado de forma precisa por Luís Eduardo Schoueri26 ao analisar o tema.
Ainda, como bem apontado pelo professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, a vedação à dedução de determinada despesa financeira com base nesse critério viola também o Princípio da Isonomia, pois confere tratamento tributário distinto a sociedades que possuem uma mesma capacidade contribuinte.
Nesse sentido, cabe esclarecer, com base nas valiosas lições de Humberto Ávila27, que o princípio constitucional da isonomia contém quatro elementos estruturais, a saber: (i) Sujeitos: aqueles que se pretende comparar; (ii) Medida de Comparação: medida
considerada para se diferenciar os contribuintes e que deve manter pertinência com a finalidade buscada pela diferenciação; (iii) Elemento Indicativo de Comparação: elemento que indica a medida de comparação e que deve guardar relação fundada e conjugada com esse; e (iv) Finalidade da Diferenciação: fim a que se destina a comparação entre os sujeitos e que “não pode ser preexcluída pelas regras de tributação, nem incompatível com a finalidade predeterminada pela regra de tributação ou pelo regime jurídico constitucional estabelecido relativamente à obrigação tributária objeto de instituição”.
Em matéria tributária, a finalidade da diferenciação é a busca por uma distribuição justa dos encargos tributários entre os contribuintes, o que se dá por meio da comparação da capacidade contributiva de cada um desses28, que, no caso do IR, é mensurada através do lucro (proxy da capacidade contributiva).
Por esse motivo, o princípio da isonomia exige, como regra geral, que contribuintes que possuem a mesma capacidade contributiva, mensurada, no caso das pessoas jurídicas, através de seu lucro, devem estar sujeitos a um mesmo tratamento tributário no que diz respeito ao IR.
Ocorre que, instituindo-se a regra primária sugerida na Ação 2 do BEPS, esse tratamento isonômico é comprometido, já que contribuintes que apuram o mesmo lucro passariam a receber tratamento tributário em decorrência de critério/medida de comparação – tributação ou não do rendimento pelo beneficiário – que não guarda relação de pertinência com a finalidade de diferenciação aplicável ao IR, qual seja, a justa distribuição dos encargos tributários entre os contribuintes.
Não fosse isso suficiente, cabe destacar, ainda, que a inclusão de uma previsão nesse sentido violaria a garantia constitucional ao livre exercício da atividade econômica, na medida em que representaria uma medida de repressão irrestrita aos instrumentos financeiros híbridos, cuja utilização, como já abordado, não está necessariamente relacionada à erosão de bases tributáveis e transferência artificial de lucros.
Nesse exato sentido, Humberto Ávila29, analisando situação semelhante, em que o legislador pretendeu reprimir, de forma irrestrita, os efeitos fiscais decorrentes de determinadas operações envolvendo partes relacionadas, aponta que medidas dessa natureza violam a garantia constitucional ao livre exercício da atividade econômica (art. 5º, inciso XIII e art. 170, caput, da CF).
Sendo assim, levando-se em consideração as garantias e os princípios que norteiam a tributação da renda no ordenamento jurídico brasileiro, não nos parece que seria possível
negar dedutibilidade de uma despesa financeira incorrida por uma sociedade pelo simples fato de a legislação a que está submetido o beneficiário do rendimento não determinar a sua tributação.
Realmente, nos termos do que foi acima exposto, nos parece que a instituição de uma regra nesse sentido teria como efeito (i) tornar a base de cálculo do IR uma grandeza que não é equivalente à renda líquida obtida pela sociedade, (ii) diferenciar, para fins de tributação, contribuintes com base em critério não indicador da capacidade contributiva, bem como
(iii) inibir a utilização de instrumentos financeiros também em situações legítimas, violando, assim, princípios da universalidade, da renda líquida e da isonomia, bem como contrariando a garantia ao livre exercício da atividade econômica.
Por outro, cabe esclarecer que em relação à adoção da regra secundária, tendo em vista que tanto os dividendos quanto os juros percebidos pela sociedade brasileira em operações cross-border compõem o lucro tributável, não haveria a necessidade de modificar a legislação doméstica para se alinhar às medidas sugeridas pela OCDE na Ação 2 do Plano BEPS30.
Art. 24 da Convenção Modelo OCDE
Outra questão que merece ser analisada diz respeito à compatibilidade entre o art. 24 da Convenção Modelo da OCDE e as medidas sugeridas na Ação 2 do Plano BEPS. É que o aludido artigo da convenção determina que juros, royalties e outros desembolsos pagos por uma empresa de um Estado contratante a um residente de outro Estado contratante devem ser dedutíveis, na apuração do lucro tributável da primeira empresa, nas mesmas condições em que seriam caso tivessem sido pagos a um residente do mesmo Estado.
Assim, como no Brasil, para fins fiscais, privilegia-se a forma jurídica sobre a essência econômica do instrumento financeiro híbrido, ainda que determinado rendimento, pago por uma sociedade a outra sediada no Estado, possua a essência econômica de dividendos (e.g., remuneração atrelada ao lucro a que faz jus o detentor de uma debênture perpétua), esse será considerado como uma “despesa” dedutível para fins de apuração da base de cálculo do IR.
Por esse motivo, caso o pagamento seja realizado a uma sociedade no exterior, a princípio, a dedutibilidade da “despesa” também deveria ser assegurada ao emissor do instrumento financeiro híbrido sob pena de se violar a cláusula de não discriminação contida no art. 24 da Convenção Modelo.
Contudo, é também possível interpretar o art. 24 de modo a compatibilizá-lo com a regra primária prevista na Ação 2, assumindo que o termo “sob as mesmas condições” abarcaria também um exame sobre a sua tributação pelo beneficiário.
Assumindo-se como correta essa interpretação, seria possível sustentar que no exemplo acima mencionado o pagamento realizado à sociedade no Brasil não estaria “sob as mesmas condições” daquele realizado à sociedade sediada no exterior, já que este último, ao contrário do primeiro, não estaria sujeito à tributação pelo seu beneficiário. É o que aponta Diogo Ferraz Lemos Tavares et al31.
De todo modo, embora seja possível defender a compatibilidade entre a regra primária e a cláusula de não discriminação, é também um fator que deve ser considerado em uma eventual implementação das medidas sugeridas pela OCDE.
Desafios operacionais
Por fim, ao se analisar os obstáculos à implementação das medidas sugeridas na Ação 2 do Projeto BEPS, não podem deixar de ser mencionados os desafios operacionais que precisariam ser superados. É que, como visto, a OCDE sugere que um Estado deve determinar a indedutibilidade de determinado rendimento, atrelada a um instrumento financeiro híbrido, quando o mesmo não estiver sujeito à tributação pelo seu beneficiário, localizado em uma outra jurisdição.
Ocorre que, para isso, cada Estado deverá conhecer, em detalhes, os sistemas tributários de outros inúmeros Estados, o que, como aponta Luís Eduardo Schoueri, não parece ser algo factível32. Desse modo, além dos desafios jurídicos, nota-se que também de uma perspectiva operacional, a implementação das medidas sugeridas pela OCDE na Ação 2 do Projeto BEPS pode ser inviável.
Mas será que existe, hoje, uma alternativa viável para se combater a utilização dos instrumentos híbridos, assumindo que seria legítima uma iniciativa nesse sentido? É o que se passa a investigar.
CLASSIFICAÇÃO DOS INSTRUMENTOS HÍBRIDOS SOB A ÓTICA CONTÁBIL – UMA MEDIDA ALTERNATIVA?
Como visto, na esfera tributária, em decorrência da ausência de uma uniformidade, entre os diferentes Estados, na qualificação dos instrumentos financeiros híbridos, têm surgido oportunidades de arbitragem fiscal, que beneficiam, em sua maioria, as grandes
corporações multinacionais, o que tem sido questionado pela OCDE no âmbito do Projeto BEPS.
Por outro lado, na esfera contábil, parece existir um maior alinhamento, entre as diferentes jurisdições, na qualificação desses instrumentos financeiros, dada a existência de padrões internacionais, que, de modo geral, orientam que esses instrumentos sejam contabilizados levando-se em consideração a essência econômica do ativo em detrimento à sua forma jurídica, como faz no Brasil o Pronunciamento Técnico CPC n. 3933.
O fundamento por trás dessa orientação contábil, no sentido de que deve ser considerada a substância econômica do instrumento financeiro em detrimento à forma jurídica, encontra fundamento na própria finalidade da ciência contábil, que, conforme explica Alexsandro Broedel e Roberto Quiroga34, tem evoluído de modo a tornar as informações contábeis ferramentas de mensuração do valor das companhias, através do fornecimento de dados que possam ajudar na previsão dos fluxos de caixa futuros que essas têm a capacidade de gerar, o que é feito por meio de uma aproximação dessas informações com a realidade econômica das empresas.
Nesse sentido, seguindo-se tal orientação, ainda que determinado instrumento financeiro tenha a forma jurídica de um instrumento de capital, por exemplo, uma ação, esse poderá ser classificado total ou parcialmente no passivo, tendo, assim, toda ou parte da sua remuneração contabilizada como despesa financeira, se as suas características (econômicas) forem mais próximas de um instrumento de dívida, como, por exemplo, conferir direitos ao seu detentor a rendimentos com razoável grau de certeza e não subordinados ao risco do negócio35.
A questão que surge, no entanto, é se esse procedimento de qualificação orientado para fins contábeis poderia ser também adotado pelos Estados também para fins fiscais, de modo a reduzir a assimetria que existe, hoje, na qualificação dos instrumentos híbridos na esfera tributária.
Em outras palavras, a dúvida que se coloca é se para fins de qualificação dos instrumentos híbridos poderia se adotar a orientação de que deve haver a prevalência da substância econômica sobre a forma jurídica.
Pois bem. Em relação à aplicação dessa orientação para fins fiscais no Brasil36, há quem defenda que o direito tributário, por ser um direito de sobreposição, deveria sempre se pautar na forma jurídica e não na substância econômica do fato.
Nesse sentido, com base nessa premissa, defendem que em relação aos instrumentos financeiros híbridos, a sua contabilização não deveria servir de parâmetro para definição do tratamento tributário aplicável, já que a renda ou acréscimo patrimonial deveria ser apurada, para fins fiscais, levando-se em consideração o conjunto de direitos e obrigações de uma determinada pessoa jurídica, tal como definido no direito privado37.
Seguindo tal linha de raciocínio, ainda que um instrumento financeiro fosse registrado, para fins contábeis, como um passivo, esse não poderia, para fins fiscais, reduzir o patrimônio da sociedade, porquanto não representaria uma obrigação do ponto de vista do direito privado. Assim, eventual despesa financeira atrelada a esse passivo, não poderia, seguindo essa orientação, ser considerada na apuração da base de cálculo do IR.
Contudo, existe na doutrina também quem defenda que embora o legislador possa se valer de conceitos jurídicos para identificar os signos de capacidade contributiva, esse não é obrigado a se valer de figuras jurídicas preexistentes, motivo pelo qual a noção de patrimônio, para fins fiscais, não deveria, necessariamente, guardar correspondência com o conceito extraído do direito privado.
Nesse sentido, ao analisar os contornos da tributação da renda no ordenamento jurídico brasileiro, Luís Eduardo Schoueri38 aponta que “o fato de a lei tributária fazer referência a ‘acréscimo patrimonial’ não significa que se deva necessariamente ir à lei civil para buscar tal conceito”. Ainda, prosseguindo na análise do tema, conclui que o art. 43 do CTN, ao utilizar o termo “disponibilidade econômica” pode ter buscado fazer referência a um sentido econômico de patrimônio, que poderia ser acrescido ou reduzido sem que houvesse a alteração de direitos e obrigações, tal como reconhecidos do ponto de vista do direito privado39.
Desse modo, assumindo-se como correto este segundo posicionamento, haveria que se concluir que o legislador tributário poderia optar pela adoção dos critérios contábeis como forma de identificar o tratamento tributário a ser dispensado aos instrumentos financeiros
híbridos, seguindo, assim, a lógica de que deve prevalecer a essência econômica do ativo sobre a sua forma jurídica.
Realmente, se assumirmos que o termo “acréscimo patrimonial” não deve necessariamente guardar correspondência com o aumento de direitos e/ou redução de obrigações da pessoa jurídica sob a perspectiva de direito privado, haveríamos que concluir que é possível que haja, por exemplo, uma redução do lucro tributável em decorrência da remuneração de um instrumento financeiro híbrido que, apesar de ter a forma jurídica de um instrumento de capital, é, em sua essência econômica, um instrumento de dívida40.
Além disso, é interessante notar que tal procedimento poderia, inclusive, levar a base de cálculo do IR a se aproximar ainda mais da renda disponível, signo de riqueza que se pretende atingir com esse tributo. É só imaginar, por exemplo, uma remuneração que, apesar de fixa e certa, esteja atrelada a um instrumento que possui, da perspectiva do direito privado, a forma jurídica de um instrumento de capital41. Nesse caso, apesar de essa remuneração ter a forma jurídica de dividendo, ela reduzirá a renda disponível. Por outro lado, a remuneração de um instrumento que possui a forma jurídica de um instrumento de capital pode não representar uma redução da renda disponível caso o seu pagamento esteja subordinado à existência de lucro líquido, situação em que se estaria frente a uma distribuição da renda disponível.
Vale destacar que essa matéria foi analisada pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF”) no Acórdão n. 1301-003.295 (sessão de 15 de agosto de 2018), embora sob a égide da legislação anterior ao advento da Lei n. 12.973/2014, que introduziu disposições com vistas a determinar a prevalência da forma jurídica sobre a essência econômica dos instrumentos financeiros. Na ocasião, a turma julgadora, seguindo o voto proferido pelo Conselheiro Carlos Augusto Daniel, entendeu que determinadas debêntures perpétuas emitidas pelo contribuinte seriam, em sua essência econômica, instrumentos de capital e não de dívida, de modo que a remuneração a esses atrelada não teria como reduzir a renda disponível, na medida em que seria, em realidade, uma distribuição da própria renda já disponível.
Todavia, não se pode deixar de reconhecer que a regulamentação contábil, apesar de se pautar em uma orientação fixa, pode levar, quando de sua aplicação no caso concreto, a diferentes qualificações por diferentes agentes econômicos, o que poderia representar um obstáculo à utilização da classificação contábil para fins fiscais42.
Também não se pode desconsiderar que a classificação contábil, por envolver a segregação dos componentes de renda fixa e renda variável43, é tarefa bastante complexa, o que é apontado na doutrina como um desafio na sua utilização no campo fiscal, especificamente no âmbito dos Acordos de Bitributação44, já que nessas situações seria necessário alcançar uma convergência entre os Estados da Fonte e da Residência na segregação do instrumento financeiro.
Todavia, um ponto que merece atenção diz respeito ao fato de que a adoção dos critérios contábeis pelas legislações domésticas não faz com que a classificação dos rendimentos tenha que ser adotada também no âmbito dos aludidos acordos, uma vez que o acordo de bitributação não está vinculado à qualificação atribuída ao rendimento pelas legislação domésticas dos Estados45.
Além disso, tratando-se de alteração na regra de qualificação desses instrumentos para fins de aplicação da legislação doméstica, não haveria a necessidade de se chegar a uma alocação idêntica dos componentes de capital e dívida entre os Estados de Fonte e de Residência.
É evidente que eventual discrepância na alocação dos diferentes componentes de capital e dívida pelos Estados poderia gerar oportunidades de arbitragem fiscal, mas essas, por óbvio, seriam muito menos atrativas, já que eventuais diferenças de qualificação recaíram apenas sobre um parcela do instrumento, ao contrário do que ocorre hoje, em que, para determinados casos, um instrumento financeiro híbrido é integralmente reconhecido como instrumento de capital por um Estado e um instrumento de dívida por outro.
Desse modo, à luz do que foi até aqui exposto, nos parece que, embora existam desafios, seria possível, da perspectiva do Brasil, a adoção, pelo legislador, da classificação contábil para fins de fixação do seu tratamento fiscal dispensado pelos Estados aos instrumentos financeiros híbridos, de modo a reduzir, mas não necessariamente eliminar, os cenários de assimetria.
Não obstante, como já mencionado, há no ordenamento jurídico brasileiro uma opção expressa do legislador de privilegiar a forma jurídica em detrimento à substância econômica, pelo menos em relação a determinadas situações46. Nesse sentido, a legislação
tributária prevê que: (i) são isentos, mas não dedutíveis, os dividendos de ação classificada no passivo e cuja remuneração seja classificada como despesa financeira na escrituração comercial (art. 10, §§ 2º e 3º, da Lei n. 9.249/199547); (ii) são dedutíveis e devem ser tributadas pelo beneficiário as remunerações e encargos relativos a instrumentos financeiros emitidos pela pessoa jurídica, com exceção de ações (art. 38-B do Decreto-lei n. 1.598/197748); e (iii) os juros sobre capital próprio (JCP), devem ser apurados levando-se em consideração todas as ações, inclusive aquelas registradas como passivo na escrituração comercial da pessoa jurídica (art. 9º, § 12, da Lei n. 9.249/199549).
Assim, apesar de as normas contábeis brasileiras, alinhadas aos padrões internacionais, determinarem que o registro contábil de um instrumento financeiro deve ser feito levando- se em consideração a sua substância econômica e não a sua forma jurídica, o legislador determinou que, para fins fiscais, deveria ser feito exatamente o contrário, isto é, a forma jurídica deveria se sobrepor à essência econômica. Por esse motivo, pode-se afirmar que, em relação aos instrumentos financeiros híbridos, o Brasil segue dois modelos distintos, que convivem entre si: (i) para fins contábeis, prestigia-se a essência econômica sobre a forma jurídica; por outro lado, (ii) para fins fiscais, por uma escolha do legislador, prestigia- se a forma jurídica sobre a essência econômica.
De toda forma, como buscamos demonstrar, não é de se descartar a possibilidade de, no futuro, serem utilizados os critérios contábeis para fins de fixação do tratamento fiscal dispensado aos rendimentos decorrentes de instrumentos financeiros híbridos.
CONCLUSÃO
A história do sistema capitalista é marcada pelo desenvolvimento de figuras jurídicas voltadas à codificação do capital, isto é, ao estabelecimento de regras que prevejam, de forma clara, os riscos e retornos associados às diferentes formas de investimento. Nesse
contexto, as figuras dos instrumentos de capital (equity) e dos instrumentos de dívida (debt), cujos contornos foram traçados há tempos nesse processo de codificação do capital, são amplamente conhecidas pelos agentes econômicos.
Todavia, com o desenvolvimento do sistema capitalista, novos instrumentos financeiros têm surgido, colocando em xeque essa clássica distinção, o que, para fins fiscais, tem sido relevante em decorrência das oportunidades de arbitragem fiscal que surgem das diferentes qualificações atribuídas pelos Estados aos rendimentos associados a esses instrumentos financeiros híbridos.
O tema ganhou tamanha relevância que foi objeto de ação específica no Projeto BEPS, Ação 2 (Neutralising the Effects of Hybrid Mismatch Arrangements), por meio da qual a OCDE sugeriu aos Estados que adotassem determinadas medidas com vistas a neutralizar os efeitos fiscais decorrentes de divergências na qualificação, por dois ou mais Estados, de operações envolvendo entidades ou instrumentos financeiros híbridos.
Todavia, como visto, as justificativas apresentadas pela OCDE para defender a necessidade de os Estados promoverem um combate irrestrito à utilização de instrumentos financeiros híbridos são questionáveis, o que tem sido apontado de forma consistente pela doutrina.
No entanto, outra questão também bastante relevante e que parece ainda não ter sido explorada de forma tão ampla pela doutrina se refere à análise da compatibilidade das medidas sugeridas pela OCDE com os princípios e garantias que norteiam a tributação da renda nos diferentes Estados.
Nesse sentido, após analisarmos os princípios e garantias que norteiam a tributação da renda no Brasil, foi possível concluir que as medidas sugeridas pela OCDE na Ação 2, em especial a regra primária, são incompatíveis com o ordenamento jurídico brasileiro, já que a sua adoção teria como efeito (i) tornar a base de cálculo do IR uma grandeza que não é equivalente à renda líquida obtida pela sociedade, (ii) diferenciar, para fins de tributação, contribuintes com base em critério não indicador da capacidade contributiva, bem como
(iii) inibir a utilização de instrumentos financeiros também em situações legítimas, violando, assim, princípios da universalidade, da renda líquida e da isonomia, bem como contrariando a garantia ao livre exercício da atividade econômica.
Por essas razões, mesmo assumindo-se que seria legítimo um combate aos instrumentos financeiros híbridos, o que, como visto, já é questionável, não nos parece que as medidas sugeridas pela OCDE representariam o melhor caminho a ser seguido, pelo menos sob a ótica do ordenamento jurídico brasileiro.
E é exatamente nesse contexto que ganha relevância a abordagem que a ciência contábil tem adotado para lidar com os instrumentos financeiros híbridos, que, por seguir uma orientação em âmbito internacional, tem o potencial de reduzir (não necessariamente
eliminar) as assimetrias na qualificação desses instrumentos e dos seus respectivos rendimentos pelos diferentes Estados.
A questão que surge, no entanto, é se a orientação contábil de que os instrumentos financeiros híbridos devem ser registrados levando-se em consideração a sua substância econômica, em detrimento à sua forma jurídica, poderia ser também adotada pelo direito tributário.
Examinando a questão, nos parece que a respostaria seria afirmativa, na medida em que, não sendo o direito tributário um direito de sobreposição, o termo “acréscimo patrimonial”, empregado pelo legislador, não deve necessariamente guardar correspondência com o aumento de direitos e/ou redução de obrigações da pessoa jurídica sob a perspectiva de direito privado.
Por esse é motivo, é possível que um rendimento atrelado a um instrumento financeiro que, apesar de constituído sob a forma jurídica de instrumento de capital, possui a essência econômica de instrumento de dívida, reduza a renda disponível, ainda que esse evento, da perspectiva do direito privado, não represente uma diminuição do patrimônio.
Por esse motivo, apesar de essa não ter sido orientação adotada pelo legislador brasileiro, não é de se descartar que, no futuro, possam ser adotados os critérios contábeis em um eventual combate – caso se entenda ser legítimo – às oportunidades de arbitragem fiscal nas operações envolvendo a utilização de instrumentos financeiros híbridos.
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