A Escolha dos Métodos de Cálculo dos Preços de Transferência: Best Method Rule à Brasileira?

The Choice of Transfer Pricing Methods: “Brazilian” Best Method Rule?

Caio Schunck

Especialista em Direito Civil pela FMU-SP. Especialista em Direito Tributário pela USP. Mestrando em Direito Tributário pela PUC/SP. Professor assistente na especialização em Direito Tributário do IBDT. Advogado em São Paulo. E-mail: caio.schunck@zrdf.adv.br.

Resumo

O presente trabalho trata da questão referente à escolha dos métodos de cálculo de preços de transferência no Brasil, de forma a saber se ao contribuinte é efetivamente conferida uma opção, bem como a extensão e os limites desta escolha, especialmente no que se refere à aplicação do método mais benéfico.

Palavras-chave: Imposto de renda das pessoas jurídicas, preços de transferência, best method rule, princípio da capacidade contributiva.

Abstract

This article aims to discuss the choice of different transfer pricing methods in the Brazilian legislation, in order to assess whether the tax payer effectively has the option to choose any method and the extension and limits of this choice, mainly with regard to the application of the most beneficial method.

Keywords: corporate income tax, transfer pricing, best method rule, ability to pay principle.

Introdução

O objetivo do presente trabalho é investigar, com base na legislação, na doutrina e na jurisprudência brasileiras, qual é a extensão da norma contida no § 4º do art. 18 e no § 5º do art. 19 da Lei n. 9.430/1996, isto é, qual a extensão e as limitações da regra segundo a qual deve-se aplicar o método de preços de transferência menos oneroso ao contribuinte.

De maneira mais específica, pretende-se analisar se a aplicação da regra do método menos oneroso ao contribuinte caracteriza-se ou não como um dever jurídico atribuído pela lei ao Fisco, ou, ao contrário, se a este seria conferida a discricionariedade para o cumprimento desta regra.

Também objetiva-se verificar se a regra da menor onerosidade encontra fundamento e está de acordo com os princípios da igualdade e da capacidade contributiva.

1. A escolha dos métodos e a aplicação da regra best method

A escolha do método sempre foi uma questão levantada pelos estudiosos dos preços de transferência1, haja vista as legislações normalmente colocarem à disposição do contribuinte mais de um método de cálculo.

Antes de ingressar na análise da situação brasileira, cabe mencionar, como o fez Schoueri, que “a existência de mais de um método para a apuração do preço parâmetro arm’s length provoca a indagação sobre a existência de uma ordem de prioridade entre eles, em que se encontram duas posições” (SCHOUERI, 2013, p. 103).

De acordo com o mencionado autor, a primeira posição é a da legislação norte-americana, a qual determina a aplicação de apenas um dos métodos existentes, mas sem uma ordem de prioridade rígida, vigorando, desta forma, a best method rule, isto é, no caso concreto faz-se necessário determinar a espécie de operação analisada, devendo-se, a partir desta constatação, utilizar-se o método que mensura mais adequadamente tal operação2.

De outro lado tem-se a posição da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE, segundo a qual nem o contribuinte nem o Fisco são obrigados a examinar mais de um método, ou seja, afastou-se a ideia contida na legislação norte-americana de obrigar o contribuinte a comprovar que escolheu o melhor método (o que tornava necessário demonstrar não apenas que o método escolhido era o melhor, mas também provar que os demais seriam “piores”)3.

Em que pese a OCDE não obrigar o contribuinte a avaliar a aplicabilidade de mais de um método (identificação do best method), importa destacar as impressões de Godé e Héliée (2017, p. 1) no sentido de que as Guidelines da OCDE estabelecem uma hierarquia entre os métodos a serem aplicados.

Diante disso, considerando a existência, também no Brasil, de mais de um método de cálculo e todos eles servindo, em tese, para apurar um preço parâmetro fiscalmente “legítimo”4, surge a dúvida: poderia o contribuinte aplicar qualquer deles de acordo com a sua conveniência ou estaria obrigatoriamente vinculado a um deles ou a uma ordem de prioridade preestabelecida?

Sob a ótica das importações, a questão que se coloca vem disposta, primeiramente, no § 4º do art. 18 da Lei n. 9.430/19965. Já para as exportações, a regulação da matéria consta do § 5º do art. 19 da Lei n. 9.430/19966.

Especificamente quanto à “opção” do contribuinte, temos o art. 20-A da Lei n. 9.430/1996, que dispõe o quanto segue:

Art. 20-A. A partir do ano-calendário de 2012, a opção por um dos métodos previstos nos arts. 18 e 19 será efetuada para o ano-calendário e não poderá ser alterada pelo contribuinte uma vez iniciado o procedimento fiscal, salvo quando, em seu curso, o método ou algum de seus critérios de cálculo venha a ser desqualificado pela fiscalização, situação esta em que deverá ser intimado o sujeito passivo para, no prazo de 30 (trinta) dias, apresentar novo cálculo de acordo com qualquer outro método previsto na legislação.

§ 1º A fiscalização deverá motivar o ato caso desqualifique o método eleito pela pessoa jurídica.

§ 2º A autoridade fiscal responsável pela verificação poderá determinar o preço parâmetro, com base nos documentos de que dispuser, e aplicar um dos métodos previstos nos arts. 18 e 19, quando o sujeito passivo, após decorrido o prazo de que trata o caput:

I não apresentar os documentos que deem suporte à determinação do preço praticado nem às respectivas memórias de cálculo para apuração do preço parâmetro, segundo o método escolhido;

II apresentar documentos imprestáveis ou insuficientes para demonstrar a correção do cálculo do preço parâmetro pelo método escolhido; ou

III deixar de oferecer quaisquer elementos úteis à verificação dos cálculos para apuração do preço parâmetro, pelo método escolhido, quando solicitados pela autoridade fiscal.

§ 3º A Secretaria da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda definirá o prazo e a forma de opção de que trata o caput.”

Em primeiro lugar, ao se avaliar os arts. 18 e 19 supra, constata-se que ambos regulam a situação em que, no caso concreto, o contribuinte se vê obrigado a adicionar nas bases de cálculo do IRPJ7 e da CSLL8 o ajuste decorrente da aplicação das regras de preços de transferência – no art. 18 a adição de custos/despesas e no art. 19 a adição de receitas que superaram os limites legais9.

Passo seguinte, a legislação expressamente confere ao contribuinte o direito de utilizar mais de um método de cálculo para alcançar o preço arm’s length10, determinando que: (i) nas importações, será considerado dedutível o maior valor de custos/despesas apurado; enquanto que (ii) nas exportações, será considerado tributável o menor dos valores de receita.

Ou seja, resta claro que as regras de preços de transferência brasileiras não estabelecem qualquer ordem de utilização dos métodos legalmente previstos11, não havendo no Brasil, portanto, qualquer espécie de best method rule. Este também é o entendimento de Schoueri (2013, p. 109-110) a respeito do assunto:

“[...]. Se a ausência de previsão de ordem de prioridade, conforme sustenta Cauwenbergh, indica a presença de alguma forma de best method rule, poder-se-ia concluir que este seria o caso brasileiro. Todavia, a análise mais cuidadosa da legislação leva à conclusão oposta. Com efeito, o legislador brasileiro afasta do temário nacional qualquer questionamento acerca do melhor método, ou do mais apropriado.

[...]

5.3.1. Como se pode notar, excetuados os casos de commodities sujeitas a cotação em bolsas de mercadorias e de futuros, a legislação brasileira de preços de transferência não exige que se aplique o método que melhor reflita determinada operação, mas, determina que se deve considerar o método que implicar menor ajuste. Em outras palavras, não há que se falar em best method, mas sim em aplicação do método mais favorável ao contribuinte. A opção do legislador brasileiro, diferentemente do norte-americano, foi pela liberdade na escolha do método pelo contribuinte”.

Na verdade, até seria possível sustentar a ideia da existência de uma best method rule na legislação brasileira, mas não no sentido comumente adotado pelo direito estrangeiro de “ordem de prioridade entre os métodos” ou de “método que melhor reflita determinada operação”, mas sim no sentido de que ao contribuinte é conferido o direito de optar pelo melhor método para si, isto é, aquele lhe for mais conveniente dentre os existentes.

Aqui vem a pergunta: a escolha do método de preços de transferência trata-se de uma “opção” conferida ao contribuinte, no sentido de ele ter que obrigatoriamente escolher um método, não havendo como alterar tal opção uma vez feita a escolha (ainda que não seja o mais favorável), ou um dever imposto ao Fisco de sempre analisar no caso concreto o método mais favorável ao contribuinte?

Analisando o § 4º do art. 18 e o § 5º do art. 19 da Lei n. 9.430/1996, constata-se que o legislador claramente permite que o contribuinte utilize mais de um método de cálculo de preços de transferência, já que usa a expressão “Na hipótese de utilização de mais de um método [...]”.

Todavia, nos termos do art. 20-A da mesma lei, tal “utilização” está condicionada aos seguintes limites/regras:

– A opção será efetuada para o ano-calendário e não poderá ser alterada pelo contribuinte uma vez iniciado o procedimento fiscal, exceto quando, durante este procedimento, o método ou algum de seus critérios de cálculo venha a ser desqualificado pela fiscalização;

– Caso haja desqualificação do método escolhido, tal decisão deve ser motivada, sendo que o contribuinte deverá ser intimado para, no prazo de 30 dias, apresentar novo cálculo de acordo com qualquer outro método previsto na legislação.

– Nas hipóteses de o contribuinte não apresentar novo cálculo ou: (i) não apresentar os documentos que deem suporte à determinação do preço praticado nem às respectivas memórias de cálculo para apuração do preço parâmetro, segundo o método escolhido; (ii) apresentar documentos imprestáveis ou insuficientes para demonstrar a correção do cálculo do preço parâmetro pelo método escolhido; ou (iii) deixar de oferecer quaisquer elementos úteis à verificação dos cálculos para apuração do preço parâmetro, pelo método escolhido, quando solicitados pela autoridade fiscal, a autoridade fiscal responsável pela verificação poderá determinar o preço parâmetro, com base nos documentos de que dispuser, e aplicar um dos métodos previstos na legislação.

Neste sentido, o contribuinte tem até o início do procedimento fiscal para “escolher” ou “utilizar” mais de um método, já que, uma vez iniciado tal procedimento, extinto estará seu “direito de escolha”.

Entretanto, ao mesmo tempo em que o art. 20-A da Lei n. 9.430/1996 estabelece que o início do procedimento fiscal extingue o direito de escolha do contribuinte, no § 4º do art. 18 e no § 5º do art. 19, essa mesma lei impõe explicitamente a obrigação de sempre buscar-se o método mais favorável ao contribuinte. A partir destas ideias e da análise sistemática destes dispositivos, questiona-se: quem seria o destinatário de tal comando legal, o contribuinte, o Fisco ou ambos?

Entendemos que a resposta à esta pergunta variará conforme o procedimento fiscal tenha sido ou não iniciado.

Como antes do início do procedimento fiscal o contribuinte pode escolher o método que lhe for mais favorável, num primeiro momento, constata-se que a norma é direcionada a este, cabendo-lhe buscar a aplicação do método que lhe for mais favorável, haja vista o direito de escolha que lhe é legalmente garantido.

Contudo, como o início do procedimento fiscal extingue o direito de escolha do contribuinte, a este não sendo mais possível agir, conclui-se que após este marco temporal, o destinatário da regra que obriga a aplicação do método mais favorável ao contribuinte no caso concreto passa a ser o Fisco, pois somente este é o titular da possibilidade de alterar o método escolhido (por meio do procedimento de desqualificação). Desta forma, após o início do procedimento fiscal cabe ao Fisco aplicar o método de cálculo que resulte no menor ajuste para o contribuinte, porquanto só ele está legalmente autorizado a alterar ou não o método originalmente escolhido.

Ou seja, em decorrência do disposto no § 4º do art. 18 e no § 5º do art. 19 da Lei n. 9.430/1996, ao analisar o caso concreto, o Fisco está obrigado a verificar se o método escolhido pelo contribuinte é aquele que resulta no menor ajuste; caso não seja, deve o Fisco desqualificar o método escolhido pelo contribuinte e aplicar outro que resulte no menor ajuste12.

Tal conclusão decorre do disposto no § 4º do art. 18 e no § 5º do art. 19 da Lei n. 9.430/1996, nos quais o legislador se utiliza da dicção “será considerado” com o claro intuito de conferir o sentido de “obrigatoriedade” à ideia de se aplicar o método que gere o menor ajuste nas bases de cálculo do IRPJ e da CSLL (“será considerado dedutível o maior valor apurado” e será considerado o menor dos valores apurados”, respectivamente)13.

Dessa forma, sempre deverá ser aplicado o método que resulte no menor ajuste fiscal, cabendo: (i) ao contribuinte buscar este resultado se ainda não iniciado o procedimento fiscal; e (ii) ao Fisco, após iniciado este procedimento.

Entendendo no mesmo sentido da obrigatoriedade imposta ao Fisco, Mariz de Oliveira (2009, p. 155 e ss.) destaca que “Com os métodos previstos nos arts. 18 e 19 da Lei nº 9.430 dá-se regramento diferente, uma vez que a lei não os coloca à disposição do fisco, para efetuar o lançamento sob qualquer um deles, à sua livre eleição, pois, como visto, faz parte da norma o emprego do melhor método para o contribuinte. Sendo assim, o lançamento não pode ser concluído enquanto não se aprofundar a investigação da situação sobre todos os métodos aplicáveis, e a constatação daquele que for o mais favorável”.

Todavia, a doutrina não é unânime a respeito do assunto, haja vista o entendimento de Xavier (2015, p. 363) no sentido de que o Fisco não estaria obrigado a aplicar a regra do método menos oneroso quando a escolha do método fosse uma incumbência sua14:

“No entanto, a Lei nº 12.715/2012, atendendo a antigo anseio do Fisco, introduziu o art. 20-A, segundo o qual, a partir do ano-calendário de 2012, passava a ser obrigatória a opção por um dos métodos previstos nos arts. 18 e 19 para o ano-calendário, não podendo ser alterada pelo contribuinte uma vez iniciado o procedimento fiscal, salvo quando, em seu curso, o método ou algum de seus critérios de cálculo vier a ser desqualificado, motivadamente, pela fiscalização, quando então se oportunizará ao sujeito passivo apresentar novo cálculo de acordo com qualquer outro método previsto na legislação.

[...]

Ou seja, a Lei nº 12.715/2012 alterou a lógica da legislação anterior, atribuindo à autoridade fiscal a liberdade para, em certas condições, escolher a aplicação do método de preços de transferência, sem que para tanto tenha fixado qualquer limite, como a escolha do método menos oneroso ou do método mais compatível com a atividade do contribuinte etc.”

No mesmo sentido tem sido o entendimento majoritário adotado pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) em recentes julgamentos sobre o tema:

1. “[...]. Preço de transferência. Da compatibilidade entre a Lei nº 9.430/96 e os princípios da Convenção Modelo da OCDE. Não há contradição entre as disposições da Lei nº 9.430/96 e o art. 9º da Convenção Modelo da OCDE. O art. 9º da Convenção Modelo da OCDE incorporou o princípio do arm’s length price sem impor obstáculos à aplicação da legislação de preços de transferência dos países contratantes. As operações realizadas entre empresas brasileiras e pessoas jurídicas domiciliadas em paraísos fiscais sujeitam-se aos ajustes dos preços de transferência, nos termos do art. 24 da Lei nº 9.430/96. Preço de transferência. Métodos. Possibilidade de escolha pelo contribuinte. A possibilidade de escolha do método é garantida aos contribuintes, nos termos do § 4º, do art. 18 da Lei nº 9.430/96, todavia, inexiste previsão legal obrigando a fiscalização a apurar os preços de transferência por todos os métodos previstos na legislação para só então efetuar os ajustes pelo método menos oneroso ao contribuinte. [...]” (CARF, 1ª Seção de Julgamento, Proc. n. 16561.720157/201362, Acórdão n. 1301-002.235 – 3ª Câmara/1ª Turma Ordinária, sessão de 22.03.2017, Rel. Milene de Araújo Macedo)

2. “[...]. Preços de transferência. Desconsideração. Método PIC. Verificados equívocos na apuração do preço de transferência por parte do contribuinte, a autoridade fiscal deve refazer o procedimento mediante um dos métodos determinados na legislação. Preços de transferência. Ajustes produto a produto. Os ajustes de preços de transferência devem ser apurados para cada produto. Eventual ajuste a maior de um determinado produto não pode ser utilizado para compensar ajustes a menor relativos a outros produtos. Preço parâmetro. Exclusão do valor correspondente a fretes, seguros e imposto de importação. Improcedência. Em decorrência de disposição legal e da necessidade de se comparar grandezas semelhantes, na apuração do preço parâmetro devem ser incluídos os valores correspondentes a frete e seguro cujo ônus tenha sido do importador. Método mais favorável. Pedido de diligência. A escolha do método mais favorável ao contribuinte é uma prerrogativa do contribuinte, mas não uma imposição à fiscalização (nem aos órgãos julgadores). [...]” (CARF, 1ª Seção de Julgamento, Proc. n. 16561.720059/201244, Acórdão n. 1301-002.012 – 3ª Câmara/1ª Turma Ordinária, sessão de 04.05.2016, Rel. Paulo Jakson da Silva Lucas)

Entretanto, não se pode olvidar que o antigo Conselho de Contribuintes, atual CARF, já se pronunciou favoravelmente à tese de que a aplicação do método menos oneroso é um vetor a ser obrigatoriamente observado tanto pelo contribuinte como pelo Fisco15.

Referido entendimento jurisprudencial baseia-se no fato de que seria ilógico e contraditório que a lei conferisse ao contribuinte a possibilidade de escolha do método que lhe fosse menos oneroso e, no caso em que essa opção não fosse feita, não obrigasse o Fisco a aplicar o método mais benéfico ao contribuinte. A liberdade de escolha prevista na lei não significa ausência de limites ou outorga de poderes discricionários ao Fisco. Tendo em vista o caráter de ato administrativo vinculado do lançamento (art. 142 do CTN), este entendimento aponta que aquilo que para o contribuinte é opção, para o Fisco é obrigação, sendo que tal obrigação de dedutibilidade do maior valor apurado impõe ao Fisco não só a utilização, mas também a comprovação, de que o método utilizado foi o menos oneroso, sob pena de violação ao § 4º do art. 18 e do § 5º do art. 19 da Lei n. 9.430/1996.

Apesar de não ser nosso objetivo aprofundar a questão, não podemos deixar de mencionar que o entendimento compartilhado por Xavier e pelo CARF, no sentido da liberdade total atribuída ao Fisco na escolha do método de cálculo (i.e., sem qualquer obrigatoriedade de adotar o método menos oneroso ao contribuinte), conflita diretamente com os princípios16 da igualdade tributária17 e da capacidade contributiva18-19, haja vista caber ao Fisco aplicar a legislação ao caso concreto de forma equânime para, por consequência, alcançar a correta capacidade contributiva a ser tributada.

Especificamente quanto à capacidade contributiva, entendemos que o legislador, ao prever expressamente no § 4º do art. 18 e no § 5º do art. 19 a ideia de “menor onerosidade”, acaba por definir os contornos da capacidade contributiva que considera “correta” no caso e que deseja alcançar com a tributação: a capacidade contributiva captada por meio do método de cálculo menos oneroso ao contribuinte.

Tal conclusão decorre da necessidade de uma interpretação sistemática das regras de preços de transferência instituídas pela Lei n. 9.430/1996, especialmente da análise conjunta do art. 20-A com o § 4º do art. 18 e o § 5º do art. 19, já que tais dispositivos, quando interpretados sistematicamente, deixam claro que a menor onerosidade do método de cálculo deverá sempre ser tomada como parâmetro no momento da aplicação das regras de preços de transferência, inclusive no que se refere à escolha do método.

Assim, quando se trata da aplicação das regras de preços de transferência, viola a capacidade contributiva qualquer tentativa do Fisco no sentido de adicionar às bases de cálculo do IRPJ e da CSLL um ajuste que extrapole o valor apurado com base no método menos oneroso ao contribuinte.

Esta ideia coaduna-se com a noção de Kirchhof (2016, p. 27) a respeito do princípio da capacidade contributiva, segundo o qual “[...] a carga tributária individual deve ser dimensionada em conformidade com a capacidade de cada indivíduo de prover prestações tributárias de acordo com as suas condições econômicas. Essa ideia de divisão da carga tributária deve reger a legislação, definir a interpretação das leis, limitar a possibilidade de o indivíduo alterar as consequências tributárias de suas condutas, e fazer o direito tributário compreensível, previsível e ensinável”.

Desta forma, o Fisco deve analisar a aplicabilidade de todos os métodos de cálculo no caso concreto antes de optar por um ou outro. Ou seja, deve testar todas as possibilidades, porquanto, o legislador foi claro no sentido de que a capacidade contributiva captada pelo método menos oneroso já seria o suficiente para fins tributários, o que implica concluir que a adoção do método mais oneroso pelo Fisco resultaria no oferecimento de valor superior à capacidade contributiva eleita pelo legislador como objeto de tributação, caracterizando-se verdadeira penalização do contribuinte pela via da tributação do patrimônio e não da renda.

Mas não é só. A interpretação que confere ao Fisco a discricionariedade absoluta para escolher o método de cálculo que lhe aprouver, seja ele o mais ou o menos oneroso ao contribuinte, acaba por violar também a igualdade. Antes de avançar no tema, faz-se necessário esclarecer as premissas nas quais nos baseamos para chegar a tal conclusão.

Inicialmente, estamos partindo das lições de Bandeira de Mello (1998, p. 21-22), para quem a identificação do respeito ou desrespeito à igualdade depende da análise de três fatores: (i) do elemento utilizado como fator de discrímen; (ii) da correlação lógica abstrata existente entre o fator qualificado como critério de discrímen e a diferenciação de regime jurídico levada a efeito; e (iii) da conformidade desta correlação lógica abstrata com os valores prestigiados no sistema constitucional.

Analisando os três fatores citados, verifica-se que o fator de discrímen adotado pelo § 4º do art. 18, e pelo § 5º do art. 19, ambos da Lei n. 9.430/1996, é o fato de ser possível aplicar ao caso concreto mais de um método de cálculo de preços de transferência.

No que se refere ao segundo fator, constata-se que, na parte final dos dispositivos legais referidos, o legislador foi claro ao indicar que o regime jurídico diferenciado a ser aplicado consistiria na adoção do método de cálculo menos oneroso ao contribuinte.

Nesse sentido, avaliando se há correlação lógica entre “a possibilidade de aplicação de mais de um método de cálculo” e “a adoção do método menos oneroso ao contribuinte”, conclui-se que tal correlação lógica existe de per si e é pertinente, já que é plausível entender que a adoção do método menos oneroso somente pode acontecer quando for possível a aplicação de mais de um método de cálculo no caso concreto. Do ponto de vista lógico, poder-se-ia firmar a seguinte “regra”: se for possível a aplicação de mais de um método no caso concreto, então deverá ser aplicado o menos oneroso ao contribuinte.

Por fim, ao examinar o terceiro fator, verifica-se que também há compatibilidade entre a correlação lógica abstrata e os valores constitucionalmente prestigiados, especialmente o da tributação conforme a capacidade contributiva20.

Ou seja, pode-se concluir que a ideia de adoção do método menos oneroso, se no caso concreto for aplicável mais de um método, está de acordo com o princípio da capacidade contributiva, no sentido de que a capacidade contributiva tributável “eleita” no § 4º do art. 18, e no § 5º do art. 19 da Lei n. 9.430/1996, será aquela expressa mediante a utilização do método de cálculo de preços de transferência mais benéfico ao contribuinte.

Os argumentos apresentados até aqui já seriam suficientes para demonstrar que a interpretação que confere ao Fisco a possibilidade de adoção do método de cálculo mais oneroso para o contribuinte viola a igualdade.

Mas ainda é possível esmiuçar este raciocínio um pouco mais.

O respeito ou desrespeito à igualdade depende da análise de três fatores, dentre eles, o critério de discrímen escolhido pelo legislador.

Como visto, a partir do disposto no § 4º do art. 18, e no § 5º do art. 19 da Lei n. 9.430/1996, constata-se que o correto fator de discrímen passível de eleição pelo legislador no caso concreto é a possibilidade de se aplicar mais de um método de cálculo de preços de transferência.

Todavia, ao defender que o Fisco não estaria obrigado a aplicar a regra do método menos oneroso quando a escolha do método fosse uma incumbência sua, a doutrina e a jurisprudência do CARF acabaram por eleger um critério de discrímen diverso do acima indicado, qual seja, a data do início do procedimento de fiscalização.

Isso porque, simplesmente argumentam que até o início do procedimento de fiscalização o contribuinte é livre para escolher o método que desejar, inclusive o menos oneroso, enquanto que, ultrapassado este marco temporal sem a escolha do contribuinte e a escolha passando a ser incumbência do Fisco, seria este livre para aplicar o método que melhor lhe aprouvesse, inclusive o mais oneroso.

Supostamente com base no art. 20-A da Lei n. 9.430/1996, esta parcela da doutrina e da jurisprudência do CARF acabam indiretamente alegando que com o simples início da fiscalização, com a transferência do poder de escolha do método para o Fisco, não mais haveria a obrigação deste de apurar e adotar o método menos oneroso.

Ou seja, de acordo com este racional, a aplicação de regimes jurídicos distintos (método menos oneroso ou método mais oneroso) para um mesmo contribuinte numa mesma situação de fato, teria por base única e exclusivamente o “início da fiscalização”, isto é, um mero fator temporal, o que não pode ser aceito em decorrência do que determina o princípio da igualdade, muito bem realçado por Bandeira de Mello (1998, p. 29-34) quando ensina que “[...] um fator neutro em relação às situações, coisas ou pessoas diferençadas é inidôneo para distingui-las. [...] O fator ‘tempo’ não é jamais um critério diferencial, ainda que em primeiro relanço aparente possuir este caráter. [...] tempo, só por só, é elemento neutro, condição do pensamento humano e por sua neutralidade absoluta, a dizer, porque em nada diferencia os seres ou situações, jamais pode ser tomado como o fator em que se assenta algum tratamento jurídico desuniforme, sob pena de violência à regra da isonomia”.

No presente caso, constata-se que a situação do contribuinte não se altera: é a mesma, tanto antes como após o início da fiscalização; e, se assim é, não há razão para o estabelecimento de regimes jurídicos diversos (método menos oneroso e método mais oneroso), como pretende parte da doutrina e a jurisprudência do CARF.

Se a situação fático-jurídica do contribuinte, tanto antes como depois do início da fiscalização, permaneceu e permanecerá a mesma, afigura-se totalmente desproporcional a aplicação do regime “X” para o fato “A” antes do início da fiscalização, e do regime “Y” para o mesmo fato “A” após este início.

Ou seja, havendo a manutenção e a continuidade da situação fático-jurídica, o tratamento jurídico dispensado à espécie deve ser o mesmo. Dito de outro modo: não há variação na capacidade contributiva do contribuinte pelo simples fato de a fiscalização ser iniciada ou não, não havendo, portanto, razão que justifique tratamento diferenciado.

Conclusão

Após todo o exposto, pode-se concluir que o § 4º do art. 18 e o § 5º do art. 19 da Lei n. 9.430/1996 expressamente permitem ao contribuinte a utilização do método de cálculo de preços de transferência menos oneroso, apenas havendo dúvida se tal diretriz deve ser obrigatoriamente respeitada pelo Fisco ou, ao contrário, a atuação do Fisco poderia ser discricionária.

Em que pese a atual jurisprudência administrativa seguir o entendimento de que o Fisco não está obrigado a escolher o método menos gravoso ao contribuinte, vimos que tal raciocínio está eivado de algumas ilegalidades e incoerências, dentre elas a violação frontal à regra da menor onerosidade definida no § 4º do art. 18 e o § 5º do art. 19 da Lei n. 9.430/1996, bem como a tributação de um “excesso” de capacidade contributiva, resultando em verdadeira penalização do contribuinte.

Ao final, concluímos que, por dever inafastável de obediência à legislação, é atribuído ao Fisco o ônus de verificar quais dos métodos de cálculo previstos em lei conduzem à menor tributação, não lhe sendo assegurada discricionariedade para adotar o método que lhe acarrete menos esforços, maior ônus fiscal ao contribuinte ou quaisquer outros critérios subjetivos de escolha.

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XAVIER, Alberto. Direito tributário internacional do Brasil. 8. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2015.

1 “[...]. No que se refere aos preços de transferência, o foco circunscreve-se àqueles preços pactuados entre partes vinculadas, as quais, precipuamente em razão de seu vínculo, podem fixar arbitrariamente tais preços, com vistas a promover a transferência indireta de lucros. [...]. Sob a designação genérica de preços de transferência cuida-se, pois, do cotejo dos preços de bens tangíveis ou intangíveis estabelecidos numa transação, de cunho internacional, entre partes vinculadas, com os preços que teriam sido pactuados, se não houvesse o vínculo entre as partes contratantes. Tal ação é realizada com o fito de identificar e submeter à tributação uma transferência indireta de lucros. Para que se dê uma transferência (indireta de lucros) por intermédio dos preços pactuados, é forçoso estarmos diante de: a) pessoas vinculadas; b) domiciliadas em diferentes países; c) preço distinto daquele que seria estabelecido numa operação entre partes não vinculadas; e d) vantagem fiscal para as partes contratantes.” (BARRETO, 2001, p. 97-99)

2 “5.2.1.4. Segundo dispõe a regulamentação norte-americana dos preços de transferência, quando trata da regra do melhor método, o resultado arm’s length de uma transação controlada deve ser determinado segundo o método que, dentro dos fatos e circunstâncias, oferece a medida mais confiável de um resultado arm’s length. Portanto, não há qualquer prioridade estrita dos métodos e nenhum método será considerado invariavelmente mais confiável do que os demais. Um resultado arm’s length pode ser determinado por qualquer método, sem que se demonstre a inaplicabilidade de outros, mas se ficar constatado, posteriormente, que outro método produziria uma medida mais confiável de um resultado arm’s length, então esse outro método é que deve ser usado. Diante das penalidades impostas pela má escolha do método, é de se acreditar que, na prática, os contribuintes não se limitam a examinar um método (o melhor método), mas também examinarão os demais, a fim de se munirem de razões para justificar a não escolha de outros métodos. Com efeito, tendo em vista a prevenção da aplicação de penalidades pelo Fisco, os contribuintes acabam por investigar e documentar a aplicação de todos os outros métodos de preços de transferência previstos.” (SCHOUERI, 2013, p. 105)

35.2.2.3. A OCDE tentou superar tais diferenças com a publicação dos Guidelines, em 1995. Em tal documento, foi dada maior ênfase à questão da comparação, assim como na regulamentação norte-americana. No entanto, o best method rule foi rejeitado, conforme se infere dos seguintes trechos dos Guidelines: ‘2.11. The arm’s length principle does not require the application of more than one method for a given transaction (or set of transactions that are appropriately aggregated following the standard described at paragraph 3.9), and in fact undue reliance on such an approach could create a significant burden for tax payers. Thus, these Guidelines do not require either the tax examine or taxpayer to perform analyses under more than one method. While in some cases the selection of a method may not be straightforward and more than one method may be initially considered, generally it will be possible to select one method that is apt to provide the best estimation of an arm’s length price’.” (SCHOUERI, 2013, p. 107-108)

4 “Legitimidade” baseada no princípio arm’s length, conforme definido por Yariv Brauner na seguinte passagem: “To recap what we have learned: our transfer pricing regime has developed as an articulation of the arm’s length standard that dictates taxation of transacting related parties as if they were unrelated, based exclusively on ‘comparable’ factors that the tested transactions share, to one extent or the other, with transactions between unrelated parties.” (BRAUNER, 2010, p. 15)

5Art. 18. Os custos, despesas e encargos relativos a bens, serviços e direitos, constantes dos documentos de importação ou de aquisição, nas operações efetuadas com pessoa vinculada, somente serão dedutíveis na determinação do lucro real até o valor que não exceda ao preço determinado por um dos seguintes métodos: [...] § Na hipótese de utilização de mais de um método, será considerado dedutível o maior valor apurado, observado o disposto no parágrafo subsequente”.

6Art. 19. As receitas auferidas nas operações efetuadas com pessoa vinculada ficam sujeitas a arbitramento quando o preço médio de venda dos bens, serviços ou direitos, nas exportações efetuadas durante o respectivo período de apuração da base de cálculo do imposto de renda, for inferior a noventa por cento do preço médio praticado na venda dos mesmos bens, serviços ou direitos, no mercado brasileiro, durante o mesmo período, em condições de pagamento semelhantes. [...] § Na hipótese de utilização de mais de um método, será considerado o menor dos valores apurados, observado o disposto no parágrafo subsequente”.

7 Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas.

8 Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.

9 “Isto é assim porque o regime legal dos preços de transferência visa estabelecer limites máximos de custos dedutíveis e mínimos de receitas tributáveis, mas não cria direito à dedução de valores de custos superiores aos efetivamente incorridos ou à tributação de valores inferiores aos efetivamente ganhos. [...]. Por conseguinte, destinando-se as disposições legais sobre preços de transferência a proteger interesses arrecadatórios, elas não podem ser utilizadas com objetivo diverso e, assim, produzir alguma vantagem para os contribuintes. Deste modo, graças a esse mecanismo legal, o resultado do sistema é sempre favorável ao fisco, pois: [1] se o contribuinte pratica preço de importação maior do que o limite legal determinado pelos métodos do art. 18, o excesso a este não é dedutível (tal como se não o tivesse praticado), mas, se pratica preço inferior ao que seria permitido pelos métodos, não pode deduzir o valor que não praticou, mas poderia ter praticado (parágrafo 5º do art. 18); [2] se o contribuinte pratica preço de exportação inferior ao limite legal determinado pelos métodos do art. 19, o excesso (insuficiência) a este deve ser oferecido à tributação (tal como se o tivesse praticado), mas, se pratica preço maior do que seria permitido pelos métodos, não pode deixar de oferecer à tributação o valor que praticou, embora pudesse ter praticado valor menor (parágrafo 6º do art. 19).” (OLIVEIRA, 2009, p. 155 e ss.)

10 “The arm’s length standard is embodied in all U.S. tax treaties; it is in each major model treaty, including the U.S. Model Convention; it is incorporated into most tax treaties to which the United States is not a party; it has been explicitly adopted by international organizations that have addressed themselves to transfer pricing issues; and virtually every major industrial nation takes the arm’s length standard as its frame of reference in transfer pricing cases. The United States should continue to adhere to the arm’s length standard. What is the ALS, and why did the Treasury seek to defend it in these terms? The problem for which the ALS attempts to provide the solution may be illustrated by a simple example. Suppose that a product (e.g., computers) is manufactured by a corporation in country A, and then sold to a wholly owned subsidiary of the manufacturer in country B, which proceeds to resell it to unrelated customers. In this common situation, the taxable profit of the subsidiary is determined by three factors: (1) the price at which it resells the computers to the unrelated customers, (2) its expenses other than cost of goods sold, and (3) the price which it pays its parent corporation for the computers. The first two of these factors are governed by market forces outside the control of the parent or the subsidiary. However, because the parent controls the subsidiary, the third factor (the price for which the manufacturer sells the computers to the reseller, or the ‘transfer price’) is wholly within the control of the related parties. Accordingly, the potential for abuse arises because the related parties will seek to increase aftertax profits by manipulating the transfer price. If the effective tax rate in the manufacturer’s country is higher, the price will be set as low as possible so as to channel all taxable profit to the reseller. Conversely, if the effective tax rate in the reseller’s jurisdiction is higher, the transfer price will be as high as possible, so as to eliminate any taxable profit of the reseller and concentrate the entire profit in the hands of the manufacturer. But for tax considerations, the affiliated parties do not care what the transfer price is, since it merely reallocates profits within the affiliated group.” (AVI-YONAH, 2007, p. 1)

11 Exceção feitas aos métodos do Preço sob Cotação na Importação (PCI) e do Preço sob Cotação na Exportação (PECEX), os quais são de aplicação obrigatória no cálculo dos preços de transferência de commodities sujeitas a cotação em bolsas de mercadorias e de futuros. No mesmo sentido: Solução de Consulta COSIT n. 310, de 3 de novembro de 2014.

12 “Neste contexto geral, resumido deste modo, o parágrafo 4º do art. 18 e o parágrafo 5º do art. 19 instituem uma diretriz essencialmente única e integrante da norma, de que, em todo e qualquer caso, o limite legal a ser considerado para comparação com o preço efetivamente praticado é aquele que for mais favorável ao contribuinte, dentre os resultados que forem apurados mediante a aplicação dos respectivos métodos. Quer isto dizer que, se, por um lado, o fisco nunca perde em face dos limites a seu favor, prescritos nos métodos e nos parágrafos 5º e 6º dos arts. 18 e 19, por outro lado, tendo em vista os parágrafos 4º e 5º dos mesmos artigos, nunca terá o seu benefício aumentado em relação a qualquer dos métodos que fixar um parâmetro que dê suporte ao preço efetivamente praticado, ou fixe um parâmetro menos oneroso para o contribuinte.” (OLIVEIRA, 2009, p. 155 e ss.).

13 No mesmo sentido: “Dito isto, podemos passar a aspectos relevantes desse regramento, inclusive aos propostos pela organização científica do seminário, mas apontando desde logo o caráter mandatório das prescrições do parágrafo 4º do art. 18 e do parágrafo 5º do art. 19, eis que em ambos a dicção legal conduz a esta afirmação, ao dizer ‘será considerado’, isto é, ao não empregar uma expressão menos severa, tal como ‘poderá ser considerado’.” (OLIVEIRA, 2009, p. 155 e ss.).

14 Na mesma linha de Alberto Xavier é a opinião de Renata Borges La Guardia que, citando Heleno Taveira Tôrres, assim se pronuncia: “Se cabe ao fisco aplicar ‘um dos métodos indicados nos arts. 18 e 19’ sempre que se averiguar a ocorrência das alternativas indicadas nos incisos I a III do art. 19-B da Lei nº 9.430/96, a questão até então debatida no âmbito doutrinário e jurisprudencial era a seguinte: deve a autoridade fiscal avaliar todos os métodos disponíveis, a fim de aplicar o mais favorável ao contribuinte? Essa dúvida advinha da redação original dos artigos 18, § 4º, e 19, § 5º, da Lei nº 9.430/96, que se referiam tão somente à ‘aplicação do método mais favorável ao contribuinte’. Como a redação da lei era dúbia, alguns doutrinadores, destacando-se Luís Eduardo Schoueri, posicionaram-se no sentido de que ‘a falta de identificação de método, ou o erro nesta identificação não afasta o mandamento de que se escolha o mais benéfico ao contribuinte’. Outros, como Heleno Taveira Tôrres, sustentavam não ser razoável que o fisco despendesse tempo examinando todos os métodos disponíveis: bastaria a aferição do preço parâmetro segundo um único método. [...]. Nesse sentido, não está o fisco obrigado a testar todos os métodos, a fim de indicar o mais benéfico; todavia, isso não significa que o contribuinte não possa discutir os critérios por ele adotados. [...]” (LA GUARDIA, 2010, p. 211-212)

15 Vide Acórdão n. 107-09.411, 7ª Câmara, 1º Conselho de Contribuintes, sessão de 25.06.2008.

16 Segundo Humberto Ávila, para se alcançar o verdadeiro conceito de “princípio jurídico” faz-se necessário, antes, efetuar algumas distinções, de modo a afastá-lo de outras categorias jurídicas com as quais normalmente é confundido, in verbis: “A busca de uma definição mais precisa de princípios jurídicos é necessária. Não tanto pela diferença da denominação, mas pela distinção estrutural entre os fenômenos jurídicos que se procura descrever mediante o emprego de diversas categorias jurídicas. Ora, tanto a doutrina como a jurisprudência são unânimes em afirmar que as normas jurídicas mais importantes de um ordenamento jurídico são os princípios. Do próprio ordenamento jurídico brasileiro constam normas positiva ou doutrinariamente denominadas de princípios, alguns fundamentais, outros gerais. Sua definição não pode, por isso, ser equívoca, antes deve ser de tal forma formulada, que a sua aplicação diante do caso concreto possa ser intersubjetivamente controlável.” (ÁVILA, 2001, p. 5-6)

Uma primeira distinção, e talvez a mais importante, deve se dar entre os “princípios” e as “regras”. Nesta linha, é possível identificar na doutrina duas etapas de redefinição das normas jurídicas. Na primeira, verificou-se que integram o Direito, sendo por isso válidas, tanto as normas que possuem uma prescrição determinada (regras), como aquelas que estabelecem prescrições ligadas indiretamente a valores, fins e ideias a serem institucionalmente determinadas (princípios) (ÁVILA, 2001, p. 7).

Na segunda etapa, há um aprofundamento na diferenciação entre princípios e regras, de modo que a força normativa dos princípios passa a não ser mais questionada, passando-se a direcionar a análise à determinação dos critérios objetivos que melhor fundamentam a interpretação e a aplicação normativa baseada neles. A evolução desta segunda etapa inicia-se com a doutrina de Canaris, passando-se à de Dworkin e conclui-se com a doutrina de Alexy. Em relação a este último, Humberto Ávila leciona: “[...] os princípios jurídicos consistem apenas numa espécie de normas jurídicas por meio das quais são estabelecidos deveres de otimização aplicáveis em vários graus, segundo as possibilidades normativas e fáticas. Com base na jurisprudência do Tribunal Constitucional Alemão, Alexy demonstra a relação de tensão ocorrente no caso de colisão entre os princípios: nesse caso, a solução não se resolve com a determinação imediata de uma prevalência de um princípio sobre outro, mas é estabelecida em função da ponderação entre os princípios colidentes, em função da qual um deles, em determinadas circunstâncias concretas, recebe a prevalência. Os princípios, portanto, possuem apenas uma dimensão de peso, e não determinam as consequências normativas de forma direta, ao contrário das regras. É só a aplicação dos princípios diante dos casos concretos que os concretiza mediante regras de colisão. Por isso a aplicação de um princípio deve ser vista sempre com uma cláusula de reserva, a ser assim definida: ‘se no caso concreto um outro princípio não obtiver maior peso’. É dizer o mesmo: a ponderação dos princípios conflitantes é resolvida mediante a criação de regras de prevalência, o que faz com que os princípios, desse modo, sejam aplicados também ao modo ‘tudo ou nada’ (‘Alles-oder-Nichts’). Essa espécie de tensão e o modo como ela é resolvida é o que distingue os princípios das regras: enquanto no conflito entre regras é preciso verificar se a regra está dentro ou fora de determinada ordem jurídica (‘problema do dentro ou fora’), o conflito entre princípios já se situa no interior desta mesma ordem (‘teorema da colisão’).” (ÁVILA, 2001, p. 9)

E continua o citado autor: “A distinção entre princípios e regras, segundo Alexy, não pode ser baseada no modo ‘tudo ou nada’ de aplicação proposto por Dworkin, mas deve resumir-se, sobretudo, a dois fatores: diferença quanto à colisão, na medida em que os princípios colidentes apenas têm sua realização normativa limitada reciprocamente, ao contrário das regras, cuja colisão é solucionada com a declaração de invalidade de uma delas ou com a abertura de uma exceção que exclua a antinomia; diferença quanto à obrigação que instituem, já que as regras instituem obrigações absolutas, já que não superadas por normas contrapostas, enquanto os princípios instituem obrigações prima facie, na medida em que podem ser superadas ou derrogadas em função dos outros princípios colidentes.” (ÁVILA, 2001, p. 10)

17 “Um dos princípios mais importantes para a aplicação da capacidade contributiva é o da igualdade tributária (art. 150, II, da Constituição Federal), conquanto não seja o único relevante à configuração constitucional. No Brasil, duas correntes surgiram a respeito da relação entre igualdade e capacidade contributiva: a primeira sustenta que o princípio da capacidade contributiva tem um conteúdo diferente do princípio da igualdade, enquanto a outra sustenta que ele é o critério de aplicação da igualdade no âmbito do Direito Tributário.” (CARRAZZA, 2015, p. 78-79)

18 “Reforça o princípio republicano o da capacidade contributiva, que determina a equitativa repartição dos encargos tributários entre os contribuintes. Também é instrumento hábil à adequada fixação da base de cálculo, seja in abstracto, seja in concreto, dos tributos. O princípio em tela vem materializado na primeira parte do § 1º do art. 145 da CF: ‘Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuintes, [...]. De um modo bem amplo, já podemos adiantar que ela se manifesta diante de fatos ou situações que revelam, prima facie, da parte de quem os realiza ou neles se encontra, condições objetivas para, pelo menos em tese, suportar a carga econômica desta particular espécie tributária. [...]. Acrescentamos que o princípio da capacidade contributiva hospeda-se nas dobras do princípio da igualdade e ajuda a realizar, no campo tributário, os ideais republicanos. Realmente, é justo e jurídico que quem, em termos econômicos, tem muito pague, proporcionalmente, mais imposto do que quem tem pouco. Quem tem maior riqueza deve, em termos proporcionais, pagar mais imposto do que quem tem menor riqueza. Noutras palavras, deve contribuir mais para a manutenção da coisa púbica. As pessoas, pois, devem pagar impostos na proporção dos seus haveres, ou seja, de seus índices de riqueza. A par disso, a própria interpretação das normas tributárias que visam onerar financeiramente os contribuintes deve ser feita em perfeita sintonia com os princípios da capacidade contributiva e da igualdade.” (CARRAZZA, 2015, p. 102-103).

19 Em que pese o conteúdo do princípio da capacidade contributiva ser de difícil delimitação, na linha de Elizabeth Nazar Carrazza, entendemos ser possível compreendê-lo de forma satisfatória a partir do “sistema tributário” estabelecido pela Constituição Federal, especialmente no disposto em seu art. 145, § 1º. De acordo com a citada autora: “O princípio da capacidade contributiva, por sua necessária vinculação com a justiça tributária, possui um conteúdo de difícil delimitação, mas que nem por isso o torna incompreensível dentro do ordenamento jurídico brasileiro. Essa dificuldade recebe adicional complexidade com a grande quantidade de definições que esse princípio recebeu dos mais diversos tributaristas, sem contar as diversas definições oriundas da Economia e da Ciência das Finanças que ganharam muita atenção na primeira metade do século XX.” (CARRAZZA, 2015, p. 78)