EMENTÁRIO DE ACÓRDÃOS

CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS – CARF

1. Omissão de Rendimentos de Fonte Situada no Exterior. Fraude

Acórdão: 2301-010.982

Processo: 10166.741382/2020-48

1ª Turma Ordinária, 3ª Câmara, 2ª Seção de Julgamento

Julgamento: 01 de novembro de 2023

Recorrentes: MARCELO FISCH DE BERREDO MENEZES E OUTRO

Presidente e Redator: João Maurício Vital

Ementa:

DECADÊNCIA DO LANÇAMENTO. OMISSÃO DE RENDIMENTOS RECEBIDOS DE FONTE SITUADA NO EXTERIOR. MULTA QUALIFICADA. Configurado o dolo, a fraude ou a simulação na tentativa de esconder do Fisco a ocorrência do fato gerador do imposto ou de eximir-se, total ou parcialmente, do pagamento de tributo, o prazo para que a Fazenda Nacional exerça o direito da constituição do crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, nos termos do art. 173 do CTN.

[...] NULIDADE. PROVA EMPRESTADA. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DO DIREITO AO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. OBSERVÂNCIA DO ORDENAMENTO JURÍDICO. É lícita a utilização, pelo Fisco, de documentos e/ou informações obtidos por outras autoridades fiscais, administrativas ou judiciais para efeito de lançamento, desde que os mesmos guardem pertinência com os fatos geradores e os sujeitos passivos que foram objeto da autuação e que tenha sido dada ciência aos contribuintes dos documentos carreados aos autos, no sentido de possibilitar o exercício do contraditório e da ampla defesa.

NULIDADE POR ERRO NA IDENTIFICAÇÃO DO SUJEITO PASSIVO. Comprovado nos autos que o contribuinte, mediante a utilização, como interposta pessoa, de empresa cuja sócia majoritária é sua esposa, recebeu rendimentos de fonte situada no exterior, constituindo-se como o real beneficiário das receitas omitidas, fica consubstanciada a sua caracterização como sujeito passivo de obrigação tributária, independentemente da pessoa jurídica em questão ter oferecido à tributação os valores objeto da presente autuação.

MULTA ISOLADA DE 50% E MULTA QUALIFICADA DE 150%. ALEGAÇÃO DE CONFISCO. Não pode ser inquinado pela alegação de confisco o lançamento do Imposto de Renda da Pessoa Física que atendeu aos preceitos legalmente estabelecidos e exigiu imposto resultante da apuração de omissão de rendimentos de fonte situada no exterior, aplicando, outrossim, multa isolada de 50% pela falta de recolhimento do IRPF devido a título de carnê-leão, e impondo, ainda, com base na constatação de dolo, multa qualificada de 150%, que apresentou como base de cálculo o correspondente imposto apurado. No que tange, ainda, à invocação da figura do confisco, não é competência da Autoridade Administrativa a apreciação e a decisão de questões que versem sobre a constitucionalidade de atos legais, salvo se já houver decisão do Supremo Tribunal Federal declarando a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo.

SUJEIÇÃO PASSIVA SOLIDÁRIA DO CÔNJUGE. Em consonância com a legislação vigente, atribui-se ao cônjuge do contribuinte a sujeição passiva solidária, na medida em que também possui interesse na situação que constituiu o fato gerador da obrigação principal, uma vez ser ela sócia majoritária de empresa utilizada como pessoa jurídica interposta para encobrir o recebimento, por parte do contribuinte, de receitas provenientes de fonte no exterior.

MULTA QUALIFICADA. APLICABILIDADE. CARACTERIZAÇÃO DE DOLO. A aplicação da multa de ofício decorre de expressa previsão legal, tendo natureza de penalidade por descumprimento da obrigação tributária, e restando demonstrada nos autos a ocorrência de fraude e evidenciado o dolo correspondente, fica plenamente fundamentada e justificada a aplicação da multa de ofício qualificada, no percentual de 150% (cento e cinquenta por cento), uma vez constatada a tentativa do contribuinte de impedir o conhecimento, por parte do Fisco, da ocorrência do fato gerador do imposto, ou de eximir-se, total ou parcialmente, do pagamento de tributo.

Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, em rejeitar as preliminares e negar provimento ao recurso. [...]

COMENTÁRIOS DOS EDITORES: O presente caso trata de lançamento do IRPF sobre rendimentos recebidos no exterior e omitidos de tributação pela pessoa física.

Segundo o acórdão, a fiscalização teria concluído que pagamentos feitos à empresa MDI CONSULTORIA – que tem sócia majoritária a cônjuge do contribuinte (MARIANGELA DEFEO) – correspondiam na realidade à contraprestação por serviços de consultoria prestados pelo contribuinte (MARCELO) à pessoa jurídica estrangeira CFC, de titularidade de CHARLES FINKEL.

Segundo relata o acórdão, “a MDI foi fundada exclusivamente para que MARCELO pudesse receber propina de CHARLES FINKEL pela sua atuação ostensiva em favor da empresa SICPA no processo licitatório com a Casa da Moeda, tudo relacionado ao cargo que ocupava na Receita Federal do Brasil”.

Interessante notar que neste lançamento o Fisco considerou que restou demonstrado que o real beneficiário dos valores pagos no exterior era o Sr. Marcelo, tendo por isso lhe imputado a condição de contribuinte e considerado que houve omissão de rendimentos.

Como para esconder do Fisco o real contribuinte foram produzidos documentos, firmados contratos, prestadas declarações falsas por MDI, o CARF entendeu estar caracterizada a sonegação, a fraude e o conluio, com a aplicação da qualificação da multa prevista no art. 44 da Lei n. 9.430, de 1996.

Para alcançar essas conclusões, o CARF e a Receita se basearam em uma série de indícios dos autos e provas emprestadas do processo criminal que apontavam que (i) MDI teria formalizado proposta para a CFC tomando por base serviços na sua área de gestão de pessoas, quando na realidade os serviços executados foram de outra natureza e sequer constavam de seu objeto social; (ii) MDI se desviou de seu fim “menos de um mês após sua constituição, somado ao fato de que jamais prestou serviço algum para outro cliente”; (iii) o serviço à CFC CONSULTING GROUP foi prestado pelo Sr. MARCELO FISCH, devido a sua grande experiência na área, fato que todo os réus são unânimes em afirmar; (iv) MDI foi utilizada como pessoa interposta com intuito de “esconder” o real prestador do serviço, o Sr. MARCELO FISCH; (v) MDI ofereceu os valores à tributação de uma forma muito mais favorável do que teriam estes sido tributados na pessoa física; (vi) o Sr. MARCELO FISCH não fazia parte da empresa MDI ou de qualquer outra pessoa jurídica, logo, o recebimento dos valores deveria, necessariamente, ser tributado na pessoa física, através de carnê-leão; (vii) por ter efetiva participação na tentativa de desfigurar a obrigação tributária e possuir o vínculo com o fato e com a pessoa do contribuinte, imputa-se a responsabilidade solidária à Sra. Mariangela Defeo.

Interessante notar que o acordão dá conta de que em segunda instância os réus teriam sido absolvidos, mas nota que independentemente da absolvição penal do crime de corrupção, os elementos dos autos seriam suficientes para demonstrar que o real contribuinte era o réu/Marcelo.

2. Qualificação dos Serviços Técnicos e da Assistência Técnica nos Tratados

Acórdão: 1301-006.591

Processo: 10880.946288/2015-41

1ª Turma Ordinária, da 3ª Câmara, da 1ª Seção

Julgamento: 20 de setembro de 2023

Recorrente: COQUEPAR – COMPANHIA DE COQUE CALCINADO DE PETROLEO

Presidente Redator: Rafael Taranto Malheiros

Ementa:

TRATADO. SERVIÇOS TÉCNICOS. ASSISTÊNCIA TÉCNICA. O tratamento tributário a ser dispensado aos rendimentos pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos por fonte situada no Brasil a pessoa física ou jurídica residente no exterior pela prestação de serviços técnicos e de assistência técnica, com ou sem transferência de tecnologia, com base em acordo ou convenção para evitar a dupla tributação da renda celebrado pelo Brasil será aquele previsto no respectivo Acordo ou Convenção, no artigo que trata de royalties, quando o respectivo protocolo contiver previsão de que os serviços técnicos e de assistência técnica recebam igual tratamento, na hipótese em que o Acordo ou a Convenção autorize a tributação no Brasil. Acordam os membros do colegiado, por unanimidade, em negar provimento ao Recurso Voluntário, nos termos do relatório e do voto condutor.

COMENTÁRIO DOS EDITORES: O acórdão examina se o tratado Brasil-China autoriza a retenção do Imposto de Renda na fonte sobre remuneração paga em razão de contrato de prestação de serviços técnicos de engenharia.

A Recorrente alegava que o caso tratava de serviços técnicos, sem transferência de tecnologia e, por isso, qualificáveis ao teor do art. 7º (lucro das empresas) que estabelece competência exclusiva do país de residência do prestador dos serviços (China) para tributar os seus lucros. Para ela não seria aplicável o art. 12 (royalties) do tratado, que estabelece competência cumulativa dos dois Estados Contratantes, pois os serviços in casu não contêm transferência de tecnologia.

A Recorrente também alegou que (i) o Ato Declaratório Interpretativo da RFB n. 5/2014 – que autoriza a tributação pelo art. 12 de serviços técnicos com ou sem transferência de tecnologia – só foi editado em 16.06.2014, enquanto as remessas foram feitas no ano de 2012; e que (ii) o STJ proferiu decisão (REsp n. 1.161.467) em que consolidou o entendimento favorável à Recorrente.

O acórdão, porém, rejeitou esses argumentos, afirmando que o art. 12 do Tratado Brasil-China, complementado pelo item 3 do Protocolo anexo, prevê que devem ser enquadradas no conceito de royalties as remessas realizadas em contraprestação de serviços técnicos.

Logo, a Convenção com a China autoriza a retenção na fonte sobre os pagamentos relativos a contrato de prestação de serviços técnicos de engenharia, independentemente de ter havido transferência de tecnologia, sujeitando-se à incidência do IRRF de 15%. O Ato Declaratório Interpretativo n. 5/2014 é norma interpretativa e, segundo o art. 106 do CTN, aplica-se a ato ou fato pretérito.

Já o STJ, ao julgar em 2021 o REsp n. 1.759.081/SP (2018/0199869-0) concluiu que se o Tratado prevê o tratamento de royalties a pagamentos provenientes dos serviços de assistência técnica e de serviços técnicos, deve prevalecer a regra específica que permite a retenção na fonte pelo Brasil. A jurisprudência citada pela Recorrente é anterior à decisão do REsp n. 1.759.081/SP e não possui efeito vinculante.

3. Imunidade na Exportação Indireta não alcança o Senar

Acórdão: 2401-011.519

Processo: 14120.720026/2019-34

1ª Turma Ordinária, 4ª Câmara, da 2ª Seção

Julgamento: 08 de novembro de 2023

Recorrente: TAUÁ BIODIESEL LTDA

Relator: Matheus Soares Leite

Ementa:

CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. RECEITA DA COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO DECORRENTE DE EXPORTAÇÃO INDIRETA. UTILIZAÇÃO DE “TRADING COMPANIES”. IMUNIDADE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 759.244/STF E ADI N. 4735/STF. A receita decorrente da venda de produtos ao exterior, por meio de “trading companies”, não integra a base de cálculo das contribuições previdenciárias incidentes sobre a comercialização da produção

CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SUBSTITUTIVA PATRONAL. CONTRIBUIÇÃO AO SENAR. AGROINDÚSTRIA. REGIME DO ART. 22A DA LEI N. 8.212 COM REDAÇÃO DA LEI N. 10.256, DE 2001. As contribuições previdenciárias patronal (art. 22A, I e II) e as de Terceiros ao Senar (art. 22A, § 5º) devidas pela agroindústria, definida como sendo o produtor rural pessoa jurídica cuja atividade econômica seja a industrialização de produção própria ou de produção própria e adquirida de terceiros, incide sobre o valor da receita bruta proveniente da comercialização da produção. A receita bruta corresponde ao valor total da receita proveniente da comercialização da produção própria e da adquirida de terceiros, industrializada ou não, incluindo aquela decorrente da revenda de mercadorias.

CONTRIBUIÇÃO AO SENAR. NATUREZA JURÍDICA. CONTRIBUIÇÃO DE INTERESSE DAS CATEGORIAS PROFISSIONAIS OU ECONÔMICAS. IMUNIDADE NA EXPORTAÇÃO. INEXISTÊNCIA. A contribuição ao Senar, destinada ao atendimento de interesses de um grupo de pessoas; formação profissional e promoção social do trabalhador rural; inclusive financiada pela mesma categoria, possui natureza de contribuição de interesse das categorias profissionais ou econômicas, em sua essência jurídica, destinada a proporcionar maior desenvolvimento à atuação de categoria específica, portanto inaplicável a imunidade das receitas decorrentes da exportação. A imunidade prevista no inciso I do § 2º do art. 149 da Constituição Federal apenas abrange as contribuições sociais (gerais) e as contribuições destinadas à intervenção no domínio econômico, ainda que a exportação seja realizada via terceiros (trading companies), não se estendendo, no entanto, ao Senar, por se tratar de contribuição de interesse das categorias profissionais ou econômicas. São devidas as contribuições ao Senar sobre as receitas de exportação.

ZONA FRANCA DE MANAUS. RECEITAS DE EXPORTAÇÃO. IMUNIDADE. ART. 149, § 2°, I, DA CF. As receitas provenientes da comercialização de produtos para a Zona Franca de Manaus são equiparadas a receitas de exportações por força do art. 4° do Decreto-Lei n°. 288/67, razão pela qual são imunes à incidência da contribuição previdenciária nos termos do art. 149, § 2°, I, da Constituição Federal.

[...] Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, dar provimento parcial ao recurso voluntário para excluir da base de cálculo dos lançamentos relativos a cota patronal (4863) e GILRAT (2158) as receitas decorrentes de exportações por meio de “trading companies” e das receitas decorrentes de vendas para Zona Franca de Manaus.

COMENTÁRIO DOS EDITORES: O acórdão discute, entre outras matérias, a imunidade sobre as receitas de exportação indireta, promovidas pela Recorrente por meio de tradings.

Na origem o auto de infração considerou que em razão da utilização da trading as operações não se caracterizariam como exportações, mas vendas no mercado interno, fora do alcance da imunidade prevista no art. 149, § 2º, I da CF/1988.

Contudo, no julgamento do RE n. 759.244 o STF, em repercussão geral, fixou a Tese n. 764 de que “a norma imunizante contida no inciso I do § 2º do art.149 da Constituição da República alcança as receitas decorrentes de operações indiretas de exportação caracterizadas por haver participação de sociedade exportadora intermediária”. Assim, em obediência ao art. 62, § 2º, do Ricarf, o Turma deu provimento parcial ao recurso voluntário excluindo do lançamento da cota patronal e do RAT as receitas de exportações indiretas.

No entanto, em relação ao lançamento de terceiros a tributação foi mantida sob o argumento de que a norma imunizante é restrita às contribuições sociais e às de intervenção no domínio econômico, enquanto a contribuição ao Senar seria qualificável como de interesse das categorias profissionais ou econômicas, portanto, fora do alcance a imunidade do inciso I do § 2º do art.149 da CF/1988.

O acórdão também equipara as receitas de vendas à zona franca de Manaus a receitas de exportação para fins do gozo da imunidade prevista no art. 149, § 2º, I, da CF/1988.

4. Lucros no Exterior. Tratado contra a Dupla Tributação. MP n. 2.158-35/2001

Acórdão: 9101-006.795

Processo: 16327.720623/2016-25

1ª Turma da CSRF

Julgamento: 07 de novembro de 2023

Recorrentes: BANCO BRADESCO S/A e Fazenda Nacional

Presidente e Relator: Fernando Brasil de Oliveira Pinto

Ementa:

TRATADOS PARA EVITAR DUPLA TRIBUTAÇÃO. BRASIL-GRÃO-DUCADO DE LUXEMBURGO. TRIBUTAÇÃO DO LUCRO DA CONTROLADORA NACIONAL. AUSÊNCIA DE ANTINOMIA. Não há incompatibilidade entre os tratados internacionais para evitar dupla tributação e a aplicação do art. 74 da Medida Provisória n. 2.158-35, de 2001. No caso concreto, o Tratado firmado entre Brasil e Luxemburgo não impede a tributação do resultado de empresa domiciliada no Brasil em função de sua renda obtida por intermédio de sua participação em sociedades domiciliadas no exterior.

[...] Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, em não conhecer do Recurso Especial da Fazenda Nacional e conhecer do Recurso Especial do Contribuinte, nos limites do despacho de admissibilidade. No mérito, por voto de qualidade, acordam em negar provimento ao recurso do Contribuinte.

COMENTÁRIOS DOS EDITORES: O acórdão examina se os lucros de uma controlada, domiciliada no Luxemburgo, podem ser tributados junto ao controlador no Brasil nos termos do art. 74 da MP n. 2.158-35/2001 ou se essa tributação estaria impedida por força do art. 7º do tratado com o Luxemburgo.

Nesse julgamento prevaleceu o entendimento de que os lucros da controlada estrangeira podem ser tributados no Brasil, sem representar ofensa ao tratado. Apesar de ter ocorrido empate na votação, como o julgamento foi realizado já na vigência da Lei n. 14.689/2023, a questão foi decidida pelo voto de qualidade do Presidente em favor do Fisco.

Acórdão: 9101-006.796

Processo: 12448.736514/2011-98

1ª Turma da CSRF

Julgamento: 7 de novembro de 2023

Recorrente: BELGRAVIA SERVIÇOS E PARTICIPAÇÕES S/A

Redatora Designada: Edeli Pereira Bessa

Ementa:

LUCROS OBTIDOS POR MEIO DE CONTROLADA NO EXTERIOR. CONVENÇÕES DESTINADAS A EVITAR A DUPLA TRIBUTAÇÃO E PREVENIR A EVASÃO FISCAL EM MATÉRIA DE IMPOSTO SOBRE A RENDA. ART. 74 DA MP N. 2.158-35/2001. NÃO OFENSA. Não há incompatibilidade entre os Tratados Firmados pelo Brasil para evitar a dupla tributação da renda e a aplicação do art. 74 da Medida Provisória n. 2.158-35/2001, não sendo caso de aplicação do art. 98 do CTN, por inexistência de conflito. Os Tratados firmados pelo Brasil nessas matérias não impedem a tributação na controladora no Brasil dos lucros auferidos por intermédio de suas controladas no exterior. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, em conhecer parcialmente do Recurso Especial, apenas em relação às matérias “a) Incompatibilidade do art. 74 da MP n. 2158-35 com o art. 7º dos acordos de bitributação celebrados pelo Brasil com Portugal e Equador” e “b) Incompatibilidade do art. 23 do acordo de bitributação celebrado entre o Brasil e o Equador e o art. 74 da MP n. 2158-35”.

COMENTÁRIOS DOS EDITORES: O acórdão examina se os lucros de uma controlada, domiciliada no Equador, podem ser tributados junto ao controlador no Brasil nos termos do art. 74 da MP n. 2.158-35/2001 ou se essa tributação estaria impedida por força dos arts. 7º (lucro das empresas) e 23 (isenção dos dividendos) do tratado com o Equador.

Nesse julgamento prevaleceu o entendimento de que os lucros da controlada estrangeira podem ser tributados no Brasil, sem representar ofensa a qualquer dos dois dispositivos do tratado. Apesar de ter ocorrido empate na votação, como o julgamento foi realizado já na vigência da Lei n. 14.689/2023, a questão foi decidida pelo voto de qualidade do Presidente em favor do Fisco.

5. Lucros no Exterior. Tratado contra a Dupla Tributação. Lei n. 12.973/2014

Acórdão: 1302-006.963

Processo: 10920.720043/2020-39

2ª Turma Ordinária, da 3ª Câmara, da 1ª Sessão

Julgamento: 17 de outubro de 2023

Recorrente: FAZENDA NACIONAL

Interessado: WEG EQUIPAMENTOS ELÉTRICOS S/A

Redator Designado: Paulo Henrique Silva Figueiredo

Ementa:

INCENTIVOS FISCAIS À INOVAÇÃO TECNOLÓGICA. PARECER TÉCNICO DO MCTI. COMPETÊNCIA. PROJETOS RECUSADOS PELA RFB. CANCELAMENTO. O Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTI) é o órgão que detém a competência legal para opinar sobre matéria técnica a respeito de projetos de inovação tecnológica, conforme Decreto n. 5.798/2006. O Parecer Técnico emitido pelo MCTI deve ser reconhecido pela RFB e a glosa de exclusão de dispêndios de inovação tecnológica relativos a projetos recusados pela RFB, mas aprovados pelo MCTI, deve ser cancelada.

TRIBUTAÇÃO DA PARCELA DO AJUSTE DO INVESTIMENTO EM CONTROLADA DOMICILIADA NO EXTERIOR EQUIVALENTE AOS LUCROS. TRATADO PARA EVITAR DUPLA TRIBUTAÇÃO. BRASIL-ÁUSTRIA. AUSÊNCIA DE ANTINOMIA. Não há incompatibilidade entre os tratados internacionais para evitar dupla tributação e a aplicação do art. 77 da Lei n. 12.973, de 2014. No caso concreto, o Tratado firmado pelo Brasil com a Áustria não impede a tributação da parcela do ajuste do valor do investimento em controlada domiciliada no exterior equivalente aos lucros por ela auferidos.

LUCROS AUFERIDOS NO EXTERIOR. PREÇO DE TRANSFERÊNCIA. DEDUÇÃO DO LUCRO REAL E DA BASE DE CÁLCULO DA CSLL. Quando os lucros auferidos no exterior são considerados na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, os valores relativos às adições, espontaneamente efetuadas, decorrentes da aplicação das regras de preços de transferência, devem ser deduzidos do lucro real e da base de cálculo da CSLL.

COMPENSAÇÃO DE SALDO NEGATIVO. EXISTÊNCIA POSTERIOR DE AUTO DE INFRAÇÃO. Homologa-se a compensação de saldo negativo, regularmente declarada pela contribuinte antes de novo auto de infração. Em caso de verificação posterior de inexistência de saldo negativo, por apuração de base positiva, o lançamento complementar deve se referir ao ano de apuração do saldo negativo, recalculado junto com os demais ajustes propostos pela fiscalização.

CSLL. DECORRÊNCIA. LANÇAMENTO REFLEXO. Versando sobre as mesmas ocorrências fáticas, aplica-se ao lançamento reflexo alusivo a CSLL, o que restar decidido no lançamento do IRPJ.

[...] Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso de ofício, nos termos do relatório e voto do relator. Quanto ao recurso voluntário, acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, em rejeitar as preliminares de nulidade suscitadas, e, em relação ao mérito: (i) por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso quanto aos dispêndios com projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação; à utilização de saldo negativo em períodos subsequentes; e à incidência de juros de mora sobre multa de ofício; (ii) por voto de qualidade, em negar provimento ao recurso quanto à tributação dos lucros auferidos no exterior, por meio de sociedade controlada, vencidos os Conselheiros Heldo Jorge dos Santos Pereira (relator), Sávio Salomão de Almeida Nóbrega e Rycardo Henrique Magalhães de Oliveira, que votaram por dar provimento ao recurso em relação a tal matéria.

COMENTÁRIOS DOS EDITORES: O acórdão examina se a tributação dos lucros de uma controlada, domiciliada na Áustria, junto ao controlador no Brasil estaria impedida por força dos arts. 7º (lucro das empresas) e 23 (isenção dos dividendos) do tratado com a Áustria ou se a alteração da legislação introduzida pelos arts. 77 e ss. da Lei n. 12.973/2014 afastaria a aplicação dos tratados.

O Relator votou para reconhecer a identidade substancial do art. 77 e ss. da Lei n. 12.973/2014 com o regime do art. 74 da MP n. 2.158-35/2001, entendendo aplicar-se também à nova legislação o entendimento acerca da sua incompatibilidade com o art. 7º dos tratados, ressaltando ainda o fato de a lei ter mantido a intributabilidade dos resultados de equivalência patrimonial.

Contudo, nesse ponto o Relator foi vencido, prevalecendo o entendimento de que o art. 7º do tratado:

“[...] não trata da forma de tributação estabelecida no art. 77 da Lei n. 12.973, de 2014, pois não estamos tratando da tributação, segundo o critério da fonte, dos lucros da empresa no exterior, nem da tributação do lucro de estabelecimentos permanentes da empresa estrangeira situados no Brasil.

Tal entendimento tem prevalecido no âmbito do Carf e da CSRF5 (em regra, por meio do voto de qualidade), quanto ao art. 74 da MP 2.158-35, de 2001, sendo estabelecido que a tributação não incide sobre o lucro produzido pela empresa estrangeira, até porque a legislação pátria não pode alcançar esta última sem que algum critério de conexão se estabeleça. O que se faz, por meio do referido dispositivo, é tributar a empresa nacional, consoante o critério da residência, tomando como base de cálculo a proporção que lhe cabe, com base nos lucros apurados pela empresa no exterior.

[...]

No caso da incidência do art. 77 da Lei n. 12.973, de 2014, não há motivos para adoção de entendimento distinto. Seja por que o aspecto material do fato gerador passou a ser diverso (“parcela do ajuste do valor do investimento em controlada, direta ou indireta, domiciliada no exterior equivalente aos lucros por ela auferidos”), e, expressamente, alinhado à interpretação que se conferia à norma legal; seja pelas mesmas razões acima expostas”.

Prevaleceu, portanto, o entendimento de que os lucros da controlada estrangeira podem ser tributados no Brasil, sem representar ofensa a qualquer dos dois dispositivos do tratado. O julgamento foi realizado já na vigência da Lei n. 14.689/2023, tendo este ponto sido decidido pelo voto de qualidade do Presidente em favor do Fisco.

Além disso, o acórdão também examina a possibilidade de as adições realizadas para fins das regras de preços de transferência serem deduzidas do lucro real e da base de cálculo da CSLL.

Processo n. 10600.720035/2013-86 Recurso Especial do Contribuinte Acórdão n. 9101-006.381 – CSRF / 1ª Turma Sessão de 6 de dezembro de 2022 Recorrente ARCELORMITTAL BRASIL S.A. Interessado FAZENDA NACIONAL ASSUNTO: PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL Ano-calendário: 2008, 2009, 2010 RECURSO ESPECIAL. CONHECIMENTO. MATÉRIAS SUMULADAS. Não se conhece de recurso especial contra acórdão que aplica entendimento das Súmulas Carf n. 108 (Incidem juros moratórios, calculados à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – Selic, sobre o valor correspondente à multa de ofício) e 116 (Para fins de contagem do prazo decadencial para a constituição de crédito tributário relativo a glosa de amortização de ágio na forma dos arts. 7º e 8º da Lei n. 9.532, de 1997, deve-se levar em conta o período de sua repercussão na apuração do tributo em cobrança). ACEITAÇÃO DE DOCUMENTOS EM ÂMBITO RECURSAL. REFORMULAÇÃO DE PREMISSA JURÍDICA QUE DISPENSOU A APRECIAÇÃO DE DOCUMENTOS APRESENTADOS EM IMPUGNAÇÃO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. Reformada premissa jurídica que dispensou a apreciação de documentos juntados em impugnação, os autos devem retornar à autoridade julgadora de 1ª instância para manifestação acerca destes documentos, bem como para avaliação quanto a necessidade de diligência e de exame de provas complementares juntadas na 2ª instância. Em consequência, resta prejudicado o debate acerca da aceitação de prova documental em âmbito recursal. ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA (IRPJ) Ano-calendário: 2008, 2009, 2010 UTILIZAÇÃO DE EMPRESA VEÍCULO. LEGALIDADE. MANUTENÇÃO DA DEDUTIBILIDADE DO ÁGIO. O ágio fundamentado em rentabilidade futura, à luz dos artigos 7º e 8º da Lei n. 9.532/97, pode ser deduzido por ocasião da absorção do patrimônio da empresa que detém o investimento pela empresa investida (incorporação reversa). O uso de holding (ou empresa veículo), constituída no Brasil com recursos provenientes do exterior, para adquirir a participação societária com ágio e, em ACÓRDÃO GERADO NO PGD-CARF PROCESSO 10600.720035/2013-86 DF CARF MF Fl. 19064 Original Fl. 2 do Acórdão n. 9101-006.381 – CSRF/1ª Turma Processo n. 10600.720035/2013-86 seguida, ser incorporada pela investida, reunindo, assim, as condições para o aproveitamento fiscal do ágio, não caracteriza simulação por interposição de pessoa, de modo que é indevida a tentativa do fisco de requalificar a operação tal como foi formalizada e declarada pelas partes. TRANSFERÊNCIA DOS RECURSOS POR EMPRESA CONTROLADORA DOMICILIADA NO EXTERIOR PARA SOCIEDADE HOLDING. LEGITIMIDADE DA DEDUÇÃO DO ÁGIO. IMPROCEDÊNCIA DA TESE DO REAL ADQUIRENTE. A transferência, por controladora domiciliada no exterior, dos recursos empregados na aquisição de participação societária por empresa holding constituída no Brasil não impede a amortização fiscal do ágio após esta ser incorporada pela investida. A tese do “real adquirente”, que busca limitar o direito à dedução fiscal do ágio apenas na hipótese de existir confusão patrimonial entre a pessoa jurídica que disponibilizou os recursos necessários à aquisição do investimento e a investida, não possui fundamento legal, salvo quando caracterizada hipótese de simulação, o que não se revela no caso. ÁGIO AMORTIZADO CONTABILMENTE E CONTROLADO NA PARTE B DO LALUR. POSSIBILIDADE DE AMORTIZAÇÃO DEPOIS DO EVENTO DE INCORPORAÇÃO. O artigo 7º da Lei n. 9.532/97, ao tratar da amortização fiscal do ágio, não faz qualquer remissão ou menção ao conceito ou saldo contábil, prescrevendo categoricamente que o ágio passível de dedução fiscal é aquele descrito “na alínea ‘b’ do § 2º do art. 20 do Decreto-lei 1.598/77”, ou seja, a diferença positiva entre o preço do negócio e o valor patrimonial da investida. LUCROS AUFERIDOS POR CONTROLADAS DOMICILIADAS NO EXTERIOR. CONVENÇÃO BRASIL-ARGENTINA E CONVENÇÃO BRASIL-PAÍSES BAIXOS (HOLANDA). PREVALÊNCIA DO ARTIGO 7º DOS TRATADOS EM FACE DO ARTIGO 74 DA MP 2.158-35/2001. O artigo 7º das Convenções firmadas pelo Brasil com a Argentina e Holanda para evitar a dupla tributação da renda, impede que os lucros auferidos pelas sociedades controladas lá domiciliadas sejam aqui tributados, “bloqueando”, assim, a aplicação da regra geral de tributação de lucros no exterior prevista no artigo 74 da MP n. 2.158-35/2001. ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO (CSLL) Ano-calendário: 2008, 2009, 2010 CSLL. LANÇAMENTO REFLEXO. Por se tratar de exigência constituída como reflexo do lançamento principal, a decisão de mérito que afastou a cobrança de IRPJ em virtude da glosa dos ágios deve ser aplicada também para fins de afastar a CSLL. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos. DF CARF MF Fl. 19065 Original Fl. 3 do Acórdão n. 9101-006.381 – CSRF/1ª Turma Processo n. 10600.720035/2013-86 Acordam os membros do colegiado, por maioria de votos, em conhecer parcialmente do Recurso Especial para os tópicos recursais A.4.I, A.5.II, A.5.III, A.5.V, A.5.VII, B.3, B.4, B.6 e B.7, divergindo os Conselheiros Edeli Pereira Bessa e Luiz Tadeu Matosinho Machado que também não conheceram do tópico recursal A.5.VII (julgamento encerrado em agosto/2022). No mérito, acordam em: i) por maioria de votos, dar provimento ao Recurso Especial nos tópicos A.4.I, A.5.II, A.5.III, A.5.V, A.5.VII, vencidos os Conselheiros André Mendes de Moura (relator), Edeli Pereira Bessa, Luiz Tadeu Matosinho Machado e Guilherme Adolfo dos Santos Mendes que negavam provimento (julgamento encerrado em novembro/2022); ii) por maioria de votos, dar provimento ao Recurso Especial nos tópicos B.6 e B.7, vencidos os Conselheiro André Mendes de Moura (relator), Edeli Pereira Bessa, Luiz Tadeu Matosinho Machado e Guilherme Adolfo dos Santos Mendes, que negavam provimento; iii) por maioria de votos, dar provimento ao Recurso Especial no tópico B.4 e considerar prejudicado o tópico B.3, vencido o Conselheiro André Mendes de Moura (relator) que dava provimento parcial ao Recurso Especial no tópico B.3 e considerava prejudicado o tópico B.4 e, subsidiariamente, negava-lhe provimento. Designada redatora ad hoc a Conselheira Edeli Pereira Bessa e designado para redigir o voto vencedor o Conselheiro Luis Henrique Marotti Toselli. Manifestaram intenção de apresentar declaração de voto os Conselheiros Edeli Pereira Bessa e Guilherme Adolfo dos Santos Mendes. Nos termos do § 5º do art. 58 do Anexo II do RICARF, não participou do julgamento o Fernando Brasil de Oliveira Pinto em razão de o relator, conselheiro André Mendes de Moura, já ter proferido seu voto na reunião de março de 2020. (documento assinado digitalmente) CARLOS HENRIQUE DE OLIVEIRA – Presidente. (documento assinado digitalmente) EDELI PEREIRA BESSA – Redatora ad hoc.

6. Compensação Imposto Pago no Exterior

Acórdão: 9101-006.512

Processo: 16692.720871/2017-99

1ª Turma, da CSRF

Julgamento: 04 de abril de 2023

Recorrente: AMBEV S/A

Redatora designada: Edeli Pereira Bessa

Ementa:

RECURSO ESPECIAL. CONHECIMENTO. DEDUÇÃO DE IMPOSTO PAGO NO EXTERIOR. UTILIZAÇÃO DO EXCEDENTE EM PERÍODOS POSTERIORES. LIMITES. POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO PARA LIQUIDAÇÃO DE ESTIMATIVAS. CONTEXTOS FÁTICOS E JURÍDICOS DIFERENTES. DIVERGÊNCIA NÃO CARACTERIZADA. Não se conhece de recurso especial cujos acórdãos apresentados para demonstrar a divergência evidenciam decisões em contextos fáticos e legislativos distintos do recorrido que examinou o aproveitamento de excedente de imposto pago no exterior sobre lucros de investidas destinado à liquidação de estimativas de período subsequente. Os paradigmas admitidos não analisaram a demandada apresentação de Declaração de Compensação – DCOMP para a liquidação das estimativas e, na parte em que flexibilizam o limite em razão do imposto devido, não tiveram em conta incidência sobre lucros de investidas no exterior, mas sim sobre outros rendimentos e em face de imposto retido e pago no Brasil, cuja compensação é estabelecida em regramento legal próprio.

CRÉDITO DE IMPOSTO PAGO NO EXTERIOR. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DA EXPRESSÃO “PAGO NO EXTERIOR”. IMPOSSIBILIDADE. Também devem ser considerados como impostos pagos no exterior, aqueles quitados ou cujo crédito foi extinto por compensação, mormente ante a explicita previsão legal que não admite a restrição de seus dizeres fora dos contornos normativos. Reformada a premissa jurídica que dispensou o julgamento administrativo, desde a 1ª instância, de se manifestar sobre as provas apresentadas, os autos devem retornar à DRJ.

[...]. No mérito, por maioria de votos, acordam em dar provimento parcial com retorno à DRJ para apreciar os documentos relativos à compensação de imposto pago no exterior [...].

COMENTÁRIOS DOS EDITORES: O acórdão examina questões de conhecimento, diante da ausência de similitude fática de certos paradigmas, e no mérito discute se a compensação no exterior produziria efeitos semelhantes ao pagamento do imposto estrangeiro, para fins de creditamento no Brasil, tendo em vista produzir a extinção da obrigação tributária.

Com relação ao tema do conhecimento, interessante observar apenas que o acórdão da Turma Ordinária discutia a “possibilidade de formação de saldo negativo a partir do IR no exterior pago por controladas” e sua compensação com estimativas devidas no Brasil. O que se percebe pelo acórdão é que a decisão da Turma Ordinária foi desfavorável ao contribuinte que não teve êxito em demonstrar a existência de paradigma sobre situação semelhante.

Ademais, o acórdão afirma não ser possível a formação de saldo negativo neste caso, pois a compensação do imposto estrangeiro com as estimativas não foi realizada por meio de DCOMP, o que seria necessário para a sua liquidação. A inexistência da forma que seria exigida por lei bastaria para negar provimento ao recurso voluntário da Contribuinte, diante da alegação de que o imposto pago no exterior, não aproveitado em períodos anteriores, só poderia ter sido validamente utilizado para compensação de estimativas se as estimativas tivessem sido compensadas mediante apresentação de DCOMP.

Com relação à possibilidade de se apurar crédito de imposto pago no exterior, quando este tiver sido quitado mediante compensação no exterior (e não pagamento em espécie), conclui que o pagamento e a compensação veiculam hipóteses extintivas de débito tributário e que a distinção está, basicamente, em qual momento a extinção se dá, já que a compensação depende do que disser o regramento legal específico.

A referência a “efetivo” pagamento indica que o objetivo da normatização era tão somente o de evitar a compensação, no Brasil, de pagamentos fictícios, como ocorre com os créditos presumidos, e não quando originados de valores efetivamente pagos (i.e., antecipação de imposto).

7. Preços de Transferência

Acórdão: 1301-006.329

Processo: 10680.000178/2004-34

1ª Turma Ordinária, da 3ª Câmara, da 1ª Seção

Julgamento: 11 de abril de 2023

Recorrente: USINAS SIDERURGICAS DE MINAS GERAIS S/A – USIMINAS Relator: Iágaro Jung Martins

Ementa:

PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA. MÉTODO PIC. SIMILARIDADE. COMPROVAÇÃO. Incumbe à fiscalização a comprovação da identidade ou similaridade dos produtos utilizados como parâmetro para ajuste da base de cálculo da CSLL conforme o Método de Preços Independentes Comparados (PIC). Na espécie, o fato de todos os produtos utilizados como referência encontrarem-se acobertados pela mesma classificação fiscal (NCM 27131100) não é suficiente para atestar a similaridade em razão da falta de distinção da qualidade, do teor de enxofre e do uso do coque de petróleo.

Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.

Acórdão: 9101-006.688

Processo: 16561.720074/2012-92

1ª Turma da CSRF

Julgamento: 9 de agosto de 2023

Recorrente WYETH INDUSTRIA FARMACEUTICA LTDA. (PFIZER)

Relator: Luis Henrique Marotti Toselli

Ementa:

AGREGAÇÃO DE VALOR. BLISTERIZAÇÃO. APLICABILIDADE DO MÉTODO PRL20. A “agregação de valor” prevista apenas em Instrução Normativa para fins de aplicação do PRL60 não tem base na lei. Constitui, portanto, critério jurídico que não deve surtir efeitos ante a extrapolação da função regulamentar das normas infralegais. A Lei n. 9.430, na verdade, criou o PRL60 para operações de importação de bens usados para produção (insumos), o que não se confunde com simples agregação de valores relativos às operações que não transformam o produto importado, como é o caso da blisterização exigida por legislação regulamentar para atender os padrões de embalagem e acondicionamento dos mesmos medicamentos importados a granel para revenda no mercado brasileiro. Aplicável, portanto, o PRL20 nessas operações.

IRPJ. AJUSTES NAS REGRAS DE PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA. REFLEXO NA CSLL. O decidido quanto ao lançamento matriz (IRPJ) deve ser aplicado à tributação reflexa (CSLL), decorrente dos mesmos elementos e fatos.

Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, em conhecer do Recurso Especial. No mérito, por determinação do art. 19-E da Lei n. 10.522/2002, acrescido pelo art. 28 da Lei n. 13.988/2020, em face do empate no julgamento, negou-se provimento ao recurso.

COMENTÁRIOS DOS EDITORES: O acórdão examina a ilegalidade da exigência de agregação de valor para fins de aplicação do método do PRL60 ao abrigo das regras de preços de transferência, em especial no caso de blisterização.

O resultado favorável ao contribuinte decorreu de empate na decisão com a aplicação do critério previsto no art. 19-E da Lei n. 10.522/2002, acrescido pelo art. 28 da Lei n. 13.988/2020, em vigor na data do julgamento.

Acórdão: 1401-006.569

Processo: 18471.000871/2006-46

1ª Turma Ordinária, da 4ª Câmara, da 1ª Seção

Julgamento: 18 de julho de 2023

Recorrentes: MULTI OPTICA DISTRIBUIDORA LTDA. e FAZENDA NACIONAL

Relator: André Severo Chaves

Ementa:

NORMA PROCESSUAL. APLICAÇÃO IMEDIATA. ENUNCIADO N. 103 DA SÚMULA CARF. Não deve ser conhecido o recurso de ofício de decisão que exonerou o contribuinte do pagamento de tributo e/ou multa de valor inferior ao limite de alçada. Para fins de conhecimento de recurso de ofício, aplica-se o limite de alçada vigente na data de sua apreciação em segunda instância.

PREÇO DE TRANSFERÊNCIA. MÉTODO DE APURAÇÃO. INDIVIDUALIZAÇÃO DOS PRODUTOS. A legislação de regência dos preços de transferência foi introduzida pela Lei n° 9.430/96 (arts. 18 a 24), tendo como objetivo coibir a transferência de resultados para o exterior, mediante a manipulação dos preços pactuados nas importações ou exportações de bens, serviços ou direitos, em operações com pessoas vinculadas, residentes ou domiciliadas no exterior, ou residentes em países de tributação favorecida que sejam ou não vinculadas. O art. 18, da Lei n. 9.430/96, estabelece que o custo passível de dedução terá como limite o valor determinado pelo PRL, isto é, da média aritmética dos preços de revenda dos bens, com as diminuições previstas no inciso II. Ou seja, ao determinar que o cálculo deverá ser efetuado pelo preço de revenda, extrai-se da própria lei que o cálculo é realizado de forma individual, por produto, sendo irrelevante para o cálculo do preço parâmetro a similitude técnica dos produtos.

RECOLHIMENTO DE ESTIMATIVA APÓS O INÍCIO DA FISCALIZAÇÃO. EFEITOS EM RELAÇÃO À MULTA ISOLADA. CONCOMITÂNCIA COM A MULTA DE MORA. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. Uma vez iniciada a fiscalização, e perdida a espontaneidade, configura-se a condição para a aplicação das penalidades, incluindo-se aí a multa isolada, que não mais pode ser evitada, mesmo com o pagamento da rubrica principal e acréscimos moratórios. O recolhimento realizado pelo contribuinte não deixa de produzir efeitos, eis que ele tem implicação direta na apuração anual do tributo, que acabou sendo regularizada com o recolhimento a destempo das estimativas. Mas a infração relativa à falta no recolhimento das estimativas não pode ser revertida após o início da fiscalização, posto que em relação a ela a Contribuinte não mais gozava de espontaneidade. Por outro lado, se a multa isolada objetiva justamente punir a falta no recolhimento de estimativa, este problema já foi compensado em parte pelo recolhimento da multa de mora que incidiu sobre esta mesma rubrica. A multa isolada (pela falta) possui uma relação de sobreposição com a multa de mora (pelo atraso), de modo que a multa de mora recolhida pela Contribuinte deve ser deduzida da multa isolada aplicada pela Fiscalização.

Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos (i) não conhecer do recurso de ofício; (ii) dar parcial provimento ao recurso voluntário tão somente para deduzir da exigência da multa isolada sobre as estimativas de IRPJ e CSLL do ano-calendário 2005 a multa de mora de 20% paga quando do recolhimento extemporâneo e sem espontaneidade das estimativas.

Embargos Acórdão: 9101-006.644

Processo: 16561.720183/2013-91

1ª Turma da CSRF

Julgamento: 11 de julho de 2023

Recorrente: TITULAR DE UNIDADE RFB

Interessado: GEVISA S/A

Relator: Luiz Tadeu Matosinho Machado

Ementa:

EMBARGOS INOMINADOS. RECURSO ESPECIAL. CONHECIMENTO. ABRANGÊNCIA INEXATIDÃO MATERIAL. RETIFICAÇÃO DO ACÓRDÃO SEM EFEITOS MODIFICATIVOS. Constatada a inexatidão material no acórdão, impõe-se a sua retificação quanto à abrangência de conhecimento do recurso especial, sem efeitos modificativos. Assim, há que se reconhecer a inexatidão material do acórdão embargado, corrigindo-se a disposição quanto ao conhecimento da divergência apontada na segunda matéria, na forma indicada pela contribuinte em seu recurso: PREÇO DE TRANSFERÊNCIA – Método Preço de revenda menos lucro (PRL) – Inclusão das despesas com fretes, seguros e imposto de importação na apuração do preço praticado.

Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, em acolher os embargos inominados, sem efeitos infringentes, para corrigir a inexatidão material apontada quanto à abrangência do conhecimento do recurso especial objeto do acórdão embargado.

8. Dedução de Royalties. Preços de Transferência

Acórdão: 1401-006.420

Processo: 16561.720113/2018-47

1ª Turma Ordinária, da 4ª Câmara, da 1ª Seção

Julgamento: 15 de março de 2023

Recorrente: ARCOS DOURADOS COMERCIO DE ALIMENTOS SA

Redator Designado: Daniel Ribeiro Silva

Ementa:

EXCESSO DE DEDUÇÃO DE ROYALTIES. INDÚSTRIA DE PRODUTOS ALIMENTARES. O limite de dedução dos royalties aplicável à indústria de produtos alimentares é de 4% da receita líquida de vendas do produto fabricado ou vendido. O contribuinte não opera como simples coletor de royalties que seriam devidos pelos subfranqueados nacionais ao detentor internacional do nome comercial e da marca explorados. A relação jurídica que obriga o franqueador master nacional (contribuinte) ao pagamento dos royalties ao detentor estrangeiro do direito é travada de forma direta. O pagamento dos royalties devidos pelo primeiro ao segundo independe do recebimento, pelo primeiro, dos royalties a ele devidos pelos subfranqueados nacionais (terceiros). O contribuinte, ao pagar os royalties, paga em nome próprio.

ÁGIO. OPERAÇÃO INTERNACIONAL. TRANSFERÊNCIA PARA O BRASIL. IMPOSSIBILIDADE. Não se admite a transferência de um ágio formado em operações realizadas entre entidades no exterior. O ágio deve ser registrado pela contribuinte, quando adquirir participações no Brasil. Caso ocorra a confusão patrimonial desta com a investida, em face da baixa do investimento, a legislação autoriza a dedução à razão de um sessenta avos ao mês do valor registrado. O ágio pago pela controladora no exterior (primeiro momento), não pode ser transferido para pessoa jurídica no Brasil (recorrente), com o intuito de deduzir esses valores na apuração dos tributos aqui devidos.

NULIDADE. PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA. DESQUALIFICAÇÃO. ESCOLHA DO MÉTODO. DIREITO SUBJETIVO. A escolha do método, quando entender aplicável o controle do preço de transferência, é direito subjetivo do contribuinte. Isso está claramente expresso na lei ao prever o direito de opção. Entender que tal dispositivo não seria aplicável em razão do contribuinte não ter adotado o controle de preço de transferência, por entender que tal controle não seria aplicável ao caso, é subverter a própria intenção da norma. A partir do momento que a fiscalização concluiu que seria aplicável o ajuste de preço de transferência, resguardado seria o direito do contribuinte de escolher o método que lhe fosse mais favorável, aplicando-se o que dispõe o art. 20-A. Dar um tratamento diferente seria limitar o direito subjetivo do contribuinte de entender inaplicável o preço de transferência.

MULTA QUALIFICADA. OPERAÇÃO DE ÁGIO. DOLO NÃO DEMONSTRADO Se não houver intuito de enganar, esconder, iludir, mas se, pelo contrário, o contribuinte agiu de forma clara, deixando explícitos seus atos e negócios, de modo a permitir a ampla fiscalização pela autoridade fazendária, e se agiu na convicção e certeza de que seus atos tinham determinado perfil legalmente protegido, não se pode duplicar a multa. Interpretar a norma tributária da maneira que entendia razoável, não é conduta suficiente para qualificação da penalidade.

DESCABIMENTO DA MULTA ISOLADA E MULTA DE OFÍCIO. Após a alteração da redação do artigo 44 da Lei n. 9.430/96 pela Lei n. 11.488/2007, a aplicação da multa isolada passou a ser possível, mesmo diante da aplicação de multa de ofício.

MULTA DE OFÍCIO. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. INCOMPETÊNCIA DO CARF. SÚMULA CARF N. 02. O Carf não é competente para se pronunciar sobre a inconstitucionalidade de lei tributária.

APLICAÇÃO DOS JUROS SELIC. A partir de 1º de abril de 1995, os juros moratórios incidentes sobre débitos tributários administrados pela Secretaria da Receita Federal são devidos, no período de inadimplência, à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – Selic para títulos federais.

JUROS MORATÓRIOS INCIDENTES SOBRE A MULTA DE OFÍCIO. SÚMULA CARF N. 108 Incidem juros moratórios, calculados à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – Selic, sobre o valor correspondente à multa de ofício. (Vinculante, conforme Portaria ME n. 129 de 01/04/2019, DOU de 02/04/2019).

ART. 24 DA LINDB. INAPLICABILIDADE. SÚMULA CARF N. 169. O art. 24 do decreto-lei n. 4.657, de 1942 (LINDB), incluído pela lei n. 13.655, de 2018, não se aplica ao processo administrativo fiscal.

Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso no tocante (i) ao descabimento da multa de ofício sobre a Glosa de Royalties e sobre DF CARF MF Fl. 28965 Original Fl. 3 do Acórdão n. 1401-006.420 – 1ª Sejul/4ª Câmara/1ª Turma Ordinária Processo n. 16561.720113/2018-47 os Ajustes de Preços de Transferência (75%); (ii) impossibilidade de aplicação dos juros Selic; (iii) aplicação do art. 24 da LINDB (Súmula Carf n. 169); (iv) glosa das despesas com ágio; Por voto de qualidade, negar provimento ao recurso em relação (i) à glosa do excesso de dedução das despesas de royalties; vencidos os Conselheiros Daniel Ribeiro Silva, André Severo Chaves, Lucas Issa Halah e André Luis Ulrich Pinto que davam provimento ao recurso; (ii) à aplicação do método de preços de transferência ao caso concreto; vencidos os Conselheiros Daniel Ribeiro Silva, André Severo Chaves, Lucas Issa Halah e André Luis Ulrich Pinto; (iii) multa isolada pela falta de recolhimento de estimativas; [...] Por maioria de votos, (i) indeferir a proposta de diligência para a apuração do ajuste de preços de transferência de acordo com o método escolhido pela Contribuinte e (ii) dar provimento ao recurso para (a) declarar a nulidade do lançamento relativo aos ajustes de preços de transferência, nos termos da fundamentação; [...] (b) afastar a multa qualificada incidente sobre a glosa de ágio.

9. Regras de Subcapitalização

Acórdão: 1302-006.970

Processo: 16682.720808/2019-33

2ª Turma Ordinária, da 3ª Câmara, da 1ª Seção

Julgamento: 19 de outubro de 2023

Recorrente: FAZENDA NACIONAL

Interessado: IBM BRASIL-INDÚSTRIA MAQUINAS E SERVIÇOS LIMITADA

Relator: Sávio Salomão de Almeida Nóbrega

Ementa:

[...] REGRAS DE SUBCAPITALIZAÇÃO E REGRAS ESPECIAIS DE INDEDUTIBILIDADE. ARTIGOS 25 E 26 DA LEI 12249/2010. REINO DOS PAÍSES BAIXOS. ANO-CALENDÁRIO 2014. INAPLICABILIDADE CONFORME ADE RFB N. 10/2010. EFICÁCIA EX NUNC DO ADE RFB 3/2015. São inaplicáveis, ao ano de 2014, as regras dos artigos 25 e 26 da Lei 12249/2010 às holding companies constituídas nos Países Baixos, pois o ADE RFB n. 3/2015, que revogou o ADE RFB n. 10/2010, tem eficácia prospectiva, conforme o parágrafo único do artigo 4º da IN RFB n. 1530/2014, segundo o qual o resultado do pedido de revisão produzirá efeitos a partir da data de publicação, no Diário Oficial da União, do ADE.

MULTA ISOLADA. ERRO DE ESCRITURAÇÃO NA ECD. DESCABIMENTO. INEXISTÊNCIA DE INFRAÇÃO E INEXISTÊNCIA DE PRÉVIA INTIMAÇÃO AO SUJEITO PASSIVO PARA SANAR A FALTA. Deve ser aplicada a aplicação da multa quando todas as informações necessárias para obter uma compreensão precisa do evento econômico estavam claramente apresentadas no lançamento contábil, o qual não deve ser interpretado exclusivamente com base em seu histórico. O § 1º do artigo 1184 do Código Civil permite a utilização de uma escrituração resumida do Diário, desde que os totais não ultrapassem um período de trinta dias, especialmente para contas com operações numerosas ou realizadas fora da sede do estabelecimento. A regra do inciso II do parágrafo único do artigo 12 da Lei 8218/1991 é suficientemente descritiva, abrangente e decisiva, no sentido de determinar que as multas “serão reduzidas” a 75% se o sujeito passivo cumprir a obrigação no prazo a ser fixado em intimação. A redação do dispositivo legal não deixa margem para dúvidas, pois estabelece, ao mesmo tempo, um direito para o contribuinte e um dever para a fiscalização, dever este concernente à necessidade de intimação para que o sujeito passivo forneça as informações ou corrija a ECD dentro de determinado prazo.

Acordam os membros do colegiado, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso de ofício, nos termos do relatório e voto do relator.

COMENTÁRIOS DOS EDITORES: O acórdão examina se a despesa com juros relativos a empréstimo contratado com holding constituída na Holanda, em país com regime fiscal privilegiado, seria indedutível.

O auto de infração aponta que a entidade não possuía empregados ou outros ativos tangíveis em seu patrimônio, além de outros indícios que entende suficientes para demonstrar que o contribuinte não comprovou que a mutuante holandesa exercia atividade economicamente substantiva, nos termos da IN RFB n. 1.037/2010.

Apesar desses indícios, o acórdão acolhe os argumentos do contribuinte, pois, em 2014, a inclusão dos Países Baixos na lista de regimes fiscais privilegiados, prevista no art. 2º da IN RFB n. 1.037/2010, encontrava-se suspensa pelo Ato Declaratório Executivo RFB n. 10/2010 desde 25/06/2010, tendo voltado a produzir efeitos somente em 21/12/2015, quando o ADE RFB n. 10/2010 foi revogado pelo Ato Declaratório Executivo RFB n. 03/2015.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – STJ

1. Preços de Transferência

AgInt AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL N. 2056722-SP (2022/0015888-5)

RELATOR: MINISTRO HERMAN BENJAMIN

AGRAVANTE: LABORATÓRIOS PFIZER LTDA

DECISÃO: Cuida-se de Agravo Interno interposto em face da decisão monocrática às fls. 2.640-2.649, e-STJ, que conheceu do Agravo para não conhecer do Recurso Especial, em razão de se impugnar ato infralegal e por incidir o óbice da Súmula 7 do STJ.

Na origem, trata-se de Agravo que visa à admissão de Recurso Especial (art. 105, III, “a”, da CF) contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região assim ementado (fls. 1.887-1.918, e-STJ):

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. LEI 9.430/1996. IN SRF243/2002. PREÇO DE TRANSFERÊNCIA. MÉTODO DE PREÇO DE REVENDA MENOS LUCRO – PRL 60 E PRL 20. PROVA PERICIAL DISPENSÁVEL. BLISTERIZAÇÃO E EMBALAGEM DE MEDICAMENTOS. AGREGAÇÃO DE VALOR. CRITÉRIO DEFINIDOR DA MARGEM DE LUCRO APLICÁVEL. LEGALIDADE. AUSÊNCIA DE INOVAÇÃO NORMATIVA. VIOLAÇÃO À ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA AFASTADA. RESPALDO EM ENTENDIMENTO MAJORITÁRIO À ÉPOCA. INOCORRÊNCIA. PREÇO PARÂMETRO. DESCONTO DE VALORES DEPIS/COFINS. MULTA DE OFÍCIO. SELIC. VERBA HONORÁRIA RECURSAL.

1. Não se verifica cerceamento de defesa no indeferimento da prova pericial contábil, pois a matéria discutida é de direito, sendo demonstrável por prova documental presente nos autos, não cabendo cogitar de violação ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa.

2. A IN SRF 243/2002 foi editada na vigência da Lei 9.959/2000, que alterou a redação da Lei 9.430/1996, para distinguir a hipótese de revenda do próprio direito ou bem, tratada no item 2, da hipótese de revenda de direito ou bem com valor agregado em razão de processo produtivo realizado no país, tratada no item 1, ambos da alínea do inciso II do artigo 18 da lei.

3. O cálculo do preço de transferência, pelo Método de Preço de Revenda menos Lucro – PRL, no caso de direitos, bens ou serviços, oriundos do exterior e adquiridos de pessoa jurídica vinculada, passou, na vigência da Lei 9.959/2000, a considerar a margem de lucro de 60% “sobre o preço de revenda após deduzidos os valores referidos nas alíneas anteriores e do valor agregado no País, na hipótese de bens (artigo 18, II, d, 1). importados aplicados à produção”.

4. A adoção, na técnica legal, do critério do valor agregado objetivou conferir adequada eficácia ao modelo de controle de preços de transferência, aderindo aos parâmetros da Convenção Modelo da OCDE, evitando distorções e, particularmente, redução da carga fiscal diante da insuficiência das normas originariamente contidas na Lei 9.430/1996 e refletidas na IN SRF 32/2001. O legislador, independentemente de obrigação convencional, pode adotar, na disciplina interna das relações jurídicas, modelos ou parâmetros internacionalmente aceitos ou discutidos, sendo, para tal efeito, irrelevante a subscrição da convenção ou se os próprios países subscritores descumprem o avençado. Imperioso ressaltar que a liberdade de conformação do legislador, adstrita aos vetores maiores de Constituição e legislação complementar – sem que, a propósito, esteja presente qualquer violação ao ordenamento hierárquico interno –, não pode, portanto, ser invalidada ao argumento de que o Brasil não aderiu à Convenção Modelo da OCDE.

5. O cálculo do preço de transferência a partir da margem de lucro sobre o preço de revenda é eficaz, no atingimento da finalidade legal e convencional, quando se trate de importação de bens, direitos ou serviços finais para revenda interna, não, porém, no caso de importação de matérias-primas, insumos, bens, serviços ou direitos que não são objeto de revenda direta, mas são incorporados em processo produtivo de industrialização, resultando em distintos bens, direitos ou serviços, agregando valor ao produto final, com participações variáveis na formação do preço de revenda, que devem ser apuradas para que seja alcançado corretamente o preço de transferência, deque trata a legislação federal.

6. A IN SRF 243/2002, ao tratar, nos §§ 10 e 11 do artigo 12, do Método do Preço de Revenda Menos Lucro, para bens, serviços ou direitos importados aplicados à produção, com exclusão do valor agregado e da margem de lucro de 60%, para tanto com a apuração da participação de tais bens, serviços ou direitos no custo e preço de revenda do produto final industrializado no país, não inovou nem violou o artigo 18, II, item 1, da Lei 9.430/1996, com a redação dada pela Lei 9.959/2000.

7. Houve a necessária e adequada explicitação, pela instrução normativa impugnada, do conteúdo legal para permitir a sua aplicação, considerando que o conceito legal de valor agregado, conducente ao conceito normativo de preço-parâmetro, leva à necessidade de apurar a sua formação por decomposição dos respectivos fatores, abrangendo bens, serviços e direitos importados, sujeitos à análise do valor da respectiva participação proporcional ou ponderada no preço final do produto.

8. O artigo 18, II, da Lei 9.430/1996, com redação da Lei 9.959/2000, previu que o8. preço de transferência, no caso de bens e direitos importados para a aplicação no processo produtivo, calculado pelo método de preço de revenda menos lucros – PRL 60,é a média aritmética dos preços de revenda de bens ou direitos, apurada mediante a exclusão dos descontos incondicionados, tributos, comissões, corretagens e margem de lucro de 60%, esta calculada sobre o preço de revenda depois de deduzidos os custos de produção citados e ainda o valor agregado calculado a partir do valor de participação proporcional de cada bem, serviço ou direito importado na formação do preço final, conforme previsto em lei e detalhado na instrução normativa.

9. O preço de transferência, assim apurado e não de outra forma como pretendido, é que pode ser deduzido na determinação do lucro real para efeito de cálculo do IRPJ/CSL. Há que se considerar, assim, a ponderação ou participação dos bens, serviços ou direitos, importados da empresa vinculada, no preço final do produto acabado, conforme planilha de custos de produção, mas sem deixar de considerar os preços livres do mercado concorrencial, ou seja, os praticados para produtos idênticos ou similares entre empresas independentes. A aplicação do método de cálculo com base no valor do bem, serviço ou direito em si, sujeito à livre fixação de preço entre as partes vinculadas, geraria distorção no valor agregado, majorando indevidamente o custo de produção a ser deduzido na determinação do lucro real e, portanto, reduzindo ilegalmente a base de cálculo do IRPJ/CSL.

10. Para dar eficácia ao método de cálculo do preço de revenda menos lucro, previsto na Lei 9.430/1996 com alteração da Lei 9.959/2000, é que foi editada a IN SRF243/2002, em substituição à IN SRF 32/2001, não se tratando, pois, de ato normativo inovador ou ilegal, mas de explicitação de regras concretas para a execução do conteúdo normativo abstrato e genérico da lei, prejudicando, pois, a alegação de violação aos princípios da legalidade e da capacidade contributiva, sem que exista, tampouco, fundamento para cogitar-se de ofensa à anterioridade tributária.

11. Para compreender que a Lei 9.430/1996, ao referenciar “produção” (artigo 18, II,11. d1, à época) não abrange a blisterização e embalagem de medicamentos, haveria que se assumir que o conceito de “industrialização” não estaria inteiramente abrangido em “produção”, o que a toda vista não pode ser acolhido. A solução propugnada pela apelante exige que se entenda que ao menos determinadas hipóteses de industrialização, não esclarecidas em nenhuma medida pela lei, estariam excluídas da ideia de “produção” (que seria conceito paralelo) e para estas não se aplicaria o PRL60. Não há, contudo, qualquer elemento normativo que permita esta inferência, tanto menos que oriente como a diferenciação deveria ser estabelecida em âmbito infralegal, pelo que nítida a impertinência do argumento. Revela-se contraditório frente ao próprio fundamento da diferenciação entre o PRL 60 e PRL 20 que haja processos de industrialização que se enquadrem na sistemática própria da revenda.

12. Inviável acolher a suscitação constante do recurso de que procedimentos “simples” de industrialização seriam considerados “revenda”. Afora a carência de respaldo normativo, o argumento apenas desloca o núcleo de incerteza (pois não há tampouco definição do que são industrializações “simples”). Além disto, inexiste, em qualquer elemento do sistema normativo tributário, ou do direito privado, qualquer disposição que trate procedimentos de industrialização específicos como revenda, pelo que é patente o descompasso com a teleologia do artigo 110 do CTN. Ademais, é certo que os elementos definidores do conceito de revenda prescindem de qualquer inferência a respeito da embalagem do produto. Se é impossível afirmar que a aposição de embalagem diversa daquela pela qual efetuada a aquisição da mercadoria é condição indispensável para a caracterização de revenda, ou que a tarefa de embalar é operação que pode ser isoladamente considerada como revenda (ainda que a alienação mercantil eventualmente não ocorra), é forçosa a conclusão de que não há qualquer liame entre os conceitos.

13. Os termos legais denotam que o critério de identificação de “produção” é, precisamente, a ocorrência de operação que agregue valor ao produto importado. Com efeito, a razão pela qual a variável “o valor agregado no país” aparece, na Lei9.430/1996, apenas na previsão do PRL 60, é justamente a de que esta é a circunstância que define a aplicação de tal método de cálculo. Havendo agregação de valor em âmbito interno, a margem de lucro aplicada para controle de preço de transferência deve ser de 60%, após deduzidos (do preço de revenda) os valores legais e o próprio valor agregado; do contrário, deve ser aplicado o percentual menor, de 20% como parâmetro. Esta observação é prontamente ratificada porque, em caso diverso, também a referência ao PRL 20 haveria que prever a dedução do valor agregado do preço de revenda, o que não consta da lei. Esta percepção é, afinal, adotada pela IN SRF243/2002 que apenas esclarece a diferenciação estabelecida na lei. Note-se, também, que o entendimento é em tudo mais condizente com a percepção de que todo processo industrial, por definição, tem por output um “produto”. Logo, toda industrialização enquadra-se como “produção”.

14. A blisterização caracteriza-se como processo industrial, largamente automatizado (note-se, a partir de maquinário imobilizado nas indústrias e mão de obra especializada), pelo qual cada unidade de medicamento é individualmente embalada (a “bolha” ou “blister” em que alocado o fármaco), a partir da termoformagem de filmes plásticos (que compõem a “cartela”). A embalagem secundária, normalmente de papelão, em que inseridas as cartelas (acompanhadas de bula), por sua vez, é a apresentação comercial do produto, inclusive com aposição de marca, que fica exposta na colocação do produto à venda. Não se trata, portanto, de mera embalagem para transporte, tampouco de estrito cumprimento de especificações regulamentares, mas etapa final de industrialização, impondo a conclusão de que não há importação de produto “final”, mas, sim, semiacabado. Não há que se confundir os parâmetros de fracionamento de medicamentos exigidos pela ANVISA com a aplicação de processos produtivos com finalidade comercial. A exceção do artigo 6º, § 2º do RIPI (quanto à caracterização de industrialização) aplica-se exclusivamente se o acondicionamento ou o rótulo atendam “apenas” normas técnicas.

15. Como corolário lógico da percepção, inclusive jurisprudencial, de que a normativa em debate não produziu inovação, forçosa a conclusão de que não há ofensa ao princípio da anterioridade tributária, entendimento igualmente assente no âmbito desta Corte. De fato, a IN SRF 243, publicada em 13/11/2002, tratou de explicitar parâmetros legais de apuração dos custos de bens importados para dedução na base de cálculo do IRPJ/CSL. A hipótese de incidência legalmente prevista manteve-se inalterada, falecendo sentido à pretensão de qualificar como majoração tributária a modificação de texto infralegal que, inclusive por impossibilidade normativa, não é o fundamento primário da tributação (este sim sujeito à anterioridade tributária). A IN SRF 243/2002 sequer modificou qualquer modelo de cálculo, propriamente, tão somente especificando conceitos como exigência material da incidência fiscal estabelecida pela lei, pelo que não se sustenta a alegada ofensa aos artigo 150, III, da Constituição Federal, bem como ao artigo 104 do Código Tributário Nacional. Assim, não há ilegalidade ou inconstitucionalidade na aplicação da disciplina normativa ao ano-calendário de 2002, até porque, à míngua de demonstração específica, nada impedia eventual retificação de escrituração em relação a operações já ocorridas no período em curso. Ademais, ressalta o permissivo legal, constante do artigo 18, § 1º, da Lei 9.430/1996, a consideração de “preços praticados e os custos incorridos durante todo o período de apuração da base de cálculo do imposto sobre a renda a que se referirem os custos, despesas ou encargos”. Precedentes da Corte.

16. Não cabe cogitar de entendimento majoritário observado pelo contribuinte com base em confiança legítima, no tocante à alegação de violação ao princípio da anterioridade. Com efeito, até porque os fatos em questão ocorreram no próprio ano de 2002, não havia prática administrativa consolidada sobre a aplicação da INSRF 243/2002. Neste sentido, todos os elementos apontados pela apelante são posteriores aos fatos (a saber, a Solução de Consulta COSIT 02/2008 e acórdãos administrativos 1201-00.658 e 9101-002.839, datados, respectivamente, de 14/03/2012e 12/05/2017) e não prevalecem frente à interpretação judicial exposta, que firma jurisprudência sobre a matéria. Não há o que se acolher com base no artigo 24 da LINDB, portanto.

17. A respeito da pretensão de afastar o desconto correspondente a créditos presumidos de PIS/COFINS da formação do preço-parâmetro (na espécie, previstos pela Lei10.147/2000), cumpre destacar que o artigo 18, II, da Lei 9.430/1996 expressamente prevê a subtração, no cálculo em questão, das “contribuições incidentes sobre as vendas”. A legislação aplicável à apelante não afasta a das contribuições, incidência pelas alíquotas fixadas na Lei 10.147/2000, o que seria o caso se houvesse isenção ou exclusão tributária (note-se que mesmo que a redução a zero da alíquota não significaria não incidência, mas ausência de repercussão quantitativa desta). O que existe, diversamente, é a previsão de valores presumidos a serem abatidos, a após incidência. Sendo este o fato jurídico valorado pela norma vigente à época (a incidência das contribuições sociais), correta a postura fiscal ao exigir o desconto em questão.

18. O artigo 113, § 1º, do CTN prevê que a penalidade pecuniária integra o crédito principal (não distinguindo, para tal, fim, a multa de ofício da de mora). O artigo 161do CTN, por sua vez, determina a correção do crédito tributário não pago no vencimento. Considerando que a correção do crédito tributário é realizada pela

taxa SELIC, na forma da Lei 9.250/1995, o silogismo conduz linearmente à conclusão deque a multa moratória deve ser corrigida pela SELIC. De fato, se a legislação tributária prevê conversão da multa moratória ou punitiva em obrigação principal, ao momento em que aplicada, o tratamento a ser dado no tocante aos juros

de mora não pode ser discrepante, até porque a privação do capital não se limita ao crédito tributário em si, dada a aplicação de sanção pecuniária. Conclusão em sentido diverso conflitaria com toda estrutura dogmática do CTN, na medida em que criaria valor exigível sem qualquer regime jurídico identificável, à margem do crédito tributário – que é o próprio instrumento normativo de cobrança de dívida fiscal, estruturado a partir do lançamento, nos termos do artigo 142 do CTN.

19. Fixada verba honorária pelo trabalho adicional em grau recursal, em observância ao comando e critérios do artigo 85, §§ 2º a 6º e 11, do Código de Processo Civil.

20. Apelação desprovida.

Os Embargos de Declaração foram rejeitados às fls. 1.981-2004, e-STJ. Aponta-se, no Recurso Especial, em preliminar, ofensa aos arts. 489, § 1º, IV, e 1.022, II, do CPC/2015, e, no mérito, violação dos arts. 3º, 9º, 97, 100, 104, 105, 106 e 144 do CTN; 18, II, “b”, “d”, da Lei 9.430/1996; 24, parágrafo único, da LINDB; e 7º, 369, 371, 464, § 1º, 479 e 480 do CPC/2015. Pugna-se, em suma, pela declaração de “ilegalidade e inaplicabilidade da IN n. 243/02 para o ano-calendário de sua edição (2002)” (fls. 2.054-2.104, e-STJ).

Nas razões de Agravo Interno (fls. 2.665-2.686, e-STJ, e-STJ), o agravante afirma que (fls. 2.671-2.672, e-STJ):

21. Especificamente quanto à ilegalidade da IN 243/02, o tema envolve as regras (dispositivos de lei federal, já listados acima) que determinam tanto (i) a metodologia de cálculo do preço parâmetro do método PRL 60; quanto (ii) a aplicação do PRL 60 aos procedimentos de blisterização de produção acabados, inviabilizando a aplicação do PRL 20. Esses temas são autônomos e distintos entre si.

[...] 23. Em breve síntese, a alteração na metodologia imposta pela IN n. 243/02 representa afronta ao princípio da legalidade, previsto nos artigos 9º, 97, 100 do CTN, assim como uma ofensa ao artigo 18, II, “d, 1, da Lei 9.430/96, especialmente por envolver majoração de tributação por uma norma infralegal.

24. As divergências entre as metodologias da Lei n. 9.430/96 (artigo 18, II, “d”, 1) e da IN 243/02 (artigo 12, § 11) são claras. Segundo a Lei n. 9.430/96 (conforme redação da Lei n. 9.959/00 e regulamentação pela IN n. 32/01) o PRL 60 deve ser apurado por meio de duas fórmulas. Por sua vez, a IN 243/02 modificou a estrutura do método PRL 60 e estabeleceu cinco fórmulas para sua apuração, que não podem ser identificadas a partir da leitura do texto legal.

Sem contrarrazões, conforme certidão à fl. 2.690, e-STJ.

É o relatório.

Decido.

Os autos foram recebidos neste Gabinete em 25 de outubro de 2022.

Considerando as razões apresentadas no recurso de Agravo Interno, reconsidero a decisão às fls. 2.640-2.649, e-STJ, uma vez que esta Corte Superior possui orientação no sentido de que é possível a análise, em Recurso Especial, da extrapolação ou não do poder regulamentar de Instrução Normativa em relação à Lei federal. A propósito:

TRIBUTÁRIO. ISENÇÃO. ADICIONAL DE FRETE DA MARINHA MERCANTE – AFRMM. REGIME ADUANEIRO ESPECIAL. REPETRO. CONDIÇÃO. SUSPENSÃO TOTAL DOS TRIBUTOS INCIDENTES NA IMPORTAÇÃO. PORTARIA MPT N. 72/2008. ATO NORMATIVO QUE EXTRAPOLA O COMANDO LEGAL. [...]

III – No caso dos autos, a recorrida promoveu importações de bens na sistemática do regime aduaneiro especial Repetro, instituído pelo Decreto n. 4.543/02, que se baseia nos regimes aduaneiros de admissão temporária com utilização econômica e de drawback. Em se tratando de regime aduaneiro de admissão temporária com utilização econômica, alega a Fazenda Nacional que a isenção ao AFRMM estaria afastada, pois a suspensão dos tributos nessa hipótese seria parcial, enquanto o art. 56 da Portaria MT n. 72/2008 exige a suspensão total.

IV – Não obstante a possibilidade de o ato normativo regulamentar a concretização do benefício fiscal, a Portaria MT n. 72/2008 evidentemente extrapolou o comando da Lei n. 10.893/2004, mediante a exigência de que a suspensão dos tributos incidentes na importação seja total. Isso porque a Lei n. 10.893/2004, ao instituir a isenção de AFRMM nas operações sujeitas aos regimes aduaneiros especiais, não condicionou o benefício à suspensão total dos tributos incidentes na importação.

V – À época dos fatos, estava em vigor a Instrução Normativa RFB n. 844/2008, que tratava sobre a aplicação do regime aduaneiro especial Repetro, cujo art. 4º estabelecia a suspensão total dos tributos incidentes na importação, de modo que perde sentido a alegação da Fazenda Nacional de que, no caso em tela, a recorrida não tinha o direito à isenção ao AFRMM.

VI – Recurso especial improvido.

(REsp n. 1.735.355/RJ, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 28/11/2022, grifei)

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. OFENSA AO ART. 1.022 DO CPC/2015 NÃO DEMONSTRADA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSELHO PROFISSIONAL. COMPETÊNCIA. NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO DE RESOLUÇÃO EDITADA PELO CONSELHO. ATO QUE NÃO SE ENQUADRA NO CONCEITO DE LEI FEDERAL. ACÓRDÃO FUNDADO EM DISPOSITIVO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ANÁLISE INVIÁVEL EM RECURSO ESPECIAL.

[...] 4. O fundamento central do Recurso Especial se baseia na Resolução 293/2004, do COFEN e na interpretação do princípio constitucional da separação dos poderes. No entanto, o Apelo Nobre não constitui, como regra, via adequada para julgamento de ofensa a resoluções, portarias ou instruções normativas quando analisadas isoladamente, sem vinculação direta ou indireta a dispositivos legais federais, por não estarem tais atos normativos compreendidos na expressão “lei federal”, constante da alínea “a” do inciso III do art. 105 da Constituição Federal.

5. Não compete ao Superior Tribunal de Justiça, na via especial, analisar eventual contrariedade a preceito contido na Constituição Federal, tampouco uniformizar a interpretação de matéria constitucional, porquanto seu exame é de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal, conforme dispõe o art. 102, III, do permissivo constitucional.

6. Agravo Interno não provido. (AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.071.024/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 13/12/2022, grifei.)

Diante do exposto, dou provimento ao Agravo Interno e reconsidero a decisão monocrática às fls. 2.640-2.649, e-STJ. Após as publicações, retornem os autos para nova apreciação do Agravo em Recurso Especial.

Publique-se.

Intimem-se.

Brasília, 29 de março de 2023.

MINISTRO HERMAN BENJAMIN

Relator

AgInt no RECURSO ESPECIAL N. 1957687-SP (2021/0277305-1)

RELATOR: MINISTRO HUMBERTO MARTINS

AGRAVANTE: SANDVIK DO BRASIL S/A INDÚSTRIA E COMÉRCIO

Ementa: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AFRONTA AOS ARTIGOS 165, 458 E 535 DO CPC/1973. NÃO OCORRÊNCIA. TRANSAÇÕES INTERNACIONAIS ENTRE PARTES VINCULADAS. PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA. BASE DE CÁLCULO DO IRPJ E DA CSLL. MÉTODO DO PREÇO DE REVENDA MENOS LUCRO – PRL60. CÁLCULO DA INSTRUÇÃO NORMATIVA SRF 243/2002. ILEGALIDADE. ART. 18, II, DA LEI 9430/96.

Cuida-se, na origem, de embargos à execução fiscal opostos pela ora agravante, em execução ajuizada pela União, requerendo o cancelamento das certidões de dívida ativa n. 80.2.17.002985-64 e 80.6.17.008800-68, em razão da ausência de certeza e liquidez e o cancelamento das certidões de dívida ativa n. 80.2.17.002985-64 e

80.6.17.008800-68, tendo em vista a ilegalidade da Instrução Normativa n. 243/2002, que as embasa.

Em primeira instância, o processo foi extinto sem julgamento do mérito quanto à retificação das CDAs, pela falta de interesse processual, e julgado improcedente, mantendo a exigência relativa às CDAs nos80.2.18.016089-09 e 80.6.18.112536-65 com valores retificados. Condenada a União ao pagamento de honorários advocatícios fixados em valor correspondente à 20 salários-mínimos vigentes à data da sentença.

O Tribunal de origem manteve a sentença em sua integralidade. No recurso especial a parte recorrente apontou violação dos artigos 1.022, I e II, do CPC, 18 da Lei n. 9.430/1996; 9º, I, e 97, I e II, do CTN e dos arts. 85, § 3º e 140, parágrafo único, do CPC.

Sustenta que a referida instrução normativa extrapola e inova as determinações da Lei n. 9.430/96, com redação dada pela Lei n. 9.959/00, gerando aumento de tributação sem previsão legal, o que a tornaria inconstitucional e ilegal.

A matéria relativa à extrapolação do poder regulamentar referente à da IN SRF 243/2002 foi analisada pela Primeira Turma desta Corte no julgamento do AREsp n. 511.736/SP e do REsp n. 1.765.882/SP.

Nos referidos julgamentos, os Ministros da Primeira Turma entenderam que a norma regulamentadora (IN/SRF n. 243/2002) foi além da moldura normativa proposta pelo legislador ordinário (art. 18, II, da Lei n. 9.430/1996, com a redação dada pela Lei n. 9.959/2000).

No AREsp n. 511.736/SP, o Ministro Gurgel de Farias, em seu voto-vista que posteriormente foi acompanhado pelo Relator e demais Ministros da Turma,

expressamente consignou que “o ato infralegal editou critério completamente estranho à lei regulada, ao estabelecer como preço parâmetro “a diferença entre o valor da participação do bem, serviço ou direito importado no preço de venda do bem produzido”, preconizando uma espécie de proporção dos bens, serviços ou direitos importados no preço de venda do bem produzido”.

E complementa fundamentando que, se “a sistemática prevista no art. 18, II, da Lei n. 9.430/1996 (com a redação dada pela Lei n. 9.959/2000) provocava distorções ou não reproduziria fielmente a chamada fórmula at arm’s length (ou princípio do preço sem interferência), competia à lei (em sentido estrito) modificá-la, e não ao executor ou intérprete da norma. É verdade que a expressão “valor agregado” prevista na lei regulada poderia ensejar margem para interpretações díspares. Mas a instrução normativa não se dispôs a promover a exegese dessa expressão em particular. Ela (a norma secundária), na realidade, criou conceitos novos e os inseriu na fórmula de cálculo para definição do preço de transferência, sem que o legislador ordinário tenha dado qualquer margem para tal inovação. E pior: aumentando a carga tributária”.

No caso dos autos, o Tribunal de origem, ao analisar a controvérsia, assim se manifestou (fls. 662-667):

[...]

Desse modo, merece reforma o acórdão por contrariar o entendimento dominante deste Tribunal, aplicando-se, ao caso, o entendimento consolidado na Súmula 568/STJ: “o relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema”.

Ante o exposto, reconsidero a decisão de fls. 1.054-1.059 para dar provimento ao recurso especial, a fim de, reformando o acórdão recorrido, afastar a aplicação do art. 12, §11, da IN SRF n. 243/2002, para cálculo do IIRPJ e da CSLL, autorizando que o cálculo dos recolhimentos entre a vigência da IN SRF n. 243/2002, até o advento da Lei n. 12.715/2012, seja realizado na forma da IN SRF n. 32/2001.

Invertem-se os ônus sucumbenciais.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília, 20 de abril de 2023.

Ministro HUMBERTO MARTINS

Relator

O acórdão da 1ª Turma é o primeiro julgado do STJ a examinar a ilegalidade da IN 243/2002 que vigorou até 2012, porém, o recurso não foi julgado sob a sistemática de recursos repetitivos.